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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

lealmente a todas as auctoridades, que não exerçam pressão sobre a vontade e a consciencia dos cidadãos, e que apenas encaminhem docemente a opinião no sentido das idéas e da politica do governo. Outros houve que influiram nas eleições directa e abusivamente (apoiados), dando força ás tendencias malignas dos seus agentes, auctorisando todos os abusos, violencias e excessos, protegendo os criminosos, depois de averiguados os delictos, o negando-se a dar satisfação aos principios liberaes postergados, e á moral publica offendida (apoiados).

Tem havido entre nós de tudo, e até houve, creio eu, um governo de eterna e risonha recordação, que confiou, sem condições, a amigos pouco escrupulosos, que fizeram a partilha do leão, a direcção politica de umas eleições (riso).

Deploremos, sr. presidente, todas as aberrações do systema constitucional (apoiados). Censuremo-las, e castigue-mo las (apoiados). Mas é preciso mais alguma cousa, é necessario evita-las no futuro (apoiados). É impreterivel acautelar todas as fraudes, que uma longa experiencia tem denunciado (apoiados). Façamos nova lei eleitoral (apoiados). Revolvamos toda a nossa actual legislação n'este assumpto (apoiados). Expunjâmos do acto eleitoral a sombra até da interferencia da auctoridade na eleição (apoiados). Haja severas penas para os infractores da nova lei (apoiados). Haja serias responsabilidades para todos os delinquentes, sem excepção, desde o cabo de policia até ao ministro do reino (apoiados). Seja a violencia contra a liberdade, seja a pressão na consciencia, seja a fraude, seja o suborno, seja a veniaga, seja a corrupção um crime abominavel, um peccalo sem perdão. Cumpram todos o seu dever. Querelem todos os cidadãos, querele sempre o ministerio publico, seja inflexível o poder judicial, se quer manter o prestigio de que necessita, para tornar respeitada a sua alta missão (apoiados).

É preciso castigar todos os abusos; quer elles procedam da auctoridade, quer procedam dos cidadãos (apoiados). Urge que todos se mantenham dentro da esphera da lei, que todos obedeçam aos principios constitucionaes e ás prescripções da moral (apoiados).

Não façamos só a lei eleitoral; é necessario, é indefectivel educar e instruir o povo. Empreguemos os mais energicos esforços, para que o povo portuguez desgraçadamente indifferente e apathico nos actos mais solemnes do systema constitucional, adquira habitos honestos de vida publica, e pese com justeza todos os seus deveres politicos e moraes. Não nos limitemos só a garantir direitos, colloquemos-lhes ao lado o sentimento do dever, e a consciencia da propria independencia.

Quando o homem for instruido, ha de ser digno; quando for digno, ha de ser independente; e quando for independente, está realisado todo o desideratum de uma excellente lei eleitoral, porque está assegurada a execução da sua parte mais essencial.

Sr. presidente, se eu entendo bem o mechanismo e a indole do systema constitucional, não posso ser absolutamente da opinião d'aquelles, que pretendem, que os governos sejam completamente indifferentes a todo o movimento eleitoral. Eu parto do principio, de que n'aquellas cadeiras nunca se póde assentar uma administração sem programma (apoiados), sem partido, mais ou menos disciplinado (apoiados), ou sem amigos numerosos, que o valham.

Este partido governamental que ampara e proteje o programma ministerial, tem direito, tem mesmo obrigação de pelejar no combate eleitoral, mas em repto leal e cavalheiroso, mas em campo franco e aberto, igualados os meios legitimos de acção (apoiados), sem surprezas, sem emboscadas, sem traições (muitos apoiados). Não vem á luta como agente directo e official do governo, apparece como os simples cidadãos. Não precede o despotismo, com as faxas do lictor, traja as insignias augustas da soberania popular. (Vozes: — Muito bem.)

Os excessos da auctoridade, as intimidações, as ameaças, os patronatos, as veniagas, as violencias, as perseguições, são immoralidades, são crimes, são infamias, que a consciencia publica condemna, e que as leis devem fulminantemente castigar (muitos apoiados).

