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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887

Presidencia do exmo. sr. José Maria Rodrigues de Carvalho

Secretarios os exmos. srs.

Francisco José de Medeiros
José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral

SUMMARIO

Têem segunda leitura um projecto do sr. D. José de Saldanha, assignado por outros srs. deputados: outro dos srs. Oliveira Martins e João Arrojo; e uma nota de renovação de iniciativa dos mesmos.- Apresentam projectos de lei os srs. Simões Ferreira e Guilherme de Abreu, sendo o d'este ultimo considerado urgente. - Apresentam representações os srs.: Vieira de Castro, de alguns negociantes da praça de Lisboa: e o sr. João Pinto, José Pinto dos professores officiaes de ensino primario no concelho do Fundão. - O sr. Alves Matheus, referindo-se ás observações feitas na sessão de hontem pelo sr. Franco de Castello Branco, ácerca de um incidente occorrido entre o governador civil de Braga e á camara de Guimarães, fez o elogio do governador civil de Braga, mostrando que as accusações que lhe tinham sido feitas não tinham fundamento. - O sr. Pedro Monteiro, não lhe tendo chegado a palavra por occasião da discussão do projecto de lei n.° 138 (bill de indemnidade), fez largas considerações com relação á instrucção publica, referindo se ao discurso do sr. Julio de Vilhena, quando tratou da instrucção secundaria. - O sr. ministro das obras publicas apresentou uma proposta de lei, auctorisando o governo a vender directamente á camara municipal de Thomar o pinhal da Catta. - O sr. ministro da fazenda mandou para a mesa uma proposta de lei, auctorisando o governo a permitir a convenção das obrigações emittidas pelo banco nacional ultramarino, em virtude, do decreto de 29 de dezembro de 1855, e com fundamento na carta de lei de 22 de julho do mesmo anno, ou outras de juro inferior, comtanto que não haja augmento no praso da amortisação fixado n'aquella, lei e na annuidade de 59:309$400 réis, indicada no citado decreto.- Apresentam requerimentos de interesse particular os srs. Pereira Borges, Pinheiro Chagas e Augusto Ribeiro. - Justificaram faltas os srs. Alpoim, Hintze Ribeiro, Pedro Victor e José de Napoles.
Na primeira parte da ordem do dia entrou em discussão o projecto n.° 157, creando no lyceu de Braga o ensino das linguas grega e allemã. - Usa da palavra o sr. Franco Castello Branco, mostrando a necessidade de se crearem em Guimarães cadeiras de francez e inglez para a instrucção dos seus industriaes, e apresenta uma proposta n'este sentido. Responde-lhe o sr. ministro das obras publicas, dizendo que o projecto tratava de lyceus e não de escolas industriaes, e que mais uteis julgava em Guimarães crear junto da escol:, industrial, como era sua intenção, officinas de serralheria, cutellaria e tecelagem para aperfeiçoamento d'aquellas industrias. - Apresentam propostas do additamento ao projecto os srs. José Castello Branco, Abreu Castello Branco e Candido da Silva. - a sr. Alves de Moura (relator) mostra que não havia perfeita paridade entre o que se requeria nas propostas e as circumstancias especiaes que se davam no lyceu de Braga, e por essa occasião faz o elogio do governador civil de Braga, defendend-o das arguições que lhe fizera na sessão antecedente o sr. Franco Castello Branco. - O sr. Franco Castello Branco responde ás considerações que lhe fizera o sr. ministro das obras publicas e por essa occasião estranha que o sr. Alves de Moura viesse, levantar a questão de Guimarães para fazer o elogio da auctoridade superior do districto. - Por ultimo, julgando-se a materia discutida, a requerimento do sr. Vieira de Castro, é o projecto approvado, sendo rejeitados os additamentos dos srs. Franco Castello Branco, José Castello Branco, Candido da Silva e Abreu Castello Branco.
Na segunda parte da ordem do dia entra em discussão o projecto n.° 186 (reforma de pautas). - O sr. Matoso Santos (relator) apresenta, por parte da commissão, differentes emendas. - Enceta a discussão o sr. D. José de Saldanha, que fica com a palavra reservada.

Abertura da sessão - Ás duas horas e tres quartos da tarde.

Presentes á chamada 58 srs. deputados. São os seguintes:- Alfredo Brandão, Antonio Castello Branco, Oliveira Pacheco, Pereira Borges, Tavares Crespo, Antonio Maria de Carvalho, Mazziotti, Hintze Ribeiro, Augusto Fuschini, Miranda Montenegro, Augusto Ribeiro, Bernardo Machado, Eduardo José Coelho, Feliciano Teixeira, Matoso Santos, Freitas Branco, Francisco de Barres, Fernandes Vaz, Francisco de Medeiros, Francisco Ravasco, Gabriel Ramires, Guilherme de Abreu, Sá Nogueira, Casal Ribeiro, Pires Villar, João Pina, Cardoso Valente, Searnichia, Franco de Castello Branco, Izidro dos Reis, Dias Gallas, João Arroyo, Menezes Parreira, Vieira de Castro, Teixeira de Vasconcellos, Rodrigues dos Santos, Sousa Machado, Correia Leal, Alves Matheus, Oliveira Valle, Joaquim Maria Leite, Simões Ferreira, Jorge de Mello (D.), Amorim Novaes, Alves de Moura. Ferreira Galvão, Barbosa Collen, José Castello Branco, Pereira e Matos, Ruivo Godinho, Abreu Castello Branco, Vasconcellos Gusmão, José Maria de Andrade, Oliveira Matos, Rodrigues de Carvalho, José de Saldanha (D.), Santos Moreira, Santos Reis, Julio Graça, Bandeira Coelho, Manuel José Correia, Manuel José Vieira, Matheus de Azevedo, Miguei da Silveira, Pedro Monteiro, Estrella Braga, Visconde de Silves e Consiglieri Pedroso.

Entraram durante a sessão os srs.: - Albano de Mello, Moraes Carvalho, Mendes da Silva, Alfredo Pereira, Alves da Fonseca, Baptista de Sousa, Antonio Candido, Antonio Centeno, Antonio Villaça, Ribeiro Ferreira, Antonio Ennes, Guimarães Pedrosa, Jalles, Pereira Carrilho, Barros e Sá, Simões dos Reis, Santos Crespo, Victor dos Santos, Lobo d'Avila, Elizeu Serpa, Emygdio Julio Navarro, Goes Pinto, Madeira Pinto, Fernando Coutinho (D.), Firmino Lopes, Almeida e Brito, Francisco Beirão, Francisco Machado, Lucena e Faro, Soares de Moura, Severino de Avellar, Guilhermino de Barros, Candido da Silva, Souto Rodrigues, Santiago Gouveia, Alfredo Ribeiro, Silva Cordeiro, Joaquim da Veiga, Oliveira Martins, Jorge O'Neill. Dias Ferreira, Elias Garcia, Laranjo, Pereira dos Santos, Figueiredo Mascarenhas, Ferreira Freire, Alpoim, Barbosa de Magalhães, Simões Dias, Abreu e Sousa, Julio Pires, Lopo Vaz, Vieira Lisboa, Poças Falcão, Manuel Espregueira, Manuel d'Assumpção, Brito Fernandes, Pinheiro Chagas, Marçal Pacheco, Marianno de Carvalho, Marianno Presado, Miguel Dantas, Dantas Baracho, Tito de Carvalho e Vicente Monteiro.

Não compareceram á cessão os srs.: - Serpa Pinto, Anselmo de Andrade, Sousa e Silva, Campos Valdez, Gomes Neto, Moraes Sarmento. Fontes Ganhado, Urbano de Castro, Augusto Pimento!, Conde de Castello de Paiva, Conde de Villa Real, Eduardo de Abreu, Elvino de Brito, Estevão de Oliveira, Castro Monteiro, Francisco Matoso, Frederico Arouca, Sant'Anna e Vasconcellos, Baima de Bastos, Avellar Machado, Ferreira de Almeida, Guilherme Pacheco, José de Napoles, José Maria dos Santos, Pinto de Mascarenhas, Julio de Vilhena, Mancellos Ferraz, Luiz José Dias, Pedro Victor, Sebastião Nobrega, Visconde de Monsaraz, Visconde da Torre e Wenceslau de Lima.

Acta - Approvada.

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores. - Entre os serviços importantes que estão a cargo das camaras municipaes, e, que o actual codigo administrativo expressamente recommenda, merece muito especial consideração o da extincção dos incendios.
Luctar contra a força devoradora do fogo, para salvar vidas, a propriedade, e haveres, é uma necessidade, para a satisfarão da qual todos quasi espontaneamente concorrem.

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Assim, em muitas terras, estão hoje organisadas sociedades de mancebos, que, com a denominação de bombeiros voluntarios, se dedicam da maneira mais distincta a essa corajosa e arriscada tarefa, coadjuvando por esta fórma poderosamente as auctoridades locaes.
Se nas povoações pequenas o emprego d'estes esforços é capaz de pôr obstaculo á devastação d'aquelle formidavel agente, não acontece o mesmo nas cidades grandes, onde a accumulação de predios, a existencia de muitas materias combustiveis, e a repetição de accidentes extraordinarios provocam constantemente incendios, que seriam geralmente muito desastrosos, se não houvesse recursos dispostos para os combater, e para limitar os seus estragos.
É difficil e muito despendiosa a organisação de um bom serviço para extincção de incendios; mas torna-se realmente indispensável nas cidades populosas.
Acontecimentos recentes, entre nós e no estrangeiro, affirmam a urgencia de prestar a mais séria attenção a este assumpto, fazendo convergir para o fim todos os meios que for possivel reunir.
E, á imitação do que se faz, com rasão e justiça, na capital da Inglaterra, ordenou a carta de lei de 18 de julho de 1885 que as companhias e agencias de seguros em Lisboa, como muito directamente interessadas na materia, contribuissem com uma parte relativamente insignificante dos seus lucros para as despezas d'aquella organisação.
E, na verdade, estas sociedades, distribuindo á custa do trabalho de segurança, municipal avultados dividendos, não devem eximir-se a subsidiar com uma pequena somma o aperfeiçoamento de tão prestante serviço, que é o principal elemento de sua propria riqueza.
Com estes fundamentos, representou ao governo a camara municipal do Porto, e n'elles assenta o seguinte projecto, para o qual pedimos toda a attenção:
Artigo 1.° As disposições do artigo 174.° e seus paragraphos, da carta de lei de 18 de julho de 1885, para as despezas do serviço geral de incendios, são applicaveis á camara municipal do concelho do Porto, com respeito ás companhias e agencias seguradoras de moveis ou immoveis, que no mesmo municipio tenham a respectiva séde, e que constituirão com 5:000$000 réis.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
camara dos senhores deputados, em 19 de julho de 1887. = J. P. Oliveira Martins = João M. Arroyo.
Lido na mesa, foi admittido e enviado a commissão de administração publica.

Projecto de lei

Senhores deputados da nação portugueza. - O padre Bernardo Alves Valente, parocho collado na freguezia de S. João Baptista da villa de Ibo, provincia de Moçambique, exerceu na referida parochia e na sé matriz de Moçambique, durante quasi treze annos, as obrigações inherentes ao seu sagrado ministerio; outrosim serviu oito annos e sete mezes como professor de instrucção primaria na mesma villa, factos confirmados pelos boletins officiaes de 18 de janeiro e 20 de fevereiro de 1877, provando-se pelo attestado do reverendissimo prelado, existente na secretaria dos negocios ecclesiasticos e de justiça, que mais de dois annos ensinou no collegio do seminario da referida provincia, empregando se tambem no serviço dos hospitaes civis e militares, e substituindo, por os não haver, os capellães do exercito.
Com a ordenação d'este ecclesiastico nada gastou o collegio das missões ultramarinas, todas as despezas da sua educação religiosa foram feitas á custa da familia, que teve até de pagar um substituto por motivo de recrutamento, concluindo-se de tudo quanto levo exposto que os serviços no ultramar, prestados pelo padre Bernardo Alves Valente, não eram obrigatórios, como succede com os alumnos do alludido collegio das missões.
Por mais de uma vez diligenciou este sacerdote obter um beneficio ecclesiastico no reino, que o compensasse dos pesados e evangelicos trabalhos por elle prestados na nossa longinqua colonia, não continuados, pelo estado melindroso da sua saude, que o obrigou, mau grado seu, a voltar á Europa. Não lhe valeu, porém, o que está disposto no decreto com força de lei de 2 de janeiro de 1862, artigo 10.°, que manda preferir para os empregos ecclesiasticos os individuos nas condições d'este padre, nem o protegeu a vantagem, resultante para o thesouro, de se economisar por esta fórma o magro subsidio annual de 106$666 réis, que foi concedido pelo governo ao seu antigo e zeloso servidor. (Diario do governo de 18 de março de 1879).
Permitta-nos a camara, n'este momento, que nós, tratando a questão mais de alto, e abstraíndo das qualidades do padre Bernardo Alves Valente, lembremos que a necessidade de protegermos os ecclesiasticos, mandados para as nossas colonias, se impõem hoje mais do que nunca. Temos de luctar ali com os missionarios das outras nações, e os nossos padres, quando voltam ao reino, doentes e cansados pela idade e fadigas, merecem amparo efficaz dos poderes publicos; e se outros ha, como o padre Bernardo Alves Valente, em identicas circumstancias, usem as cortes e o governo de toda a benevolencia para com elles, que ninguem condemnará tão justificada protecção.
Sabemos que pelo decreto de 6 de dezembro de 1884 a congrua dos missionarios, que por incumbencia do governo forem servir no ultramar, foi elevada de 320$000 réis a 350$000 réis; mas argumenta-se no caso do reverendo padre, de quem fallámos, dizendo que este decreto não tem effeito retroactivo, e que o governo, muito embora a caridade o domine, não póde só por si attender quem se não encontra por uma questão de data nas condições legaes de aproveitar o beneficio do sobredito decreto!
Devemos chamar a attenção da camara ainda para um ponto importante. Para não morrer á mingua, e levado igualmente por sentimentos muito para louvar, tem o padre Bernardo Alves Valente, depois do seu regresso a Portugal, occupado grande parte do seu tempo ensinando na escola; mas nem assim lhe valeu as disposições do decreto com força de lei de 17 de dezembro de 1868, artigo 8.°, que se refere ao ultramar, e por isso não póde aproveitar as pequenissimas vantagens pecuniarias, estatuidas no mencionado decreto, restando-lhe apenas continuar a receber o escasso subsidio de 106$666 réis, que só cabe a este homem benemérito, nos termos do decreto de 13 de março de 1879, porque nas demissorias, com que veiu de Moçambique, juntas ao respectivo processo, archivado na direcção geral do ultramar, 1.ª repartição, consta que elle apenas serviu doze annos, tres mezes e vinte e tres dias na nossa colonia africana.
Apenas doze annos, tres mezes e vinte e tres dias, voltando doente, depois de ter prestado excelentes serviços á religião e á patria.
O poder legislativo tem, para honra sua, precedente, que veiu corrigir a crueza da legislação vigente. O ex-prelado de Moçambique, José Caetano Gonçalves, serviu apenas tres annos na provincia, e foi-lhe concedido por uma carta de lei a congrua por inteiro, e as côrtes todos os dias affirmam os seus sentimentos humanitarios, entendendo que não é justo morrer á fome quem honradamente serviu o paiz.
Ha poucos dias votou a camara que se concedesse o beneficio de uma aposentação a um actor distincto, e não é muito que vote hoje a congrua por inteiro de 350$000 réis ao missionario, que treze annos em Africa e vinte e dois annos contados na totalidade, tem passado a vida parochiando, e ensinando como professor.
As qualidades moraes e religiosas do reverendo padre Bernardo Alves Valente são notorias em Villa Franca de Xira, sua actual residencia. Ainda ha pouco, por fallecimento do parocho d'esta freguezia, houve por bem s. ema. o sr. cardeal patriarcha, nomeal-o parocho encommendado

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da sobredita parochia, e o povo, sabendo a noticia, accla-mou-o novo parocho interino; mas a sua idade e falta de saude não lhe permittem continuar por muito tempo com estas pesadas obrigações, e alem d'isso é natural que a interinidade se não prolongue, e que o governo nomeie um parocho effectivo.
Por todas estas considerações, temos a honra de propor o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É concedida ao padre Bernardo Alves Valente, ex-missionario em Moçambique e parocho da freguezia de S. João Baptista da Villa do Ibo, a congrua de 350$000 réis, nos termos do decreto de 6 de dezembro de 1884, que lhe são applicados.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara dos senhores deputados da nação portugueza, em 19 de julho de 1887. = João Eduardo Scarnichia = José de Saldanha Olheira e Sousa = Tito de Carvalho = Oliveira Martins = Alfredo Mendes da Silva = Ignacio do Casal Ribeiro = José Frederico Laranjo.
Lido na mesa foi admittido e enviado á commissão ao ultramar, ouvida a de fazenda.

Projecto de lei

Artigo 1.° As disposições da carta de lei de 11 de abril de 1874 são applicaveis ás camaras municipaes pelas suas gerencias anteriores a 1 de julho de 1887.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara dos deputados, em 20 de julho de 1887. = Antonio Maria de Carvalho = Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu = Teixeira de Vasconcellos.
Pedida e obtida dispensa do regimento, foi lido na mesa, admittido e enviado á commissão de administração publica.

Proposta para renovação de iniciativa

Renovâmos a iniciativa do projecto de lei apresentado na camara dos senhores deputados, em sessão de 13 de março de 1876, pelo sr. deputado Illidio Ayres Pereira do Valle.
Sala das sessões, em 19 de julho de 1887.= J. P. Oliveira Martins = João M. Arroyo.
Lida na mesa, foi admittida e enviada fazenda.

REPRESENTAÇÕES

De negociantes da praça de Lisboa, pedindo que o artigo phosphoros continue a pagar de direito o estabelecido na antiga pauta, ou que, a ser elevado, se refira unicamente ao peso liquido.
Apresentada pelo sr. deputado Vieira de Castro e enviada á commissão de fazenda.

De professores officiaes de ensino primario no concelho do Fundão, pedindo reforma das leis de 2 de maio de 1878 e 11 de junho de 1880, de maneira a ser-lhes melhorada a sua situação.
Apresentada pelo sr. deputado Rodrigues dos Santos e enviada á commissão de instrucção primaria e secundaria.

JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS

Por motivo justificado que não posso comparecer na sessão do dia 20 e a mais algumas que se seguirem. = O deputado por Beja, Pedro Victor Sequeira.

Declaro que, por motivo de fallecimento de pessoa de minha familia e por incommodo de saude, não pude comparecer ás ultimas sessões. = Arthur Hintze Ribeiro.

O sr. deputado José de Lemos e Napoles tem faltado a algumas sessões por motivo justificado. = José Maria de Alpoim.

Declaro que faltei n'este mez, por motivo de saude, a algumas sessões. = José Maria de Alpoim.
Para a secretaria.

DECLARAÇÃO DE VOTO

Declaro que, se estivesse presente á sessão em que foi approvada a concessão de portos francos a algumas das ilhas dos Açores, teria votado contra. = Arthur Hintze Ribeiro.
Para a acta.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR

De Pedro Augusto Arnaut de Menezes, capitão de engenheria em commissão no ministerio das obras publicas, contra a preterição que se lhe fez na classificação do pessoal technico do dito ministerio.
Apresentado pelo sr. deputado Pinheiro Chagas e enviado á commissão de obras publicas.

Do major reformado, Antonio Bruno da Rosa, pedindo que lhe sejam extensivas as disposições da proposta de lei n.° 104-G, que estabelece novas tarifas de soldos para os officiaes em effectividade e para os que de futuro se reformarem.
Apresentado pelo sr. deputado Pinheiro Chagas e enviado á commissão de guerra, ouvida a de fazenda.

Do major reformado, Miguel Miranda, fazendo igual pedido.
Apresentado pelo sr. deputado Pereira Borges e enviado á commissão de guerra, ouvida a de fazenda.

Do general de brigada reformado da provincia de Moçambique, Francisco Teixeira de Almeida Queiroz, fazendo igual pedido.
Apresentado pelo sr. deputado Augusto Ribeiro e envia do á commissão de guerra., ouvidas a do ultramar e de fazenda.

O sr. Alves Matheus: - Teria pedido hontem a palavra no final do discurso do illustre deputado o sr. Franco Castello Branco, que sinto não ver presente, se commissão de v. exa. me tivesse declarado momentos antes, que estando muito adiantada a hora não podia deixar de passar á ordem do dia não póde ser hontem, vou fazel-o.
Farei hoje o que hontem, por aquelle motivo, me foi impossivel realisar.
O illustre deputado o sr. Franco Castello Branco, accusou o governador civil de Braga de n'uma questão relativa ao orçamento da camara municipal de Guimarães haver procedido por fórma que revelára a um tempo pouco conhecimento da lei, da boa vontade d'aquelle alto funccionario contra Guimarães.
O nobre presidente do conselho demonstrou hontem aqui, de uma maneira clara, positiva e concludente, que o governador civil tinha cabalmente cumprido a lei, e quem cumpre a lei, conhece-a e não a ignora.
Não póde com fundamento ser arguido de falta de competencia no exercicio das suas funcções.
Quem respeita e observa a lei não mostra nem boa, nem má vontade, contra ninguem, mostra, sim, mas é o desejo de cumprir o seu dever. (Apoiados.)
Sr. presidente a phrase final do discurso do illustre deputado, a quem muito considero e respeito pelos seus talentos e pelo seu caracter, foi na verdade dura e muito immerecida.
S. exa., referindo-se ao conflicto levantado ha um anno entre as duas cidades do Minho, disse que o sr. visconde de Pindella fôra por Braga contra a terra do seu berço.
Ora, sr. presidente, parece-me que ninguem tem obrigação de defender as idéas ou as pretensões dos seus conterraneos, quando ellas se julguem pouco rasoaveis, e quando se opponham ás nossas convicções.

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Mais de um cidadão natural de Guimarães foi desfavoravel á de annexação d'aquelle concelho do districto de Braga, e ninguem e accusava, por isso, de filho desnaturado e de inimigo da sua patria. (Apoiados.)
Conheço ha vinte e quatro annos o sr. visconde de Pindella, e tenho a honra de ser ha muito seu amigo pessoal e politico.
Conhece v. exa. aquelle cavalheiro e póde dar como eu, testemunho publico das fidalgas e distinctas qualidades que ennobrecem o seu caracter. (Apoiados.)
Nunca conheci n'aquelle cavalheiro sentimentos de odio contra ninguem, muito menos contra a terra do seu berço, aonde tem fainilia e parentes muito chegados. (Apoiados.)
Dadas estas explicações, creio ter demonstrado que as accusações, feitas contra aquelle funccionario pelo sr. franco Castello Branco, não têem fundamento, e que o sr. visconde de Pindella cumpriu dignamente o seu dever.
Tenho dito.
O sr. Vieira de Castro: - Mando para a mesa uma representação do um grande numero de commerciantes d'esta praça, pessoas muito respeitaveis, protestando contra o excesso de um artigo da pauta aduaneira.
Sr. presidente, é um genero de primeira necessidade não só para as classes pobres como para as abundantes.
Sr. presidente, peço a v. exa. que se digne enviar esta representação á respectiva commissão e que seja publicada no Diario do governo.
O sr. Pedro Monteiro: - Sr. presidente, não me coube a palavra na discussão do bill, não obstante tel-a pedido por tres vezes; isto não é irrogar censura a ninguem, é simplesmente expor o facto.
Eu desejava então responder principalmente a algumas affirmações feitas pelo illustre deputado, o sr. Julio de Vilhena, ao referir-se á reforma de instrucção secundaria, decretada em dictadura.
A discussão do bill terminou hontem, mas como d'essas affirmações umas importam theorias pedagogicas que, a meu ver, não devem passar em julgado no parlamento portuguez, e outras envolvem censura, mal cabida, a uma corporação respeitavel do nosso paiz, a que tenho a honra de pertencer como membro electivo, não podia deixar de usar da palavra na primeira occasião em que a podesse obter, para impugnar essas affirmações.
Eu pensava que o illustre deputado, que sinto não ver presente, com o seu muito talento e illustração, atacaria a reforma de instrucção secundaria do mesmo modo por que o fez a secção permanente do conselho superior de instrucção publica; e que assim o ataque consistiria: em não ser comprehendido o grego e o allemão no curso dos lyceus, em esse curso ser ensinado em seis e não em oito ramos, pelo menos, em haver disciplinas pouco fraccionadas ou divididas por poucos annos e em terem sido supprimidos os exames de saída.
Enganei me; s. exa. applaude tudo o que são reducções, exceptuando unicamente a suppressão da cadeira de legislação civil, parque a proposta da creação d'esta cadeira foi da sua iniciativa.
O illustre deputado affirma, que a reforma de 1886 foi a condemnação da de 1880; pretende que a frequencia e exames se façam por disciplinas e não por annos; acha as propinas exageradas; considera os programmas peiores do que a lei, e, como prova, analysa o de portuguez, onde encontra as expressões enclise e crase, assim como superlativos de formação erudita e de formação popular, que não sabe o que significam; julga os livros ainda peiores do que como prova, analysa um compendio francez de geographia em que encontra erros, com respeito a Portugal, entendendo por isso tambem, que o conselho superior de instrucção publica é pouco cuidadoso na approvação dos livros para o ensino; quer um compendio para cada disciplina para todos os lyceus e deseja, que haja concurso para se avaliar qual o melhor.
Respondendo a s. exa., devo dizer, que esta reforma consigna principios novos, perfeitamente compativeis com as principaes disposições da lei de 1880 e restabelece algumas disposições d'essa lei, que tinham sido alteradas pelo decreto de 23 de maio de 1883; e em ambas estas hypotheses a ultima reforma é antes a ampliação e o restabelecimento da lei de 1880 do que a sua condemnação; alem d'isso, emenda alguns defeitos d essa lei; e só nesta parte se poderia dizer a condemnação d'ella, mas por este facto só cabem elogios ao governo; ha casos em que a coherencia é inimiga do progresso; se o ideal varia, se ha o reconhecimento de que é preciso emendar algumas cousas, é bom que essas emendas se façam.
Pretende o illustre deputado, que a frequencia e exames se façam por disciplinas; é um systema muito das nossas sympathias e das dos nossos vizinhos da peninsula.
Quanto a mim, por algum tempo hesitei sobre se seria melhor o estudo de uma disciplina inteira, no menor praso possivel, com um só exame sobre toda ella, se o fraccionamento de cada disciplina por diversos annos do curso, com exame sobre a fracção de cada anno.
Ha muito que sou partidario decidido do systema do fraccionamento, pelos motivos que passo a expor.
1.° Este systema permitte estudarem-se em cada anno partes de disciplinas diversas; e como estas disciplinas têem relações entre si e se auxiliam mutuamente, ha logar para que o estudo de uma disciplina aproveite com o que se aprende das outras, que se estudam ao mesmo tempo.
2.° Mais facilmente se criam e radicam na intelligencia os habitos que para ella resultam do estudo de uma disciplina, se este estudo se protrahir por muito tempo.
3.° Amadurecem mais os conhecimentos, se der a sua revisão em epochas differentes e muito afastadas.
4.° Tendo os alumnos de dar conta em exame de cada uma das partes de cada disciplina, hão de habilitar-se melhor em cada uma d'essas partes e consequentemente na disciplina inteira.
5.° Finalmente, ao acabarem o curso, poderão os alumnos sommar conhecimentos que realmente possuem, com o maior prolongamento possivel do estudo de cada disciplina, e não simplesmente documentos de exames, como tem sido vulgar succeder entre nós.
E note v. exa. e a camara, que não é tão sómente uma aspiração esta theoria: é a que está realisada, e ha muito, nos paizes mais cultos da Europa; em todos os paizes da raça germanica, por exemplo, se começa simultaneamente pelo estudo da lingua nacional, latim, geographia, historia, marhematica, sciencias naturaes, desenho, musica e gymnastica; e contra esta pratica não tem havido reclamações.
A mesma theoria é seguida na França, na Belgica, na Suissa e na Italia.
O sr. Julio de Vilhena acha as propinas exageradas, e para isso suppõe as hypotheses menos communs, quando não é este o modo de avaliar uma disposição da lei. Se um estudante gastar com as disciplinas de cada anno tres ou quatro annos, claro está que as propinas lhe sáem muito caras; mas as disciplinas estão de tal modo distribuidas, que um estudante medianamente intelligente, e com um estudo regular, póde vencer em cada anno as que lhe são respectivas, e n'este caso as propinas não são exageradas; e posso mesmo assegurar, que são mais baratas do que em nenhum outro paiz.
Analysa s. exa. o programma de portuguez; acha-o mau, e conclue, que todos são maus, sem se lembrar da lei logica, que não permitte concluir do particular para o geral.
E como acha s. exa. mau aquelle programma?
Tomando como criterio a sua ignorancia ácerca de alguns pontos n'elle contidos.
Ora eis aqui está um modo curioso de analysar um pro-

