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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Discurso do sr. Mariano de Carvalho, na sessão de 29 de agosto, que devia ler-se a pag. 445, col. 2.ª

O sr. Mariano de Carvalho: — Pretendo explicar ao mesmo tempo o meu voto, e não defender o projecto de lei que não foi admittido á discussão, mas justificar o procedimento dos seus auctores.

O partido reformista, a que tenho a honra de pertencer e que tomou a iniciativa na apresentação d'este projecto, entende, como creio que entendem todos os homens publicos liberaes e amantes d'este paiz, que a actual constituição do estado, a carta constitucional, precisa ser reformada em alguns dos seus artigos e accommodada aos costumes e aos progressos do espirito humano.

Entende mais que n'este processo da reforma das instituições devemos antes aproveitar os recursos que a mesma constituição nos fornece, do que lançar mão de outro qualquer recurso que possa dar em resultado a perturbação da ordem publica. O partido reformista queria o progresso e a liberdade pela legalidade (apoiados), e pela ordem.

Não nos admirou que este projecto não fosse admittido á discussão; esperavamo-lo até não só pelas circumstancias especiaes dos partidos politicos, mas tambem por que a historia de todos os tempos e de todas as nações mostra que commettimentos d'esta ordem não são realisados á primeira vez que se tentam; é necessario tempo e persistencia.

A historia politica e economica da Inglaterra e a de todas as nações tornam evidente esta verdade. Não desanimamos com o resultado de hoje; appellâmos para o futuro e para a energia da nossa vontade e das nossas convicções.

Ouvi dizer a alguns dos illustres deputados que têem fallado, que não admittiam o projecto á discussão, porque o julgavam vago e indefinido; outros porque o julgavam inopportuno; e outros finalmente porque receiavam que a sua discussão trouxesse ao paiz a desordem ou um abalo geral que podia ser funesto.

Entendo que o projecto, apresentado pelo meu illustre amigo o sr. Francisco Mendes, não podia ser concebido de outro modo, não podia deixar de ser indefinido, uma vez que se interpretem, como me parece que devem ser interpretados, os artigos da carta que regulam esta materia. O artigo 140.° da carta diz (leu).

Por consequencia, este artigo prescrevendo que se faça a proposição por escripto para a reforma de algum dos artigos da carta, desde que diz «algum dos artigos» admitte a reforma simultanea de mais de um. Póde-se constitucionalmente propor de uma só vez a reforma de mais de um artigo. Assim se fez quando foi discutido e approvado o acto addicional.

Este artigo porém não é tão explicito como seria para desejar, mas aqui temos o artigo 142.°, que torna esta questão muito mais clara, porque diz (leu).

Admittida á discussão, e vencida a necessidade da reforma, não quer dizer que deva ser vencida a materia da reforma; não podia sê-lo, porque seria isso contra a mesma constituição.

O que se discute em côrtes ordinarias é o projecto de lei, approvando a necessidade da reforma, e aos futuros legisladores é que cumpre tratar d'essa reforma. De outro modo as côrtes extraordinarias viriam com mandato imperativo, o que não permittem nem a rasão, nem a dignidade humana, nem a propria carta.

Não era possivel indicar n'este projecto qual a reforma

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que se precisa realisar. Os auctores do projecto indicavam-n'a no relatorio, porque não podiam ir mais longe. Era facil indicar a um e um todos os artigos, cuja reforma julgâmos necessaria, mas tanto valeria isso como indicar todos os artigos constitucionaes de determinados titulos. Todos julgâmos susceptiveis de util e liberal reforma.

Creio ter demonstrado que os auctores do projecto procederam em harmonia com a lei quando apresentaram a proposta com a fórma que lhe deram.

Ouvi a um illustre deputado, que se senta na extrema direita, que não via nos artigos da carta, que se referem á organisação e divisão dos poderes, materia para reformas.

Pois não seria a reforma que maior echo encontra no paiz a da camara dos pares? E esta está comprehendida nos titulos em que s. ex.ª não viu materia de reforma.

