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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Discurso que devia ser transcripto a pag 1337, col. 3.ª linha 66, do Diario de Lisboa, na sessão de 28 de abril

O sr. Mártens Ferrão: — Não venho renovar um debate, que está findo por uma votação unanime da camara; não volto a fallar sobre esse objecto, não posso faze-lo, nem me parece que isso fosse conveniente. O que venho é registar a minha opinião ácerca do incidente de que actualmente se trata.

Folguei de ver a maneira como começou o meu nobre amigo e collega o sr. Albuquerque Amaral, explicando o sentido, que dá ao requerimento, que hontem fôra mandado para a mesa por um sr. deputado.

Não creio effectivamente que nós possamos ou ainda que podessemos, que devêssemos fazer publicar documentos alheios aos actos parlamentares; documentos, que se referem á vida privada dos individuos que têem assento n'esta casa ou que o não tivessem. Seria um precedente menos nobre e menos digno da parte da camara, fertil em inconvenientes, e que rebaixaria a dignidade do parlamento.

Que a camara decida que se publique o processo, que diz respeito ao meu illustre amigo o sr. Gouveia Osorio, creio uma inutilidade porque a camara já a respeito d'elle cumpriu a sua missão; já o julgou, mas ainda assim é para mim uma cousa indifferente; mas que se publiquem outros documentes relativos a um negocio já julgado pela camara e completamente findo, sobre o qual não se póde votar, estou certo que a camara não ha de querer estabelecer um precedente, que não se pratica em corporação alguma. Depois de um processo findo nada mais se póde addicionar; não se volve sobre elle. A consideração que a camara teria com qualquer individuo, não a póde quebrar para com os seus membros.

Não sei se o illustre deputado o sr. Gouveia Osorio addicionou ou não esclarecimento ao processo quando estava pendente da resolução da camara; se o não fez podia livremente faze-lo. Era elle a parte que tinha a ser julgada, e até á decisão da camara a defeza era-lhe pela lei e pelos precedentes amplamente garantida.

O processo estava completo perante as auctoridades judiciaes, estava porém pendente perante a camara, e eu que já me reputo antigo n'esta casa, posso dizer que a pratica constante aqui, sempre que tem vindo á camara processo em relação aos srs. deputados, tem sido, que as commissões aceitam todos os esclarecimentos apresentados pelos deputados, tendentes a illustrar a camara, que julga como jury, sem ter de fundamentar expressamente a sua decisão, nem lavrar accordão ou sentença.

Eu não venho aqui censurar o procedimento das auctoridades administrativas; mas desejaria que ellas se contivessem na esphera da administração; que não procurassem pôr-se directamente em communicação com o parlamento enviando lhe documentos sobre processos pendentes da camara; jamais de uma vez tem havido serios desgostos d'esta casa por as auctoridades administrativas entenderem que se devem dirigir á camara sobre questões analogas.

As auctoridades administrativas correspondem-se com o governo, e este tem obrigação de as defender, se injustamente são atacadas; não tendo aqui assento não o podem ellas fazer directamente. É sempre o governo que tem obrigação de as defender ou de as punir, o que não póde é ser-lhe indifferente. Mas se este é o dever do governo, por outra parte as auctoridades administrativas não podem, não devem, não se póde admittir nem é conveniente que venham estabelecer communicação directa com o parlamento, pretendendo influir nas decisões. Contra este principio protesto eu, não o admitto.

A moção de ordem, que tencionava mandar para a mesa, era para que a camara decidisse que a votação que hontem tinha tido logar, de modo algum comprehendia a publicação dos documentos que não fossem os do processo, que foi julgado perante a camara; mas tendo o requerimento que hontem foi votado sido explicado pelos illustres deputados que me precederam não faço a proposta que tencionava.

Notarei ainda, sr. presidente, que a resolução da camara com relação ao julgamento d'este processo foi tão nobre, tão digna e tão elevada, que não é sem sentimento que vejo procurar destruir-se tanto tempo depois o nobre effeito que produziu uma resolução unanime da camara!

Com relação ás considerações que a imprensa tem feito a proposito d'esta resolução, a camara nada deve ter com ellas. Se nós viessemos levantar aqui as arguições pessoaes da imprensa, viriamos frequentes vezes tratar na camara o que não tem aqui o seu logar, como mais de uma vez tenho sustentado.

Eu, sr. presidente, declaro muito francamente, que respeitando muito a imprensa como uma instituição indispensavel nas sociedades; mas estando em perfeito desaccordo na maneira por que ella aprecia de ordinario os individuos, e não poucas vezes os negocios publicos; estabeleci para mim como regra não a ler quando assim se desvaira na apreciação das pessoas e das cousas.