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gramma e um criterio novo para o julgar; um programma abrange alguma cousa que nós não sabemos, logo devemos concluir que é mau.
O illustre deputado, não obstante o seu immenso talento e a sua muita illustração, não sabe o que é inclise, o que é crase e o que são superlativos de formação erudita e formação popular, porque já está longe do principio da sua educação litteraria; talvez até porque os programmas d'esse tempo não contivessem esses pontos; e principalmente, sr. presidente, porque os pretores não se occupam de cousas minimas; mas as cousas mais pequenas são as que melhor se coadunam com a capacidade das creanças; e s. exa. que tem um filho que ha poucos dias fez um bom exame de portuguez, tem em casa quem lhe ensine estas cousas, se em alguma hora vaga tiver curiosidade de as saber; e espero que então me diga, que esses pontos estão muito bem n'aquelle programma.
Quanto ao livro de geographia que s. exa. analysou na parte que se refere a Portugal, devo dizer-lhe, que essa parte não serve para o eneino nos nossos lyceus; a litteratura, a historia e a chorographia dá-se por outros livros, que para esse fim foram approvados pelo conselho superior de instrucção publica; e esses livros são de auctores portuguezes muito conceituados, taes como: para a litteratura os srs. Theophilo Braga e o nosso collega Simões Dias, para a historia patria os srs. conselheiros Pinheiro Chagas e Viale e para chorographia o sr. Bettencourt.
No curto praso de cada sessão ordinaria do conselho superior, de que tenho a honra de fazer parte, não ha tempo para ler cada livro sujeito á sua approvação, desde a primeira pagina até á ultima; o livro de que se trata abri-o eu aqui e acolá, sem lhe achar erros; e se não o fui ler na parte relativa a Portugal, onde realmente os tem, é por que não tinha necessidade d'isso para cousa nenhuma.
É vulgar os livros francezes commetterem erros, quando se referem ao nosso paiz; eu vou mostrar a v. exa. e á camara o que os proprios francezes pensam do seu saber a respeito das nossas cousas.
(Leu em abono da sua affirmativa a parte bibliographica da revista internacional de ensino do dia 15 do corrente, a proposito da litteratura portugueza escripta em francez por M. Loiseau.)
Note v. exa. e a camara que confessam não terem conhecido até agora da litteratura portugueza senão Camões, e não admira, por isso, que o livro em questão não adiante mais no assumpto.
O conselho superior de instrucção publica procura escolher bem, mas os livros que se apresentam á sua apreciação é que, em geral, são pouco bons. Suppondo mesmo que o conselho se tinha enganado na approvação de um livro, podendo dizer-se por isso que dormitou uma vez, não me parece que merecesse a censura acrimoniosa que aqui lhe ouvi fazer, e especialmente da parte do illustre deputado, que no seu proprio discurso mostrou ser muito fallivel, o da parte da camara, que, por uma lei que ha poucos dias aqui foi lida pelo sr. ministro das obras publicas mostra que não só é capaz de dormitar, mas até de dormir a somno solto.
Ora, ha um outro ponto que é o que se refere á adopção de um compendio unico para cada disciplina para todos os lyceus; mas a que mira este alvitre? A produzir a unidade? Esta unidade no ensino consegue-se pelos programmas e não pela uniformidade de livros.
Os diversos modos de ver de cada professor, representados pelos differentes livros que adopta, constituem a variedade, que é tambem condição inherente a todo o progresso scientifico.
Um livro representa uma doutrina organisada segundo um certo methodo, resolve as questões que n'elle se tratam de um modo que póde ser opposto ao systema que o professor segue, e impor-lh'o seria violar a liberdade do pensamento.
O professor illustrado e brioso, a quem se impõe uma doutrina, um methodo scientirico, umas certas soluções da sciencia, um livro emfim, eu ensina sem discussão, mandando aos alumnos que o decorem sem lho explicar, ou modifica segundo o seu systema as doutrinas e o methodo que n'elle se coutem, e no fim do anno tem realmente dado por um livro moldado pelo seu modo de ver e não pelo que lhe foi imposto.
A imposição de compendios aos professores é, pois em todo o caso, um ataque á liberdade do pensamento e torna o ensino catechetico ou reduz se a uma inutilidade.
As minhas idéas sobre este ponto tambem não representam uma theoria só minha, mas sim a theoria seguida nos paizes mais cultos da Europa; na Allemanha, cada gymnasio tem a sua lista de livros, e na França conheço eu uns poucos de compendios de philosophia, que todos se dão em diversos lyceus.
Nem me consta que em parlamento algum se fizesse uma tal exigencia, nem sequer se apresentasse um tal alvitre.
Ouçamos, a proposito, M. Bréal:
«Le maitre dans toute Corporation enseignante est la force organique, d'où doit partir la vie et le mouvement. Si vous le reduisez au rôle d'un instrument de transmission, vous changez l'ensemble du corps enseignant en un mécanisme, Qui ne peut se perfeccioner ni se renouveler lui mesme.»
é necessario dar ao professor a responsabilidade scientifica, consideral-o propriamente como mestre e não como instrumento de transmissão das idéas dos outros, se queremos aperfeiçoar o ensino.
Quanto ao concurso para se conferir um premio ao que for reputado melhor livro para o ensino, é preciso saber, que ha grande difficuldade de organisar no nosso paiz jurys habilitados para as diversas especialidades, totalmente; imparciaes e isentos do espirito de rotina; e que ha muitas vezes impossibilidade de decidir entre dois livros qual seja o melhor, porque um se distinguirá e levará vantagem por uma certa qualidade e outro por outra, e n'este caso a apreciação ha de ter meramente subjectiva; entretanto ou acceito o concurso e o premio, porque em todo o caso é mais um estimulo que anima os auctores a maiores esforços, mas nunca produzindo a adopção exclusiva de um livro para cada disciplina, imposto aos respectivos professores.
Dou por concluidas as considerações que tinha a fazer em resposta ao sr. Julio de Vilhena, omittindo muitas cousas que desejava dizer a respeito da ultima reforma de instrucção secundaria por terem perdido a opportunidade.
Resta-me pedir desculpa, se acaso não fui tão lucido como desejava ser, pela primeira vez que faliu mais extensamente n'esta casa, e ao mesmo tempo agradecer a v. exa. e á camara a attenção e benevolencia com que me têem ouvido.
Vozes: - Muito bem.
(O orador fui comprimentado pelou dois lados da camara.)
O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - Mando para a mesa uma proposta auctorisando o governo a vencer directamente á camara municipal de Thomar o pinhal da Cita.
Vae publicado no fim da sessão.
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Mando para a mesa uma proposta de lei auctorisando o governo a permittir a conversão das obrigações emittidas pelo banco ultramarino, em virtude do decreto de 29 de dezembro de 1855, e com fundamento na carta de lei de 22 de julho do mesmo anno, ou outras de juro inferior, comtanto que não haja augmento no praso da amortisação fixado n'aquella lei e na annuidade de réis 59:309$400, indicada no citado decreto.
Vae publicada no fim da sessão.
O sr. Simões Dias: - Mando para a mesa o parecer

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1862 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

da commissão de marinha ácerca da proposta de lei que auctorisa o governo a reformar a escola naval.
Mandou-se imprimir.
O sr. Simões Ferreira: - Mando para a mesa um projecto de lei, cujo assumpto creio que merecerá a attenção da camara. É a reparação de uma injustiça pessoal, e o estabelecimento de um principio bom de administração.
Ficou para segunda leitura.
O sr. Guilherme de Abreu: - Tenho a honra de mandar para a mesa o seguinte projecto de lei.
(Leu.)
Este projecto vae tambem assignado pelos meus illustres collegas e amigos os srs. Antonio Maria de Carvalho e Teixeira de Vasconcellos, e tencionava apresental-o como additamento na discussão do projecto que a camara approvou na ultima sessão nocturna, renovando a favor das juntas de parochia e das mesas das irmandades e confrarias, as disposições da lei de 11 de abril de 1874, para o fim de as relevar da responsabilidade em que hajam incorrido por terem feito despezas não auctorisadas ou com excesso das auctorisadas nos seus orçamentos, quando se prove, que foram applicadas a serviços da sua competencia e em proveito das corporações que administravam.
Mas quando cheguei á camara, apenas decorridos alguns minutos depois da abertura da sessão, já o encontrei votado e approvado sem discussão, e por isso só me restava este meio para fazer vingar uma idéa que tenho por justa.
Tanto o precedente que se invoca, como os motivos que se adduzem a favor das juntas de parochia e demais corporações referidas, nos relatorios que fundamentam os projectos do governo e da illustre commissão, procedem igualmente, senão por força de maior rasão, a favor das camaras municipaes, e por isso é de justiça que a estas se amplie o beneficio concedido áquellas, pois a lei deve ser igual para todos e é principio incontroverso de direito, já sanccionado pela jurisprudencia romana - que á mesma rasão deve corresponder identica disposição.
Nada mais digo, que me não parece preciso agora, nem quero tomar tempo á camara sem necessidade.
Concluo pedindo a v. exa. que se digne enviar com urgencia este projecto á illustre commissão de administração publica, para, no caso de merecer a sua approvação e a d'esta camara, poder ser apreciado pela dos dignos pares juntamente com o projecto já approvado e do qual é natural complemento. (Apoiados.)
De novo requeiro a v. exa. a urgencia.
Foi considerado urgente.

PRIMEIRA PARTE DA ORDEM DO DIA

Discussão do projecto n.º 157

É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 157

Senhores.- A vossa commissão de instrucção primaria e secundaria examinou attentamente a proposta de lei n.° 107-E, que tem por fim crear definitivamente no lyceu de Braga as duas cadeiras de lingua grega e allemã, cujo ensino tinha sido auctorisado provisoriamente, no presente anno lectivo, por decreto de 3 de novembro de 1886.
Considerando que o referido decreto attendeu ás justissimas instancias da camara municipal e de todas as corporações da cidade de Braga, que unanimemente peticionaram para que as disposições dos decretos de 29 de julho e 12 de agosto ultimo, relativas aos lyceus centraes, fossem applicaveis ao lyceu de Braga;
Considerando que o lyceu de Braga é sem contestação um dos mais importantes e mais frequentados do reino, elevando-se o numero dos seus alumnos, em alguns annos, a uma cifra superior ás dos lyceus de Lisboa, Coimbra e Porto, como se patenteia das respectivas estatisticas;
Considerando ainda que a cidade de Braga tem uma população superior a vinte mil e tantos habitantes e que litterariamente é a sede tradicional das duas importantes provincias, Minho e Traz os Montes, e que o seu lyceu foi sempre de 1.ª classe, e como tal n'elle professados todos os estudos preparatorios necessarios para o ingresso nos cursos superiores;
Considerando que para satisfazer ás louvaveis e nobres aspirações da cidade de Braga, anterior e persistentemente manifestadas, já pela lei de 14 de junho de 1880 lhe fôra concedido um curso complementar de letras e pela lei de 30 de junho de 1885 fora creado o curso complementar de sciencias:
Por todas estas rasões a vossa commissão entende que deve ser approvada a proposta governamental referente á creação das cadeiras de lingua grega e allemã.
E, de accordo com o governo, é tambem a vossa commissão de parecer que as rasões expostas justificam a creação dos logares de professores aggregados, não só para aquelle lyceu, mas ainda para todos os demais que se encontrarem em condições analogas, e por isso ampliou a proposta, refundindo-a no seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É creado no lyceu de Braga o ensino das linguas grega e allemã, conforme o que se acha preceituado para os lyceus centraes, no decreto de 29 de julho de 1886, e bem assim fica o governo auctorisado a crear até dois logares de professores aggregados n'este e n'outros lyceus, que reunam as seguintes condições: movimento escolar não inferior a 1:200 exames, rendimento para o estado superior a 7:000$000 réis, voto affirmativo da secção permanente do conselho superior de instrucção publica.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala da commissão, aos 15 de junho de 1887. = José Simões Dias = Pedro Antonio Monteiro = João Augusto Pina = Albano de Mello = José Maria Barbosa de Magalhães = João Antonio Pires Villar = Luiz José Dias = J. A. da Silva Cordeiro = E. J. Goes Pinto = José Alves de Moura, relator.

A vossa commissão de fazenda, na parte em que é chamada a dar o seu parecer, concorda com a illustre commissão de instrucção primaria e secundaria.
Sala da commissão, 7 de julho de 1887.- Vicente R. Monteiro = J. P. de Oliveira Martins = Carlos Lobo d'Avila = F. Mattozo Santos = Antonio Maria de Carvalho = Gabriel José Ramires = José Maria dos Santos = Antonio Eduardo Villaça = Marianno Presado = Antonio M. Pereira Carrilho, relator.

N.° 107-E

Senhores. - Por decreto de 3 de novembro de 1886 foi provisoriamente auctorisado no lyceu nacional de Braga o ensino das linguas grega e allemã, ficando a sua creação definitiva dependente da approvação das camaras legislativas.
Os motivos que levaram o governo a tomar esta providencia provisoria, acham-se expostos nos considerandos que precedem aquelle decreto; e por isso me abstenho de os reproduzir aqui para não cansar a vossa attenção.
Em vista de taes motivos, e das condições especiaes que reune a cidade de Braga, a qual já pela lei de 14 de junho de 1880 fôra contemplada com o curso complementar de letras, e teria obtido tambem o curso complementar de sciencias em virtude da lei de 30 de junho de 1885, se não fosse a ultima reforma de instrucção secundaria, julgo de manifesta justiça, que se lhe conceda a creação dos estudos que solicita, para completa habilitação dos alumnos que ali affluem em grande numero.
N'este intuito, e em desempenho do compromisso contrahido, tenho a honra de submetter á vossa illustrada approvação a seguinte
Artigo 1.° É creado no lyceu de Braga o ensino das linguas grega e allemã, como disciplinas annexas ao res-

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1863

pectivo curso, conforme o que se acha preceituado para os lyceus centraes no decreto de 29 de julho de 1886.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 4 de junho de 1887.= José Luciano de Castro.
O sr. Franco Castello Branco: - (O discurso será publicado quando s. exa. o devolver.)
Foi lida e admittida á discussão a proposta do sr. Franco Castello Branco. É a seguinte:

Proposta

Projecto de lei n.° 157:
Proponho que seja additado com o seguinte artigo, que ficará sendo o segundo do projecto:
São creadas na cidade de Guimarães duas cadeiras para o ensino das linguas franceza e ingleza.
§ 1.° Os professores respectivos serão nomeados precedendo concurso, nos termos do decreto de 29 de julho de 1886, e vencerão o ordenado de 500$000 réis cada um.
§ 2.° A camara municipal do concelho de Guimarães fica obrigada a fornecer casa propria para a installação das referidas cadeiras. = Franco Castello Branco.
Foi admittida.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - Pedi a palavra, sr. presidente, para responder á parte do discurso do illustre deputado, relativamente ás escolas industriaes.
É certo que a materia do projecto, e o assumpto da proposta do illustre deputado, podem considerar-se parallelos, mas não são tão identicos que um podesse trazer forçosamente a outra. Nós estamos discutindo um projecto que respeita á organisação dos lyceus, e não á organisação das escolas industriaes. Portanto, eu vou dar uma breve explicação, que me parece que satisfará o illustre deputado.
Tudo quanto o illustre deputado acaba de dizer não fez senão confirmar aquillo que ainda ha poucos dias tive occasião de dizer á camara, isto é, que é necessario augmentar a despeza com as escolas industriaes. O illustre deputado já está a pedir mais, e pede-o com todo o fundamento; quer dizer, que os que se me seguirem hão de gastar mais e muito mais com este serviço. (Apoiados.) E nem póde deixar de ser, porque d'ahi é que ha de vir o renascimento da nossa industria.
O que o illustre deputado com tanta rasão pede para Guimarães, outros com igual rasão hão de pedir para outros pontos do paiz. Eu julgo necessarias as cadeiras, mas parece-me que será mais util á cidade de Guimarães a creação de officinas para o desenvolvimento industrial.
Tenho trabalhos organisados para estabelecer n'aquella cidade officinas de cuteleria, serralheria e tecelagem, de modo que se dê aos seus productos um acabamento que rivalise com os melhores do estrangeiro. Os productos de tecelagem de Guimarães têem qualidades excellentes, mas têem outras defeituosas, que é facil corrigir.
O illustre deputado sabe que em Guimarães ha hoje apenas um tear Jaquart! A cidade de Guimarães mandou um operario a Inglaterra aprender a trabalhar com esse tear, mas, não sabendo inglez ou francez, aprendeu por acenos, e a camara sabe o que poderia aprender.
Tenho um relatorio sobre isso.
Ha necessidade de estabelecer uma officina de tecelagem com todos os progressos da industria moderna; a difficuldade é que ali a industria de tecelagem, como o illustre deputado sabe, tem por isso o caracter de industria caseira; não ha ali grandes fabricantes que possam por meio de grandes machinas alargar o desenvolver aquella industria.
A minha idéa é, como disse, estabelecer officinas de cutelaria, serralheria e tecelagem, montadas por praticos estrangeiros, porque nacionaes não sabem, e depois se dará a escola de francez e de inglez; o mais proveitoso parece-me ser o estabelecimento de officinas, e tenho já trabalhos preparatorios sobre esse assumpto.
Na proxima sessão legislativa, se não couber dentro das faculdades do governo, tenciono apresentar um projecto a esse respeito.
Digo ao illustre deputado, defensor dos interesses de Guimarães na sua rivalidade com Braga, que se dão a Braga as cadeiras de allemão e grego, porque os estudos d'aquella cidade são mais classicos, dar-se-hão a Guimarães officinas de cuteleria, de serralheria e de tecelagem, porque são as mais proprias para as industrias que n'aquella cidade se exercem; e é assim que o governo continúa a manter entre as duas cidades a balança do equilibrio que tem mantido até agora. (Apoiados.)
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
O sr. José de Azevedo Castello Branco: -Inscrevi-me contra, mas não é porque isso traduza exactamente as minhas intenções a respeito do assumpto que se discute.
Não desejo contrariar a fórma d'este projecto; se as camaras e as corporações da cidade de Braga querem ser instruidas em grego e allemão, não serei eu que vá crear embaraços.
N'este sentido aproveito a occasião para mandar para a mesa uma proposta de additamento ao artigo 1.° do projecto.
Ao artigo 1.° proponho eu que se acrescente no § 1.° a seguinte emenda.
(Leu.)
E ao § 2.° a seguinte.
(Leu.)
São intuitivas as rasões com que eu poderia fundamentar estas propostas, que se tornam essenciaes para aquelle centro de producção agricola, e confio bastante na justiça e inteireza da camara que as tomará na devida conta.
Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proposta de additamento ao artigo 1.°:
§ 1.° É igualmente auctorisado o governo a crear uma escola pratica de agricultura e industria na cidade da Guarda.
§ 2.° A dotação d'esta escola será fixada em 1:500$000 réis annuaes, ficando a cargo do districto as despezas com o edificio. = O deputado pela Guarda, José de Azevedo Castello Branco.
Foi admittida.
O sr. Alves de Moura: - Sr. presidente, depois do que ouvi ao illustre deputado o sr. Franco Castello Branco, poderia julgar-me dispensado de usar da palavra, na qualidade de relator do projecto em discussão, visto que s. exa. começou por dizer que o não combatia, e o seu additamento, quando acceito pela camara, constitue um segundo projecto completamente distincto do que se discute, e sobre o qual as respectivas commissões teriam de pronunciar-se.
As cadeiras a que o illustre deputado se referiu no seu additamento pertencem ás escolas industriaes, cujos negocios correm, não pelo ministerio do reino, mas sim pelo das obras publicas, e o illustre e nobre ministro d'esta ultima pasta já respondeu cabalmente a s. exa.
Uma vez, porém, que estou no uso do palavra, permitta-me o illustre deputado que, sem combater tambem a idéa do melhoramento, indicado na sua proposta de additamento discorde, todavia, quanto ás rasões com que a quiz fundamentar.
Disse s. exa. que achava uma certa paridade entre o projecto submettido á discussão e o seu additamento, porquanto, se Braga e todas as corporações d'aquella capital reclamaram que no seu lyceu houvesse o ensino de todos os preparatorios necessarios para os cursos superiores, desejava o illustre deputado que Guimarães tambem fosse contemplada com a creação das duas cadeiras industriaes propostas.

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Sr. presidente, não serei eu que regatearei nem a Guimarães, nem a qualquer outro centro industrial ou agricola, os melhoramentos de ensino especial ou de applicação pratica, como lhe chamou o nobre ministro das obras publicas; mas, parece-me que tratando-se de ampliar e completar o ensino secundario no lyceu de Braga, como existe nos lyceus centraes, cujos negocios são da attribuição do nobre ministro do reino, não seja o ensejo proprio para se proporem n'uma outra terra cadeiras industriaes, cuja creação e estabelecimento pertence, como já disse, a outro ministerio.
O lyceu de Braga foi sempre lyceu de 1 .ª classe, e como tal teve sempre uma d'estas cadeiras. Pelo decreto do 20 de julho ultimo, o ensino das linguas grega e allemã ficou centralisado nos tres lyceus de Lisboa, Coimbra e Porto, mas o exmo. ministro, conhecendo quanto eram justas as representações de todas as corporações da cidade de Braga, unanimes em pedir que n'aquelle lyceu fossem professadas todas as disciplinas, cujos exames são exigidos para o ingresso nos cursos superiores, providenciou pelo decreto de 3 de novembro passado, que ainda no presente anno lectivo começasse provisoriamente o ensino das duas cadeiras.
Pelo decreto de 29 de julho e regulamento de 12 de agosto passado, os exames das linguas grega e allemã são obrigados dentro de quatro annos, para a entrada dos cursos superiores das faculdades de theologia, medicina, curso superior de letras e escolas medico-cirurgicas; foi este, sem duvida, um dos motivos por que a cidade de Braga, cuja população é superior a 20:000 habitantes, séde tradicional das duas importantes provincias do Minho e Traz os Montes, solicitou que ao seu lyceu fossem applicaveis as disposições referentes ao numero de cadeiras dos lyceus centraes. O lyceu do Braga é um dos mais concorridos do reino e o seu movimento escolar é em alguns annos superior a alguns dos centraes. No presente anno lectivo, o numero de exames de instrucção primaria eleva-se a perto de 3:000.
Firmado n'estas rasões apenas esboçadas, julgo justificada a creação das duas cadeiras.
Sr. presidente, sou apologista de todos os melhoramentos que possam advir áquella provincia, e por isso jamais negarei o meu voto para este um, quando qualquer projecto seja apresentado e abonado era rasões que satisfaçam ao meu espirito.
Disse o illustre deputado que a cidade de Guimarães, como terra industrial, devia ter as duas cadeiras propostas por s. exa. no seu additamento. Sem idéa de fazer confrontos, direi a s. exa., que a cidade de Braga tambem tem as suas fabricas e industrias. Foi n'esta cidade que o espirito esclarecido do venerando e benemerito arcebispo fr. Caetano Brandão iniciou esse certamen do trabalho e do estimulo, as exposições; foi ali que em 1863, sendo governador civil do districto o nobre ministro da guerra, actual membro do gabinete, se realisou a primeira exposição agricola e industrial.
Sei tambem que a cidade de Guimarães na exposição industrial, que ali se fizera, se apresentára de modo que conseguira mais tarde e com toda a justiça, apraz-me dizel-o. ser dotada com uma escola industrial, cujo ensino está dividido por tres cadeiras: desenho, chimica e physica, e geometria com applicação ás artes, e que na cidade de Braga apenas fôra creada uma cadeira industrial, a de desenho.
O ensino de francez e inglez indicado pelo illustre deputado, supponho (pelo menos o de francez) que já ali é facultado no excellente e patriotico instituto Martins Sarmento, e porventura em mais algum collegio ou escola. Eu mesmo posso dar testemunho, como professor, que da cidade de Guimarães tem vindo ao lyceu de Braga fazer exames d'aquellas linguas alguns alumnos.
Sr. presidente, a creação das cadeiras, a que se refere o projecto, não é uma vaidade, nem é um quadro luxuoso de disciplinas, como lhe chamou o illustre deputado sr. José de Azevedo Castello Branco, por occasião de mandar para a mesa a sua proposta de additamento, creando na Guarda uma cadeira de agricultura e industria; trata-se unicamente de completar no lyceu de Braga, como nos lyceus centraes, o ensino secundario, de modo que os alumnos ali possam frequentar todas as disciplinas, cujos exames, segundo a nova organisação de instrucção secundaria, são exigidos aos que se destinam aos cursos superiores.
Direi a s. exa.: conheço que o estudo agricola e industrial vae felizmente no nosso paiz tendo um desenvolvimento notavel e animador, e para louvar será que os governos, aproveitando esta variante da actividade, vão fornecendo os meios necessarios e abrindo as escolas proprias ás differentes regiões agricolas. A taes melhoramentos, quando justificados, nunca deixarei de prestar o meu voto.
Sr. presidente, já que estou com a palavra permitta-me v. exa. e permitta-me a camara, que eu, na qualidade de deputado por Braga, levante com estranheza algumas phrases que na sessão de hontem o illustre e talentoso deputado por Guimarães e meu amigo, sr. Franco Castello Branco, proferira a respeito do governador civil do districto, a proposito de uma interpellação dirigida ao exmo. presidente do conselho de ministros, e ministro do reino.
O illustre deputado motivara a sua interpellação n'um incidente occorrido entre o governador civil e a camara municipal de Guimarães por causa do seu orçamento.
Parece-me que o illustre deputado fôra injusto ao apreciar o procedimento da auctoridade superior do districto, quando esta havia procedido em conformidade com a lei.
O tribunal administrativo composto de juizes imparciaes e rectos tinham tambem cumprido o seu dever.
Ia felizmente passado o periodo para todos muito desagradavel da questão Braga Guimarães; fôra esta resolvida sabia e prudentemente, a contento dos povos, pelo distinctissimo estadista o exmo. presidente do conselho de ministros; era pois nobre o digno da parte de todos não estar a levantar pequenas questões a proposito da mais ligeiros motivos, para não corrermos o risco de se dizer, que, por parte dos habitantes das cidades de Braga e Guimarães, renovam-se todos os dias questiunculas similhantes ás do alecrim e mangerona.
O governador civil por dever do seu cargo e em harmonia com o codigo administrativo interpretou a lei de modo que nas estancias superiores o seu procedimento merecêra approvação, como franca e categoricamente o dissera o nobre presidente do conselho de ministros e ministro do reino.
Não se podia affirmar gratuitamente que o governador civil e o tribunal administrativo quisessem demorar ou difficultar a approvação do orçamento municipal, nem tão pouco que da sua parte houvesse menos boa vontade.
A portaria de 28 de abril passado, expedida determinadamente para dirimir duvidas a esse respeito, parece-me que justifica o procedimento quer do governador civil quer do tribunal administrativo.
Podia afiançar que os cavalheiros de Braga prestavam homenagem e respeito ás tradições gloriosas de Guimarães, e estimavam o progresso das suas industrias e artes; e a respeito do governador civil, que era natural d'aquella cidade, podia igualmente asseverar com toda a verdade e franqueza que ente cavalheiro tem mostrado sempre a maior dedicação e sympathia pela sua terra natal, onde tem familia e amigos, que certamente seriam os primeiros a confirmar o que deixo dito.
Seria, pois, injustiça immerecida que sobre aquelle cavalheiro pesasse o epitheto de menos amante da terra da sua naturalidade.
Releve-me v. exa. e releve-me a camara estas palavras que, na qualidade de deputado por Braga e tratando-se da auctoridade superior do districto, cujo caracter e qualidades pessoaes conheço e com cuja amisade me honro ha muitos annos, não podia deixar de proferir. (Apoiados.)
Vozes: - Muito bem.

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1865

O sr. Franco Castello Branco: - (O discurso será publicado quando s. exa. o devolver.)
O sr. Ministro das Obras Publicas (Emgdio Navarro): - Em resposta ao illustre deputado tenho a dizer que julgo mais urgente crear primeiro as officinas de serralharia, cutelaria e tecelagem e só depois d'isto crear então as referidas cadeiras, não me compromettendo, porém, a marcar desde já o praso de tempo em que o farei.
O sr. Franco Castello Branco: - V. exa. não marca limite?
O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - Não marcai nem posso acceital-o.
O Orador: - Quer dizer, Braga tem já as suas cadeiras e Guimarães talvez espere por sapatos de defunto, porque atrás de s. exa. virão outros ministros que em logar de organisar um estado maior para os institutos, pense a serio na creação de escolas praticas para o complemento do ensino districtal.
O sr. Abreu Castello Branco: - Mando para a mesa uma proposta.
É a seguinte:

Proposta

Proponha que ao artigo 1.° seja additado um paragrapho nos termos seguintes:
É igualmente creado no lyceu de Angra o ensino das línguas grega e allemã. = J. F. Abreu Castello Branco.
Foi admittida.
O sr. Jacinto Candido: - Mando para a mesa uma proposta:
É a seguinte:

Proposta

É igualmente auctorisado o governo a crear, com a maior urgencia possivel, uma aula de agricultura pratica annexa ao lyceu de Angra do Heroismo, no districto central dos Açores. = O deputado pelo circulo u.° 90, Jacinto Candido.
Foi admittida.
O sr. Vieira de Castro (para um requerimento): - Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se julga a materia sufficientemente discutida.
Julgou-se discutida.
Foi approvado o artigo 1.° do projecto.
Os additamentos dos srs. Franco Castello Branco, José Castello Branco,, Jacinto Candido, e Abreu Castello Branco, foram rejeitados.
Argigo 2.° approvado.
Foram approvadas as ultimas redacções dos projectos 147, 156 e 149.

SEGUNDA PARTE DA ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: - Vae entrar em discussão o projecto n.° 18.6. Leu-se na mesa.

PROJECTO DE LEI N.° 186

Senhores. - A vossa commissão de fazenda estudou com todo o cuidado a proposta de lei de reforma da pauta aduaneira, sem duvida uma das mais importantes, de entre as que foram sujeitas ao seu exame.
Para vos facilitar o estudo, tão complexo como importante do projecto que vimos sujeitar á vossa approvação, entendemos dever apresentar-vos todos os elementos e dados de que nos servimos para a apreciação da respectiva proposta.
O governo transacto, em obediencia ao disposto no § unico do artigo 1.° da carta lei de 7 de junho de 1882, fez publicar em 1885 uma edição da pauta, ainda em parte em vigor, edição na qual se tiveram em vista principalmente duas cousas: evitar a coexistencia de duas pautas, uma geral, outra convencional; dar um numero a cada artigo, o que facilitava a organização do indice remissivo e explicativo, tão necessario em diplomas d'esta ordem.
A primeira d'estas modificações tornara-a possivel o artigo 1.° da carta de lei acima citada, que generalisou a todos os paizes comnosco em relações commerciaes o que havia sido accordado ha pouco com a França, no tratado assignado em Paris em 19 de dezembro de 1881 e approvado por carta de lei de 13 de maio de 1882.
Entendeu a vossa commissão manter no presente projecto ambas as modificações introduzidas pela referida edição na pauta de 1882, estancio de accordo com os motivos que as determinaram.
Entre a proposta do governo e a antiga pauta notam-se, independentemente de n'esta se inscrever em certos artigos a importancia dos addicionaes, do que adiante fallaremos, uma differença com relação ao numero de classes.
O agrupamento systematico das diversas mercadorias não tem rasão de ser em tarifas com limitado numero de artigos, mas, nas que têem grande numero d'elles, é quasi indispensavel a sua divisão em grupos. Não só se evitam repetições que complicariam, mas é mais facil encontrar o artigo em que qualquer mercadoria está comprehendida. A concisão nos dizeres, póde tambem assim ser maior, visto que estes, subordinados ao titulo da classe, têem n'elle até certo ponto o correctivo do vago, com que por vezes não podem deixar de ser redigidos.
Não se deve comtudo exagerar o numero d'esses grupos de modo a transformar-se em confusão o que justamente é feito para a evitar.
Numerosas classes obrigariam a disseminação das mercadorias e dariam logar por vezes a incertezas em qual d'ellas classificar um producto, ou introduzir um dizer, já porque as classes pela sua multiplicidade mesma não poderiam ser bem delimitadas, já porque não seriam sufficientemente genericas para poderem abranger artigos, a que tivesse de deixar-se larga comprehensão.
É assim que em cada publicação de pauta, se tem ido resumindo o numero das classes. Encontrareis em curioso resumo a historia destas modificações no parecer da commissão de fazenda da sessão ordinaria de 1886, sobre a proposta de reforma da pauta apresentada n'essa sessão.
N'essa proposta, em que a apresentada agora se moldou, reduzem-se a doze as dezenove classes da edição de 1885 da pauta: fundindo algumas, repartindo outras pelas classes já existentes, procurou dar se ás que ficavam ao mesmo tempo a maior externo e a melhor delimitação possivel. Claro é que se não pensou em crear estas classes obedecendo a rigorosos principios de taxonomia. Nada se nos afigura mais improprio e menos pratico do que fazer n'uma pauta aduaneira uma classificação das mercadorias com pretensões a scientifica. O que se tentou foi arrumal-as como se julgou conveniente, conforme o uso a que este diploma é destinado e o regimen a que obedece.
A correspondencia das classes da antiga pauta ás do projecto que temos a honra de apresentar-vos, que são no conjuncto as mesmas, com pequenas modificações nos titulos das da proposta de 1886, é a seguinte:

Projecto

[Ver tabela na imagem]

