1586 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
que a disposição da lei, util no exercito, não tem rasão de ser, e antes é nociva para o serviço publico na marinha.
A incoherencia de s. exa. é, por consequencia, manifesta, acceitando agora o additamento do illustre deputado, o sr. Abreu e Sousa. (Apoiados.)
O sr. Abreu e Sousa: - Eu acceito a hypothese do artigo 80.° da lei, para os soldados e não para as praças.
O Orador: - Praças de pret são todos os individuos desde o soldado até ao sargento ajudante ou brigadas. (Apoiados.) E não sou eu só que o digo; ninguem que conheça um pouco as cousas militares o póde ignorar.
O sr. Ministro da Marinha (Henrique de Macedo): - V. exa. dá-me licença?
Quando eu disse no relatorio, que era util, etc., não quiz de modo nenhum dizer, nem podia dizer, que a disposição não seria util para as praças todas graduadas.
Com relação ao exercito, esta disposição era util, e tanto que, não se propõe a sua derogação, mas sim apenas uma alteração.
O Orador: - Mas as entidades que constam da proposta do illustre deputado o sr. Abreu e Sousa, satisfazem integralmente as condições de praças de pret, e tendo se dirigido o sr. ministro, no seu relatorio, em sentido generico, a praça, n'essa designação, permitta-se-me a insistencia, estão comprehendidas as graduadas e não graduadas, e portanto posta em evidencia a contradicção de s. exa. (Apoiados.)
De tudo isto se deduz mais uma rasão por que nem todos os bachareis podem fazer tudo. (Riso.)
Sr. presidente, eu disse já que acceitava não só o projecto, mas tambem a emenda do sr. Abreu e Sousa, additando-lhe uma proposta, que mando agora para a mesa, e que quando comecei a fallar. Não queria, porém, deixar passar sem protesto a leviandade systematica com que este governo faz leis. (Apoiados.) Foi isso que eu procurei pôr em relevo, e é isso que ainda me dá margem a dizer que este governo é, no genero, incontestavelmente original.
Póde ficar certo de que não tem rival. (Apoiados.)
E a proposito de originalidade, recordo-me agora do que se passou com um homem de letras, francez, que a camara toda conhece seguramente de nome, e que já morreu, Edmond About.
Tinha elle feito uma campanha em regra, pela imprensa, contra o governo chamado de 16 de maio, sendo presidente da republica, franceza o marechal Mac-Mahon. Depois da queda do marechal, dizia Edmond About, com relação ao gabinete republicano, que seguidamente fôra organisado: elle tudo me prometteu, eu tudo acceitei, e elle nada me deu.
Ora este governo está precisamente n'este caso. O governo tudo promette ao paiz, e nada faz; e quando alguma cousa faz, é o contrario do que devia fazer. (Apoiados.)
Vozes: - Muito bem.
O sr. Ministro da Marinha (Henrique de Macedo): - Sr. presidente, nem v. exa.,
nem o illustre deputado, nem a camara estranhará, que, em vista do estado do adiantamento, não só da sessão legislativa, mas da sessão de hoje, porque se passou á ordem do dia bastante tarde, não estranhara, digo, que eu não aproveite o ensejo da discussão d'este projecto, para entrar em uma larga discussão politica.
S. exa propoz um additamento, e se eu tomei a palavra n'esta occasião, foi apenas para dizer que, não estando presente o sr. ministro da fazenda, eu nada posso dizer sobre essa proposta.
Tendo, por acaso, conversado com o sr. ministro da guerra, soube que elle é favoravel á idéa do additamento apresentado pelo sr. Abreu e Sousa; tive d'isto conhecimento por mero acaso e suppuz até que s. exa. viria apresentar, elle proprio, uma proposta relativa a alguma alteração na lei do recrutamento, no tocante ao exercito.
Por isso, apparecendo agora este additamento, e sabendo
que o sr. ministro da guerra o approvava, declarei á camara, por parte do governo, que o acceitava, apesar da sua materia ser estranha ao projecto de lei que se discute.
Não se dá porém o mesmo em relação á proposta do sr. Baracho. A respeito d'essa devo dizer que me parece natural que ella seja remettida á commíssão competente; e se a camara assim o resolver, ali poderá ser ouvido o sr. ministro da fazenda para se pronunciar sobre O assumpto.
Em todo o caso o que é necessario é que nenhuma d'estas propostas se anteponha á discussão do projecto; e talvez que na ultima redacção, como já disse, possam ser introduzidas as disposições que n'ellas se contêem.
Parece-me tambem que não deve causar estranheza ao sr. Baracho o facto de ser enviado o seu additamento á commissão porque com isso não se pratica senão um acto de respeito pelo parlamento.
Quanto á lei do recrutamento votada em 1887, devo lembrar que ou, n'essa occasião, não fazia parte do ministerio, e que se o respectivo projecto não foi analysado pelas commissões de guerra e marinha, foi isso motivado pela circumstancia de estar chegada ao seu termo a sessão e haver urgencia da lei.
Não deve, portanto, s. exa. considerar esta omissão como falta de respeito pelas formulas parlamentares. (Apoiados.)
(S. exa. não reviu.)
O sr. Avellar Machado : - Presto a devida homenagem no sr. ministro da marinha pela sinceridade e franqueza com que s. exa. escreveu estas palavras que são a condemnação completa da sua maioria n'esta casa.
(Leu.)
Se s. exa. se tivesse afastado de vez dos seus collegas, creia que melhor teria andado para credito seu e boa norma dos verdadeiros principios constitucionaes.
(Interrupção do sr. ministro da marinha.)
Creia s. exa. que lhe fallo d'esta maneira pela muita sympathia e consideração que s. exa. me merece e mereceu sempre e que os termos em que s. exa. só expressa no relatorio que precede o projecto ou proposta de lei que se discute, dão logar á interpretação que apresentei.
O sr. Ministro da Marinha (Henrique de Macedo): -
Se o illustre deputado me dá licença, observarei que essas palavras não querem dizer que não houvesse no exercito algumas classes de praças para as quaes fosse rasoavel a excepção de que se trata.
Essas palavras o que queriam dizer era que a doutrina da lei de 1887 era util para o exercito, quando applicada á generalidade.
Póde ser que com taes palavras não manifestasse bem o meu pensamento, mas era este...
O Orador: - Isto, porém, pouco vale para o caso, porque s. exa. têm de responder unicamente pelos negocios da marinha; não pelos que tem intima relação com o exercito.
Pondo isto de parte, vejamos de relance as circumstancias que o anno passado se deram na discussão da lei do recrutamento.
Por duas vezes, uma na sessão diurna, quando se discutia a generalidade do projecto, e outra na sessão nocturna, discutindo-se a especialidade do mesmo projecto, eu tive a honra de propor, sendo-me rejeitado com energia e clamor por parte da maioria, que ácerca de tão importante proposta de lei fossem ouvidas as commissões de guerra e marinha. A sessão foi até um pouco tempestuosa, devida ao facciosismo dos granadeiros do governo, que não queriam de modo algum que as commissões de guerra e de marinha emittissem o seu conspicuo parecer n'uma lei de recrutamento, quando, como todos sabem, o soldado é a materia prima de um exercito, assim com o marinheiro um dos primeiros elementos a considerar n'uma bem organisada. (Apoiados.)