D'esses pugilatos pessoaes entendo que é melhor afastarmos as vistas até que a imprensa chegue a corrigir-se, e não estando eu disposto a votar nem a minima restricção á sua maxima liberdade, sinto comtudo profundamente que ella se não eleve sempre á altura da sua missão, discutindo os negocios publicos e não os individuos, e perdendo assim a força que devia ter. Mas discuta ou não está no seu direito; o que me parece é que se não deve estabelecer correspondencia entre o parlamento e a imprensa ácerca de questões pessoaes. Isso acarretaria-nos discussões infructiferas e desagradaveis, alheias completamente da missão da camara, com perda e preterição do tempo necessario para o maduro exame dos negocios mais importantes, e que vem de ordinario lançar os debates n'esta casa n'um campo inconveniente, o crear ou pôr a descoberto indisposições que é triste que se dêem ou manifestem aqui entre homens que se devem respeitar, e que estão n'uma posição social especialissima, e sobre os quaes o paiz tem os olhos, porque elles devem ser os sacerdotes da lei (apoiados).

Não digo mais nada: a questão está collocada no seu verdadeiro terreno; parece-me que a camara nada tem que notar, em vista das declarações do illustre deputado que me precedeu.

Discurso que devia ser transcripto a pag. 1341, col. 1.ª, lin. 66, do Diario de Lisboa, na sessão de 28 de abril

O sr. Castro Ferreri: — Com quanto o assumpto que se discute não seja da minha competencia, não posso deixar de dizer alguma cousa a seu respeito, ainda que muito pouco para não cansar a camara.

Trata-se da instituição de um banco, a que se chama banco nacional ultramarino, e que para assim dizer de ultramarino só tem o nome, porque onde elle se estabelece é em Portugal, aonde ha de estender as suas operações, visto que nove partes do seu fundo ficam cá.

É com effeito uma instituição importante com relação á agricultura e com relação ao commercio; mas para o ultramar não trás as vantagens que se imaginam. E eu vou mostrar as immensas concessões que se lhe fazem.

Em primeiro logar, quando nós devemos restringir os privilegios que se concedem aos bancos ou ás associações anonymas, porque um privilegio é sempre um monopolio, este banco não tem um praso fixo de duração, como têem todos e como convem que o tenham para que se possam alterar os privilegios que se lhes hajam concedido, quando essa alteração for julgada conveniente.

Depois o seu fundo consta de 4.000:000$000 réis, e só entram nas nossas colonias de Africa 400:000$000 réis, ficando a parte mais importante do capital em Portugal...

O sr. Ministro da Marinha: — 400:000$000 réis só para Angola.

O Orador: — Eu não duvido de que nas outras populações se estabeleçam succursaes e agencias; mas o que vejo é que não se estipula a quantia que deve pertencer-lhes, porque ao passo que se estabelecem 400:000$000 réis para Angola, não se estabelece tanto para Cabo Verde, e tanto para Mossamedes; e portanto só tenho a considerar esses 400:000$000 réis.

O sr. Ministro da Marinha: — É só para Loanda.

O Orador: — Conviria então que a commissão tivesse estipulado no projecto geral as sommas que se destinavam para as outras localidades, isto é, o minimo, pois o projecto falla sómente de algumas e nada mais.

O governo garante o juro de 7 1/2 por cento ao anno sobre esses 400:000$000 réis, isto é, 30:000$000 réis de subvenção, caso novo, e que me não consta se haja concedido a banco algum. O banco póde fazer a emissão do triplo do seu capital, ou de 1.200:000$000 réis com o juro de 8 por cento e 12 por cento; o que nunca se prometteu a estabelecimento algum d'esta ordem. O proprio banco do Brazil póde apenas emittir o duplo do seu fundo inicial, e com onerosas condições.

O sr. Ministro da Marinha: Todos o podem fazer.

O Orador: — Eu não creio que haja banco algum ao qual se concedesse a emissão do triplo do seu fundo existente.

Os 400:000$000 réis de Loanda traduzem-se em réis 1.200:000$000, que a 12 por cento rendem 36 ou 43 1/2, juntando-lhe o que o governo dá!

Ora já se vê que eu entendo que a somma applicada em Angola é mui pouco importante á vista do fundo de réis 4.000:000$000, de que se compõe o banco, para todas as operações em Angola, Mossamedes e Cabo Verde (leu); mas isto é facultativo. Portanto alem dos immensos privilegios que são concedidos tem mais este de que trata a representação que tenho presente de negociantes muito respeitaveis, privilegio que não é concedido a banco algum, e por especial recepção ao de Lisboa, que deve acabar.

Não se julgue que eu impugno a creação d'este estabelecimento bancario; não, senhores; o que quero unicamente é que a respeito d'elle se não faça uma excepção dando-se-lhe preferencia a todos os mais creditos, o que de certo é injusto, e vae prejudicar todas as transacções commerciaes dos negociantes d'esta praça com aquella provincia.

Em vista pois d'estas considerações não posso deixar de provocar da parte do illustre relator da commissão ou do sr. ministro da marinha algumas explicações, mesmo porque tenho duvidas quanto ás agencias que se estabelecem. Vejo que á succursal se lhe marca em Loanda um fundo; mas em quanto ás outras são agencias que podem constar de um simples correspondente e nada mais; isto póde ser uma decepção. Aguardo pois a resposta de s. ex.ª, e depois tomarei a palavra se assim o entender.

Esquecia-me de fallar da vantagem de se não poder por espaço de quinze annos estabelecer outras instituições d'esta ordem, não havendo portanto concorrencia para se obter dinheiro com um juro menor, pois ninguem dirá que 8 por cento para a agricultura e 12 por cento para as outras operações seja de vantagem.