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1866 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Se, pelo que adiante dizemos, alguns artigos de uma classe da proposta foram mudados para outra, em obediencia ao que pelo titulo de cada classe se podia immediatamente inferir para sua comprehensão, a divisão geral manteve-se, por satisfazer ao que á vossa commissão pareceu se lhe poderia exigir.
Ao lado de classes bem definidas collocaram se duas bastante genericas para n'ellas se poder inscrever o que nas outras não tinha cabimento. Ahi é que se encontram todos os artigos que englobam productos de variadas procedencias, ou artefactos de diversas industrias que, se pela origem são distinctos, são comtudo fiscalmente similhantes. Por exclusão chega-se a estas duas classes XI e XII, que tambem por tal motivo se pozeram uma e outra no fim da pauta. Questão de systematica que, para quem tem de lidar com estes diplomas, sabe não ser absolutamente indifferente, porque ainda que o seu principal destino seja para uso do commercio e para o serviço aduaneiro, são tambem a base das estatisticas, elemento precioso e indispensavel para o estudo da historia commercial e industrial.
Ainda pelo que respeita á parte material do diploma que examinâmos mencionaremos a innovação de se inscrever, nos artigos sujeitos a tratado, os addicionaes para portos e para emolumentos. E ella a consequencia do expresso no § 3.° d'este projecto de lei, em que muito propositadamente se fez sentir que, se aboliam as leis que haviam creado estes addicionaes, era porque elles se achavam comprehendidos nos direitos totaes impostos a cada mercadoria, ou grupo de mercadorias, sem que por isto perdessem o seu caracter, nem fossem desviados da sua applicação.
Mesmo quem pouco conheça das cousas alfandegarias comprehende o estorvo que para a rapidez e exactidão das operações aduaneiras resultaria de terem que se fazer calculos de addicionaes, uns percentagens sobre o valor, outros percentagens sobre o direito principal, calculos que, ainda que simplissimos, poderiam dar logar a erros, os quaes, conforme o sentido, prejudicariam ou o fisco ou o commercio. Quantas vezes para se occultarem estes erros se falseariam as estatisticas, escrevendo-se nos bilhetes de despachos e nos resumos enviados das diversas alfândegas, não a quantidade real das mercadorias entradas ou saídas, mas a quantidade d'ellas que correspondia aos direitos recebidos a mais ou a menos; isto sem a intenção de prejudicar ninguém, mas por erros de calculo, que só não commette quem os não faz.
E visto que fallâmos de direitos, diremos tudo o que sobre elles foi assumpto de estudo da parte da vossa commissão. Nos direitos tem a attender-se á sua natureza e quantidade, e na quantidade ainda á unidade sobre que incidem.
É hoje incontestavel que os direitos baseados sobre o valor, isto é, representados por uma percentagem sobre o custo das mercadorias, sendo theoricamente os mais justos, por acompanharem as evoluções do preço d'estas, e representarem um acrescimo sobre o seu custo, sempre proporcional á importancia d'elle, são comtudo praticamente inacceitaveis. Qualquer que seja o processo que se empregue, os resultados são sempre maus.
O da determinação dos valores pelas facturas é origem de constantes contestações, e póde dar logar a repetidas fraudes. Se para corrigir isto se estabelece o direito de preempção, raras vezes o estado encontrará quem lhe pague as mercadorias com que ficou, pela quantia desembolsada e mais os direitos devidos. Então de duas uma, ou as vende por menos do que aquelle valor e faz uma concurrencia desleal ao commercio honrado, ou as inutilisa e perde, o que lhe custaram.
O outro processo que poderia servir para a determinação dos direitos ad valorem, seria a confecção de tabeliãs de valores medios periodicamente revistas, como entre nós se usa para os direitos de exportação. Taes tabellas ou teriam quasi os mesmos inconvenientes dos direitos fixos, se abrangessem grupos de mercadorias, ou deveriam ser tão especificadas, estabelecendo para cada artigo da pauta series de valores, correspondentes ás diversas mercadorias que em alguns d'elles se acham reunidas, que a sua elaboração viria a ser difficil e complicadissima. Em ambos os casos, de um ou de outro modo que as tabellas fossem feitas, ficariam pendo uma segunda pauta, na qual, em vez de se marcar direitos, se fixavam valores para se applicarem esses direitos; e uma segunda pauta, tanto menos simples do que a outra, quanto mais se quizessem approximar de rigorosos os direitos ad valorem. Ora se se affirma, e com rasão, que da simplicidade das tarifas depende em grande parte a simplicidade e a rapidez das operações aduaneiras, essa simplicidade seria apenas apparente se a pauta, por mais reduzida que fosse, tivesse de estar sempre appensa a complicadas e miudas tabellas.
Não podia a vossa commissão, por estes motivos, que lhe não parece possam ser facilmente contrariados, deixar de adherir ao pensamento que resalta da proposta do governo de não só fazer desapparecer as taxas addicionaes sobre o valor, mas de reduzir quanto possivel os proprios direitos d'esta natureza.
Mais longe foi ainda a vossa commissão, e no projecto o vereis: substituiu por direitos especificos alguns dos direitos ad valorem inscriptos na proposta.
Foi-lhe impossivel fazel-o para todos: uns por serem direitos convencionaes, outros porque seria difficil fixal-os equitativamente sem a divisão excessiva e inconveniente dos artigos.
Lembra o conselho superior do commercio e industria se restabeleça, para os que ficam, o direito de preempção, cremos que tal como esteve em tempo estabelecido na nossa legislação aduaneira.
Alem dos prejuizos que já dissemos podem provir de tal systema, ficariamos para a mesma cousa com dois modos differentes de proceder, visto que de certo, o conselho superior do commercio e industria só poderia referir o seu alvitre, apesar do relatorio o não indicar, ao limitadissimo numero de artigos taxados ad valerem que não estão comprehendidos na tabella B annexa ao tratado franco portuguez. Não nos é licito acreditar que tão illustrada corporação esquecesse ou ignorasse o disposto no artigo 10.° do tratado com a França. Acceite aquelle parecer haveria o direito de preempção n'uns casos e n'outros não, o que, por não ser uniforme, nem seria justo, nem simples.
O quantitativo dos direitos está intimamente ligado ao pensamento que domina na organisação d'estes diplomas fiscaes. Não se trata de livre carabismo, nem de proteccionismo; a nossa pauta, não podendo deixar de ser proteccionista só se deveria pensar no como exercer o proteccionismo.
Nos paizes em que a pauta representa mais uma fonte de receita publica do que alem d'isto um auxilio indispensavel ao desenvolvimento industrial, percentagens fixas taxam grupos de mercadorias, quer estes grupos sejam organisados conforme a natureza, ou conforme o estado. Assim a Hollanda adoptou como principio para a fixação dos direitos pautaes: liberdade para as matérias primas, 5 por cento para as materias primas semi-trabalhadas, 10 por cento para os artefactos completos. Fica muito ao arbitrario, mas em todo o caso é uma norma. Quando, porém, tem de se attender aos redditos do estado e ás necessidades da industria, o problema complica-se, não só porque umas vezes se põem em conflicto os interesses da fazenda, os do commercio e os da industria, mas muitas tambem porque o embate dá-se dentro do proprio commercio e da propria industria.
Hoje que o estudo interessantissimo das questões aduaneiras occupa altos espiritos, têem alguns d'elles procurado reduzir a formulas a determinação dos direitos, quando, estabelecido o da materia prima, se procura o do artefacto

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1867

correspondente, sabidos os agentes de trabalho e quaes os onus fiscaes de qualquer natureza, que sobre estes incidem. Meras tentativas, diversões scieutificas reveladoras por vezes de grande engenho e saber, mas praticamente inusaveis.
Na nossa hypothese o problema era tanto mais complicado, que todas as nossas industrias luctam para se desenvolver, nenhuma tendo ainda adquirido força que lhe dê independencia. Favorecer uma, é desfavorecer as que lhe são subsidiarias ou as de quem ella o é; e como se isto não bastasse, o tratado com a França corta toda a possibilidade de se estabelecerem normas, embora muito geraes e muito sujeitas a correctivo.
Foi tendo em attenção todas as queixas, ouvindo todos os pedidos, que a vossa commissão foi acceitando ou modificando a proposta do governo. Na fixação dos direitos a nenhum principio geral se obedeceu, a não ser diligenciar o equilibrio da protecção, fazendo justiça a todos, mas não esquecendo a fazenda publica.
A unidade sobre que os direitos incidiriam, era questão de somenos importancia. A de peso é a mais frequente, por ser a mais commoda, a mais usada, a mais facil, e que em regra geral mais traduz a qualidade da mercadoria, por ser indicativa da quantidade de materia prima que contém. O numero e volume são excepcionalmente empregados, e só nos casos em que a verificação do peso seria difficil, ou de resultado, quer incerto, quer injusto.
Os dizeres dos differentes artigos, esforçou-se a vossa commissão porque traduzissem a comprehensão d'elles. Não crê, porém, tel-o conseguido em todos, nem isso para muitos se lhe afigura possivel, a não ser que perdessem a concisão que devem ter. Mas se a isto póde dar remédio um indice remissivo e explicativo da pauta, mal póde evitar tal indice os inconvenientes de uma menos bem medida latitude da letra do artigo. Com effeito, se houver artigos de demasiada extensão será facil que uns abranjam parte de outros, e que d'ahi resulte a incerteza de em qual d'elles se classifica uma dada mercadoria que em ambos parece ter logar; isto obrigará a pôr de parte a letra e a recorrer ao espirito, cousa que em materia que deve ser taxativa, é sempre mau, por ser o ingresso no caminho, se não do arbitrario, pelo menos do opinativo.
Se, pelo contrario, são muito restrictos os dizeres dos artigos, a multiplicidade e constante variedade de productos novos, que os progressos da industria todos os dias estão lançando nos mercados, não encontrarão logar na pauta, e as omissões succeder-se-hão, constituindo dentro em pouco uma serie de artigos extravagantes, que acabam por transformar em verdadeiro cahos a pauta ainda a mais simples.
Em obediencia a estas reflexões, tambem a vossa commissão se esforçou quanto póde, para que saísse sem tal defeito a pauta annexa a este projecto; infelizmente ainda nisto lhe tolheu os desejos o tratado com a França. Algumas cousas se remediaram, outras, porém, não achou a vossa commissão meio de as emendar.
Já o dissemos, póde attenuar este defeito um bom indice remissivo e explicativo. É attendendo a isto, e ao quanto convém estejam sempre reunidas e codificadas todas as resoluções e determinações que digam respeito á pauta, que vos propomos auctoriseis o governo a mandar, pelo menos de dois em dois annos, rever esse indice, emendando-o é additando-o, conforme as occurrencias que durante este periodo se tiverem dado e modifiquem ou ampliem o n'elle estabelecido.
O que se conseguiu de tudo que acabâmos de expor-vos, dando-vos summaria idéa de como a vossa commissão dirigiu o seu estudo, podereis averigual-o pelos quadros comparativos que adiante, no exame que fazemos em especial de cada uma das classes, juntamos como complemento do mesmo exame.
N'esses quadros indica-se a correspondencia dos numeros do projecto, aos da actual proposta, aos da proposta de 1886 e aos da edição de 1885 da pauta, seguindo-se a estes numeros a menção dos direitos principaes, e dos direitos totaes correspondentes 1.

É-nos impossivel fazer-vos, ainda que muito resumidamente, a historia do nosso desenvolvimento industrial e commercial no periodo que decorre desde a publicação da ultima pauta (1882) até hoje. Para, porém, vos darmos uma idéa de qual elle tem sido, vamos agrupar alguns numeros que, ainda que muito em grosso, alguma cousa vos dirão.

1 É facil, dado um direito total com addicionaes, achar o direito principal; para vos facilitar porém o trabalho das verificações que quizerdes fazer nas differentes hypotheses que offerecem os diplomas que nos pareceu conveniente comparar, indicar-vos-hemos as formulas de que nos servimos, e sem as quaes só por tentativas se podem obter taes valores.
Os addicionaes existentes até hoje eram os seguintes:
2% taxa complementar.
0,66 % para portos.
6% (sobre a somma dos precedentes com o direito principal).
3% para emolumentos.
A taxa de 0,66% foi elevada a 2% e é esta que englobam os direitos totaes da proposta actual e do projecto.
Ás mercadorias porém cujos direitos se acham fixados no tratado com a França só, em virtude dos artigos 3.° e 14.°, do mesmo tratado se lhes applicam os addicionaes para portos e emolumentos.
Na proposta de 1886, os direitos ali mencionados comprehendiam a taxa complementar de 2% e os 6% ; os addicionaes para portos e para emolumentos não estavam n'elles comprehendidos. É por nenhum destes addicionaes onerar as mercadorias comprehendidas no tratado, que ellas se mantêem, na proposta de que estamos fallando, taxadas com o direito primitivo exarado na tabella B annexa ao tratado franco-portuguez.
D'estas differentes hypotheses as formulas são:

[Ver formula na imagem]

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1868 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Movimento commercial

[Ver tabela na imagem]

A importação e exportação mencionadas foram feitas de ou para os paizes abaixo mencionados, na quantidade que se indica.

[Ver tabela na imagem]

O augmento de importação da Allemanha deu-se em quasi todos os generos que de lá importamos; o da Belgica igualmente, mas mais accentuadamente no ferro e zinco batidos; o da França especialmente em tecidos e em articles de Paris; o da Hollanda no tabaco, velas de stearina e varias outras mercadorias; o da Inglaterra no bacalhau, em tecidos, particularmente nos de algodão, e metaes; tendo diminuido um pouco no papel, nos vidros, nos generos coloniaes, nos cereaes (775:400$000 réis) nos tecidos de lã, etc.; o de Marrocos foi devido ao augmento na entrada do milho (mais 67:532 kilogrammas, no valor de 131:900$000 réis); o da Suecia e Noruega ao bacalhau, e algum ás madeiras; o das nossas provincias de Africa aos couros, aos dentes de elephante e ao café; o da Asia ao arroz e algumas fibras vagataes (cairo).

Importámos menos da Austria, cereaes; do Brazil, generos coloniaes; dos Estados Unidos, milho e quasi todos os géneros, com excepção do trigo e das madeiras; da Hespanha, menos cereaes, principalmente centeio, milho, trigo, e menos farinha e pão; da Italia, menos canhamo; da Russia, menos linho e madeiras.
O acrescimo da exportação para Allemanha é na cortiça e no vinho (mais 172:327 decalitros, no valor de 87:600$000 réis); para a Belgica, nos figos; para a França, na cortiça e sobretudo no vinho (vinho do Porto, mais 271:724 decalitros, no valor de 409:600$000 réis; vinho de outras qualidades, 6.459:610 decalitros, no valor de 3.462:800$000 réis 1); para a Hollanda, na cortiça; para as provincias portuguezas de Africa, em alguns tecidos e uma pouca de farinha.
Afrouxou a exportação de vinho para o Brazil, e de quasi todas as mais mercadorias que lhe mandavamos; para os Estados Unidos diminuiu a do azeite e laranjas, posto tenha augmentado a dos vinhos da Madeira e do Porto; e decresceu tambem para Hespanha, principalmente nos animaes vivos, nas pescarias e na cortiça, e para Inglaterra bem sensivelmente no gado vaccum.
Para completar esta breve indicação apontaremos os valores de importação das machinas industriaes:

1 A nossa exportação de vinhos desde 1880 tem sido em valor:

[Ver tabela na imagem]

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1869

[Ver tabela na imagem]

Desde 1871 até hoje a importancia das machinas industriaes eleva-se a 8.416:000$000 réis.
Não temos prosperado muito, mas sem duvida nos vamos afastantando de uma quasi antipathia fabril, de uma especie de receio de cultivar outra industria que não seja a agricultura.
Nas notas que se seguem, sobre cada uma das classes, diligenciámos reunir todos os dados e esclarecimentos que podessem facilitar a apreciação do projecto.

CLASSE I

Comprehende a classe I do projecto os animaes vivos e os productos manufacturados ou não de origem exclusivamente animal, sem usos ou propriedades que os subordinem ao titulo de alguma classe especial, ou ao dizer de algum artigo commercial ou industrialmente definido.
Abrange esta classe do projecto a quasi totalidade dos artigos tributados das classes I, II e III da edição de 1885 da pauta geral (animaes vivos, despojos e productos de animaes, pescarias). De taes artigos os não mencionados na classe de que fallâmos, parte, por a vossa commissão entender se lhes deveria dar livre importação (5, 6, 7, 8. 27, 29, 67, 68) engloba-os, salvo o n.° 5, que corresponde ao n.° 1 da tabella B d'este projecto, o n.° 3 da mesma tabella: - Despojos ou productos de animaes,, etc.; os restantes, pela delimitação dada a esta classe, passaram para outra, ou por o titulo d'ella especialisar a sua mais importante applicação (n.ºs 10, 11, 58, 59, 60, 70, 75 para a classe X), ou por as mercadorias n'elles singularmente indicadas se juntarem a similares pelo emprego industrial ou pelos caracteres commerciaes, constituindo um só artigo composto assim de substancias de procedencias diversas (65 no n.° 279 classe X; 56 e 96 em parte no n.° 274 classe X.)
Por isto o n.° 10 da proposta do governo, parecendo á vossa commissão que deve manter-se comprehendendo o mesmo que os artigos n.ºs 54.° e 55.° da edição de 1885 da pauta (indice remissivo e explicativo da pauta, pag. 59 e 60, palavra Cera e abranger ainda a cerezina, passou para a classe X, n.° 273, para evitar a presumpção de que tal artigo, devendo subordinar-se ao titulo da classe, só se refere á cera animal e d'ella se excluem os productos analogos segregados pelas plantas ceriferas e o proveniente da ozokerite ou cera fossil.
É relativamente tão pequena a quantidade importada de cabello em bruto ou peparado e de crinas em bruto ou preparadas (n.ºs 11 e 13 da proposta), e tão diminuta a importancia total dos direitos cobrados nos ultimos annos sobre estas mercadorias 1, que nem a concorrencia que possam fazer a similares productos ou industrias do paiz, nem o seu rendimento fiscal auctorisam a inscrevel-as como excepção ao pensamento que transluz na proposta do governo, e a vossa commissão applaude, de libertar de direitos de entrada as matérias primas, a que tal beneficio não dê a possibilidade de virem afrontar producções nacionaes.
Passarão, pois, se assim o entenderdes, os nºs 11 e 13 da proposta a classificarem-se no n.° 4 da tabella B do projecto.
Afóra estes tres artigos conservam-se na classe I do projecto todos os mais da mesma classe da proposta, tendo comtudo a vossa commissão em alguns d'elles modificado os direitos, n'outros alterado os dizeres, para os tornar mais claros, e ainda acrescentado alguns artigos novos.
Gado. - O titulo de nação mais favorecida, que a França se reservou no tratado de commercio que com ella concluimos em 1882, torna extensivo a este paiz tudo o que com qualquer outro accordarmos, excepto com o Brazil; e a carta de lei de o de junho de 1882, mandando applicar a todas as nações comnosco em relações commerciaes o regimen convencional do tratado com a França, se tornou possivel a reducção a um só diploma das duas anteriores pautas - a geral e a convencional, tambem, por virtude das suas disposições, este diploma deverá ser modificado por qualquer subsequente convenio: as concessões por estes feitas aproveitarão á França pela clausula citada do seu tratado com Portugal, e por isto a todas as mais nações, pelo determinado na citada carta de lei de 1882.
Tal a rasão porque ainda na edição de 1885 da pauta geral das alfandegas, feita antes do tratado com a Hespanha, se taxa o gado vaccum, asinino, cavallar e muar, os dois ultimos conforme os n.ºs 1 e 2 da tabella B, annexa ao tratado com a França, entretanto que na proposta de lei n.° 7-E, apresentada ás camaras na sessão de 1886, assim como na proposta actual, nenhum d'estes generos de gado é tributado e só o é o gado suino. Uma e outra d'estas propostas feitas sob o regimen do convénio com o vizinho reino 2, deviam generalisar pelas rasões expostas o com elle estipulado.
Mas a terminação do tratado de commercio com a Hespanha, em 30 de junho proximo passado, desligando-nos do n'elle convencionado, boas rasões parece á vossa commissão haver para se alterarem algumas das suas clausulas.
Ás causas que prejudicam a industria da creação e engorda do gado vaccum no nosso paiz, entre as quaes figura como a mais importante a diminuição da exportação, ajuntava-se tambem a concurrencia que aos nossos gados faria o gado hespanhol, se continuasse com livre entrada no nosso paiz, como a tinha pelo tratado a que alludimos. Julgou a vossa commissão dever estudar até que ponto esta concurrencia era prejudicial. O quadro seguinte mostra qual a importação e exportação de gado vaccum nos ultimos sete anãos, aquella pela raia secca, que é para o assumpto a que mais nos interessa.

1 A importação noa ultimos dois annos foi:

[Ver tabela na imagem]

que daria para total dos direitos dos artigos 11.º e 13.° da proposta

[Ver formula na imagem]

2 O tratado com a Hespanha foi assignado em Lisboa pelos respectivos plenipotenciarios em 12 de dezembro de 1883. approvado pelas camaras em 1886, e ratificado por lei de 2 de julho do mesmo anno.

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1870 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

[Ver tabela na imagem]

Do exame d'estes numeros, vê-se que a differença entre a importação e a exportação cresce, com excepção de 1881, desde 1879 a 1886, e que este acrescimo é devido simultaneamente a um augmento na importação e a uma diminuição na exportação. Suppondo que a differença entre a importação e a exportação até 1884 servisse, com os nascimentos, para manter o numero necessario de cabeças do armentio de trabalho, substituindo as que morreram e entraram no consumo, tomando mesmo o maior d'aquelles numeros: - 22:828 1, achâmos em 1885 um excesso de 10:436 cabeças, isto é, um numero d'ellas maior do que o das exportadas, e em 1886 quasi o dobro d'aquelle numero:- 22:920. Ha pois um excesso de importação, que necessariamente suffocará a industria nacional da creação dos gados, se continuar a poder fazer-se livremente, e tanto mais quanto em mais proximas condições de se abater, esse gado der entrada no nosso paiz. Tendencia para isto se revela já na differença do valor medio das rezes importadas nos dois ultimos annos: estes valores medios indicando resultarem de valores parciaes, alguns d'elles elevados, isto é, alguns d'elles não de rezes para recrear, mas de rezes gordas.
O gado vaccum, na sua quasi generalidade, passa pela charrua antes de atermar no açougue, e é justamente este duplo lucro, o da valorisação pela ceva e o do trabalho anteriormente prestado, que anima a industria da creação e recreação.
Mas para isto é necessario que o recreador, diminuida como o está a exportação, possa ao menos estar certo de que não terá a concurrencia do gado estrangeiro a difficultar-lhe a venda do seu, e o creador seguro de que não se verá obrigado a entregar por qualquer preço as crias que não póde sustentar, e um grande numero das quaes encontrará com dificuldade quem lh'as pague. Assim, será possivel a um augmentar o seu armentio de trabalho, ao outro desenvolver a sua industria, a ambos concorrerem lucrativamente para a prosperidade da agricultura. Para confirmar a verdade do que deixâmos dito, transcreveremos as seguintes palavras do relatorio que o conselho superior das alfandegas apresentou ao governo sobre a renovação do tratado com a Hespanha:
«Quando estes dados não fossem bem eloquentes (os da estatistica), outros factos ainda ha, que exuberantemente demonstram as difficuldades com que actualmente luctam os nossos creadores. Apparecem no mercado do paiz tantas rezes adolescentes á venda, que a carne de vitella está

1 Pelo recenseamento geral dos gados de 1870 existiriam no nosso paiz 161:546 vaccas mais ou menos propostas á creação, entre manadias e não manadias. D'estas seriam exclusivamente votadas á reproducção 29:170, e as unicas cobertas quasi todas annualmente; as vaccas leiteiras, em numero de 5:443, fazem se cobrir de anno e mez para se aproveitar mais leite e as vaccas de trabalho e creação, 106:900, e as de fins indistinctos, 2:033 são cobertas de um anno para outro, para melhor satisfazerem aos fins a que são destinadas.
Calculemos das primeiras cobertas annualmente 80 por cento, e de todas as outras 50 por cento, teremos, abatendo 20 por cento para as quebras de infecundidade e aborto, o numero total de uma provavel reproducção annual de 64:419 cabeças, isto sem entrarmos em linha de conta, por o não termos por suficientemente constatado, com a maior fecundidade por alguns attribuida ás vaccas manadias. Comparando se o numero que apontâmos com o de 48:097 do recenseamento, onde buscámos os elementos para o nosso calculo, acharemos uma differença para menos n'este de 16:322 cabeças, que deverá, pouco mais ou menos representar o numero de vitellas que se abatem para o consumo, (só em Lisboa no anno economico de 1886 e 1887, foram abatidas 5:089). Se se juntar portanto ao numero medio de crias annuaes 64:419, o excesso entre a importação e exportação em 1884 22:828, achar-se-ha a somma de 87:247 cabeças para satisfazer ao consumo e substituir as mortas. Tomando para base o calculo apresentado no relatorio da direcção geral do commercio e industria, ácerca dos serviços dependentes da repartição de agricultura, desde a sua fundação até 1870, pelo conselheiro Moraes Soares, deduz-se que o consumo annual de carne bovina em relação a cada habitante de Portugal, é representado por 5k,350. Acceitando seja hoje maior e igual a 6 kilos, com excepção de Lisboa e Porto, cidades para as quaes computar-se-ha, para uma avaliação da media geral, o consumo em separado a rasão de 20 kilos, é certamente exagerado, teremos:

Consumo medio em Lisboa e Porto .... 5.864:840
No resto do paiz .... 19.335:365
25.200:205

Tomando para peso medio de cada vez o de 567 kilos, media do peso das differentes raças que concorrem ao matadouro de Lisboa, e cujo rendimento em carne limpa e miudezas alimentares regula por 65 por cento do peso vivo, poderá computar-se o peso de cada cabeça alimentar em 368k,55, o que, para os 25.200:205 kilos calculados acima como necessários ao consumo do paiz, dá em rezes 68:293, que abatidas das 87:247, deixa livre para compensar as mortes accidentaes 18:954. Estes numeros approximam-se muito da differença entre a importação e a exportação nos dois annos de 1882 e 1883, os de maior saída de gado vaccum.
Ora o numero total de rezes bovinas em funcção de trabalho, que se apurou no recenseamento de 1870, foi de 472:377, correspondentes a 327:267 cabeças normaes de trabalho, numero que, calculando uma cabeça para o serviço de 6 hectares - o que resulta da estimação de 30 moios de terra e correspondente folga para uma charrua de tralhoada, puxada por tres juntas de bois - inculca uma superficie de cultura arvense e pradosa de não menos de 1.963:602 hectares. E esta pouco mais do que a superficie cultivada do reino, segundo a estimação do sr. Rebello da Silva, 1.961:265 hectares, mas, deve notar-se, comprehendem-se n'este ultimo computo da superficie cultivada:

[Ver tabela na imagem]

Olivaes ....
Vinhas ....
Soutos ....
Matas ....
Total ....

Subtrahindo este numero do avaliado pela quantidade de cabeças de trabalho, reduzem-se ellas a 1.626:053, deduzindo só daqui um excesso de 56:307 cabeças, excesso que realmente não existe, não só por aquella estimação do sr. Rebello da Silva ser evidentemente muito baixa, como porque, afora a cultura arvense e pradosa, o gado vaccum é tambem empregado na cultura de algumas das terras comprehendidas nos 337:843 hectares que deduzimos do total obtido, tomando para base a existencia em numero de cabeças normaes de trabalho. Póde, pois, dizer-se que, para a superficie cultivada o nosso armentio de trabalho é regular, devendo ainda notar-se que tomámos para os calculos a relação entre a superficie aravel e a media do trabalho da raça brava amanhada (boi de tralhoada) e não a de algumas raças mais fortes, como a mirandeza e a ratinha, a qual dá a media que aponta Laconteux, 1 boi para 8 hectares.

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1871

pelo mesmo preço da de rezes adultas, e já tem estado por vezes mais barata, o que prova que os creadores preferem vender as rezes adolescentes por preço pouco remunerador a conserval-as para creação.»
Por estas rasões a vossa commissão entende dever propor-vos um direito de entrada para o gado vaccum de réis 2$485 por cabeça. Este direito, que comprehende todos os addicionaes, equivale a um direito principal de 1$510,08 réis, tomando para valor medio, a media dos valores declarados em 1886 (19$788 réis).
Não passaremos adianto sem vos ponderar, que este direito, sobre ser justo, é sympathico. A industria da recreação do gado vaccum é no nosso paiz uma industria de pobres, desprotegel-a seria completar a ruina de uma classe já bem pouco favorecida. Com effeito, pelo recenseamento de 1870 mostra-se que o numero de possuidores de uma a cinco cabeças d'este gado é de 169:500, para um total de 178:542 possuidores, isto é, 91 por cento, dos que têem rezes bovinas, são apenas donos de 1 a 5 cabeças. E d'estes pequenos possuidores encontram-se em todos os districtos do paiz, correspondendo, em alguns dos do norte, a proporção d'elles ao numero de cabeças recenseadas. É portanto a pequena industria armentosa, em todos os seus ramos, a que predomina em Portugal, e todos sabem que sendo assim representa em capital as economias de um rude trabalho, accumuladas á custa de toda a ordem de sacrificios.
Ao gado suino podem applicar-se igualmente estas ultimas considerações: «A industria da ceva (de porco) vão do mais abonado lavrador ao mais misero cabaneiro, porque os menos afortunados é da rez suina que tiram o unto para o fumeiro, que engorda um tanto e dá tempero á sua magra panella, como tiram, não poucos d'elles, pelo cevão que engordam ou crias que recriam com rebotalhos alimenticios e que vendem depois, os meios até de pagar a renda do mesquinho tegurio e quintalejo que desfrutam». Ha comtudo differença entre as condições do gado suino e bovino no nosso paiz. É aquelle, pelo numero de cabeças e principalmente pelo valor pecuario, um dos primeiros, e alem d'isso não tem funcções de trabalho. Não sendo para desprezar a concurrencia estrangeira, e principalmente a do que póde entrar pela raia, é, ao contrario do gado bovino, mais prejudicial a importação doe leitões que a dos cevões.
Se juntarmos a uma frouxa exportação, a irregularissima producção dos montados, principalmente em os nossos dois districtos mais altamente suinos, Evora e Portalegre, e o systema da alfandega hespanhola de permittir as exportações temporarias para beneficiação, convidando assim a irem lá buscar-se porcos para engordar, visto que os direitos de entrada no nosso paiz eram diminutissimos, teremos as causas que explicam a quéda que, ha alguns annos a esta parte, tem soffrido entre nós a industria da creação de gado suino. Manter menores os direitos de importação no nosso paiz do que analogos direitos no vizinho reino, seria aggravar este mau estado de cousas; igualal-os, como se vos propõe, remedial-as ha, sem perigo de elevação do preço da carne de porco, alimento das classes trabalhadoras de muitos dos nossos districtos.
Relativamente aos outros gados alimentares nunca o seu numero se póde ter como excessivo: são a carne do pobre, subsidiarios de industrias variadissimas e os mais fecundos agentes da fertilisação da terra. A grei ovina e o armentinho caprino, não sendo no nosso paiz, nem em quantidade nem em qualidade sufficientes, mantém apesar d'isso uma forte corrente de exportação para o vizinho reino. Nada auctorisava o impôr-se direito de entrada a este gado.
Como gado auxiliar temos o cavallar, o asinino e o muar. Este ultimo substituo o boi em muitos dos nossos districtos (em 12 pelo menos) como animal de lavoura, de tiro e de carga. Pouco susceptivel, sobrio e valente, reune todas as condições do animal de trabalho. A sua producção é entro nós diffusa, mas pouco intensa e mal qualificada, isto principalmente pela má qualidade dos reproductores. Raro apparece jumento mulateiro de lei, o ainda os maus deitam-nos a eguas agarranadas, ou pouco mais do que isso, que insam de manehegos o paiz inteiro. A sua exportação, não obstante isto, é ainda superior á importação e arriscar-se-ía por direitos mal cabidos este vantajoso movimento.
O mesmo se póde dizer relativamente ao gado asinino e cavallar. Tem elle entre nós uma reproducção nada apoucada mas de pouco quilate. O meio unico de melhoria, é permittir a livre entrada a reproductores que o possam aprimorar.
Pelles e couros. - A comparação com as estatisticas dos n.ºs 12 a 25 da edição de 1882 da pauta mostra que de muitos d'elles é pequenissima a importação e que se foram convenientes em outra epocha as distincções ali feitas, hoje são, pelo menos, inuteis. Alem d'isto para alguns a especificação não se justifica, e antes a condemna o embaraço que d'ella podia resultar nas verificações aduaneiras.
Perdemos por medidas fiscaes impeditivas o commercio dos couros do Brazil; só poderiamos deixar na pauta os dizeres que lhes concernem como um conselho, para não dizer como uma censura.
Aquelles quatorze artigos dos quaes doze continuam tributados, são reduzidos a nove: o n.° 8 do projecto englobam os n.ºs 16 e 20, e os n.°s 14 e 15 da pauta até ha pouco em vigor repartem-se pelos n.ºs 3 e 4 do mesmo projecto. Os dois artigos que permanecem livres, n.0119 e 25, comprehende-os o n.° 3 da tabella B do projecto.
Para que vos seja mais facil o avaliardes dos direitos propostos resumiremos o estado da industria dos cortumes em Portugal, em 1881. Se ameaçada actualmente pelos novos processos que encurtam consideravelmente o curtimento das pelles, tem até aqui caminhado e existe disseminado por quasi todo o paiz.
As noventa e três installações constatadas em 1881 repartiam-se assim: Aveiro 1, Braga 2, Bragança 3, Coimbra 1, Évora 6, Faro 1, Leiria 10, Lisboa 21, Porto 19, Santarém 27, Vizeu 2.
N'estas installações fabricava-se: sola, bezerro, vitella, vaquetas, atanados, couros curtidos ordinarios, frizados e tintos, carneiras, cordovões, marroquins e pellicas.
O capital circulante d'esta industria era superior a réis 60:000$000, o valor da materia prima empregada andava por 155:000$000 a 160:000$000 réis, a mão de obra não custaria menos de 60:000$000 a 65:000$000 réis, a producção elevava-se a um valor não inferior a 1.450:000$000 réis.
O numero de operarios era de 800 a 850 cujos salarios importavam em pouco mais ou menos 200$000 réis diarios.
Oleos e gorduras.-Para evitar difficilimas verificações por differenças de direitos que não compensavam o trabalho, fixou-se um direito unico para todas as gorduras animaes com excepção da banha o unto; estas, pelos limites que dissemos attribuirem-se a esta classe, não tinham n'ella cabimento.
De duas reclamações contra a taxa fixada teve a vossa commissão conhecimento, e ambas com referencia ao sebo. Pede-se n'uma (Doe. n.° 3) se imponha de direitos de entrada a esta gordura 50 réis por kilo, fundando-se os signatarios d'ella, marchantes e proprietarios de talhos:
1.° Em que o sebo nacional diminuido no seu valor pelo baixo preço do estrangeiro, os creadores de gado deixam de promover a engorda do gado vaccum, porque, dando o gado gordo relativamente menos carne limpa do que o de meias carnes ou magro, tambem relativamente attinge menor preço;
2.° Que o gado vaccum em Lisboa está ainda sujeito ao elevado imposto local de 60 réis por kilogramma de carne limpa, a qual comprehende sebo aggregado na proporção de 10 a 14 por cento.