Quando os excessos são de homem particular para homem particular, ainda o fraco de animo póde abrigar-se á sombra da lei, e recorrer aos poderes tutelares da sociedade, ou buscar amparo nas consciencias honestas e nos espiritos rectos, que se revoltam contra todas as prepotencias e contra todas as cobardias. Mas quando são os poderes publicos que vexam e opprimem o cidadão (e ás vezes parece que todos conspiram diabolicamente para o mal), que remedios e que recursos ha contra estas oppressões??? É soffrer e calar, e ás vezes, por desespero, perturbar a ordem publica.

As perturbações de ordem publica não vem só da ignorancia, do desvario, do fanatismo das classes menos illustradas (apoiados), procedem tambem dos maus governos (apoiados), que não respeitam a liberdade dos cidadãos (apoiados), que desacatam cynicamente os principios, e que fazem perder ao povo a esperança de que sejam mantidos e assegurados os seus direitos politicos e individuaes (apoiados. — Vozes: — Muito bem.) E d'ahi que vem o odio de muitos ás instituições... não direi-ás instituições, porque aonde houver um coração nobre e um espirito illustrado, não póde haver odio ás instituições liberaes; mas é d'ahi que procede a aversão e a antipathia contra os estadistas hypocritas e contra os governos pseudos-liberaes (apoiados); é d'ahi que vem a atonia dos espiritos, o servilismo das almas, a degradação dos caracteres, a dissolução dos costumes, e ás vezes a perda de uma nacionalidade, se um facto providencial, a revolução, na sua accepção mais generosa e mais levantada, não acode a salvar de imminente perigo aquelles que Deus não quer perder. (Vozes: — Muito bem.)

Sr. presidente, não quero attribuir ao governo associação consciente e criminosa nos actos eleitoraes; mas é para mim ponto de fé, diz-me a minha mais sincera convicção, affirma-me a consciencia, que elle foi mal servido por muitos dos seus agentes no acto eleitoral; agentes que affrontaram a liberdade, que offenderam a moral politica (apoiados), que calcaram aos pés os direitos dos cidadãos, e que não podem continuar a exercer as funcções que estão desempenhando (apoiados).

Sr. presidente, não estou aqui tratando de discutir especialmente factos que occorreram n'um ou n'outro circulo eleitoral. Trato da questão em geral; se eu precisasse convencer a camara, de que o governo foi mal servido no acto eleitoral pelos seus agentes officiaes e officiosos, não tinha mais do que appellar para as palavras auctorisadas e para os amigos mais intimos e predilectos do proprio governo. Se são suspeitos os argumentos da opposição, porque os dicta a paixão ou o despeito; se a oratoria da esquerda não é orthodoxa para o lado direito da camara, eu offereço ao sr. marquez d'Avila, como os mais valiosos depoimentos, em abono das minhas apreciações, o proceder insuspeito do sr. relator da resposta ao discurso da corôa, e o de um seu empregado de confiança, o sr. ex-governador civil de Coimbra. Este segundo cavalheiro, e meu amigo, propoz ha pouco, n'esta casa, a reforma da lei eleitoral. Que significa este zêlo pelas liberdades publicas, e pelos direitos dos cidadãos? Significa, que o ex-governador civil de Coimbra, o sr. Telles de Vasconcellos, que nos declarou aqui, n'uma apreciavel effusão de sinceridade, ter dirigido as eleições d'aquelle importante districto, acha e entende, que é necessario acautelar na lei fraudes e violencias, que a auctoridade póde praticar (muitos apoiados). Se isto não é logico, não sei raciocinar (apoiados). Se está bem garantida e assegurada na actual legislação a liberdade eleitoral, para que urge reformar a lei? Para cercear direitos não póde ser, porque o sr. Telles é um homem liberal, e não podia nutrir no seu espirito tão reprehensiveis aberrações (apoiados).