O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

—97—

Discurso que devia ler-se a pag. 49, col. 2.ª, lin. 46 da sessão n.° 4 d'este vol.

O sr. Barão das Lages: — Sr. presidente, se a resposta ao discurso da corôa fosse sómente um cumprimento de respeito ao Augusto Chefe do Estado, ella seria votada unanimemente pela camara; se porém o discurso da corôa é, como se diz, um documento altamente ministerial, no qual se avalia a politica do gabinete, em que se mencionam os factos mais importantes, que tiveram logar durante os intervallos das sessões, e as medidas mais urgentes que o ministerio ha de apresentar ao parlamento, este documento é de uma grande importancia politica, e deve merecer uma séria discussão.

Sr. presidente, não entro longamente no debate, e mesmo não pediria a palavra se um facto de uma grande significação politica não tivesse succedido entre nós, do qual sou obrigado a pedir ao ministerio explicações categoricas, para sabermos as regras constitucionaes em que vivemos.

As questões politicas já não são moda; as questões hoje são todas de administração publica, de economia politica, e melhoramentos materiaes; mas é verdade tambem que levando nós trinta annos a conquistar e fundar o systema constitucional, não devemos deixar passar sem explicações factos que nos põe em guerra aberta com esse systema.

Sr. presidente, eu declaro-me em hostilidade com o gabinete, porque estou profundamente convencido de que este ministerio é inteiramente obnoxio aos interesses do paiz.

Já na sessão passada fiz opposição porque entendia que o sr. ministro da fazenda administrativa muito mal a fazenda publica; mas suppunha que este ministerio tinha uma boa qualidade, que era ser um ministerio amante dos principios, porém depois que vi a dissolução da camara passada, e o systema de corrupção que o governo empregou nas eleições, entendo na minha consciencia, que este ministerio não é digno do apoio de homens que se presam de ser liberaes.

Sr. presidente, havia uma camara que funccionava regularmente com o ministerio, aonde o ministerio tinha maioria, e uma maioria illustrada e independente, como elle dizia. Essa camara for imprevistamente dissolvida, sem que o ministerio ou a camara rompesse em hostilidade, não tendo precedido votação contra o governo. É o que ha de mais notavel é que o governo vinte ou trinta dias antes da dissolução, lendo só uma maioria de seis votos, entendeu pedir ao poder moderador a sua demissão, que lhe foi aceita; e trinta dias depois propoz ao Chefe do Estado a dissolução d'essa mesma camara, que o governo havia promettido solemnemente de nunca dissolver. Pois que contradicção é esta? É indispensavel explicar estes factos que fazem do systema constitucional um brinco de creanças, e que nos expõe á irrisão das nações civilisadas.

Entendo que o ministerio não podia constitucionalmente dissolver aquella camara; porque, tendo o sr. Fontes Pereira de Mello apresentado um systema de fazenda que não recebeu a approvação da outra casa do parlamento, entendeu-se então que a corôa não devia tomar a responsabilidade daquellas medidas, nomeando novos pares.

Que as eleições estavam proximas: que se devia fazer um appêllo ao paiz, resignando os ministros suas cadeiras. Assim se fez; mas quando essa camara se inclinava a chamar ao governo do paiz esses cavalheiros, o governo esquecendo todos os principios, dissolve o parlamento! Se o ministerio entende que tem o poder de dissolver uma camara sem que este acto esteja sujeito a regras imprescriptiveis, então era melhor fechar as portas d'esta casa, e proclamar o absolutismo.

Estimo que um nobre deputado tivesse dito do alto da

tribuna que nós não podiamos discutir este acto, porque era do exercicio do poder moderador, e que esta heresia constitucional tivesse recebido um apoiado do sr. ministro da fazenda! Seria um charlatanismo da minha parte estar a fazer erudição sobre uma cousa que sabem os estudantes nas escolas.

Só direi que não ha actos indifferentes na ordem politica; que a pessoa do Rei é impeccavel, e a corôa irresponsavel, logo os ministros são os responsaveis por todos os actos, e a quem o parlamento pede a responsabilidade; é o que nos ensinam os principios rudimentaes do direito publico constitucional.

O discurso da corôa é um documento bem triste, porque indica o adiamento de todas as importantes questões do estado. Sempre do alto do throno se proclama a necessidade da reforma da instrucção publica, e d'esta vez nem uma só palavra se disse; o que prova que os srs. ministros não pensaram sobre este grave assumpto.

Tenho pena que o sr. ministro do reino não imprimisse no gabinete as nobres qualidades de que é adornado o seu espirito, e por esta occasião tenho a dizer a s. ex.ª, que não basta a creação de muitas cadeiras de instrucção primaria: é indispensavel dota-las mais convenientemente; os mestres d'este ensino occupam-se em outros mesteres, porque o seu ordenado é tão exiguo, que lhes não chega para viver. Mando uma proposta para a mesa n'este sentido.

Não posso tambem deixar de locar em outro ponto em que sempre se tem fallado n'esta occasião solemne. A emigração para o Brazil é uma allucinação de espirito, é um desvairamento de opinião. O Brazil é a terra da promissão para aquelles desgraçados, de onde nos vem estas tristes relações de portuguezes fallecidos, que o mais velho tem trinta e seis annos! A agricultura esta soffrendo muito com este estado, e pergunto aos srs. ministros o que ss. ex.ªs têem feito ácerca de tão importante assumpto, porque mesmo o modo como se está fazendo esta emigração é mais proprio de um paiz selvagem do que de um paiz christão. Mando tambem uma proposta a este respeito.

Sr. presidente, não posso deixar de chamar a attenção dos nobres ministros sobre a necessidade de apresentar medidas que melhorem a condição da classe ecclesiastica. Esta classe em outro tempo tão rica e poderosa, hoje ve-se no mais completo abandono. A dotação do clero entre nós é uma vergonha, os parochos têem uma pequena sustentação e não têem a independencia necessaria dos seus freguezes. A nação portugueza sendo uma nação eminentemente catholica deve querer que os seus ministros sejam illustrados, independentes e bem dotados; e por isso mando tambem para a mesa uma proposta n'este sentido.

Não posso deixar tambem de notar, que sempre do alto do throno se tem dito uma palavra de consolação e de esperança aos desgraçados habitantes dos paizes vinicolos. Não venho aqui repetir o que tenho dito cem vezes em relação ao paiz vinhateiro do Douro.

Deus castigou aquelle terreno com um terrivel flagello; mas, as injustiças do governo vão quasi ao par daquelle terrivel mal. Auctorisado pelo sr. ministro da fazenda, em pleno parlamento, digo, para aviso a toda a gente que não leve rendimento liquido, que não paga os impostos.

Mando tambem para a mesa uma proposta a este respeito.

(Leu os additamentos, os quaes mandou para a mesa.)

(O sr. deputado não reviu este discurso.)