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1872 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Na outra representação, a que alludimos, varios fabricantes, reproduzindo a affirmação feita pela companhia união fabril (Relat. do Gov. pag. 214 n.° 106 e Doc. n.° 4), dizem que, se o sebo não ficar completamente livre e se entender que, em vez de comprehendido no n.° 3 da tabella B da actual proposta, o está no n.° 20 da primeira classe da mesma proposta, será consequencia inevitavel o fecharem-se todas as fabricas de vélas e sabão, por nenhuma poder viver com tal aggravamento de direito sobre sua principal materia prima. Tanto o primeiro pedido como a ultima affirmativa são, sem duvida, exagerados.
O valor medio do sabão importado, em 1886 conforme os valores declarados, foi de 94 réis, supponhamos 100 réis por kilo, e o das velas de 230 réis; os direitos de importação sendo respectivamente de 50 e de 90 réis, segue-se que estas duas mercadorias têem uma protecção, a primeira de 50 por cento, a segunda de 39 por cento. A elevação pois do direito de uma das suas materias primas de 10 réis, para que reduzisse a protecção a 30 por cento, isto é, ainda a mais do que o maximo direito ad valorem inscripto na pauta (27 por cento), seria necessario que para produzir 1 kilo de sabão fosse preciso empregar 7 kilos de sebo e para 1 kilo de velas 56 kilos da mesma materia prima, visto que seria preciso que os valores acima dados se elevassem respectivamente a 166 e 300 réis.
Por outra parte o principal argumento dos marchantes e proprietarios de talhos é que, pagando por kilo a carne limpa 61,8 réis de imposto de consumo e contendo 10 a 14 por cento de sebo, este paga direito igual e tem preço muito inferior ao da carne.
A gordura ou sebo encontra-se no tecido sub-cutaneo, gordura superficial ou flor, e nos tecidos das serosas do thorax e abdomen e nos das paredes dos órgãos d'esta cavidade, gordura profunda ou sebo. A primeira é alimentar e vende-se conjunctamente com a carne, a segunda applica-se a diversos usos industriaes. É esta ultima, portanto, a unica que póde ser desvalorisada pelo preço do sebo estrangeiro. Alguma d'ella extrahe-se é certo no talho quando se dividem as rezes em peças é o sebo de talho 1 e é elle que constitue com o sebo extraindo na occasião do preparo no matadouro, sebo tripeiro 2, depois de ambos serem fundidos ou refinados, a materia prima para que se pede mais elevado direito de importação. Cada kilo d'este sebo refinado, segundo a relação de 125 por cento, apurada no matadouro de Lisboa, do sebo de talho para o sebo tripeiro em cada vez, descontando para quebras na refinação, pelo processo de Donai empregado no mesmo matadouro, 90 por cento no sebo tripeiro e 12 por cento no sebo de talho, compõe-se, em numeros redondos, de:

[Ver tabela na imagem]

Sebo tripeiro ....
Sebo de talho ....

E como, das 1:150 grammas de sebo bruto necessarias para produzir 1:000 grammas de sebo refinado, só pagam o imposto de 60 réis as 491 grammas de sebo de talho, segue-se só ser o direito, que onera o sebo refinado proveniente de cada rez, réis 29,44. Fica pois demonstrado o exagero do pedido.
A differença de 19,45 réis que ainda fica pesando sobre o sebo nacional relativamente ao estrangeiro, entende a vossa commissão ser melhor attender-se a ella, se tiver por conveniente, quando se tratar da reforma da pauta de consumo, do que elevar o direito do sebo na pauta geral alem do que lhe impõe o n.° 19 do projecto.
As considerações que acabâmos de fazer são applicaveis ao imposto de consumo de 25 réis, pago pelas rezes vivas. Este imposto corresponde a uma percentagem de quasi 60 por cento de carne limpa, isto é, de um pouco mais do rendimento medio averiguado no matadouro de Lisboa para o gado bovino.
Facil vos será saber, pelo quadro que adiante damos, quaes os artigos das classes da edição de 1885 da pauta reunidas n'esta, que foram englobados em um só ou alterados nos seus dizeres ou direitos.

É da Hespnnha que principalmente importâmos os animaes vivos. Subindo em 1885 a 1.037:141$000 réis o valor das totalidades importadas, pertencem d'este valor 1.007:529$000 réis approximadamente ao vizinho reino, os restantes 30:000$000 réis distribuindo-se principalmente pela França, Inglaterra e Allemanha. É para a Inglaterra e para a Hespanha que principalmente exportâmos. Este commercio tendo porém para nós uma importancia especial, damos o seu movimento em 1885, em mappa separado.

Gado

[Ver mapa na imagem]

1 Massas perirenaes e peritracheaes, 8$ massas da virilha e as da costaneira, as scrotaes e as sub-scapulares.

2 Sebo do mesenterio, do epiploon, da base do coração e a gordura dos estomagos,

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1873

Sobre os despojos e productos de animaes dar-vos-ha cabal idéa das nossas transacções o quadro seguinte, em que as resumimos para cada artigo do projecto.

Productos animaes (1885)

[Ver quadro na imagem]

(a) Não está comprehendida a cera em obra, a maior parte importada sendo em vélas, classe X.
(b) Comprehendendo os animaes vivos.
(c) Comprehendendo os animaes vivos e as mercadorioa não mencionadas no momento da exportação (5:468$000 réis).
(d) Importação ou exportação inferior a 500$000 réis.

Terminaremos o que respeita a esta classe, reunindo em quadro comparativo os artigos do actual projecto, os artigos da proposta actual, os da proposta de 1886 e os da edição de 1885 da pauta geral e respectivos direitos.

Classe I

[Ver tabela na imagem]

(a) Estes direitos principaes foram calculados nos termos da tarifa geral. Como porém os direitos totaes eram os do tratado com a Hespanha, calculando o direito primitivo conforme a convenção franco-portugueza, terá elle para a da proposta de 1886, 90 réis, para o da actual proposta, 209,47.
(b) Excepto as vélas.

N.º B. Os numeros entre parenthesis são de mercadorias sobre que ha tratado com a França.

91 *

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1874 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

CLASSE II, III, IV e V

São sem duvida estas de todas as classes da pauta as mais naturaes. Comprehende cada uma d'ellas uma fibra ou um grupo de fibras textis e as suas transformações - fios e tecidos. As duas primeiras abrangem as fibras animaes, as duas seguintes as vegetaes.
O estudo dos productos que se agrupam nas quatro classes de que vamos occupar-nos tem grandissimo interesse, não só pela importancia d'elles na economia social, como por serem as industrias que se lhes referem, das que de mais longa data e mais pertinazmente têem diligenciado estabelecer-se no nosso paiz, onde hoje já attingiram um desenvolvimento relativamente importante.
Correspondem no seu conjuncto as classes II, III e IV do presente projecto ás classes IV, V, VI e VII da edição de 1885 da pauta geral. As modificações que se fizeram, tendentes a simplificar ou a esclarecer os dizeres d'esta classe, umas são particulares e d'ellas nos occuparemos quando em especial tratarmos de cada uma das classes, outras são geraes, isto é, dizem respeito a todas, e por isso desde já as mencionaremos.
Em vez de repetir para cada qualidade de fibra textil que as obras dos tecidos de que são materia prima, pagam o direito do respectivo tecido augmentado de 50 por cento, propõe-se-vos o passar esta disposição para os preliminares da pauta, o que não só permitte uma reducção de artigos, mas colloca no seu logar um preceito que, pela generalidade, é nas instrucções pautaes que tem cabimento.
Pela concessão feita no artigo 22.° dos preliminares da pauta era permittido ao importador ou despachante á sua custa e dentro da alfandega cortar os tecidos de lã e algodão em pedaços, que só pudessem ter applicação a cobertura de guarda chuva ou guarda-sol, e assim cortados pagavam estes tecidos um direito muito inferior ao direito do mesmo tecido em peça.
Esta permissão, que teria em tempo rasão de ser, é hoje, até pelos proprios interessados, tida como um desfavor e não um beneficio (Rep. E, n.° 64, D. do G, n.° 111, 20 de maio de 1887), e para a alfandega é ella sem duvida um estorvo e uma complicação de serviço, para cousa que, se não é um mal, pelo menos é de quasi nullo proveito. É elementar em serviços aduaneiros que não se deve permittir transformação alguma das mercadorias com o fim de lhes alterar, depois de sujeitas á acção fiscal, o seu regimen: comprehende-se bem a que fraudes e abusos levaria tal liberdade, e a que interminavel numero de excepções impelliria o precedente. Este preceito acha-se mesmo, e por mais de uma vez, consignado na nossa legislação alfandegaria, tendo como unica restricção d'este genero a do córte dos tecidos com applicação a chapéus de chuva ou de sol. A vossa commissao, em presença d'estas rasões, e de aos proprios interessados, por declaração espontanea d'elles, lhes não ser de utilidade, entendeu dever supprimir os artigos 38.° e 84.° da proposta, que eram a traducção da nota (a) dos n.ºs 604 e 605 da edição pautal de 1885, ficando assim abolido o regimen de excepção consignado n'essa nota e no citado artigo 22.° dos prelimares.
Dito fica pois, o motivo por que não foi acceite a opinião do conselho do commercio e industria, para que se generalizasse aos tecidos de seda o córte especial consentido aos tecidos de algodão e lã. Seria talvez justo, se aquella disposição ficasse, mas é certamente isto o não somenos inconveniente das excepções: estabelecem-se com o tempo, umas após outras, uma serie em que sem duvida cada um dos termos differe pouquissimo do antecedente e consequente, mas era que, para os termos afastados, póde chegar a haver entre elles mais opposições do que similhanças.
A transcripção na actual proposta sob os n.ºs 49, 67 e 98 dos n.ºs 61, 85 e 118 da proposta de 1886, motivou uma representação dos fabricantes de telas e artefactos de malha, ou antes uma apresentação de uma reclamação por elles feita em fevereiro de 1886, por occasião de se elaborar a pauta annexa á proposta de lei n.° 7-E, a que acima nos referimos.
Pedem elles que se englobem nos artigos que se referem á obra de telas de malha as telas em peça, fundando-se para isso em que, não só o direito para aquellas arbitrado é diminuto, mas á sombra do dizer, como está redigido, entrariam como tela, artefactos quasi promptos, aos quaes apenas falta um insignificante acabamento para terem immediata applicação aos usos á que são destinados.
O fio de seda, linho e algodão pagam direitos fixos correspondentes em media aos direitos ad valorem de:

O fio de linho e seda .... 20 por cento

fio de algodão .... 40 por cento

ao passo que a tela de malha e ponto de meia pagaria, nos mesmos termos, segundo a proposta:

A de seda .... 26 por cento
A de algodão .... 33 por cento
A de linho .... 30 por cento

E podem acceitar-se estas percentagens deduzidas dos valores medios, porque, se com effeito os valores declarados são sempre inferiores aos reaes, os de que nos servimos tendo a mesma origem, deve presumir-se lhes o erro no mesmo sentido, só podendo portanto influir na taxa pela não proporcionalidade d'elle pura cada caso, influencia que é insignificante.
Ora é certo que pelo aperfeiçoamento dos machinismos, pelas successivas melhorias dos teares circulares, elles formam a malha, e com o auxilio de tubos ou de augmentos, dão conjunctamente a fórma, senão sempre a definitiva, pelo
menos a apropriada, sendo na maioria dos casos insignificante a mão de obra necessaria para se conseguir o artefacto completo. Custa, pois, quasi tanto o fabrico das obras de malha et ponto do meia como o das telas d'estes pontos em peça. Aquellas percentagens seriam, portanto, ainda mais reduzidas por se despacharem como tela, artefactos já quasi confeccionados.
Era consequentemente justo fazer desapparecer os artigos da proposta, que se referem á tela de malha em peça, e modificar em harmonia com esta resolução os que dizem respeito á obra.
Esta proposta que se vos faz, tambem modifica, e ainda com mais rasão, o até aqui existente. No indice remissivo da edição de 1885 da pauta (pag. 97, 50 e 79) mandam-se classificar os tecidos de malha - os de seda, no n.º 148, os de algodão, nos n.ºs 168 e 169 e os de linho, no n.° 212: ora quaesquer d'estes numeros não só têem direitos muito superiores aos indicados para estes tecidos na proposta actual, mas até todos elles maiores de que os marcados para a obra de malha n'este projecto e na pauta a que alludimos. Depois do tratado com a França, não tendo havido reforma alguma na pauta, encontram-se bastantes d'estas desharmonias, provenientes d'aquelle tratado ter modificado artigos da pauta de 1882, sem se alterarem no mesmo sentido os com elles relacionados.
Examinemos em especial cada uma das classes até aqui conjunctamente tratadas.
Lã e pellos. - A producção da lã, no nosso paiz póde calcular-se, numeros redondos, em 4.800:000 kilogrammas, sendo d'estes, lã branca 2.850:000 e lã preta 1:963 1. O valor do toda esta lã computa-se em 960:000$000 réis.

1 A lã produzida no nosso paiz reparte-se pelas raças lanares: - bordaleira, merino e estambrino, a maior quantidade sendo, porém, da primeira. Carneiros do verdadeiro typo estambrino não os ha na

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1875

Em 1886 importámos de lã em rama lavada e por lavar 5.136.402 kilogrammas no valor de 1.346:708 e exportámos de lá, nas mesmas condições, 720:000 kilogrammas no valor de 155:000$000 réis. A lã empregada no paiz foi, portanto, de 9.936:402 kilogrammas, no valor de réis 2.306:000$000 réis, quantia esta a que ainda se deve acrescentar, para se ter o valor total da materia prima empregada pela industria de lanificios: a lá em rama tinta, a lã em, fitas conforme sáe da carda ou da penteadeira, a lã de trapo e o fio branqueado ou tinto que importámos:

[Ver tabela na imagem]

Podemos pois fornecer apenas 48,3 por cento da lã necessaria á nossa industria, e d'essa mesma ella não aproveita toda, 15 por cento são exportados. O nosso deficit em valor é representado por 1.191:000$000 réis, o nosso deficit em quantidade é de 4:410 kilos; o que quer dizer, que importâmos lã a rasão de 262 réis, ao passo que o valor da nossa é de 202 réis. Influe pára isto de certo a qualidade, não podendo, como se vê, ser desculpa de se não cuidar em aperfeiçoal-a a falta de consumo.
O numero de installações de lanificios mencionadas no inquerito de 1881 é de 160, distribuidas do seguinte modo pelos nossos districtos:

[Ver tabela na imagem]

Aveiro, Bragança e Faro ....
Portalegre e Santarem ....
Vizeu ....
Porto ....
Lisboa ....
Leiria ....
Guarda ....
Castello Branco ....
Capital fixo ....
Capital circulante ....
Valor da materia prima ....
Mão de obra e despezas geraes ....
Valor dos productos fabricados ....
Importancia diaria dos salarios ....
Salario de 2$000 a 55 réis.

Pessoal fixo:

[Ver tabela na imagem]

Homens ....
Mulheres ....
Menores ....
Pessoal movel ....

Material:
Motores a vapor, 63, com a força de 1:821 cavallos.
Motores hydraulicos, 162, com a força de 1:009 cavallos.
Carduças, 51.
Cardas, 504.
Fiações, 286; com 70:007 fusos.
Retorcedores, 46; com 1:270 fusos.
Teares, 2:267. Mechanicos, 356; manuaes, 1:911
Dornas de tinturaria, 45.
Caldeiras, etc. 132.
Pisoes cylindricos, 81.
Masseiras, 66.
Ramblas, 223. Mechanicas, 5; ar livre, 218.
Tesouras, 124. Transversaes, 35; longitudinaes, 89.
Perchas, 133.
Apparelhos diversos, 1:494.
Officinas auxiliares, 40.
N'estas fabricas tecem-se pannos, cazimiras, cheviotes, borelinas, baetas lizas e de xadrez, brancas e de côres, saragoças lisas e entrançadas, picotilhos, mesclas, castorinas, chales, flanellas, surrubeques, e telas e artefactos de ponto de meia.
Pela idéa que por estas notas podereis formar do estado da industria de lanificios entre nós, achareis justo, como a vossa commissão, o pedido dos fabricantes para que se conservassem os direitos taes quaes tinham sido estabelecidos no tratado com a França. É uma industria esta em completa via de desenvolvimento, e que fundando-se á sombra de uma certa protecção não póde por emquanto,

nossa producção ovina «a não ser por curiosidade algum grande churro ou lacha hespanhol».
Ha comtudo bastantes carneiros cujo vello se approxima dos caracteres do vello dos estambrinos: são uns a exageração do bordaleiro feltroso, mas, posto que assim lh'o chamem communente, não são churros; são outros ainda a exageração dos bordaleiros communs de lã altosa que, similhantes aos lachas lhes faltam muitos dos caracteres proprios. Os nossos merinos mesmo, só os de 13 branca da raça alemtejana dita dos barros e alguns raros das cercanias de Lisboa, os da raça fina saloia ou bruscos finos são os unicos que dão uma lã merino que possa qualificar-se de fina. Tomos sem duvida lãs dos tres typos feltreira, merino e longal, mas todas ellas mal apuradas, porque, não havendo cuidado nos cruzamentos, perdem pela mistura os seus caracteres proprios, tornando-se desiguaes, mesclo dos e de menor rendimento os vellos.
As qualidades das nossas lãs são:

[Ver tabela na imagem]

As rezes lanares de lã preta são entre nós em numero quasi igual ás de lã branca, o que não abona a boa qualidade de producção ovina: as raças de lã preta têem-se pelas mais primitivas e descuidadas e tendem a desapparecer nos paizes em que melhor se attende ao regimen d'este gado. São as mais rusticas sem duvida e por isso as mais preferidas, onde apesar do rifão fome e frio faz o gado gallego, tão pouco se cuida do alimento e agasalho do gado.
1 Este numero differe do atraz apontado em 296:418$000 réis, quantia tem duvida inferior ao custo das drogas e outras materias primas subsidiarias empregadas n'esta industria.

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1876 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

apesar de em bom caminho, prescindir d'ella. Tirar-lh'a seria arriscarmo-nos a Ver perdidos valores importantes, e sem pão quasi 10:000 pessoas.
A não ser a já indicada suppressao do n.° 38 da proposta, tecidos para cobertura de chapéus de chuva, nenhuma outra alteração se fez n'esta classe relativamente á proposta do governo. Maiores foram, porém, as modificações, pelo que respeita á edição de 1885 da pauta, e posto que ellas estejam indicadas no quadro adiante, mencionaremos algumas em especial.
Nos n.ºs 36 o 37 do projecto, como nos n.ºs 39 e 40 da proposta, reune se uma serie de tecidos, que repartidos por numeros diversos da antiga pauta, davam logar, uns pela redacção do dizer pautal, outros por estabelecerem inuteis e incorrectas distincções a controversias constantes e a embaraços por vezes na sua classificação. Assim o dizer dos n.ºs 117 e 120 da classe 4.ª da edição de 1885 da pauta, que são a copia dos n.ºs 14.° e 15.° da tabella B, annexa ao tratado com a França, são de impossivel delimitação, hoje que a moda tornou commum aos dois sexos todas as ordens de tecidos; e os n.ºs 114 a 117, sobre o meticuloso da distincção estabelecem differenças de direitos que não se justificam. Mantem-se pois nos dois citados n.ºs 36 e 37 do projecto, a classificação estabelecida no tratado franco-portuguez, ficando porém os dizeres perfeitamente definidos e sem poderem occasionar as duvidas e embaraços dos antigos. É certo que tendo de se englobar n'elles artigos do tratado, tiveram de se impor os direitos do numero menos tributado n'esse tratado.
Contra isto apresentou-se uma reclamação. (Rei. do Gov., pag. 102, n.º 211.°) por se terem reunido sob o direito de 900 réis, tecidos que pagavam até aqui 1$500 réis.
A vossa commissão, vendo que com este direito ainda a industria fica com uma protecção de 34 por cento, não se anima a propor-vos mais, e não vos occultará que fazel-o, será ver reapparecer o cahos em que até agora se vivia. Demais, qualquer protecção que se desse seria inefficaz. Pois que tecido, a não ser por uma arbitrariedade que justificaria a verdadeiramente extraordinaria redacção dos n.ºs 14.° e 15.° do tratado com a França, mas que era uma arbitrariedade, poderia excluir-se dos tecidos penteados, ou levemente cardados para vestuario feminino, quando nem um exclusivamente attenua a generalidade da applicação? Logo, a totalidade d'aquelles para que os fabricantes mais desejariam a protecção ficaria sem ella, e o direito seria um direito meramente platonico: á primeira reclamação do commercio francez ficaria sem effeito, embora reconhecendo-se-lhe a sem rasão: não tinham rasão, mas tinham justiça.

Terminando o que se refere a esta classe, damos a nota das nossas transacções commerciaes, com referencia a cada um dos artigos d'ella, e em outro quadro a relação dos numeros e direitos dos tres diplomas com que este deve ser comparado.

Lã e pelles (1885)

[Ver tabela na imagem]

(a) Impossivel fazer a destrinça das mercadorias inscriptas na estatistica segundo a antiga pauta, tendo no actual projecto sido os productos, abrangidos por alguns numeros d'aquella, repartidos por dois d'esta. Identicamente estão comprehendidos no n.º 31 alguns tecidos pertencentes aos n.ºs 36 e 37. O resultado geral não é alterado, mas o valor inscripto no n.° 31 é superior ao real.

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1877

Classe 2.º

[Ver tabela na imagem]

Seda. - Esta industria, que por algum tempo deu esperanças de entre nós poder adquirir largo desenvolvimento, é hoje de todas as industrias de tecelagem a menos prospera. Se em tempo exportámos desde o bicho até aos artefactos mais ricos, hoje importâmos quasi tudo. O impulso que lhe deu o marquez de Pombal não a deixou ir longe; as tentativas que depois d'isso se fizeram, se não morressem aos pés do tratado com a França, teriam de succumbir mais tarde perante o limitado consumo de um pequeno mercado, e a enorme concorrencia que ahi mesmo lhe fariam, não só os productos similares de fabricas estrangeiras estabelecidas com largo desenvolvimento e podendo variar-lhe profusamente a natureza, mas tambem o concurso de mil outros tecidos que, com o incombativel auxilio da moda, vão substituindo hoje a seda.
Em 1881 existiam 24 installações para o trabalho da seda em quatro dos nossos districtos: Guarda, 1; Lisboa, 3; Porto, 19; Vizeu, 1; com um capital inicial de réis 1.201:000$000, um capital fixo de 194:000$000 réis e um capital circulante de 62:000$000 réis. O valor das materias primas empregadas montava a perto do 94:000$000 réis, o custo da mão de obra era de mais de 64:000$000 réis, a importancia diaria do salário sendo de 242$000 réis e empregando um pessoal de 854 pessoas, a saber: homens, 316, mulheres, 429, menores, 91; um material de 4 motores a vapor da força de 30 cavallos, 338 teares e 600 fusos. O valor da producção elevava-se acima de réis 231:000$000, fabricando: damascos, sarjas, nobrezas, lenços, gorgorões, tafetás, popelinas, fitas, fio simples e torcido. D'isto, muito tem desapparecido.
Ao passo que as outras industrias textis se desenvolveram d'aquella data para cá, esta tem descido e quasi se acha hoje reduzida a só fabricar sarjas para chapéus de sol e de chuva. Exportâmos ainda algum casulo de bicho, creado principalmente nas provincias do norte, e alguns tecidos para o Brazil e possessões africanas.

A nossa importação e exportação são as seguintes:

Seda (1885)

[Ver tabela na imagem]

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1878 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Salva a suppressão do artigo referente ás telas de malha, esta classe mantem se no projecto como a da proposta.
Relativamente á classe 5.ª da antiga pauta, inscreve-se aqui a mais um artigo da tabella B (n.° 61, 3.°) annexa ao tratado com a França (n.° 53 do projecto, 57 da proposta), que estava n'aquella mencionada nos preliminares (artigo 8.°, 3.° periodo do § 2.º)
De resto fundem-se os n.ºs 141 e 142 no n.° 47 (51 da proposta) e os n.ºs 145 e 146 no n.° 49 (53 da proposta); não nos parece carecer isto de justificação, visto que, mais depressa seria ella necessaria para o contrario.

Classe 3.º

[Ver tabela na imagem]

Algodões. - É das nossas industrias a que mais prova contra a asserção, de que não tendo nós materias primas, nem espirito emprehendedor, devemos confiar pouco no futuro das industrias fabris como fonte da nossa riqueza publica. 1 Não temos algodão e, apesar d'isso, no fabrico dos pannos de algodão cru estamos na perfeição de tecelagem e completo do acabamento a nada invejar ao estrangeiro. Importâmos ainda bastante fio, mas as fiações portuguezas produzem o fio que se póde ver no nosso incipiente museu industrial, onde se expõe alguns especimens do n.° 50, tão iguaes em grossura e tão firmes em torrão como o melhor acabado. Carece, porém, esta industria de protecção per emquanto. Repetimol-o, para que seja remuneradora uma industria, não basta que venda tudo quanto produz.
A fiação e tecelagem do algodão, de que a tinturaria e estamparia são subsidiarias, tinha em 1881, 53 installações em que fabricavam
Fio, 8 (Braga 1, Lisboa 1, Porto 5, Santarem 1);
Fio tinto, 3 (Lisboa 1, Porto 2);
Fio e tecidos, 5 (Leiria 1, Lisboa 2, Porto 2);
Colchas e toalhas, 4 (Porto);
Cotins, 5 (2 industria em domicilio) (Braga 1, Porto 2);
Tecidos diversos, 15 (Lisboa 3, Porto 12);
Tecidos de malha e ponto de meia, 4 (Lisboa 1, Porto 3);
Fitas e franjas, 3 (Porto);
Passamanaria, 3 (Porto);
Rendas, 2 (industria em domicilio) (Leiria 1, Porto 1);
Cordão e atacadores, 1 (Lisboa);
Elastico para sapatos, 1 (Porto);
Fio, tecidos e tinturaria, 1 (Porto), tecidos e tinturaria, 1 (Lisboa); como a da lã, tem-se esta industria depois d'isto desenvolvido consideravelmente, já montando-se novas fabricas, já melhorando as installações e material das existentes.
Da estamparia e tinturaria mencionam-se no inquerito industrial 17 installações, das quaes, 13 no districto de Lisboa e 4 no do Porto.
Orça para mais de 3.000:000$000 réis o valor da producção das fabricas, em que no nosso paiz se fabrica o algodão.

1 Com pouca confiança no resultado poderiamos destrinçar dos mappas do inquerito industrial, onde vem confundidoscom as do linho e com a estamparia, os elementos tanto do regimen economico, como do regimen de trabalho das industrias que empregam como materia prima o algodão. Pelos dados que em seguida apresentâmos póde ainda assim fazer-se uma idéa do que pertence a cada uma das que n'elles se englobam, comparando com esses dados o numero das installações e o valor dos productos.
De fiação e tecelagem de linho e algodão de estamparia e tinturaria menciona, no continente, o inquerito de 1881, 95 installações, repartidas pela seguinte forma: Braga, 3; Faro, 1; Leiria, 2; Lisboa, 22; Porto, 58; Santarem, 3; Villa Real, 4; Vizeu, 2.
Sobe o capital fixo d'estas industrias a 1.900:000$000 réis e o circulante a 800:000$000 réis, com um capital inicial de perto de 4.000:000$000 réis.
O custo das materias primas póde computar-se em superior a réis 1.200:000$000, o da mão de obra é despezas geraes em cerca de réia 500:000$000.
Recenseia o mesmo inquerito uma população operaria n'estas industrias, de 1:810 homens, 5:375 mulheres, 1:991 menores e 30:421 sem distincção, ao todo perto de 40:000 pessoas, com um total de salario diario de 1:500$000 réis, pouco mais ou menos.
O material compõe-se de 61 motores a vapor da força de 2:543 cavallos, de 9 motores hydraulicos da força de 573 cavallos e mais 283 cardas, 95:381 fusos, 1:720 teares mechanicos e 11:996 manuaes, 160 engenhos de amassar linho, 33 machinas de estampar, 18 hydro-extractores, 19 engenhos de lavar, 11 moinhos de anil, 4 machinas de branquear, 56 tanques e mais 5:306 apparelhos diversos.
O valor da producção é de 5.000:000$000 réis para mais.

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1879

Algodão (1885)

[Ver tabela na imagem]

a) Comprehendem-se aqui tambem os tecidos do n.° 639 e n.° 97 do projecto actual por se acharem reunidos na estatistica.
b) A parte dos n.ºs 168 e 169 comprehendidos n'este numero do projecto esta englobada no n.° 72.