O artigo que diz respeito aos direitos individuaes tambem não garante clara e completamente a liberdade de consciencia, nem o direito de reunião, nem o da livre manifestação do pensamento, como o tem provado os debates que tem havido n'esta camara e factos recentes. Esse artigo é dos que mais carecem de reforma.

No estado actual de agitação do paiz e da Europa, dizem alguns illustres deputados, é necessario primeiro que tudo tratar das questões da administração e de finanças, deixando para mais tarde a questão politica.

E eu lembro aos illustres deputados que têem esta opinião que, se olhassem um pouco para o passado, veriam que em todas as camaras têem entrado os homens mais notaveis do paiz, e que em todos os ministerios tem havido homens cuja boa vontade não se póde negar; comtudo a fazenda tem marchado de desordem em desordem, de ruina em ruina, e a administração civil está n'um cahos completo, como têem demonstrado os proprios que combateram o projecto.

Estes factos, a inefficacia dos esforços de tantos homens distinctos e de boa vontade para conseguirem melhoramentos na administração e na fazenda indicam que no nosso codigo politico ha defeitos essenciaes que todo o esforço e toda a intelligencia dos mais eximios estadistas não têem podido vencer ou remediar. Ou havemos descrer de todos os partidos e de todos os homens, ou admittir a existencia de uma causa politica superior.

Emquanto á inopportunidade nas circumstancias actuaes, devo dizer que quando na Europa se prepara uma crise social que póde ter bem funestas consequencias, creio que as nações prudentes devem evitar todos os pretextos, todos os motivos para a desordem. E se é facto (como eu creio, mas entretanto não o apresento senão como hypothese), se é facto que a opinião publica no nosso paiz deseja a reforma da constituição, está claro que ir ao encontro d'esse desejo em harmonia com os principios liberaes da nação e da epocha, é tirar um pretexto á desordem. Se o paiz quizer a reforma constitucional, e não lh'a dermos pelos meios legaes, é de receiar que a venham a ter pela força.

Termino aqui as minhas considerações, porque não quero de modo nenhum abusar da concessão que a camara fez; mas antes de concluir peço a v. ex.ª que, se por acaso não lhe for possivel conceder-me a palavra antes da ordem do dia, consulte a camara sobre se me concede especialmente a palavra para tratar de um negocio urgente que diz respeito ao decoro de um membro d'esta camara.

Discurso do sr. Mariano de Carvalho, na sessão de 29 de agosto, que devia ler-se a pag. 456, col. 2.ª

O sr. Mariano de Carvalho: — Todos sabem que infelizmente o nosso collega, o sr. Luiz de Campos, se retirou hoje d'esta sala muito incommodado (apoiados).

S. ex.ª, um dos mais distinctos talentos e dos mais nobres caracteres d'esta camara, antes de saír d'aqui, disse-me que já tinha vindo á camara embora enfermo, nas duas sessões anteriores, por querer cumprir um dever que julgava de honra. Esse dever resulta de uma inexactidão contida no Diario da camara, e s. ex.ª desejava vir manifesta-la de um modo solemne.

Na sessão do dia 25 de agosto o sr. presidente do conselho descrevia aqui, com cores tenebrosas, os crimes da communa; e o illustre deputado, o sr. Luiz de Campos, julgando que a allegação do sr. presidente do conselho era um ardil para desconceituar o nosso partido politico, exclamou do seu logar: «Está em discussão a communa?»

Creio que a camara não ouviu mais nada.

Entretanto no Diario da camara apparece: «Se está em discussão a communa, peço a palavra.»

Se está em discussão a communa, peço a palavra, parece indicar por qualquer modo que o illustre deputado por Vizeu queria defender os actos da communa, o que estava longe das suas intenções e das suas idéas. Por consequencia, peço que no Diario da camara se rectifiquem aquellas palavras, que foram ali introduzidas por um equivoco, sem que s. ex.ª as tivesse pronunciado (apoiados).

Em cumprimento da missão que me incumbiu o sr. Luiz de Campos mando para a mesa a seguinte moção.

O sr. Presidente: — As palavras do sr. deputado ficam consignadas na acta de hoje, assim como a annuencia da camara, e creio que isto é bastante.

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