As differenças entre esta classe do projecto e a da proposta são de pouco valor: modificações no dizer dos artigos; ou fusão de artigos. N'um, porém, houve elevação de direito.
Os tecidos tapados lisos não especificados crus (n.° 75) taxa-os a proposta com o direito de 150 réis. Este direito corresponde a um direito de 123,92 réis inferior de réis 1,08 ao que tinham na antiga pauta, (125 réis) e inferior de réis 1,11 ao direito principal correspondente ao de 140 réis que se lhes marcava na proposta de 188G. Se por pequeno tinham o antigo direito, pequeno julgam o actual os fabricantes de tecidos de algodão cru e fundamentam as suas reclamações, em que não póde uma industria em via de desenvolvimento acompanhar na barateza fabricas similares, que já de ha muito estão em plena força. Ora é certo que os preços d'estes tecidos têem baixado muito n'estes ultimos annos nos mercados estrangeiros, provam-no os seguintes numeros:

[Ver tabela na imagem]

Em 1882 importaram-se ....
Em 1885
Em 1886

Houve pois uma differença entre o preço dos algodões de 1882 para 1886 de 33 réis e de 1885 para 1886 de 19 réis para menos em kilo.
O direito da pauta antiga com os addicionaes seria:

[Ver tabela na imagem]

Em 1886 os direitos devem ter produzido

para com o valor maximo .... 478:057$589
» » » » minimo .... 473:661$875

importancia, a do maximo, que, para se manter com o direito de 160 réis que se vos propõe para este artigo bastaria que a importação fosse de 2.987:859 kilogrammas, ou inferior á do anno passado de 89:072 e quasi igual á de 1885. Para o minimo direito uma importação de 2.056:261 kilogrammas, isto é, de menos 206:123 kilogrammas do que a de 1886 e inferior á de 1885, bastaria para produzir igual rendimento.
Se se notar mais que o preço diminuiu de 19 réis por kilogramma, ao passo que o direito augmentou apenas de 151,17 ou 149,78 a 160, isto é, de réis 10,22 ou 8,33 fica ainda uma margem de 8,78 ou de 10,17 para qualquer fluctuação nos preços. O direito proposto não póde conseguintemente nem influir no custo. D'estes tecidos, nem prejudicar o thesouro. Era este o direito que propunha o conselho superior do commercio e industria no seu relatorio e que pelas rasões expostas a vossa commissão vos propõe tambem.
Os dois n.ºs 80 e 81 da proposta tendo o mesmo direito, entende a vossa commissão que melhor será reunir em um só numero as mercadorias que elles comprehendem.
O conselho superior do commercio e industria diz no seu relatorio que conviria só separar as bombasinas e englobar as belbutinas nos tecidos avelludados. São estes dois tecidos vestuario de pobres; affectar qualquer - muito embora as belbutinas tenham mais valor que as bombasinas e possam até chegar a tel-o relativamente grande - de um pesado direito como seria impor-lhe o dos tecidos avelludados e dos velludos, tecidos meramente de luxo, pareceu á vossa commissão não ser de interesse para a fazenda prejudicar os menos abastados. Suppondo ser metade da quantidade importada em 1885 de belbutinas e bombasinas, a elevação do direito de 280 a 600 réis produziria muito pouco mais de réis 3:000$000.
Um dizer d'esta classe pede o conselho superior do commercio e industria que seja modificado, é o do n.° 72 da proposta.

Página 1880

1880 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Como vereis no projecto, tambem a vossa commissão entendeu dever modifical-o, não com o fim unico de o tornar mais claro, pois n'elle evidentemente se comprehendiam todas as sarjas quer brancas quer cruas, mas de melhor explicar a accepção do proprias para estamparias, porquanto para isso são tambem proprias sarjas com preparo que lhes deixa muitas outras applicações. A fórma por que ficou redigido, parece á vossa commissão, traduz o pensamento, e permitte a applicação pratica d'elle: proteger a estamparia, mas evitar abusos.
Se em alguma das nossas fabricas se inicia o fabrico de tecidos branqueados de algodão, é a sua producçao por emquanto tal, que apenas se póde ter como mero ensaio. Não sendo, pois, prejudicial a industria alguma, e antes beneficiando a da tinturaria e estamparia, a vossa commissão entendeu dever baixar o direito sobre os tecidos de algodão branco de 190 a 185 réis.

Melhor, porém, se poderão ver no mappa correspondente todas as differenças e apreciar as alterações, não só da proposta mas tambem da classe VI da antiga pauta, na qual a multiplicidade dos artigos e as excessivas distincções eram taes que para admirar é como não davam logar a muitos erros e a mais frequentes contestações.

Classe IV

[Ver tabela na imagem]

Linho. - Já em nota, tratando de algodão, demos uns numeros, poios quaes se póde fazer idéa do desenvolvimento que esta industria tinha em 1881.
Mas se, por os não mencionar sufficientemente o inquerito do 1831, nem podêmos indicar qual o valor approximado de producção n'aquella epocha, nem por falta de dados estatisticos, qual o desenvolvimento, de então até hoje, d'esta industria, afoitamente dizemos ser importante um e não ter parado o outro.
O trabalho do linho existe, como industria domestica, disseminado por todo o nosso paiz, principalmente no norte e região media, quasi a partir do Tejo.
Os elementos estatisticos são, pois, difficeis de recolher, e incertos, o que explica a insufficiencia nos dados do inquerito e o modo vago como n'elle se falla d'esta industria.

Apenas em dois districtos havia verdadeiras officinas de tecido de linho, e em um mais, de tecidos mixtos de linho e juta 1.

1 Em Faro (Villa Real) fabricam-se toalhas de linho adamascado, empregando-se n'isso 8 homens e 8 mulheres, com a importancia total diaria do salario de 5$640 réis e no Porto (Gondomar e Penafiel), havendo só em Penafiel cousa que possa chamar-se officinas, as quaes podem produzir 3:000 a 4:000 teias, na importancia de réis 12:000$000 a 15:000$000. As fabricas de tecidos mixtos com linho são no districto de Santarem (Torres Novas). Uma, a companhia de fiação e tecidos de Torres Novas, fundada em 1845 com um capital de 200:000$000 réis, produz artefactos no valor de 100:000$000 réis, com despezas geraes de mais 27:000$000 réis e uma população operaria de 617 pessoas, sendo 87 homens, 190 mulheres e 340 menores, cujo salario total diario monta na media a 63$580 réis. O material compõe-se de 1 motor a vapor da força de 70 cavallos, de 2 hydraulicos da força de 115 e 247 apparelhos diversos.

A outra trabalha materias primas no valor de mais de 18:000$000 réis e produz artefactos no valor de 23:000$000 réis, com um pessoal de 10 homens, 40 mulheres e 126 menores, cujo salario diario importa em 15$200 réis. Como material tem 1 machina a vapor da força de 8 cavallos 51 apparelhos diversos.

Página 1881

SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1881

Encontram-se por toda a parte teares em que, por conta dos donos, se tece o linho simples ou misturado com estopa, algodão, etc., e em que os proprietarios, mais geralmente proprietarias, tecem tambem por sua conta obra para vender: são teares isolados empregando como unico pessoal a dona.
Ha quinze annos ainda a exportação para Hespanha dos nossos tecidos de linho tinha valor, hoje é apenas de algumas dezenas de mil réis, montando a pouco mais de 12:000$000 réis a exportação total que fazemos d'estas mercadorias, sendo principalmente o Brazil o as nossas colonias africanas que mais alguma cousa, mas muito pouco, nos levam.

[Ver tabela na imagem]

Temos, porém, um deficit valioso que a importação revela, e uma vez que temos já um grande nucleo não nos parece sensato desproteger esta industria. Deixemos aos capitães disponiveis e ás tendencias fabris, que ha alguns annos parecem começar a despertar-se entre nós, o olhar com attenção para o que lhes aconselhará o exame das nossas estatisticas aduaneiras 1.
Na classe 5.ª do projecto, alem da fusão de artigos da classe 7.ª da antiga pauta, houve augmento de um artigo:
Fios de juta ou quaesquer filamentos não especificados, contendo linho ou canhamo, tributados com 60 réis.
Pela lei de 22 de julho de 1885 os fios de juta e similares, embora contendo linho ou canhamo, constituiam excepção ao disposto para os outros fios mixtos no § 3.° do artigo 26.° das instrucções preliminares da pauta de 1882, sendo isto o que motivou a redacção dada ao § 3.° do artigo 10.° das instrucções preliminares da edição da pauta de 1880. Esta excepção, que tinha por fim favorecer a industria do fabrico de grossarias, tem dado origem a numerosas contestações, que mostram o uso que d'esta auctorisação se tem feito. Quem consultar os processos archivados no conselho superior das alfandegas dos recursos que ou a alfandega ou o commercio têem feito subir áquella instancia, encontrará appensos a alguns d'elles analyses de peritos, igualmente competentes, mas cujas conclusões são diversas. É que a porção de juta existente no fio é por vezes em tão pequena quantidade que, apesar de serem sensiveis os processos microchimicos, um pouco menos do attenção, um quasi nada de pressa, o acaso até, faz com que no mesmo fio um observador encontre juta, outro não.
O fio importado sob a protecção d'este beneficio, o qual não marcava limites para a mistura, poderia ir até conter a quasi totalidade de linho: ser um fio, com o maior numero das applicações dos só compostos d'esta fibra textil.
Da redacção de todas as disposições concernentes á hypothese, desume-se haver a intenção de só se conceder tal vantagem aos fios em que predominasse a juta; mas não se tem assim praticado, e seriam grandes as dificuldades para o fazer. Como, a não ser por processos morosos e complicados, extraordinariamente alem dos que devem bastar para verificações aduaneiras, determinar n'um fio qual a fibra textil que existe em maior quantidade, quando em limites proximos, ou ainda afastados, da composição em partes iguaes?
Sendo diversas as densidades das fibras liberianas que se podem combinar poderia lembrar o peso, mas basta reflectir que, devendo ser tomado o de uma determinada unidade linear, a maior ou menor torção no fio, faria variar as densidades que se tivessem tomado por base para a fixação d'aquelle peso. O peso combinado com a grossura daria mais algumas garantias, mas teria o inconveniente de juntar mais uma ás difficuldades do processo seguinte que tambem poderia ser empregado.
Para as grossarias e canhamaços proprias para saccos

1 Cultivam-se no nosso paiz quatro variedades de linho, conhecidas vulgarmente pelos nomes de linho gallego, mourisco, coimbrão e o linho de Riga, chamado nas provincias do norte linho de fóra. O gallego e o mourisco sito as especies mais generalisadas.
A primeira é principalmente cultivada nos districtos da Guarda, Bragança, Castello Branco, Braga, Aveiro, Villa Real e Coimbra.
Este linho dá uma fibra das mais finas, infelizmente os primitivos processos de curtimenta não a levam ao estado de acabamento, que lhe daria um vantajoso logar entre os melhores, e a quantidade produzida é insufficiente para as exigencias do consumo.
Damnifica-o ainda o costume de o semear conjunctamente com feijões ou milho, que lhe roubam os elementos mineraes necessarios para as formações libero-linhosas.
O linho mourisco, cuja cultura é mais commum no sul do paiz, mas absoluta e relativamente menor em Portugal, é muito mais rustico e muito mais ordinario do que o precedente: a fibra é dura e quebradiça, e dificilmente perde os elementos córantes e custa a desagregar-se-lhe o cimento pectico. Ha duas sub-variedades: abertiço e serrano ou serradiço.
A primeira é de fibra mais fina do que a segunda, a linhaça d'esta sub-variedade é o que é realmente superior.
A segunda é a mais commum, de haste mais curta e de liber menos elastico e desagregavel.
O linho coimbrão é commum na Feira, Celorico, Cabeceira e em algumas localidades mais do districto de Vianna.
Tem se como uma degeneração de linho gallego, e, com effeito, pelas suas qualidades, faz a transição d'elle para o mourisco. A estriga é mais fina que a do ultimo, mas menos branca que a do primeiro.
Finalmente, a variedade de Riga é cultivada nos arredores do Porto, e consta-nos se fizeram em tempo serios ensaios da sua cultura em Braga.
«... les cultivateurs portugais si plaignent en effect de ce que les autres semis sont etouffés par le lin de Riga. tandis qu'ils prennent très bien avec un lin de 40 centimes comme le gallego. «Celà est très logique, mais qu'ils essaient une bonne fois un systeme de culture convenable, ils auront du lin de Riga le rendement que nous obtenous en France et ils ne se plaindrons plus.» (Éludes sur le lin, par Alf. Renouard, fils.)
Nada podemos colher de positivo sobre a extensão cultivada, e não desejando dar-vos numeros de phantasia, limitâmo-nos a concluir das estatisticas que pequena deve ser.

Página 1882

1882 DIARIO DA CAMABA DOS SENHORES DEPUTADOS

e enfardamentos, bastaria fio de grossura, talvez não superior ao n.° 12, da numeração ingleza; poderia pois tomar-se ou esta, ou a escala franceza, e fixar uma grossura abaixo da qual os fios pagariam pelo regimen ordinario, e acima d'ella pelo de excepção de que actualmente gosam. Este processo, que applicado para taxar todos os fios seria racionalissimo, applicado a um só tornar-se-ía embaraçoso, e, estamos certos, daria logar a contestações tanto mais repetidas que os dois direitos são bastante afastados.
Na impossibilidade de achar um meio facil, seguro e rapido que permittisse cumprir no seu claro intento a disposição que protege os fios mixtos de juta, linho, etc., e hão podendo, por outra parte, deixar de attender ás justas queixas das fiações de linho que reclamam contra a concurrencia que taes fios lhes fazem, a vossa commissão propõe-vos para estes fios o direito de 60 réis, que, deixando ainda uma protecção para a tecelagem de grossarias de não menos certamente de 15 por cento 1, evita um pouco os maios actuaes.
É, porém, necessario que se determine positivamente que a excepção é para o fio de juta contendo linho e não para o fio de linho contendo juta. Deve, pois, applicar-se só quando for manifesta a predominancia da juta e não quando se chegue, tão pouca ella é, a ter duvidas se existe ou não depois de minuciosa analyse.

Classe V

[Ver tabela na imagem]

(a) O valor medio das estatisticas varia consideravelmente. Assim o de 1882 é 84,75 e o de 1885 só 50,96 e o de 1886 eleva se a 17,605, o que facilmente se explica pelas diversissimas qualidades e preços das mercadorias que compõem este artigo. Pareceu melhor tomar o valor médio de 1882, por ser o que representará melhor a media commercial. A media arithimetica (10,392) dos tres annos seria seguramente elevada para estes calculos.
(b) Este valor medio foi determinado pela media em numeres redondos: 1882, 9:898; 1885, 3:048; 1886, 2:641.
(c) Sendo muito variaveis os valores medios: 1882, 24,27; 1885, 86,2; 1886, 17,01, tornou-se o de 1886 por ser o intermedio e mais recente.

CLASSE VI

N'esta classe, que comprehende as madeiras e os artefactos com ella fabricados, só os tres primeiros artigos são livres do tratado com a França. Relativamente aos dois primeiros, nem reclamações de interessados, nem qualquer outra ordem de considerações indicaram á vossa commissão modificasse os direitos da proposta.
É o n.° 102.° da proposta transcripção do n.° 248.° da antiga pauta e o seguinte, fusão dos n.ºs 242.° e 244.° da mesma. O direito principal d'aquelle foi diminuido de 1,63 por cento, e o direito total ficou inferior ao da antiga pauta de 0,36 por cento; no segundo manteve-se o direito antigo. Justifica a diminuição no primeiro a applicação das madeiras n'elle comprehendidas, e a não applicação do total dos addicionaes ao segundo, uma legal, mas prejudicial applicação, para os nossos tanoeiros, do n.° 249.° do tratado com a França. Importam-se cascos, pipas e toneis completos, mas desarmados e que se montam depois cá. A differença do custo ainda dá vantagem, depois de pago este acabamento e os direitos de entrada de 25 por cento. N'estas condições elevar o direito da materia prima seria sobre um mal outro.
Estamos chegados ao n.° 113.° da proposta, o que desta classe foi assumpto de mais demorado estudo por parte da vossa commissão: não só pela natureza do direito que se lhe applicava, como pela influencia que elle poderia ter n'uma industria que está tomando incremento entre nós, e já hoje occupa um grande numero de braços e usa um material de valor importante: referimo-nos á serração de madeiras.
Primeiro que tudo, como para todos os; outros artigos assim taxados, procurou a vossa commissão ver se poderia substituir por um direito fixo, o direito ad valorem inscripto na proposta, tomando para base as distincções, ou agru-

1 A differrença dos direitos sendo de 25 réis, suppondo o preço do fio com os direitos pagos, de 160 réis, o que está em harmonia com a

media dos valores declarados, 250 = 15,626.
16

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1883

pamentos pedidos nas diversas representações. Com effeito, a percentagem ad valorem estabelece differenças de direitos conforme as differenças de preços, não ha duvida, mas, para que seja protectora, é necessario que abranja mercadorias em iguaes condições, pelo que respeita ao seu estado e custo de producção, n'uma palavra, que applicando-se uma só percentagem a mercadorias em diversos estados, os resultados d'essa percentagem se traduzam por um excesso no custo das mercadorias importadas, relativamente ás de producção nacional, senão sempre o mesmo, pelo menos sempre protector.
Ora, não aconteceria isto com o que na proposta se estabelece para as madeiras.
A differença entre o custo das madeiras importadas em vigas e vigotas e o da madeira serrada, é tão pequeno que a percentagem de 23 por cento sobre a madeira importada em qualquer estado, equivaleria a não mais se pensar em importar madeira que não fosse serrada.
A antiga pauta nos n.ºs 232 a 236 estabelecia differenças de direitos conforme a diversa espessura das tabuas 5 á sombra d'este direito empregaram-se capitães em montar fabricas de serração mechanica é braçal. Modificar repentinamente este estado de cousas sem transição nem preparo, importaria aniquilar esta industria, lesar interesses legitamente creados, concurrer para a perda de capitães, que tinham ido ali procurar emprego, confiados no regimen estabelecido. Fiel aos seus principios não poderia a vossa commissão deixar devir propor vos alteração n'este artigo.
Tomando para base os preços apontados na representação da companhia aurificia, vê se que, custando, posto no Douro, 4 metros cubicos de madeira não serrada 45$000 réis, e a serração d'elles importando em 6$000 réis, o custo do metro cubico de madeira serrada fica em 10$465 = 11$860 réis. A mesma porção de madeira vinda serrada da America custa, posta tambem no Douro, 10$990 réis. Ha, pois, uma differença em prejuizo da industria nacional de 870 réis por metro cubico.
O direito proposto pelo conselho superior do commercio e industria, de 2$250 réis por metro cubico para as tábuas, elevaria o custo das que se importassem a 13$240 réis; mas, como a materia prima, a madeira não serrada, teria de pagar o direito de 1$600 réis, segundo o parecer d'aquelle conselho, a protecção seria diminutissima. Os direitos que vos propomos de 1$060 réis por metro cubico para as vigas e vigotas, e de 2$300 réis para a madeira ordinaria serrada em tabuas ou em folhas, direitos que representam 10 e 22 por cento pouco mais ou menos do valor, deixam uma margem de 1$775 réis para fabrico e protecção, e se aquelle for de 1$395 reis, esta será de 380 réis ou 3,29 por cento.

É principalmente da Allemanha e dos Estados Unidos, do Brazil e da Suecia, mais d'este ultimo paiz, que importâmos madeira. Assim em 1885 recebemos da

[Ver tabela na imagem]

Classe VI

[Ver tabela na imagem]

CLASSE VII

Devendo ser composta de productos variados, de industrias diversas, quer fabris quer extractivas, mas que empregam, exploram ou produzem exclusivamente substancias mineraes, foram por isso passados para esta classe do projecto os n.ºs 230, 234, 236, 238 a 242, 244, 245, 250, 252, 253. O n.° 245, posto que muito generico, tem mais logar aqui do que onde se acha na proposta. Sendo a transcripção n'ella do artigo 522.° da classe XVII da antiga pauta, a qual tem por titulo Productos chimicos, mas que, pela leitura dos artigos que a compõem, se vê bem referir-se unicamente aos productos chimicos mineraes, ficaria com muito maior extensão do que claramente houve intuito dar-lhe, permanecendo sobre a rubrica de Diversas substancias e productos.
Em rigor, considerando tal dizer isoladamente, seria tudo; comparando-o com outros dizeres da pauta, não se poderia saber o que era.
Os n.ºs 237 e 243, que tambem, se ficassem tributados, deveriam passar para esta classe, entendeu a vossa commissão que por serem materias primas de muitas industrias importantes, como se pondera em varias representações, era justo ficassem livres como até agora o têem sido.
Composta assim esta classe, ainda na proposta se fizeram algumas modificações, que passâmos a justificar.
Fundiram-se n'um os dois primeiros artigos e acrescentou-se um numero novo Cimentas e pozzolanas com o direito de 1 real. O augmento nos pimentos e no novo artigo, que eram livres - e o deveriam ser emquanto entre nós se não produziam,- motivam-no a protecção devida a uma industria que, posto que nascente, já os seus productos podem em qualidade competir com os estrangeiros, (Doc. n.ºs 5 e seg.); não podem, porém, em preço.
Tendo a livre concurrencia de productos similares de industrias estrangeiras, robustecidas por uma larga existencia e desenvolvimento, via-se obrigada a vender por pre-

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ços, os quaes lhe não permittiam lucros com que podesse alargar a exploração. De só produzir pouco e caro uma vida precaria e uma morta certa, com a perda de capitães relativamente importantes, e o descredito completo de um ramo de industria, a industria extractiva, que, se por loucas ambições tem concurrido para a ruina de muita gente, tem tambem enriquecido os paizes que não sonham só com minas de prata e oiro, mas se contentam em aproveitar, para os transformar n'estes metaes, muitos outros productos exploraveis do solo.
Do direito que se vos propõe para os cimentos, cal hydraulica e pozzolanas prejuizo nenhum virá para o thesouro pela diminuição na entrada, visto que eram livres até aqui; e o acrescimo do seu custo será um bem justo sacrificio actual, para prepararmos um futuro, no qual não tenhamos que pedir aos estrangeiros o que temos em casa.
Contra a separação do cimento e cal hydraulica podia ainda objectar-se a difficuldade da distincção: o tempo de preza, facil de verificar, evitará embaraços.
A modificação na redacção do n.º 122 tem por fim obstar a duvidas, as quaes mais de uma vez têm sido assumpto de contestações: - se um liquido apresentado a dês pacho é ou não petroleo, ou se são residuos de petroleo substancias que se pretendem importar para o consumo.
O dizer oleos mineraes evita a primeira dificuldade; e se acceitardes se devem considerar como para illuminação, e portanto comprehenderem-se n'este artigo, os oleos mineraes ou os seus residuos que distillarem entre 150° e 280° muito facil será, com esta convencional definição, ficar determinado o que o artigo de que nos occupâmos abrange.

Carvão. - Extractando dos mappas do resumo do inquerito industrial a força em cavallos vapor das machinas empregadas então nas industrias encontrâmos:

[Ver tabela na imagem]

(a) Estes calculos foram feitos na hvpothese do ser de 450 réis por tonelada o direito do carvão: são pois ainda menores do 1,25 por cento do que estes os encargos, como adiante se vê.
(b) Esta percentagem é relativa ao custo da mão de obra e das despezas geraes.

Supponhamos pura cada machina o consumo, nada pequeno, de 25 hectogrammas por hora e por cavallo. As 329 machinas consumirão 7:107c X 2k,5 = 17:767k,5 ou 177:675 kilos em dez horas de trabalho. Todo este carvão pagando o direito de 400 réis por tonelada dará um acrescimo de despeza diaria para a industria de 68$670 réis, e annual de 25:183$550 réis. Admittindo, porém, que de 1881 para cá, o numero em quantidade de cavallos vapor tenha duplicado, e dando mais metade d'este numero para os motores não comprehendidos no inquerito de 1881, isto é, acrescentando ao numero de cavallos vapores acima mencionados 150 por cento, teremos que todo o carvão consumido no paiz pelas industrias fabris, durante dez horas de trabalho por dia, onerado com o direito proposto, representa por anno um encargo para todas de 62:661$275 réis. É isto poucas centesimas mais do que 1 por cento da mão de obra e despezas geraes declaradas em 1881, mão de obra e despezas geraes que, na hypothese que fizemos, se elevariam a mais do dobro, reduzindo aquella percentagem a 0,5, ou menos. Não é, pois, gravoso para a industria o direito proposto, e evitam-se as complicações fiscaes a que daria logar, para se tornar possivel e sem fraudes o que se indicava na proposta do governo. Seria difficil, sem grandes vexames, o indagar, depois do carvão ter entrado, qual o destino que se lhe dava. É sempre mau tentar á fraude; é preferivel evitai-a a ter de a remediar.
O dizer combustiveis fosseis, o qual da antiga pauta passou para a proposta, é pouco claro e, se se consultar o indice remissivo e explicativo da mesma pauta, é então, alem d'isto, incorrectissimo. Com effeito, por este indice, comprehendem-se em tal artigo, o alcatrão mineral «coaltar», o ambar amarello e o negro (azeviche) em bruto, a anilina, o asphalto, os betumes naturaes ou artificiaes sólidos ou liquidos, a naphta, os oleos de combustiveis fosseis não especificados que não possam servir na illuminação, o oleo de alambre e o de succino, a parafina em bruto e a turfa. Como se vê, reuniram-se uma serie de cousas muito diversas, que só têem o caracter commum de fossilisadas ou mineralisadas, ou de derivadas de substancias n'este estado. Para que o artigo conserve ainda signaes do que substitue, e possa ser reconhecido, conservou-se-lhe o pensamento da antiga redacção, mas deu-se-lhe outra, se não correcta, pelo menos mais comprehensivel.
Finalmente, ainda no n.° 126 da proposta fez a vossa commissão modificações no dizer e na taxa.
Com acrescentar ao que lá está escripto as palavras - de qualquer côr, pretendeu-se evitar continuasse uma injustiça, que não é facil achar porque acanhada, mas consuetudinaria interpretação se tinha introduzido, e estava officialmente consagrada, na intelligencia do n.° 478 da antiga pauta, do qual, o de que fallâmos, é copia. Consideravam-se, e assim o diz o indice remissivo e explicativo da pauta

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(pag. 103, palavra vasilhas), só como sendo vasilhas de vidro ordinario as de côr preta, verde, amarella ou azul. Não nos demoraremos a contestar similhante restricção, que levava a chamar a todo o vidro incolor ou de cambiante diversa das mencionadas, vidro fino ou crystal. Comprehendemos que houvesse o intuito de evitar concurrencia á industria indigena e favorecer ao mesmo tempo os que negoceiam em liquidos engarrafaveis; tanto porém, carecem estes de vasilhas amarellas ou azues, como das de vidro incolor ou levemente corado.
Convinha em todo o caso evitar que, pelo arbitrario da passagem do vidro ordinario para o que o não é - passagem que a côr não traça - fosse prejudicado o fisco, mais do que o será pela maior comprehensão dada ao artigo. Por isto, e porque ides ver que bem merece ser amparada a nossa industria do fabrico do vidro, do que resultará vantagem para muitas outras industrias de que ella é subsidiaria, a vossa commissão julgou dever adoptar o parecer do conselho superior do commercio e industria e elevar o direito que na proposta se impunha ao n.° 126.
Com effeito em 1881 trabalhava-se em vidro nos districtos de Aveiro, Coimbra, Leiria, Lisboa e Porto, elevando-se o valor da producção a mais de 170:000$000 réis, com umas despezas de custeio de 95:000$000 réis e um consumo de materias primas superior a 35:000$000 réis. O pessoal operario era de mil e tantas pessoas: 730 homens, 90 mulheres e mais de 80 menores.
Ninguem deixa de conhecer, pelo menos de nome, a fabrica da Marinha Grande, a qual data de 1756, e que hoje produz em garrafas, vidraças, vidros para espelhos e crystaes mais de 102:000$000 réis annualmente, empregando n'isto 700 operarios. Mais recente do que esta, uma outra fabrica, a do Cabo Mondego em Buarcos (1870), vae tomando grande desenvolvimento, e melhor teria caminhado se no seu ramo especial, fabrico de garrafas e frasearia, não estivesse opprimida pelo restricto mercado que lhe deixa a invasão de artefactos analogos estrangeiros.
Dada, como acabámos de fazer, ainda que muito summariamente, a idéa do modo por que ficou composta esta classe, apreciareis o que se vos propõe pelo mappa comparativo que segue.

Classe VII

[Ver mapa na imagem]

(a) Este direito comprehende as taras.

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CLASSE VIII

São de pequenissima importancia as differenças entre a proposta e o projecto, por isso nos limitâmos a respeito d'esta classe a apresentar-vos simplesmente o parallelo dos seus artigos e respectivos direitos com os dos diplomas com que temos comparado os das outras classes.

Classe VIII

[Ver tabela na imagem]

CLASSE IX

Reune esta classe todas as substancias cujas propriedades nutrientes lhes dão como principal emprego o servirem para a alimentação. É complexa, e constituida por diversissimas mercadorias, as quaes, se distanciadas pela sua natureza e procedencias, se approximam intimamente pela sua funcção economica.
Na antiga pauta, e bem erradamente, não existia esta classe, de modo que a questão vital de todas as sociedades, - o regimen das subsistencias, para se poder estudar, seria necessario respigar por quasi toda a pauta os artigod que lhe diziam respeito, e os quaes, por vezes reunidos ou deslocados, eram difficeis de encontrar o impossivel de saber para muitos o que lhes dizia respeito.
Examinaremos em especial alguns numeros d'esta classe; antes d'isso, porém, mencionaremos uma alterado que se refere a muitos d'elles. Queremos fallar dos artigos que estavam sujeitos ao convenio com a Hespanha. Como para os gados, modificaram-se tambem as taxas d'estes artigos; simples arredondamentos que mais não comportariam as mercadorias que n'elles se inscrevem. São ellas as comprehendidas sob os n.ºs 186, 187, 188. O n.° 182 da proposta de muito restricta importação, não vale a pena conservar-se por causa d'elle um artigo. Passará, pois, para o n.° 3 da tabella B, se assim o entenderdes.
Cereais em grão, e farinhas de cereaes. - A questão dos cereaes preoccupa de ha muito todos os governos.
Ligada, por um lado, á alimentação de todas as classes, por outro, á industria que, no conjuncto dos seus diversos ramos, representa a maior riqueza nacional e o maior emprego de braços, apresenta-se sob fórma tão complicada, que á primeira vista parece até vir derogar leis economizas, tidas por incontraditaveis.
Decresce o preço dos cereaes e mantem-se sem modificações o custo do pão; sobe o valor do trigo e, affirma-se, os

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salarios não augmentam. E não se póde dizer seja motivo do ultimo facto o primeiro, porque - e mais ou menos tem-se commettido quasi sempre este erro - não se deve ver só o que se passa nos grandes centros, quando se pretende examinar esta questão com o cuidado que ella merece.
É certo que a panificação como industria domestica tende a desapparecer, mas ainda nas populações mais pobres, n'aquellas justamente em que mais se sentem as minimas evoluções nos preços dos generos de primeira necessidade, o fabrico do pão é um mister caseiro. As causas a que se attribue a não subida do preço do pão nos grandes centros, não existem, ou não podem ter iguaes effeitos, nas nossas povoações ruraes.
Diz-se serem os intermediarios, isto é, as industrias que desde a saída do grão do celleiro o trabalham até o transformar em pão, que mantêem o preço d'este e retêem os lucros. São tão conhecidos os calculos feitos, tão repetidas vezes se têem apresentado, que quasi não ousâmos repetil-os aqui; seria facil ir copial-os dos numerosos escriptos, mais ou menos apaixonados, que a tal respeito se têem publicado. Não o julgâmos necessario. O que pretendemos deixar estabelecido é que, onde cada um faz o pão em sua casa, a influencia d'esses intermediarios é necessariamente mais limitada, é o custo do pão tenderá a seguir as evoluções do preço do trigo.
Ora os braços hoje empregados em culturas mais remuneradoras do que a cerealifera, e que por isso podem pagar maiores salarios, sé não encontrarem ámanhã tal emprego, será então grandemente sensivel para as classes trabalhadoras qualquer augmento, ainda que minimo, no preço dos cereaes. Ou deixarão de abastecer-se sufficientemente, do que se resentirá o trabalho produzido, ou pedirão maior jornal, tanto isto como aquillo encarecerá o custo da producção. E não servem citações do passado, correspondencias entre salarios e preços de trigo em tempos que lá vão. É por annos e não por meios seculos, nem por lustres, que hoje crescem as essencias e se criam novas necessidaded, em toda a parte e em todas as classes. O viver dos trabalhadores, ainda os mais sobrios, differe de dia para dia insensivel, mas nem por isso menos realmente. Se se póde prever que o trabalhador actualmente, ainda que cada pão lhe custe mais 5 réis, não pedirá maior jornal, é porque encontra em parte do anno n'outras culturas que não a cerealifera, um ganho, que lhe compensa o que para serviço d'esta se lhe não póde pagar. Mas cresça o mal nos vinhedos, parem algumas plantações, que crises de superabundancia nos paizes estrangeiros ameaçam já, e então a lei economica virá dizer que era apparentemente contradictada pelos factos, por só sã encarar o phenomeno por uma das suas phases.
Não é necessario esforço algum para nos habituarmos a ganhar mais, é raro quem se resigne a ganhar menos.
Apontados os termos do problema para os pequenos centros, vamos estudal-os para os grandes, e n'estes principalmente para o trigo.
É certo que do cereal ao pão recebido pelo consumidor medeia: o moleiro, o commissario de farinhas, o padeiro, o moço.
Ganham muito as fabricas de moagens? Sé formos calcular qual é a protecção que a pauta lhes tem dado, não teremos realmente a surprehender-nos senão pelo pouco. Ainda que com verdade não liguemos a isto grande valor - por outras serem as rasões em que baseâmos e que vae no projecto - daremos já esse calculo; se o não dessemos aqui teriamos de dal-o mais adiante.
O valor medio do kilo de trigo em 1885 foi dw 30 réis por kilo. Estatistica de 1885, pag. 107, n.° 254 e conforme o direito de 10 réis; que lhe impunha a antiga pauta pagava 10+0,93+0,65+0,30 = 11,88 réis, o que dá para 100 kilos o direito de 1$188 réis, ou 33 por cento ad valorem.
O valor do kilo de farinha, segundo, a mesma estatistica (pag. 107. n.° 257) é 60 réis o que eleva o direito principal de 16 réis da antiga pauta a 16+1,59+1,05+0,48 = 19,12 réis. Os 75 kilos de farinha que produzem os 100 kilos de trigo pagariam portanto o direito de 10434 réis e teriam o valor de 4$500 réis. A differença entre os direitos é de 1434-1188=240. A protecção para as fabricas de moagem é pois de 5,25 por cento do valor da materia prima. Estamos porém convencidos que ganham e ganham muito estas fabricas, nem se não ganhassem poderiam dar as percentagens que dão aos commissarios, os quaes de certo tambem ganham, ainda que o lucro d'estes fique dentro da percentagem dada pelos farinadores.
Chegâmos finalmente ao padeiro.
É n'estes que para nós está tambem grandissima parte do mal.
Ninguem ignora o como esta industria se tem multiplicado, e o excessivo numero de pequenas padarias que hoje existe em todas as nossas cidades um pouco populosas.
Se a coucurrencia é um agente de barateza, a possivel co-existencia de muitas pequenissimas officinas de uma mesma industria, por insignificante differença de intensidade fabril entre ellas, é uma causa natural e certa de carestia dos productos dessas industrias. Muitos poucos fazem muitos, e é isto justamente que permitte produzir barato. Mas para isso é necessario que haja os muitos poucos.-Que muitos poucos poderá accummular diariamente qualquer dos nossos padeiros de Lisboa ou do Porto, para poder salvar das despezas geraes do seu pequeno commercio, pelo pão que vende, o pão de cada dia pára si e para os seus? Não é pois com muitos poucos que elle, que ainda tem que dividir os lucros com o moço, póde viver; carece de poucos muitos. Aqui está porque uma baixa no trigo não embaratecerá o pão, mas qualquer alta ha de fazer-se sentir. Ora não é a pauta que póde remediar este estado de cousas.
É inquestionavel que o preço actual dos cereaes não é remunerador, e que a cultura cerealifera atravessa uma crise a qual, sendo geral, e no nosso paiz, por causas mui diversas e algumas irremediaveis, muito intensa e necessitando remedio immediato.
Estará esse remedio na pauta aduaneira? Afoutamente respondemos que não está, nem só, nem principalmente na pauta.
Para que pedem os agricultores augmento nos direitos? Fará venderem mais caro; mas se tiverem a quem.
O agricultor soffre não só por a escacez e a carestia da producção cerealifera, sofrre tambem e principalmente pela falta de venda dos seus trigos, e não motiva está falta de venda unicamente a barateza do trigo estrangeiro. O consumo rejeita a farinha dos trigos rijos, tal como só a sabem e a podem produzir as fabricas, com a sua actual montagem. Os farinadores não compram portanto taes trigos, ou só compram, e em pequenissima quantidade, alguma sub-variedade menos arrijada para lotarem com os trigos malles. Além da concurrencia pelo preço ha, mais que não preferencia, ha inacceitação pela qualidade. Tambem a pauta não póde dictar leis ás exigencias do consumo, nem modificar os habitos, nem os gostos.
Poderá impôr-se aos farinadores o mudarem os seus apparelhos e aprenderem a moer capazmente os nossos trigos? Só a necessidade e a lucta a tal os póde obrigar;
mas não a necessidade provocada pela facil entrada das farinha estrangeiras, nem a lucta com fabricas de moagens estabelecidas lá fóra: - a concuriencia e a lucta internas. A diminuição do direito das farinhas seria improficua para o fim, e desastrosa para a agricultura. Era substituir o moleiro ao negociante de farinhas, negociante que, se hoje não existe em mais larga escala, é porque o retêem as fabricas de moagem. Seria aniquilar estas sem vantagem para ninguem, quando o que se deve é impôr-lhes modifiquem os suas processos; porque desenganem-se os que pensam o contrario, ellas não podem fazer

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com os seus actuaes engenhos farinha dos nossos trigos rijos, que o publico acceite.
Pede-se porém de prompto um remedio e nenhum dos que se podem dar definitivos é susceptivel da rapida execução e dos immediatos effeitos de que se carece, por isso a vossa commissão modificou, de accordo com o governo, a proposta, augmentando o direito do trigo de réis 1,5 e correspondentemente o das farinhas; parecendo-lhe porém indispensavel que auctoriseis o governo a baixar o direito d'esta ou d'aquelle, logo que se dê subida no preço do pão.
Não se vos propõe augmento para os outros cercaes, porque o direito para elles estabelecido é ao mesmo tempo um direito protector e regulador do preço. Temos bastante milho para o nosso consumo; do que carecemos é de evitar, occasionem a baixa do valor d'elle, fortes importações estrangeiras. Fixa-se um direito que estabelece um preço remunerador, e se careceremos sempre de ir buscar milho para distillar, para a alimentação em raros annos haverá grande deficit; quando o houver vencerá a importação estrangeira o direito e virá evitar a carestia d'este cereal dos pobres.
Não confiâmos nas estatisticas de producção que entre nós existem; as considerações expostas e, mais do que tudo, a historia da nossa importação de cereaes, a qual conta a lista que abaixo vos damos, são os elementos que guiaram a vossa commissão no seu estudo.

[Ver tabela na imagem]

(a) Estes preços são os do Terreiro do Trigo, em meiados de agosto de cada um dos annos.

Assucar. - A maioria das nações, que têem largamente estabelecida a industria da refinação do assucar, adoptam, para base da classificação pautai d'este artigo, o grau sacharino, avaliando por elle qual o rendimento de cada sorte commercial de assucar, em assucar crystalisavel, e taxando-a conforme esse rendimento. Mais preciso do que o systema da formação de typos pela maior ou menor alvura, tem o inconveniente de exigir uma analyse que está muito longe, posto não seja complicada, dos processos summarios de uma simples verificação aduaneira. Justifica-se isto, em todo o caso, onde a refinação carece de ser protegida. Prefere-se tal systema ao dos typos, alem da exactidão com que dá o rendimento da refinação, por ser difficil a apreciação da cor do assucar, quando as amostras divergem pouco, para mais ou para menos, da côr do typo com que se comparam. Esta difficuldade, que é real, ainda não fez com que a Belgica abandonasse os typos, sendo certo que um numero d'elles como aquelle paiz tem, póde sem duvida dar logar a fraudes. Entre nós seria um não acabar de contestações. A Italia, mantendo o systema dos typos, tem, porém, só um, o que simplifica e evita muitos dos inconvenientes de tal systema, quasi todos, sendo - e na Italia assim é - o typo escolhido, um typo extremo.
Entre nós não ha industria de refinação propriamente dita. Prepara-se um assucar amorpho, apenas clarificado, assucar que muitissima gente prefere a qualquer outro. O sabor amelaçado agrada a muitos paladares, e chega-se a affirmar com uma sincera convicção, filha da preferencia, que adoça mais que o assucar pilé, ou qualquer outra fórma de assucar crystalisado.
A protecção dada a esta industria não a justificaria muito, nem o seu grande desenvolvimento, nem o seu futuro economico, mas é tambem certo que nada aconselha que um genero que póde, pelas suas sortes commerciaes, dividir-se em dois grupos: - de utilidade, e de luxo, fique pagando um só direito, o qual, ou seria muito elevado, com prejuizo das classes menos abastadas, ou, para proteger estas, prejudicar-se-ía o thesouro.
Admittidos os dois grupos, não havia rasão para negar o beneficio a uma industria nacional, cuja conservação o consumo sustenta, inutil, porém, dar lhe protecção especial, protecção que realmente o não era. Mantendo-se o que estava na proposta, os assucares crystalisados estrangeiros, auxiliados pelo seu menor preço, venceriam depressa a preferencia que o habito dá aos amorphos: querendo por um direito exageradamente elevado evitar fossem estes pre-

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judicados pelos similares brazileiros, não o seriam por elles, mas por os assacares refinados indigenas da Europa.
A vossa commissão accordou com o governo, em vista de taes rasões, a que ficassem os assucares classificados em dois typos: assucares superiores ao typo 20 da escala hollandeza, e assucares da mesma côr ou de côr mais escura do que a d'este typo, comprehendendo-se na primeira os assucares areados pelo systema portuguez.
Na antiga pauta eram os assucares divididos tambem em duas classes: assucares refinados e não refinados (n.ºs 280 e 281).
Esta designação por vaga dava logar a duvidas que de facto só a sacharimetria poderia resolver. Tinha a condemnal-a o ser ou de uma applicação relativamente difficil sem nada o exigir, ou arbitraria.
De côr mais clara do que o typo 20, só se encontram no commercio alguns assucares brutos, clarificados, do Brazil e da Martinica, e os assucares em que a cocção dos xaropes é feita a muito baixa pressão. Que a depuração parcial do assucar seja feita conjunctamente com as operações de fabrico d'elle ou depois, o resultado é o mesmo, estes assucares a que nos referimos são assucares que os melhores podem figurar ao lado dos mais alvos e de melhor aspecto.
Em todo o caso, confusões é que as não póde haver com adopção de um typo extremo, do qual sensivelmente se afastam todas as cambiantes mais claras.
Da lucta de interesses oppostos nasceram duas representações, uma de refinadores, outra de negociantes do assucar. Pede-se na primeira protecção para os assucares areados de preparação nacional, insta-se na outra para que se applique um só direito a todos os assucares. A associação commercial do Porto, comprehendendo a vantagem de conciliar quanto possivel aquelles dois interesses, limitou-se a remetter as duas representações sem emittir opinião sobre ellas, e apenas recommendando todas as diligencias para fazer reviver o nosso commercio com o Brazil.
N'este intuito se vos propõe auctoriseis o governo a conceder um beneficio aos assucares brazileiros - beneficio calculado sobre o maior preço d'elles relativamente aos assucares de outra proveniencia - caso n'aquelle imperio sejam tambem feitas concessões que permittam para elle a vantajosa exportação de algumas das nossas mercadorias e principalmente dos vinhos 1.
A fórma por que vos propomos a classificação pautal dos assucares parece-nos pois se harmonisa com a rapidez necessaria ás verificações aduaneiras, com os interesses do thesouro, que não será prejudicado pelas opiniões que o arbitrio da antiga classificação deixava livres, e com os interesses do cousurnmidor para quem o augmento de direito não deve representar augmento no preço, vista abaixa dos assucares e a sua tão grande producção, que quasi tem creado uma crise por excesso. Com effeito de 1882 até ao anno passado, a avaliar pelas estatisticas, os assucares têem baixado de 97 a 71 réis o kilogramma ou 26 réis por kilogramma; correspondendo, para este ultimo valor medio, o direito total de no a um direito primitivo de 98,15, o augmento de 8,15 no direito é menos de um terço da differença dos preços!
Café. - A diminuição no beneficio concedido ás nossas colonias, na proposta de lei que examinâmos, provocou, da parte dos proprietarios e negociantes de café de S. Thomé e Principe e Cabo Verde, reclamações que o governo, considerando esta a mais lucrativa producção d'aquellas nossas colonias, resolveu attender. Como porém juntamente se ponderava que tal protecção seria inefficaz se se permittisse por um direito relativamente pouco elevado a entrada dos cafés brazileiros - não devendo socegar o annuncio da proxima escassa colheita - resolveu a vossa commissão, de acordo com o governo, propor-vos o elevar-se a 100 réis o direito geral do café em casca e descascado, continuando a gosar, o procedente das nossas colonias o beneficio que tem tido até hoje.
O preço medio commercial do café 1 sendo de 223 réis por kilogramma, o direito de 150 réis proposto, corresponde a um direito principal de 128,94. Ha portanto um augmento no direito primitivo de 8,94. Mas o café das colonias pagando agora 50 % do direito geral total, o qual tem englobados os addicionaes, não paga senão tambem metade dos mesmos addicionaes, o que antigamente não acontecia, porque o beneficio só affectava o direito captivo dos addicionaes; estes lançavam se por inteiro. Assim entretanto que hoje tem de pagar 75 réis cada kilogramma de café importado, pelo antigo systema pagaria, partindo do direito principal acima achado de réis 128,94 por kilogramma, 64,47+8,92+4,40+1,93 = 79,72 ou mais 4,72. Não ha pois realmente uma elevação do direito principal de 8,94 mas só de 0,26: o direito fundamental para que pelo antigo systema pagassem 70 réis por kilogramma, deveria ser réis 120,26 2.
Póde pois dizer-se que para as nossas colonias as cousas ficaram como estavam, e como o café que hoje nos vem do Brazil representa, em quantidade, quando muito 6 % do que recebemos de Africa, parece-nos que pouco se fará sentir o augmento do direito.

Importação e reexportação do café em 1885

[Ver tabela na imagem]

Alcool. - É provisorio o que vae no projecto relativamente ao alcool. As ultimas deliberações do governo alle-

1 O nosso commercio com o Brazil tem tido a seguinte marcha nos ultimos 10 annos:

[Ver tabela na imagem]

1874 ....
1875 ....
1876 ....
1877 ....
1878 ....
1879 ....
1880 ....
1881 ....
1882 ....
1885 ....

As mercadorias que importâmos do Brazil em maior valor são o algodão em rama, cuja importação tem subido todos os annos. Tendo sido em 1869 de 480:300$000 réis, tem-se elevado gradualmente, subindo em 1885 a 827:600$000 réis. Com o assucar tem-se dado o contrario: em 1870 importámos mais de 1.700:000$000 réis, mas de 1876 para cá têem ido successivamente diminuindo os valores das remessas, reduzidas em 1885 a 441:300$000 réis.
A importação de pelles seccas cresceu até 1877 para diminuir depois até hoje. Ainda assim oscula em volta de 400:000$000 réis. O azeite e o vinho represantam a nossa principal exportação. A da primeira tem diminuido desde 1877, a da segunda tem augmentado constantemente e é hoje de mais de 3.000:000$000 réis.

1 O preço medio do café tem sido nos dez ultimos annos por cada 15 kilogrammas o seguinte: 1876 = 5,235; 1877 = 5,520; 1878 = 3885; 1879 = 4,515; 1880 = 3.390; 1881 = 2.745; 1882 = 2,805; 1883 = 3,060 ; 1884 = 2:730; 1880 = 3,048. Ora entre os preços de 3$000 a 4$000 réis, que, por mais frequentes, devem ter-se como representando as oscillações commerciaes normaes do preço, a media é de 3,340 por cada 15 kilogrammas, ou 223 por kilogramma.

2 60,13+8,92+4,14+1,80 = 74,99.

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1890 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

mão, por emquanto não conhecidas em todas as suas particularidades, aconselhavam se não tomasse resolução nenhuma definitiva. De accordo com o governo a vossa commissão deixa ficar o que vinha na proposta, sem sobre isto vos dar parecer nem favoravel nem desfavoravel. Opportunamente se sujeitará á vossa apreciação e approvação o que em harmonia com as circumstancias por mais conveniente se tiver, conhecida qual possa ser a provavel influencia que o drawback annunciado na Allemanha venha a ter sobre as nossas fabricas de distillação e sobre o consumo.

Modificaram-se tambem n'esta classe os direitos do melaço, unto e banha.
Os do primeiro foram abaixados de 30 a 23 réis. São justas as considerações apresentadas por alguns importadores de melaço do Funchal (D. do Cr. n.° 111, pag. 1123), apoiadas em documento official pelo director da alfandega da mesma cidade (Doc. n.° 3). Não nos demoraremos pois a justificar o que n'estes dois documentos o está.
Propõe-se para a banha e unto, uma elevação de direito. É isto o complemento do que atraz vos expozemos com referencia á engorda do gado suino no nosso paiz? e ainda uma recommendação da hygiene.
É costume deixar-se a distincção entre os n.05 192 e 198 da proposta - Biscoito, bolacha e Doce de qualquer qualidade, ao paladar mais ou menos apurado do verificador, que julga só por este meio se n'um ou n'outro artigo devem ser classificadas as mercadorias definidas n'estes dois numeros. Era verdadeiramente caprichoso este modo de impor direitos. Lembra á vossa commissão a vantagem de se estabelecer uma regra, um limite, embora arbitrario, que separe estes dois artigos. Pagando o assucar superior 130 réis e o pão 15 réis por kilogramma, as bolachas contendo 50 por cento de assucar pagariam, proporcionalmente á massa de cereal panificado que n'ellas existe e á quantidade de assucar, por cada kilogramma 71 réis. Sendo porém objectos para consumidores remediados e devendo nós protecção a industrias nacionaes análogas, poderiamos estabelecer este limite, a que correspondendo um direito absoluto inferior a 21 por cento ao proposto para a bolacha, deixa margem de protecção e não dá prejuizo ao thesouro.
A bolacha que se importa é sempre de marcas conhecidas, e de fabricas que mantém, em cada um dos seus especimens, a mesma percentagem de assucar. Determinada esta, por uma vez para cada typo de bolachas que sé apresentasse, ficava fixado o direito que a esse typo correspondia, salvo o de vez em quando contastar-se a identidade da sua composição.
Á vossa commissão é, em vista, d'isto de parecer que se deveria definir, para os effeitos aduaneiros - Biscoito ou bolacha: massas abiscoitadas ou abolachadas não contendo mais do que 50 por cento de assucar, não o tendo exteriormente em qualquer estado, nem contendo fructas, por qualquer modo preparadas, introduzidas na massa. O que não for isto é doce, isto é, deve pagar como tal.
Pedem os fabricantes de pós de gomma, que se elevem os direitos das feculas; pede um grande numero de industrias que se baixe este direito. As considerações que vão seguir-se servir-nos-hão de base os valores declarados em 1885 para as feculas importadas do Brazil e os amidos importados da Allemanha, justamente aquelles que os fabricantes de pós de gomma especialisam na sua representação. Estes valores foram para os 509:199 kilos, que ao todo nos vieram do Brazil, 29:688$000 réis e para os 406.371 que nos mandou a Allemanha 27:305$000, deduzindo-se d'aqui valores medio por kilo, para os primeiros: 58 réis, para os segundos: 67 réis. Se estes, como quaesquer outros valores medios de que nos temos servido não são os valores commerciaes, queixe-se de si mesmo o commercio. A nós por agora, basta-nos que sejam relativamente exactos. O valor de 58 réis com o direito estabelecido na proposta e mais a mão de obra, a qual segundo affirmam os interessados importa em 40 por cento, daria como custo de producção para cada kilo de pós de gomma, fabricados no paiz 58+60+23,20 = 141,2 réis, entretanto que os amidos estrangeiros entrariam immediatamente no consumo com o preço de 67+60=127. Haveria, pois, uma differença em beneficio d'estes de 13,8, em numeros redondos 14.
A vossa commissão não querendo, por uma parte, aconselhar-vos augmento no direito sobre as feculas, por outra, considerando justos os pedidos dos industriaes para quem ellas são droga necessaria; mas pelo que acaba de expor, não lhe sendo permittido occultar-vos que rasão tem tambem os fabricantes de pós de gomma na sua reclamação, propõe-vos o direito de 60 réis para todos os amidos e feculas em pó e o de 90 réis para os amidos em pedra. Ficam assim os reclamantes, fabricantes de pós de gomma, com uma protecção de 15 réis por kilo, ou mais de 26 por cento do preço da materia prima, e mais de 22 por cento do custo em que fica importando o producto rival de fabrico estrangeiro (157-141=16.) Propor-vos outra cousa seria crear embaraços, que se vencem pelo modo por que o diz a estatistica de 1885, onde não vem consignada importação de feculas de manioca, tapioca, arrow-root, etc.

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1891

Classe IX

[Ver tabela na imagem]

a) As farinhas tinham diversos direitos na pauta de 1885 e na proposta de 1883. Pauta de 1885: farinha de trigo 16 com addicionaes 18,81, farinha de milho e centeio 11 com addicionaes 14,13, farinha de cevada e aveia 9 com addicionaes 10,57. Proposta de 1886: farinha de trigo 17, de milho e centeio 13, de cevada e avela 10, a que correspondem os direitos primitivos 15,05, 11,01 e 8,79.

CLASSE X

É esta a classe XI do projecto que só por melhor systematisação passou para este logar. Uma mais lata comprehensão dado a titulo motivou o transferirem-se para ella varios numeros das classes X e XII. O quadro adiante dá-vos conta d'isto, e estamos certos achareis de boa ordem tal agrupamento. De resto pequenas modificações nos dizeres, o acrescentamento de um artigo novo e duas mais importantes alterações em taxas com o fim de proteger a industria nacional da typographia e encadernação, são as modificações dignas de mencionar-se que o projecto faz n'esta classe da proposta.
As machinas até á força de 10 cavallos são as que mais facilmente e em melhores condições se podem fazer no nosso paiz, por isso pareceu á vossa commissão dever separal-as das outras por uma pequena differença no direito. Póde dizer-se que, sendo as empregadas pela pequena industria, é inequitativa esta differença; convém, porém, notar, que a importancia total do direito que uma machina paga é insignificantissima relativamente ao seu custo, e inferior talvez ás proprias oscillações d'este.

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1892 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Classe X

[Ver tabela na imagem]

CLASSE XI

É esta classe a classe X da proposta, tirados d'ella os artigos que por serem dw natureza mineral se encorporam na classe VII, e os que, por terem melhor collocação, sob o titulo da classe X d'este projecto, lá foram já mencionados. Veiu para aqui da clasee I - a cera, pélas rasões que quando tratámos d'esta classe vos expozemos, e - a, cortiça, que passou da classe VI para esta.
Cera. - Diz o inquerito industrial de 1871 que se trabalha a cera no nosso paiz em 21 installações, estabelecidas nos seguintes districtos: 1 em Beja, 2 em cada um dos districtos de Bragança, Evora e Lisboa, 3 em Villa Real, 3 em Vizeu e 8 no Porto.
Prepara-se n'estas instalações á cera em gamella, a cera branca e amarella, e a cera em paus, e fabricam-se veias e rolo em 12. O valor da materia prima sobe a bastante mais de 12:000$000 réis, com um despendio em mão de obra e despezas geraes superior a 3:000.0000 réis. Monta o valor dos productos fabricados a não menos de 54:000$000 réis.
N'uma representação de alguns habitantes do concelho de Poiares (D. do G. n.° 129, pag. 1249) pede-se para que a cera importada pague direito inferior ao marcado na proposta.
A cera amarella importada é branqueada em Portugal, dizem os signatarios, e exportada para Hespanha, constituindo isto uma industria que emprega bastantes capitães e braços. O acrescimo que adviria no preço da cera branca, pela elevação do direito, faria com que os hespanhoes, preferissem então vir buscar ao nosso porto a cera amarella e branquearem-na lá; a nossa industria não tem lucros de que possa tirar o augmento, proposto agora, na antiga taxa.
Os dados estatisticos sobre este artigo são relativamente a 1885 os seguintes:

[Ver tabela na imagem]

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SESSÃO 20 DE JULHO DE 1887 1893

A differença, pois, entre a importação e a exportação é em favor d'esta por uma somma superior a 30:000$000 réis; justo acha, pois, a vossa commissão, que se attenda ao pedido, principalmente estando, como está, esta industria quasi localisada no concelho de Poiares, o qual iria empobrecer o que a prejudicasse.
O direito que a cera amarella pagava pela antiga pauta era de 10 réis por kilogramma e com os addicionaes - para o valor medio acima indicado da cera de Africa - 21,47.
Com o actual addicional para portos este direito elevava-se a 26,80. Estes direitos correspondem a direitos ad valorem, o primeiro de 5,7 por cento, o segundo de 7,1 por cento. Ora uma industria que valorisa de 12 por conto a sua materia prima, não póde supportar maior direito do que 5 por cento. A vossa commissão por isso é de parecer se reduza a 22 réis o direito da cera.
Nos outros artigos d'esta classe ha apenas insignificantes mudanças de redacção, e corrigiram-se alguns direitos conforme os valores medios da estatistica de 1885.

Classe XI

[Ver tabela na imagem]

(a) Os direitos dos numeros da antiga pauta que comprehende este numero do projecto são de diversa natureza: uns fixos outros ad valorem.

CLASSE XII

Nada se alterou n'esta classe, quasi toda composta de mercadorias inscriptas na tabella B, annexa ao tratado com a França, a não ser o que já vos dissemos com referencia a passarem para a classe X do projecto alguns numeros da proposta, inscriptos nesta classe. Foram os n.ºs 279, 280, 281, 282, 283, 284, 287, 289, 290, 291, 314, 315, 316, 321, 325, 326, 330.

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1894 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Classe XII

[Ver tabela na imagem]

(a) O fio pagava 25 réis por kilogramma.

Terminando aqui o que diz respeito á pauta de importação, devemos ainda dizer-vos que na maioria de direitos em que se indica augmento são meras rectificações, provenientes de se terem tornado os valores medios de 1885 que eram superiores aos de 1882.
Em geral, na determinação dos valores medios, lançámos mão da media entre os valores de 1882 e 1885, quando os apontados na primeira d'estas estatisticas eram superiores aos da segunda, e recorremos, como em notas dos mappas comparativos vos expomos, ainda aos deduzidos da estatistica de 1886 quando os d'aquellas divergiam muito.
Relativamente aos valores da estatistica de 1885 acceitamol-os taes quaes, desde que superiores aos da estatisca de 1882. Sendo a ultima, indicam estes valores uma tendencia para alta nos preços, ou para superior qualidade nas mercadorias - quando o artigo as abrange de custos diversos - que era prudente ter em vista. Querendo substituir-se por direitos fixos, que correspondessem, pouco mais ou menos, aos antigos direitos da pauta augmentados com os addicionaes, os direitos em parte fixos, em parte ad valorem do regimen até ha pouco seguido, era da mais elementar cautela o reparar bem não ficassem elles inferiores aos antes cobrados nas alfandegas, o que aconteceria logo que se tomassem valores medios inferiores aos mais recentes ou que lhes fossem iguaes quando anteriormente os tivesse havido superiores; ficavam assim os direitos sem margem para o caso de nova subida. É por isso que o acaso nos favoreceu parecendo á primeira vista contrariar-nos. O haver publicadas duas estatísticas aduaneiras com tres annos de intervallo de uma á outra, é mais conveniente para o fim do que se as mesmas duas fossem em annos successivos. Não excessivamente distanciados os periodos a que os valores medios se referem, mas bastante para indicarem o lado para que tende a evolução dos preços, a media assim achada corregirá melhor as bruscas altas ou baixas accidentaes ou temporarias.
Fizemos excepção a estas regras sómente quando em qualquer das estatisticas a importação era representada por quantidades tão pequenas que o valor deduzido deveria ter-se por excepcional.

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1895

Pauta de exportação

Avolumam a nossa exportação principalmente o gado, e d'este o vaccum e o lanigero, as pescarias, a lã, a cortiça, algumas batatas e fructas (laranjas e figos), as cebolas, o azeite, minerios de cobre, o vinho, o sal e o calçado. São entre estas mercadorias as mais importantes a cortiça, o vinho e o gado.

[Ver tabela na imagem]

Representam, como se vê, estas tres especies de mercadorias 69 a 70 por cento do total (23:493$000 réis) da nossa exportação em 1885, e são todas ellas tributadas na exportação. Que, se as condições da fazenda publica o permittissem, todos os direitos de exportação deveriam desapparecer do nosso regimen fiscal, creio ninguem o contesta; infelizmente não o permitte o estado das nossas finanças.
Diligenciemos, porém, que taes direitos não aggravem outros males, e não possam prejudicar o trabalho nacional.
O direito de exportação sobre o gado vaccum, subsistindo, quasi inutilisaria tudo o que atrás fica estabelecido em beneficio da recreação e engorda d'este gado. Infelizmente o producto d'este imposto, na nossa exportação actual, é relativamente insignificante 1 como rendimento para o estado; é porém importantissima a sua abolição para a industria da ceva, a quem aggrava os males de que soffre.
A vossa commissão, propondo-vos a suppressão d'elle, é coherente com as idéas que deixa expendidas no estudo da classe I d'este projecto.
Outra mercadoria para que em numerosas representações se pede a modificação nos direitos é a cortiça. Cremos, porém, haver na forma do pedido alguma confusão, resultante talvez do modo por que está redigido o n.° 3.° da pauta de exportação.
Na pauta com effeito escreve-se cortiça em bruto e em pranchas, mas não crê a vossa commissão que se mencionasse aqui a cortiça em bruto por se suppôr importante a sua exportação. Cortiça em bruto, isto é, tal como são da arvore, ou meramente raspada exporta-se pouquissima.
Toda a cortiça exportada é preparada. Extrahida da arvore, enfarda se e traz-se para as fabricas. Aqui é raspada, cozida, recortada e dividida em diversas qualidades, e por ultimo enfardada para a exportação.
Acrescentasse, porém, que a saida da cortiça, mesmo em prancha, tem crescido consideravelmente; as estatisticas contestam tal asserção. Desde 1880, data do imposto de 30 réis Sobre a cortiça em pranchas, a sua exportação tem sido a seguinte:

[Ver tabela na imagem]

A media dos tres annos de minima exportação sendo em numeros redondos 18:000 e a media dos quatro de maior exportação 22:000 kilogrammas, a differença de 4:000 kilogrammas não póde ter-se, nem mesmo relativamente, como um consideravel acrescimo, para uma media de exportação, em sete annos, de 21:000 a 22:000 kilogrammas.
As nossas cortiças podem dividir-se em tres qualidades e a sua existencia relativa, expressa numericamente, é:

Qualidade fina .... 1/4
Qualidade media .... 1/2
Qualidade ordinaria .... 1/4

Fazendo o calculo pelo preço da venda d'estas tres classes, ver-se-ha que pelo actual direito de 30 réis por kilogramma a qualidade fina paga 1 por cento, a media 1/2 por cento e a ordinaria 13 por cento. Note-se que esta ultima não serve para a fabricação das rolhas e é sómente vendida no estrangeiro para a pesca.
Com o direito que se pede de 180 réis, aquellas percentagens subiram a 5, 10 1/2 e 80 por cento!
Diz-se em algumas representações que tal direito não difficultaria a exportação da cortiça. A vossa commissão, em resposta a isto, só lembra a concurrencia que nos mercados estrangeiros nos faz, já hoje a cortiça da Argelia, paiz que, está actualmente para nós, relativamente a isto, nas condições em que nós estavamos, aqui ha quarenta annos, para a Hespanha.
Prohibiu esta a saída da cortiça em prancha da Catalunha, e data d'essa epocha o desenvolvimento da nossa exportação. O vizinho reino reconheceu a necessidade de derogar essa lei; não vamos tambem nós crear cousa de que brevemente tenhamos de arrepender-nos.
Seria impossivel fabricar em rolhas toda a producção de cortiça do paiz; mas mesmo que fosse, só para a Inglaterra, unico paiz onde a entrada das rolhas é livre, as poderiamos exportar, e ahi teriamos a empenhar a lucta com os abundantissimos mercados argelinos já de ha muito senhores d'este commercio.
Em Portugal não se importa actualmente nenhuma rolha: as porções que figuram nas estatisticas aduaneiras são de rolha vinda de Hespanha para aqui ser beneficiada. A cortiça em obra, que se menciona nas mesmas estatisticas, não se refere a rolhas, e sim a cortiça em condições de applicação a diversas industrias, taes como forros de chapéus, quadros, adornos para jardim, etc.

1 Exportámos em 1886 apenas 6:361 cabeças de gado vaccum. A totalidade dos direitos de exportação cobrados deveria ser de réis.

9:511$500; mas supponhamos fossem 10 ou 12 contos de réis, valeria a pena perdel-os, porque esta é uma das taes perdas que se traduzem em lucros. Os orçamentos dos estados não devera balancear-se por artigos mas pela totalidade.

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1896 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Receiosa, pois, de ver perder por qualquer medida impeditiva os lucros de uma producção, que no nosso paiz compensa um pouco a agricultura da escacez das outras, e tendo a ameaçal-a a actual importancia dos mercados, de Hespanha, Argelia, Tunesia, França e Italia, a vossa commissão não ousa aconselhar-vos augmento de direitos de exportação na cortiça e, quando muito, limita-se, para evitar confusões, a propor-vos a divisão do artigo 3.° da pauta de exportação em dois:

Cortiça em bruto ou só raspada .... 160 réis
Cortiça preparada em pranchas .... 30 réis

O primeiro direito seria prohibitivo. Manda a verdade que se diga que a vossa commissão o tem alem d'isto por desnecessario, visto que cortiça n'aquelle estado rarissimo será exportada.

Uma antiga tabella, denominada de taras, tributava os envolucros exteriores e os primeiros envolucros interior conforme a natureza d'elles. De accordo com o governo, somos de parecer se derogue similhante pratica - com excepção para a saccaria de qualquer qualidade e em qualquer estado. - Devem, porém, considerar-se só como taras, para os effeitos fiscaes: - os envolucros de qualquer natureza que manifesta e unicamente sirvam para resguardar e acautelar as mercadorias dos damnos e accidentes do transporte. Continuâmos a insistir se excluam d'esta definição os saccos. É difficil evitar não seja um meio de importar tecidos sem pagar direitos.

Estamos certos acreditareis nos esforços que a vossa commissão fez para não vos propor cousa que offendesse interesses constituidos á sombra de anteriores regimens. Procurando conhecer quaes os interesses reaes e legitimos da industria do commercio e do thesouro, diligenciou harmonisal-os. Vós julgareis.
Pelas rasões expostas a vossa commissão é de parecer que approveis o seguinte

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° São approvadas as pautas dos direitos de importação, exportação, reexportação e baldeação, que fazem parte desta lei, completadas pelas disposições seguintes:
1.ª Fica o governo auctorisado a decretar novas instrucções preliminares da pauta, considerando-se das exaradas na edição official, approvada por decreto de 17 de setembro de 1880, unicamente como materia legislativa:
a) As disposições referentes a clausulas dos tratados de commercio e navegação;
b) As que importam alterações nas taxas dos direitos de entrada, de saída e de consumo, não modificadas por esta lei.
2.ª São abolidos os addicionaes:
a) De 2 por cento ad valorem creado por lei de 23 de abril de 1880;
b) De 6 por cento ad valorem creado por lei de 27 de abril de 1882, na parte que se refere aos direitos de importação e exportação nas alfandegas;
c) De 1/2 por cento sobra a exportação creado por lei de 18 de março de 1883;
d) De 3 por cento cobrado sobre os direitos, com o titulo de emolumentos;
e) De 2 por cento ad valorem creado pela lei de 26 de junho de 1883, para as obras dos portos de Leixões e Lisboa;
f) A taxa especial de 2 por cento ad valorem sobre a exportação do vinho, creada por lei de 17 de maio de 1878 e regulamento de 19 de dezembro do mesmo anno, modificado por decreto de 17 de setembro de 1885, com referencia ao estabelecimento de um valor medio.
3.ª São supprimidos na alfandega de consumo de Lisboa os direitos sobre farinaceos, excepto fava e batatas.
4.ª É o governo auctorisado a reduzir a 100 réis a taxa dos assucares, para os que sejam de producção e proveniencia directa brazileira, se o governo de Sua Magestade o Imperador do Brazil conceder favores especiaes para os generos de producção ou manufactura portugueza n'aquelle imperio.
§ 1.° Fica o governo auctorisado a fixar, em relação a cada grupo de alfandegas, a quota por milhar, que, em relação aos rendimentos totaes das alfandegas do mesmo grupo, deve ser destinada á distribuição pelos respectivos empregados, na proporção dos seus ordenados, e ás outras despezas mencionadas n'esta lei.
a) Para a fixação d'essa quota o governo tomará por base maxima o producto de 3 por cento dos emolumentos no anno economico de 1885-1886, deduzida a parte que pertencia ao estado dos emolumentos geraes das alfandegas de Lisboa, Porto e consumo de Lisboa, bem como a dos emolumentos sobre os direitos do tabaco importado.
b) O producto d'essa quota continuará sujeito ás contribuições geraes, quer do estado, quer dos municipios ou districtos, que recáem hoje sobre os emolumentos, ao subsidio para o monte pio das alfândegas, aos encargos dos vencimentos de aposentados e ás despezas do expediente e de livros do serviço interno das alfandegas.
c) Cessa a compensação que era dada pelo thesouro e pelas alfandegas de Lisboa e Porto ao cofre dos emolumentos das alfândegas do primeiro grupo.
§ 2.° É o governo auctorisado, sem augmento de despeza, a organisar, como melhor for para o serviço, o quadro do pessoal das alfândegas, e a applicar as economias que d'isto possam resultar ao augmento da força e do material da fiscalisação.
§ 3.° O imposto para postos, cuja importancia, para os artigos inscriptos na pauta B, annexa ao tratado com a França, vae mencionada na colunma das observações da pauta de importação, que faz parte d'esta lei, continuará a ter a applicação especial que lhe dá o § 4.° do artigo 1.º da lei de 26 de junho de 1883.
§ 4.° É abolida a tabella B da edição de 1885, nada tendo a pagar de direitos de importação, nem os envolucros exteriores, nem os primeiros envolucros interiores que evidentemente sirvam para indispensavel acondicionamento das mercadorias, excepto as saccas e os saccos em qualquer estado e de quaesquer tecidos, que pagarão, tanto as interiores como as exteriores, 50 por cento ad valorem.
§ 5.° No praso maximo de seis mezes, depois de promulgada a presente lei, será publicada pelo conselho superior das alfandegas uma nova edição da pauta geral, contendo instrucções preliminares, indice remissivo e as mais disposições indispensaveis para a sua perfeita comprehensão e execução.
1.° De dois em dois annos será publicada pelo conselho superior das alfandegas uma nova edição do indice remissivo.
2.° O governo, ouvido o conselho superior das alfandegas, poderá antecipar ou adiar a publicação d'este indice.
§ 6.° Fica o governo auctorisado até ao dia 31 de janeiro de 1888 a modificar os direitos estabelecidos na pauta que faz parte d'esta lei para o trigo e farinhas, se assim lhe for exigido pelas conveniencias da alimentação publica.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1897

PAUTA

Dos direitos de importação a que se refere a lei datada de hoje

[Ver tabela na imagem]

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1898 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

[Ver tabela na imagem]

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1899

[Ver tabela na imagem]

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1900 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

[Ver tabela na imagem]

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1901

[Ver tabela na imagem]

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1902 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

[Ver tabela na imagem]

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1903

[Ver tabela na imagem]

Observação

As obras não especificadas de tecidos de pellos e feltros, e as gravatas ou mantinhas de qualquer feitio acabadas ou não, serão mencionadas em artigo especial das instrucções preliminares da pauta, sendo tributadas segundo o regimem da edição da pauta, approvada pelo decreto de 17 de setembro de 1885.

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1904 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

[Ver tabela na imagem]

Sala das sessões da commissão, 16 de julho de 1887.=- António Eduardo Villaça = José Frederico Laranjo - Marianno Presado = J. Pedro Oliveira Martins = A. Baptista de Sousa = António Cândido = Carlos Lobo d'Avila = Antonio Alves da Fonseca = António M. Pereira Carrilho -F. Mattozo Santos, relator.

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1905

PERTENCE AO N.º 186

DOCUMENTOS

N.° 1

Proposta de lei n.° 7-E

Senhores.- Foi presente á commissão de fazenda a proposta de lei n.° 7-E, reforma das pautas de importação, reexportação e baldeação e da tabella dos impostos de consumo de Lisboa, ficando abolidas as taxas complementares de 2 e de l/2 por cento, cobrados sobre o valor das mercadorias importadas e exportadas, e o imposto addicional de 6 por cento, creado por lei de 27 de abril de 1882, e tendo nós recebido a honra de haver sido nomeados para relator desta proposta/entendemos dever reunir todos os subsídios que possam esclarecer este assumpto de tanta magnitude, e poupar á commissão o trabalho que teria para colher todas as informações de que porventura podesse carecer.
É a primeira vez que em o nosso paiz se apresenta á consideração e discussão parlamentar uma reforma completa das pautas aduaneiras, tendo sido decretadas, tambem por completo, desde 1837 até o presente, unicamente duas edições d'aquelles importantissimos diplomas.
Não desconhece por certo ninguém o alto valor que representam as pautas das alfândegas. Servindo de base á cobrança dê copiosas receitas do thesouro, constituem tambem um poderoso elemento de protecção e defeza a valiosissimos interesses commerciaes e industriaes.
Por isso compendiaremos no presente relatório, antes de entrar na analyse da proposta, os dados que temos á mão, não com o fim de historiar o que ácerca de pautas se tem feito em Portugal, mas para tirar dos factos occorridos as illações naturaes e indispensáveis á apreciação justa e conscienciosa do documento, que foi submettido á consideração do parlamento.

A pauta de 10 de janeiro de 1837

Compunha-se de 25 classes, a saber:
1 .ª Aguas e bebidas;
2.ª Pescarias;
3.ª Animaes vivos;
4.ª Grassinas;
5.ª Matérias duras;
6.ª Diversos objectos;
7.ª Pelles, couros e seus artefactos;
8.ª Sedas e suas manufacturas;
9.ª Lãs, clinas, pellos e suas manufacturas;
10.ª Linho e suas manufacturas;
11.ª Algodão e suas manufacturas;
12.ª Papel e suas applicações;
l3.ª Madeiras e seus artefactos;
14.ª Productos chimicos e medicamentos compostos;
15.ª Tintas, tanninos e suas preparações;
16.ª Suecos vegetaes;
17.ª Espécies medicinaes;
18.ª Substancias próprias para a medicina, perfumaria, e composições diversas;
19.ª Géneros chamados coloniaes;
20.ª Farináceos;
21.ª Fructos, sementes, plantas e forragens;
22.ª Metaes;
23.ª Vitrificações;
24.ª Pedras, terras e outros fosseis;
25.ª Artefactos diversos.
Estas 25 classes constituíam 1:506 artigos com diversos direitos.
Organisada esta pauta em harmonia com os trabalhos apresentados em 11 de agosto de 1836, pela commissão para esse fim nomeada em 4 de julho de 1835, foi decretada por Manuel da Silva Passos.
Vigorava n'essa epocha a pauta approvada por decreto de 14 de fevereiro de 1782, já emendada, explicada e ampliada por numerosíssimos diplomas.
Moldada pela edicção da pauta que nesse tempo se encontrava em execução em França, converteu a pauta portugueza de 1837 em específicos os direitos ad valorem, affirmando já então o notável estadista, que a decretou, no relatório que precedia o que hoje vemos confirmado pela pratica de muitos annos.
«Não se podem fixar regras para calcular o valor das mercadorias» declarava elle, referindo-se á base sobre que têem de racaír os direitos impostos aos diversos géneros de commercio; e acrescentava: «O commercio necessita de um código claro e simples, que lhe prescreva quanto cada um dos artigos, que fazem objecto das suas transacções, deve pagar por entrada e saída.»
É effectivamente indubitável que a clareza e concisão das pautas, são condições indispensáveis para que taes diplomas se tornem profícuos na sua applicação pratica, sobretudo na actualidade, em que, para corresponder aos constantes progressos realisados, deve a acção do fisco acompanhar nos seus processos a celeridade com que se verificam as operações commerciaes e o notável desenvolvimento e presteza obtidos nos meios de locomoção e de transmissão.
Dependendo ainda, nas alfândegas, o expediente de verificação de mercadorias, que serve de base á contagem dos direitos, da rigorosa interpretação da pauta, se esta não for clara, methodica e de fácil applicação, prejudicado fica todo o acto de despacho, que se tornará confuso e moroso, demandando, sem que evite reclamações e queixumes, pessoal numerosíssimo.

A pauta de 11 de março de 1841

Pelo governo foi presente às camarás, em janeiro de 1841, uma proposta de lei augmentando os direitos a diversas matérias primas, taes como: seda crua, linho em rama, esparto, cairo e piassaba em rama, madeiras, aço em bruto, ferro coado e batido em barras, etc.
Do relatório do ministro da fazenda de então se deprehende ter a proposta por fim augmentar as receitas aduaneiras, e1 ser esse augmento calculado em 140:000$OOO réis.
Tendo sido approvada a proposta, com ligeiras alterações, foi o governo auctorisado, por lei de 11 de março de 1841, a mandar organisar, em harmonia com as indicações estabelecidas na mesma lei, uma nova edição da pauta.
Essa edição, mandada publicar e executar por decreto de 20 do mesmo mez e anno; dividia-se era 25 classes, a saber:

1.ª Aguas e bebidas;
2.ª Pescarias;
3.ª Animaes vivos;
4.ª Grassinas;
5.ª Matérias duras;
6.ª Diversos objectos;
7.ª Pelles, couros e seus artefactos;
8.ª Sedas e suas manufacturas;
9.ª Lãs, crinas, pellos e suas manufacturas; -
10.ª Linho, cairo, piassaba, esparto, etc.;
11.ª Algodão e suas manufacturas;
12.ª Papel e suas applicações;
13.ª Madeiras e seus artefactos;
14.ª Productos chimicos, medicamentos compostos;
15.ª Tintas, tanninos e suas preparações;
16.ª Suecos vegetaes;
17.ª Espécies medicinaes;

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1906 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

18.ª Substancias próprias para medicina, perfumarias e composições diversas;
19.ª Géneros chamados coloniaes;
20.ª Farináceos;
21.ª Fructas, sementes, plantas e forragens;
22.ª Metaes;
23.ª Vitrificações;
24.ª Pedras, terras e outros fosseis;
25.ª Artefactos diversos.
Estas 25 classes constituíam 1:597 artigos, com direitos diversos.
De 1841 a 1852 consistiu o que de mais importante se decretou ácerca de pautas, no aggravamento successivo dos direitos estabelecidos, chegando a cobrar-se, sobre os mesmos direitos, addicionaes de 5, 7 e 10 por cento, e a elevarem-se ainda mais, pela lei de 21 de novembro de 1884, os já notavelmente excessivos impostos, que pesavam sobre o linho em rama para fiação, e sobre o ferro batido em barras, varões e verguinhas.
Em 1852 foram, pelos decretos de 5 e 11 de agosto, reduzidos os direitos do chá o do gelo, fixando se normas para a importação de embarcações estrangeiras. Em 17 de agosto do mesmo anno, apresentou a commissão, nomeada em 6 de maio antecedente para rever as pautas, a primeira parte dos seus trabalhos, expondo os fundamentos das alterações, que propunha, e que visavam principalmente a alliviar os direitos das matérias primas mais indispensáveis ao exercício do trabalho nacional. Com admirável lucidez sustentava a commissão a necessidade de não fundar os interesses do thesouro em base alguma, que comprimisse a natural expansão e desenvolvimento da industria e da riqueza do paiz.
Diminuindo os direitos, que pelo seu exagero animavam o contrabando, e dispensando a protecção, que julgou rasoavel às industrias, que denunciavam elementos de vida e prosperidade em Portugal, propoz a reducção dos direitos de alguns tecidos de seda, do papel, das chapas de vidro com lume ou sem elle, das harpas e dos pianos. Esta diminuição ampliava-se, em geral, aos 76 artigos incluídos, pela tabella respectiva, em 13 das 20 classes em que se dividia a pauta.
Finalmente, em 31 de dezembro deste mesmo anno, um decreto dictatorial mandava executar a pauta das alfândegas reformada completamente; fixava as condições em que deviam cobrar-se os direitos ad valorem; determinava que os géneros das possessões portuguesas pagassem a quinta parte dos direitos estabelecidos para os estrangeiros, havendo ainda excepção por dez annos para o assucar; e acabava com os impostos addicionaes, mantendo apenas os 12 por cento para amortisação das notas do banco de Lisboa, e os 3 por cento para emolumentos.
Assim se poz em vigor

A pauta de 31 de dezembro de 1852

que se dividia em 19 classes, a saber:
1.ª Algodões;
2.ª Animaes;
3.ª Bebidas fermentadas;
4.ª Despojos de animaes;
5.ª Farináceos;
6.ª Géneros coloniaes;
7.ª Grassinas;
8.ª Lãs e pellos;
9.ª Linhos;
10.ª Louça e vidros;
11.ª Madeiras;
12.ª Metaes;
13.ª Mineraes;
14.ª Papel;
15.ª Pescarias;
16.ª Productos chimicos e medicinaes;
17.ª Sedas;
18.ª Sementes, fructas e plantas;
19.ª Vários artigos.
Estas 19 classes constituíam 840 artigos com diversos direitos.
De 1852 até 1860, apenas se encontram dispersas pela legislação algumas disposições, que não podem ser consideradas como reformas radicaes no assumpto de que nos occupamos. Factos de somenos importância se realisaram, os quaes, ainda que summariamente, nos cumpre historiar.
Pela carta de lei dê 5 de agosto de 1854, foi o governo auctorisado a decretar, em harmonia com a tabella annexa á mesma lei, alguns additamentos e substituições á pauta de 31 de dezembro de 1852. Esta auctorisação comprehendia a fixação dos direitos dos géneros nacionalisados no ultramar, ficando o governo obrigado a dar conta às cortes, na sessão do anno seguinte, do uso que d'ella fizesse.
De 11 de outubro de 1854 é datado o decreto pelo qual o governo aproveitou a referida auctorisação, e que approva a tabella de alterações á pauta geral. Em 13 do mesmo mez e anno foi publicado novo decreto, em que se ordenava á commissão das pautas, que procedesse aos trabalhos necessários para que, com a brevidade que era reclamada pelos interesses do commercio e conveniências do serviço publico, se podessem inserir na pauta, então em vigor, as ditas alterações. Não se fez, porém, nenhuma edição, alem da que foi inserta no. Diario de 13 de outubro. Só em 1856 appareceu, organisada por um negociante do Porto, uma edição particular da pauta de 1852, na qual foram incluídos e marcados com signal especial os cento e dezeseis artigos diversos que compunham a tabella de 1854.
Mais tarde o governo, invocando o decreto de 22 de dezembro de 1852 e a lei de 1 de julho de 1853, mandou imprimir, publicar e executar

A pauta de 22 de dezembro de 1856

Que, como a de 1852, comprehendia as seguintes 19 classes:

1.ª Algodões;
2.ª Animaes;
3.ª Bebidas fermentadas ;
4.ª Despojos de animaes;
5.ª Farináceos;
6.ª Géneros coloniaes;
7.ª Grassinas;
8.ª Lãs e pellos;
9.ª Linhos;
10.ª Louças e vidros;
11.ª Madeiras;
12.ª Metaes;
13.ª Mineraes;
14.ª Papel;
15.ª Pescarias;
16.ª Productos chimicos e medicinaes;
17.ª Sedas;
18.ª Sementes, fructas e plantas;
19.ª Vários artigos.
O numero de artigos elevou-se n'esta edição a 870.
Um facto digno de menção especial, pelos resultados que d'elle advieram aos rendimentos do thesouro, e pelo desenvolvimento que facultou a uma industria de real importância na actualidade, occorreu em 1857. Pela carta de lei de 25 de abril deste anno foi extincto, desde 1 de julho de 1858, em que findava o contrato, o monopólio do sabão em todo o continente e ilhas, fixando-se o direito de importação do sabão de qualquer qualidade em l$000 réis por 100 arráteis, e em 6$000 réis tambem por 100 arráteis o dos sabonetes.

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1907

Seguiu-se

A pauta de 23 de agosto de 1860

Sanccionado o decreto das cortes geraes, de 18 de julho de 1860, foi o governo auctorisado, pela carta de lei de 30 do mesmo mez e anuo, a publicar uma nova edição da pauta geral das alfândegas, em que se tornasse para typo de pesos e medidas os do systema metrico-decimal; se reduzisse a uma só verba o impo>to principal e os addiciouaes, que então se cobravam, com excepção dos emolumentos, e com a condição de que a differença, para mais ou para menos, nos direitos que se fixassem em a nova edição, não poderia exceder 10 por cento.
Em 23 de agosto seguinte, fazendo uso da auctorisação que lhe concedera a caria de lei de 30 de julho, decretou o governo a nova edição da pauta, que foi logo executada nas alfândegas de Lisboa e Porto, onde havia pessoal habilitado; devendo, quando posteriormente se determinasse, ser tambem posta em execução nas demais alfândegas.
No anno immediato, pela carta de lei de 14 de fevereiro de 1861, era o governo novamente auctorisado a pôr em vigor as alterações á pauta de 23 de agosto de 1860, alterações que faziam parte da lei que concedia a auctorisação e com as quaes ficou organisada.

A pauta de 14 de fevereiro de 1861

Aquella carta de lei, sanccionando o decreto das cortes geraes, de 6 do mesmo mez, estabelecia, alem da auctorisação alludida, que se fizesse a conversão dos direitos ad valorem em direitos fixos, em todos os artigos nos quaes fosse possível, tomando-se a media dos direitos pagos desde a pauta de 10 de janeiro de 1837, com referencia á alteração de taxa em cada artigo e tambem com a clausula de que as differenças, para mais ou para menos, não excedessem 10 por cento; que as mercadorias estrangeiras livres de direitos de entrada pagassem, quando exportadas, os respectivos direitos de saída; que as mercadorias
nacionaes que houvessem pago direitos de entrada não ficassem sujeitas, quando exportadas, aos respectivos direitos de saída; e que o governo permittisse, quando o julgassse conveniente, que os artigos de producção nacional, depois de exportados, voltando ao reino, não perdessem a sua nacionalidade.
Por decreto de 18 de dezembro do mesmo anno foi mandada imprimir, publicar e executar a nova edição da pauta geral das alfândegas, contendo as alterações que faziam parte da carta de lei de 14 de fevereiro, e que se dividia em 19 classes, a saber:
1 .ª Animaes vivos;
2.ª Despojos e productos de animaes;
3.ª Pescarias;
4.ª Lãs e pellos;
5.ª Sedas ;
6.ª Algodões;
7.ª Linhos;
8.ª Madeiras;
9.ª Farináceos;
10.ª Géneros chamados coloniaes;
11.ª Matérias vegetaes diversas;
12.ª Metaes;
13.ª Mineraes;
14.ª Bebidas;
l5.ª Vidro, crystaes e productos cerâmicos;
16.ª Papel e suas applicações;
17.ª Productos chimicos;
18.ª Productos e composições diversas;
19.ª Manufaturas de matérias diversas.
Estas 19 classes constituíam 790 artigos com diversos direitos.
Foram nesta edição diminuídos alguns direitos dos géneros especificados era todas as classes da pauta, com excepção da 3.ª, continuando os artigos que pagavam direitos ad valorem a ser taxados pelo mesmo systema.
Na pauta do 1841 estiam 41 artigos livres de direitos de importação; na de 1852 todas as mercadorias pagavam direitos, embora houvesse muitas taxas mínimas e estatísticas; na edição que estamos analysando apparecem 140 artigos livres de direitos, que convém enumerar, e eram :
Gado lanigero;
Gado caprino;
Animaes vivos não classificados;
Pelles em bruto para fabrico de chapéus;
Pergaminho em bruto e em folhas;
Pelles ou couros em desperdícios, raspas e retalhos;
Cabello em bruto;
Penas em bruto;
Dentes não especificados;
Ossos em bruto, em pé, ou queimados em branco:
Matérias duras em bruto, folhas ou raspas;
Matérias duras em bruto;
Nervos;
Tripas em folhas;
Sangue secco;
Gorduras em brutos, coadas e em resíduos;
Ovos e albumina secca;
Substancias medicinaes;
Raspas de ponta de veado;
Adubos para agricultura:
Coral em bruto ou em fragmentos;
Coral talhado e não polido;
Conchas;
Madre-perola em bruto ou serrada;
Unhas de tartaruga;
Espermacete em bruto;
Pellos em bruto;
Seda em casulo;
Seda em desperdícios;
Pannos para peneirar;
Algodão em caroço com a semente;
Fios para tratamento de feridas;
Arcos de madeira;
Cortiça em bruto;
Serradura;
Carvão de madeira;
Castanhas;
Tubérculos não especificados;
Cevada germinada;
Baunilha e fava de cheiro;
Hortaliças verdes ou seccas e legumes verdes;
Forragens;
Cairo sem torcedura;
Carroá e pita;
Lacca e sangue de drago;
Óleos vegetaes concretos;
Aloes;
Cautehue e gutta-percha;
Lichens e musgos;
Raízes, paus e cascas para perfumaria;
Açafrão;
Orcaneta;
Urzella;
Sumagre;
Ruiva inteira;
Bagas;
Levadura;
Matérias seccas para as artes;
Oiro em bruto, em pó e objectos quebrados;
Oiro em moeda;
Platina em esponja ou em pó;
Prata em bruto e objectos quebrados;
Prata em moeda;
Ferro em metralha;

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1908 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Cobre em bruto e em metralha;
Cobre ligado em metralha;
Bronze e arame em metralha;
Nikel fundido e em metralha;
Casquinha batida e laminada;
Chumbo em metralha;
Chumbo com liga de antimonio;
Estanho em objectos quebrados;
Estanho com liga para soldar;
Zinco fundido e objectos quebrados;
Antimonio metallico;
Metaes não classificados em bruto;
Minérios não especificados;
Enxofre em bruto;
Pedras não especificadas;
Mineraes em bruto não classificados;
Mineraes em obra de alabastro, excepto quinquilherias;
Obra de jaspe, idem; Obra de amianto, idem;
Obra de alambre; Obra de azeviche, idem;
Vidros quebrados; Papel de arroz;
Papel lixa;
Mappas geographicos;
Livros brochados em língua estrangeira;
Livros brochados em portuguez quando os auctores residam no estrangeiro;
Aparas, retalhos e trapo para massa de papel;
Bromo;
Iodo;
Acido bórico em bruto;
Acido arsenioso;
Acido acético;
Oxydo de ferro;
Azotato de soda;
Azotato de cobre;
Sulfitos e hyposulfitos;
Carbonato de soda em bruto natural;
Borato de soda;
Chloreto de soda;
Ferro-cyanureto de potássio;
Acetato de ferro bi;
Tártrato de potassa;
Sulfuretos não especificados;
Chloroformio;
Glycerina;
Creosoto;
Caixas de reagentes chimicos;
Cerotos e unguentos;
Emplastos e encerados;
Pastilhas e pivetes odoríferos;
Carmim;
Extractos em liquido ou em massa, com tanninos;
Azul de cobalto;
Azul da Prussia;
Tinta da China;
Tinta de imprensa e lithographia;
Isca;
Gelo;
Fogo de artificio;
Dentes artificiaes;
Espoletas fulminantes de mineiro;
Utensílios e apparelhos de chimica de agatha;
Matrizes para typos;
Gravuras de madeira e stereotypadas em metal;
Tela preparada para pintura;
Modelos de machinas, apparelhos ou instrumentos;
Objectos de qualquer espécie para museu;
Cautchue e gutta-percha em borracha e tubos;
Amarras e cordas alcatroadas para desfiar;
Cordame de cairo velho;
Cordame de carroá velho;
Cordame de piassaba velho;
Cordame de pita velha;

sfuminhos;
Lápis em pedra.
Se entre os cento e quarenta artigos enumerados ha muitos aos quaes, por serem matérias primas ou productos indispensáveis às industrias, era justo conceder isenção completa de direitos, outros existem que obtiveram esse beneficio porque d'elles não havia, ou era quasi nulla, a importação. Para alguns d'estes últimos, posteriormente e por leis especiaes, foram decretados direitos, sendo outros tributados pela actual proposta.
Assim se deu liberdade ao pergaminho em bruto e em folhas, que, ou não figura nas estatísticas, ou apparece produzindo l$625 réis de direitos num anno; á baunilha e fava de cheiro, que, ou não apparece também, ou de que se importam por anno apenas 9 kilogrammas; aos óleos mineraes, de que não havia importação, apparecendo mais tarde o petróleo, que foi indispensável tributar; as obras de amian-tho, jaspe, alambre e azeviche, que não tinham até então figurado nas nossas importações, mas que, sendo productos valiosos e de luxo, deviam ser tributados.
Pagando direitos todos os medicamentos, apparecem livres os cerotos, os unguentos, emplastos e encerados, sem que se possa perceber bem qual o motivo de tal excepção. No mesmo caso estavam a isca, o fogo de artificio, os dentes artificiaes, etc.
Em 1863 foi presente às cortes, e por ellas approvada, uma proposta que alterava alguns direitos estabelecidos nas pautas de importação e exportação, e fixava a taxa de 20 réis por kilogramma para o óleo mineral chamado petroline.
Pela carta de lei de 11 de julho do mesmo anno, que n'aquella proposta tivera origem, reduzia-se tambem o direito da carne secca, e do papel de impressão de qualquer cor; elevava-se de 1/2 a 1 por cento o direito de saída a que estavam sujeitos os desperdícios, retalhos e raspas de couros e pelles; e igualava-se em 6 por cento ad valorem a taxa dos direitos do peixe de agua doce e do mar. Uma tabella annexa á mesma carta dê lei declarava ainda livre o minério de manganez, diminuia a taxa de importação dos hypochloritos, ácidos sulphurico e chlorhydrico, carbonatos de soda e alcalis cáusticos, e a de exportação de cremor tártaro.
Sanccionado o decreto das cortes geraes, de 12 de maio de 1864, aboliu a carta de lei de 13 do mesmo mez e anno, desde o 1.º de janeiro seguinte, o monopólio do tabaco.
Decretada, para o reino e ilhas adjacentes, a liberdade de commercio, de fabrico e de venda d'aquelle género, e prescriptas as regras e condições a que teria de sujeitar-se a fabricação, foram os direitos de importação respectivos fixados pela seguinte forma:

Tabaco denominado rolo .... l kilog. 1$100
Tabaco em folha.... l » 1$300
Tabaco em charutos .... l » 2$000
Tabaco em outras espécies, manipulado.... 1$600

Este facto é, sem duvida, um dos mais notáveis e culminantes dos que temos referido. Representando um acto de energia da parte de quem o praticou, tornou mais copiosa uma abundante fonte de receita para o thesouro, ao mesmo tempo que estancou o manancial ubérrimo de que se originavam, á sombra dos estranhos privilégios concedidos aos monopolistas, os vexames que eram o flagello do paiz, e que difficil se torna comprehender hoje como podessem ser tolerados durante trinta annos de pleno goso de liberdades políticas tão penosamente conquistadas.
A 11 de julho de 1866 era assignado em Lisboa o tratado de commercio e navegação, entre Portugal e a Fran-

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1909

ca, e a 1 de julho de 1867 era, por carta de lei, approvado o mesmo tratado, ficando o governo auctorisado a ratifical-o.
Na tabella B deste tratado não apparecem consideradas nenhumas matérias primas, alem da seda e da lã em rama, sendo productos fabricados e artefactos diversos os sessenta e um restantes artigos que a compunham. N'ella são os direitos ad valorem applicados a muitas mercadorias taxadas na pauta geral com direitos específicos, ficando por tal forma tributadas, entre outras, as obras de pelles, fios de matérias vegetaes, cartonagens, objectos para escriptorio e desenho, bandejas, gaiolas, pentes, obra miúda de madeira.
Assim se applicava em larga escala nas nossas alfândegas um systema, já então condemnado como prejudicial ao fisco e ao commercio.
É facto incontestável que o illustrado estadista que realisou o tratado excluiu delle todos os productos mais importantes da nossa industria têxtil, ficando portanto incólumes os tecidos de algodão crus, brancos e estampados, os de lã, pannos, cazimiras, flanellas, castorinas e similhantes, os de linho, panno de linho curado, estopa e aviagens, etc. E se algumas industrias soffreram com a diminuição dos direitos, operou-se um movimento commercial importante em diversos artigos cuja importação, embaraçada por taxas excessivas, era restricta, sem que d'elles houvesse fabricação no paiz.
Assim aconteceu com os tecidos mixtos de seda, sobre os quaes, pelo facto de entrar n'elles este filamento, embora em porção pouco importante, recaía o imposto como se fossem unicamente fabricados com seda.
Das modificações introduzidas na pauta convencional resultou, por exemplo, que a importação de tecidos mixtos com seda, que em 1865 se realisára no valor de 83:869$000 réis, pagando de direitos 33:911$000 réis, em 1878 já se elevava ao valor de 157:746$000 réis, que produziram 71:926$000 réis de direitos, devendo notar-se ainda a circumstancia importantíssima de que os tecidos de lã, linho e algodão, contendo menos de 10 por cento de seda, eram considerados no tratado como fabricados unicamente de lã, linho ou algodão, e que a importação destes, nulla antes do tratado, se tornou considerável, embora nas estatísticas não figurem no grupo dos mixtos, por isso que eram classificados como não contendo seda. E mais eloquente ainda do que qualquer dado isolado é a comparação do valor das mercadorias de França importadas em Portugal e daqui exportadas para aquelle paiz, antes de 1866, e depois de postas em execução as tabeliãs A e B, annexas á convenção referida.
D'esse confronto apura-se que o valor das nossas importações procedentes de França, que em 1860 era de réis 3.785:000$000 e o das exportações de Portugal para França de 747:000$000 réis, attingia em 1875, ou dez annos depois, a 5.913:000$000 réis nas primeiras, e a réis 1.271:000$000 nas segundas.
Finalmente, ampliadas aquellas vantagens a quasi todas as nações européas, em consequência do tratamento de nação mais favorecida, que Portugal e cada uma d'ellas reciprocamente se concediam, ficaram os direitos n'elle estipulados substituídos aos da pauta geral das alfândegas.
Desde 1867 a 1869 nenhuma alteração digna de referencia especial se realisou nas pautas.
Em 1870 foi presente às camaras uma proposta modificando as taxas de diversos artigos da pauta gerai, na qual eram augmentados alguns direitos fiscaes, e se fixava em 50 por cento dos direitos impostos às importações estrangeiras o favor concedido aos géneros similares produzidos em as nossas colónias.
Depois de soffrer algumas alterações, e havendo recebido sancção legislativa, foi decretada a respectiva tabeliã, em 27 de dezembro de 1870.
Adoptaram-se então, para classificação do assucar não refinado, os typos da escala hollandeza, sendo aquelle producto tributado com as taxas de 75, 85 e 95 réis por kilogramma, conforme fosse superior aos typos 12, 15 e 16 da referida escala; e augmentaram-se os direitos do café, chá, tecidos lisos de algodão crus e brancos, manteiga, queijos, feculas, legumes, etc., comprehendendo a tabella 21 artigos.
Começou esta lei a ter execução no 1.º de janeiro de 1871, sendo, por decreto de 25 do mesmo mez e anno, approvada a nova edição da

Pauta de 25 de janeiro de 1871

a qual, contendo as alterações realisadas em 27 de dezembro anterior, se dividia nas seguintes 19 classes:
1.ª Animaes vivos;
2.ª Despojos e productos de animaes;
3.ª Pescarias;
4.ª Lã e pellos;
5.ª Sedas;
6.ª Algodão;
7.ª Linhos;
8.ª Madeira;
9.ª Farináceos;
10.ª Géneros chamados coloniaes;
11.ª Matérias vegetaes diversas;
12.ª Metaes;
13.ª Mineraes;
14.ª Bebidas;
15.ª Vidros, crystaes e productos cerâmicos;
16.ª Papel e suas applicações;
17.ª Productos chimicos;
18.ª Productos e composições diversas;
19.ª Manufacturas de matérias diversas.
Estas 19 classes constituíam 793 artigos.
Pela carta de lei de 27 de abril de 1871, que sanccionou decreto das cortes geraes de 21 do mesmo mez, foram augmentados os direitos estabelecidos, para a importação do tabaco, no artigo 7.º da lei de 13 de maio de 1864, sendo substituídos pelos seguintes:

Tabaco em rolo .... kilog. 10200
Tabaco em folhas .... » 1$400
Tabaco em charutos ..... » 2$200
Tabaco manipulado em outras espécies.... » 1$800

Em 9 de julho do mesmo anno era, por carta de lei, reduzido a 10 por cento ad valorem o direito de importação do junco preparado, e a 5 réis por kilogramma o das batatas e das favas.
Pela carta de lei de 14 de maio de 1872 foram elevados os direitos de importação, exportação e reexportação aos artigos constantes da tabella junta á mesma lei, e que eram:

Importação:
Melaço.... kilog. $020
Petroline .... » $040
Stearina.... » $070
Especiarias (excepto pimentão) .... » $100

Exportação:

Gado vaccum.... cabeça 1$500
Gado suíno .... » $300
Gado ovino ou caprino .... » £O5O
Géneros que não têem direitos especiaes do saída na pauta .... ad val. 1 %

Reexportação:
Géneros reexportados, por saída, ad valorem, 1 1/2 por cento.

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1910 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Outra carta de lei da mesma data fixou em 400 réis por 100 kilogrammas o direito de importação da casca de sobro, e em 200 réis, tambem por 100 kilogrammas, o de exportação do referido género de producção nacional.
Pelo decreto de 22 de maio do mesmo anno, foi mandado inserir na classe 19.ª da pauta o seguinte artigo:

Tecidos impermeáveis alcatroados, não especificados.... ad vai. 10 %

A l5 de julho ainda do mesmo anno assignava-se o tratado com a Itália, tratado pelo qual Portugal e aquelle paiz se concediam reciprocamente o tratamento de nação mais favorecida, e que foi ratificado, depois de receber approvação legislativa, pela carta de confirmação de 5 de maio de 1873. Ao tratado foi annexa a seguinte

Pauta de importação em Portugal

Cânhamo sedado .... kilog. 20 réis
Papel de embrulho de todas as qualidades .... » 15 »
Mármores em bruto.... ad val. 1 %
Mármores em obra ..... » l %
Pedras não especificadas, em obra.... » l %
Chapéus para homem, de todas as qualidades.... » 20 %

Em 1873 apresentou o governo às cortes uma proposta de substituição da pauta geral das alfândegas. Declarava nessa occasião o ministro proponente que a apresentação da tal medida visava a obter a simplificação e clareza das classificações, alteração dos direitos de muitas mercadorias, e transformação em direitos ad valorem de grande numero de taxas fixas.
Com effeito a proposta, transformando radicalmente o systema da pauta de 1871, separando as matérias primas dos artefactos e agrupando mercadorias análogas, conseguia, soccorrendo-se largamente aos direitos ad valorem, reduzir as classes de 19 a 10, e os artigos de 793 a 303, e dava ao ministro, que a apresentou, esperanças de um augmento de receita, na importância de 30:000$000 réis.
A camara, porém, resolveu adiar a discussão de tal assumpto, e que ácerca d'elle fossem consultadas as associações commerciaes e os verificadores das alfândegas de Lisboa e Porto.
Com esta deliberação reconheceu o parlamento quanto é melindroso e grave modificar as pautas aduaneiras sem abundantes elementos de apreciação, e que é indispensável toda a prudência para alterar os diplomas por que se arrecadam as mais avultadas receitas do thesouro e para cujo estudo todos os esclarecimentos, inquéritos e informações são poucos.
As associações commerciaes não chegaram, que nos conste, a emittir a sua opinião, o os verificadores das duas alfândegas referidas deram parecer muito desenvolvido, analysando detidamente a proposta e concluindo por condemnal-a em muitos pontos, sobretudo n'aquelle em que generalisava, applicando-as a 118 dos 303 artigos, as taxas ad valorem. De tal applicação resultariam sem duvida, conforme sustentavam aquelles empregados, innumeros inconvenientes e embaraços para o expediente rápido das alfândegas, e quebra importante nas receitas do estado.
Estes pareceres foram publicados no relatório de fazenda no anno de 1874.
Entretanto, se a proposta a que nos referimos não conseguiu obter sancção legislativa, foi pelo parlamento approvada outra, que, não obstante produzir receita, muito contribuiu para perturbar e dificultar todo o expediente de despacho nas alfândegas. Alludimos á que creou a taxa complementar de 1 por cento ad valorem, que devia ser addicionada aos direitos devidos pelas mercadorias importadas, e a de 4/2 por cento tambem ad valorem ao das mercadorias exportadas.
D'esta taxa eram só exceptuados na importação o tabaco, o oiro e prata em barra, e na exportação os géneros e mercadorias que pagavam direito fixo. Esta medida foi decretada pela carta de lei de 18 de março de 1873.
Em 1874, apenas o decreto de 2õ de novembro mandou inserir, na classe ll.ª da pauta, o seguinte dizer:

Composições e productos não classificados de matérias vegetaes..... ad val. 15 %

porque havia sido declarado omisso na pauta um extracto de cevada e lúpulo proposto a despacho na alfândega de Lisboa.
Em 1875, e por idêntico motivo, em relação ao cordame de linho com applicação diversa da designada no artigo 184.º da pauta; para armação de navios, foi decretado a 7 de julho que na mesma pauta se inserisse o novo dizer:

Cordame (excepto de metal)............. ad val. 10 %

A carta de lei do 26 de janeiro de 1876, sanccionando o decreto das cortes, de 10 do mesmo mez, auctorisou o governo a tornar extensivo á Gran-Bretanha e a todos os paizes onde os productos portugueses gosavam de tratamento de nação mais favorecida, o beneficio da tabella B, annexa ao tratado de 11 de julho de 1866, concluído entre Portugal e a França; outra carta de lei de 12 de abril do mesmo anno fixou em 10 por cento ad valorem o direito do tecido de lã, denominado alpaca, destinado a cobertura de guardas-chuva e guardas-sol todas as vezes que viesse cortado por forma que não podesse ter outra applicação.
Em 1877 foram, pela carta de lei de 9 de abril, que sanccionou o decreto das cortes de 24 de março do mesmo anno, os direitos estabelecidos na pauta geral das alfândegas, para a importação de tubos de ferro fundido, substituídos pelos seguintes :

Tubos de ferro com Om,2 ou menos de diâmetro .... kilog. 10 réis
Idem, com mais de Om,2 até Ora,4 .... » 5 »
Idem, de diâmetro superior ..... » 2 »

Tendo sido considerado omisso, tanto na pauta geral como na do tratado com a Franca, um manequim articulado, próprio para os pintores estudarem as roupagens, que fora importado do Havre, e proposto a despacho na alfândega de Lisboa, foi, pelo decreto de 24 de abril de 1877, mandado inserir na classe 19.ª da primeira d'aquellas pautas o seguinte novo artigo:

Manequins ou autómatos articulados, próprios exclusivamente para o estudo de pintura .... livres

Por decreto de 11 de maio do mesmo anno, o governo, usando ainda da auctorisação concedida na lei de 2ü de janeiro do anno anterior, tornou extensivo á Hespanha o beneficio da tabella B, annexa ao tratado de 11 de julho de 1866, celebrado entre Portugal e a França.
E, finalmente, o decreto de 25 de outubro ainda do mesmo anno mandou inserir na pauta o seguinte artigo:

Carros mixtos para conducção de mercadorias e transportes de pessoas .... ad val. 15 % por ter sido julgado omisso um vehiculo nestas condições.

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1911

Em 1878, por decreto de 18 de março, mandou-se inserir na pauta o seguinte artigo:

Feltro com mistura de borra de seda... kilog. 600 réis

em consequência de ter sido julgado omisso este producto que fora proposto a despacho na alfândega do Porto.
Pela carta de lei de 15 de maio foi elevado a 360 réis por metro cubico o direito de exportação das ostras.
Se as alterações realisadas nas pautas, durante os últimos annos a que nos temos referido, foram de pequena importância relativa, não aconteceu o mesmo com a proposta submettida em 1879 às cortes, e pela qual eram elevados os direitos de importação do tabaco.
Convertida em lei a mesma proposta, sanccionada e mandada executar em 31 de março d'aquelle anno, ficaram os direitos sobre o tabaco, que já haviam sido augmentados por lei de 27 de abril de 1871, fixados da seguinte forma:

Tabaco em rolo................... kilog. 1$440 réis
Tabaco em folhas.... l$680 »
Tabaco em charutos.... » 2$640 »
Quaesquer outras espécies de tabaco manipulado.... » 2$166 »

Alem d'esta importante medida, unicamente se encontram, na legislação de 1879, dois decretos datados de 8 de agosto, que mandam inserir na pauta dois novos artigos, que haviam sido considerados omissos e que foram:

Cevada torrada.... kilog. 20 réis
Papel recortado.... » 100 »

Em 1880 o decreto de 4 de marco mandou applicar às mercadorias importadas dos Estados Unidos, a tabella B, annexa ao tratado de commercio celebrado com a França em 11 de julho de 1866.
Sendo no mesmo anno submettidas á apreciação parlamentar algumas alterações nos direitos de importação e exportação de varias mercadorias, e bem assim uma outra para o augmento da taxa complementar de 1 por cento a 2 por cento ad valorem, e havendo taes propostas obtido, com ligeiras modificações, a sancção dos corpos legislativos, foram em 23 de abril mandadas executar as leis que d'ellas resultaram, e que fixaram os seguintes direitos:

Exportação:

Cortiça em bruto ou em pranchas.... 15 Kilog. 30 réis
Cortiça fabricada em quadros.... » » 100 »
Cortiça em aparas e virgem.... » » 5 »
Cortiça fabricada em rolhas.... » » livre

Importação:

Carvão de pedra....tonelada 300 réis

Carvão de coke.... » 600 »
Óleo de semente de algodão.... decalitro 700 »
Café em casca ou descascado. ..... kilog. 120 »
Café torrado ou moido, e as suas imitações incluindo a chicória .... » 140 »

Declarava a mesma lei que por cada tonelada de carvão .de pedra, que fosse destinada ao fornecimento das embarcações a vapor nacionaes e estrangeiras, se restituiria a importância de 150 réis, e ainda que a taxa complementar, creada pela carta de lei dê 18 de março de 1873, fosse elevada a 2 por cento unicamente sobre o valor das mercadorias importadas e despachadas para consumo, exceptuando desse augmento as que eram mencionadas no § único do artigo 1.° da citada lei de 1873, e de toda a taxa o carvão de pedra e o coke.
Afóra esta importante medida, só houve digno de especial menção em 1880, o decreto de 7 de junho que elevou os direitos de importação às sementes de algodão, pela seguinte forma:

Algodão em caroço com a semente ..kilog. 15 réis

Semente de algodão limpa de felpa e separada do caroço ....kilog. 25 réis

Em 1881 foram substituídos, pela carta de lei de 21 de março, os direitos estabelecidos nos artigos 124.º, 154.º, 172.º e 184.º da pauta de 1871 pelos seguintes:

Papel pintado ou estampado para forrar casas .... kilog. 50 réis
Sabão de qualquer qualidade ..... kilog. 50 réis
Chapéus de chuva, de seda .... um 800 réis
Chapéus de chuva, de outros estofos.... 300 réis
Armações completas, sem cobertura .... Uma 250 réis
Armações incompletas, quando sejam bengalas ou cannas, com castão da mesma matéria, ou sem elle..... uma 100 réis
Armações incompletas, quando sejam bengalas ou cannas com castão de outras matérias.... uma 200 réis
Armações incompletas, quando sejam fios de aço redondos .... kilog. 15 réis
Armações incompletas, quando sejam fios de aço de meia canna .... Kilog. 25 réis

rmações incompletas, quando sejam outras peças separadas.... » 1$200 »
Tecidos para cobertura, de lã .... » 220 »
Tecidos para cobertura, de algodão .... » 120 »

Cordame, cabos, amarras, cordas, enxárcias, merlim, murrão, cordel, linha e sondarezas.... » 15 »
Cordame velho para desfiar .... livres
Cadeias, amarras, correntes e ancoras de qualquer metal.... » 10 »
Pregadura para forro de navios..... » 20 »
Redes de pesca .... »
Lonas e meias lonas, brins e brinzões para velas de embarcação .... » 60 »

Tendo sido em 1882 apresentadas ao parlamento diversas propostas de importantes modificações nas pautas, e havendo as mesmas propostas obtido approvação, foram promulgadas as leis:
De 27 de março, que, declarando livres de-imposto de consumo em Lisboa os cereaes nacionaes, augmentou os direitos de exportação aos estrangeiros, elevou os de outros géneros e substituiu pelos que abaixo enumeramos os estabelecidos na pauta de importação:

Trigo em grão.... kilog. 10 réis
Trigo em farinha .... » 16 »
Milho e centeio em grão.... » 9 »
Milho e centeio em farinha .... » 11 »
Cevada e aveia em grão.... » 8 »
Cevada e aveia em farinha ....» 9 »
Pão cozido.... » 12 »

ava .... » 8 »
Chá .... » 800 »
Assucar não refinado ..... » 90 »
Petróleo em bruto, puro ou
refinado e seus resíduos..... » 50 »
Óleos fixos líquidos não especificados
na pauta .... » 70 »
Combustíveis fosseis não especificados
na pauta ..................... ad val. 5 %
Aguardente e álcool simples ......decalitro de alcool puro 2$000 réis
Aguardente e álcool preparado .... » » liquido 2$000 »
Genebra, cognac e licores ......... » » » 2$000 »

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1912 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

A lei de 2 de maio, que decretuu a taxa de GO réis por kilogramma, incluindo no peso as taras, para a tinta de impressão e de lithographia que era livre de direitos de importação na pauta.
A lei de 17 de maio, que sujeitou, alem do pagamento dos respectivos direitos de importação, ao imposto de consumo, quando destinados ao consumo de Lisboa, e á taxa do real de agua, quando destinados a outros concelhos do reino, os géneros estrangeiros seguintes:
Banha, unto e medullas;
Arroz descascado;
Azeite de oliveira;
Vinho, qualquer que seja a sua qualidade;
Vinagre;
Bebidas alcoólicas;
Bebidas fermentadas.
Esta lei elevou tambem a 700 réis por decalitro o direito do azeite de oliveira estrangeiro.
A lei de 15 de junho, que declarou livre de direitos de importação, nas alfândegas do continente e ilhas, o milho produzido nas províncias ultramarinas, sendo conduzido em navios nacionaes e acompanhado dos respectivos despachos de exportação.
Tendo a lei de 3 de junho do mesmo anno auctorisado o governo a publicar uma nova edição da pauta geral das alfândegas, que desde 1871 não havia sido reeditada, e que não tinha iustrucções preliminares nem Índice, servindo ainda os publicados em 1861, já alterados e mutilados por innumeras disposições diversas, apparecEu a

Pauta de 6 de julho de 1882

que se dividia nas seguintes 19 classes:
1.ª Animaes vivos;
2.ª Despojos e productos de animaes;
3.ª Pescarias;
4.ª Lã, pellos e feltros;
5.ª Sedas;
6.ª Algodão;
7.ª Linho e suas assimilhações;
8.ª Madeiras;
9.ª Farináceos;
10.ª Géneros chamados coloniaes;
11.ª Matérias vegetaes diversas e suas composições;
12.ª Metaes;
13.ª Mineraes;
14.ª Bebidas;
15.ª Vidros, crystaes e productos cerâmicos;
16.ª Papel e suas applícaçoes:
17.ª Productos chimicos;
18.ª Productos e composições diversas;
19.ª Manufacturas de matérias diversas.
Estas classes comprehendiam 819 artigos.
Alteração mais importante, porém, do que aquella que deixámos indicadas em 1882, foi a que resultou da approvação, pelas cortes, do tratado de commercio e navegação celebrado com a França e assignado em 19 de dezembro de 1881 e da convenção addicional de 6 de maio de 1882, que foram ratificados em 13 de maio deste ultimo anno
A pauta B, annexa ao referido tratado, contendo apenas 137 artigos, alterou comtudo os direitos de importação estabelecidos em muito maior numero d'elles, na pauta geral, que vigorava, pois contém artigos genéricos que comprehendem muitas especialidades.
Muitos dos direitos ad valorem, estabelecidos no anterior tratado de 1866, foram reduzidos a taxas especificas, concedendo-se a liberdade a varias matérias primas como lã em rama, madeira em bruto, folhas para marcenaria, matérias vegetaes corantes, enxofre em bruto ou refinado, productos corantes, chumbo, zinco, estanho, antimonio e azougue em bruto, etc.; e reduzindo-se as taxas a outras como ferro fundido, batido ou laminado em bruto, aço fundido ou laminado. Nos productos textis com exclusão dos paunos e cazimiras que não figuram na convenção, operou-se reducção de taxas, diminuindo-se tambem os direitos a muitos outros productos como vidro, porcellana, papel, obras metallicas, etc.
A pauta convencional a que nos referimos teve em vista estreitar as nossas relações commerciaes com a França e com quaesquer outras nações às quaes fosse applicada, e ao mesmo tempo proporcionar o ensejo para se realisar uma necessária remodelação na pauta geral das alfândegas. É claramente confirmada essa intenção pela lei de 7 de junho de 1882, que mandou applicar á importação de todos os paizes a pauta B, annexa ao tratado de 1881 e respectiva convenção, e que a tornou de vigência geral.
Pelo § único do artigo 1.º da mesma lei, foi o governo auctorisado a organisar e publicar uma nova edição da pauta geral das alfândegas, em harmonia com os direitos e classificação estabelecidos no tratado e na convenção addicional.
Em 1883 nada se decretou ácerca de pautas.
Em 1884, considerando-se omissas na pauta umas chapas de ferro propostas a despacho na alfândega de Lisboa, foi, pelo decreto de 21 de fevereiro, substituído ao artigo 102.º, letra F, da pauta geral, o seguinte dizer:

Ferro forjado (batido ou laminado), galvanisado, zincado, coberto de chumbo ou com qualquer outro preparo.... kilogr. 4 réis

carta de lei de 11 de março do mesmo anno substituiu tambem os dizeres do artigo 179.º da pauta, na parte que diz respeito aos fios de aço para armações de chapéus de chuva, pelo seguinte:

Fios de aço simples, sem batidos nem guarnição, redondos .... kilogr. 15 réis
Fios de aço simples, sem batidos nem guarnição, meia canna.... » 25 »

Por lei de 6 de junho foram alterados os direitos de importação aos seguintes géneros:

Grãos farináceos, com casca ou sem ella, não especificados..... kilogr. 9 réis
Fructos e sementes para distillação » 9 » Aguardente e álcool simples .... Decal. De alcool puro 1$200 réis
Aguardente e álcool preparado.....Decal. de liquido 1$200 »

Em 1885, e por lei de 2 de julho, approvou-se o tratado de commercio celebrado entre Portugal e Hespanha, que fora assignado em 12 de dezembro de 1883, e do qual faz parte a seguinte:

Pauta A

Minerios e mineraes em bruto não classificados.... _ livres
Pescado fresco ou com o sal indispensável para
a sua conservação.... kilogr. 2,7 réis
Sardinha salgada e prensada .... » 3,6 »
Outros pescados salgados e prensados, fumados
e de escabeche .... » 9 »
Mariscos.... » 1,8 »
Fructos frescos e seccos .... » 3,6 »
Azeite de oliveira ..... decal. 500 »
Gado vaccum, lanigero e caprino.... - livre
Gado suíno .... cabeça 90 »
Cortiça em bruto e em pranchas ... - livre
Cortiça em rolhas ..... kilogr. 90 »
Lã em rama, suja ou lavada .... - livre

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1913

A carta de lei de 22 de julho declarou que a importação das mercadorias descriptas, na tabella junta á mesnn lei, ficava sujeita às taxas n'ella designadas, e que ai classificações e direitos da classe 17.ª da pauta eram substituidas pela

Tabella Classe 6.º

Algodão em rama, sem caroço nem semente .... - livre

Classe 9.ª

Farinha de pau ..... kilogr. 5 réis
Mandioca, tapioca, arrowroot e sagú. » 20 »
Todas as demais feculas e amido.... » 50 »

Classe 7.ª

Fios de juta ou de quaesquer matérias vegetaes
filamentosas não especificadas, embora contenham
linho ou cânhamo.... kilogr, 5 réis

Classe 13.ª

Cimento, cré, e gesso cru.... - livre

Classe 16.ª

Massa para fabrico de papel em qualquer estado e
de qualquer qualidade ..... - livre

Classe 17.ª

Bromo e iodo.... - livres
Phosphoro.... - livre
Acido arsenioso .... - »
Acido acético (pyro-lenhoso) que marque no
areometro até 6 graus.... - »
Acido sulphurico e chlorhydrico..... kilogr. 1 réis
Acido palmitico, oleico e esteárico em
massa ..... » 50 »
Acido azotico ou nítrico .... » 20 »
Alcalis cáusticos, propriamente ditos,
sólidos ou dissolvidos.... - livres
Azotato de soda.... - livre
Azotato de potassa (salitre).... kilogr. 30 réis
Sulphato de soda, de potassa, de cobre
e de ferro.... » 2,5 »
Carbonato de potassa em bruto ..... » 5 »
Carbonato de potassa refinado ..... » 50 »
Carbonato de soda em bruto, natural. - livre
Carbonato de soda em bruto, artificial kilogr. 10 réis
Carbonato de soda refinado secco e o
crystallisado.... » 10 »
Borato de soda.... - livre
Ghloreto de cal.... - »
Chloreto de sódio.... litro 8 réis
Caixas de reagentes chimicos e
exemplares para estudo..... - livres
Todos os demais productos chimicos
não especificados ..... Ad val. 5%

A carta de lei de 23 de julho ainda de 1885 fixou pelo praso de cinco annos, em 2 réis, os direitos de importação às telhas e tijolos para construcção.
E, finalmente, o governo, usando da faculdade que lhe fora concedida pelo § único do artigo 1.º da lei de 7 de junho de 1882, mandou, por decreto de 17 de setembro de 1885, publicar e executar a edição da

Pauta de 27 de setembro de 1885

na qual foram incluídas as classificações, artigos e direitos estabelecidos na pauta B, annexa ao tratado de commercio com a França, já generalisada a todas as procedências. E esta a pauta actualmente em vigor.
De mais fácil comprehensão e applicação do que as antecedentes, acabando com grandes agrupamentos, deu numero a cada um dos artigos e conseguiu, dividindo-se como a anterior em 19 classes, reduzir o numero destes a 661.

*
* *

Feita a resenha da legislação promulgada ácerca de pautas, desde 1837,
cumpre-nos apreciar a proposta que foi submettida á nossa consideração, e cuja primeira parte constitue a

Pauta de importação

Obedecendo evidentemente, na sua estructura, ao pensamento de simplificar o importantíssimo serviço de verificações, de que dependa principalmente a rapidez de todo o movimento de despacho nas alfândegas, consegue reduzir a 12 as 19 classes, e a 440 o numero dos artigos, que na anterior edição de 17 de setembro de 1885 ainda são, como vimos, 661.
Em todas as reformas a que nos referimos se observa a tendência constante para converter a antiga pauta, organisada sem methodo nem intuitos claramente definidos, nutn diploma pratico, de fácil interpretação e applicação, que não permitta arbitrios aos seus executores, nem suscite duvidas ou contestações, e que por conseguinte não levante embaraços á regular execução de um serviço de sua natureza complexo e difficil.
Existem, é certo, leis especiaes, que uma ou outra vez contrariam este pensamento; mas essas medidas, que representam, ora necessidades do thesouro, às quaes se julgou occorrer efficazmente, introduzindo alterações arbitrarias na pauta, ora convicções, que reputamos sinceras, de estadistas cujas idéas económicas se nos afiguram muito discutíveis, não destroem, a nosso ver, a affirmação que fazemos de ter este ramo da nossa legislação soffrido uma serie de reformas geraes, tendentes todas a operar a transformação referida.
A proposta actual realisa notável melhoramento nesta importante parte do serviço publico. Para o obter foi por certo necessario consumir grandes esforços, empregar aturado trabalho e accordar em numerosas combinações, porque, adstricta, como está entre nós, qualquer reforma de pautas às condições estipuladas nos tratados de commercio celebrados com a França, com a Itália e com a Hespanha, e às taxas fixadas nas respectivas tabeliãs, que ainda têem alguns ânuos de vigência, era indispensável subordinar a organisação da pauta geral áquellas convenções que hoje têem applicação a todas as procedências. Formular uma pauta para as alfândegas portuguezas, sem attender às tabeliãs approvadas pelos tratados que vigorara, e que têem execução no despacho de todas as mercadorias n'ellas incluídas, equivalia a fazer trabalho sem aproveitamento pratico e sem utilidade real.
Observando este indispensável preceito foi já, em parte, organisada a pauta de 17 de setembro de 1885, sendo-o totalmente a proposta que examinamos e cuja classificação se nos afigura preferível á das pautas anteriores, sobre as quaes possuo ainda outras vantagens. Entre estas não podemos deixar de mencionar a que é constituída pelo agrupamento, realisado numa só classe distincta e especial, de todas as substancias alimentícias, o que facilitará de futuro a coordenação clara e simples de um dado esta-;istico de incontestável valor para estudos económicos e de administração, como são aquelles que accusam a somma dos valores trocados pelos géneros importados e destinados á alimentação do paiz.

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1914 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Dependendo o preenchimento dos bilhetes de despacho, como todo o outro trabalho dos verificadores, da organisação da pauta, e dependendo o apuramento da estatistica dos dizeres dos bilhetes de despacho, é claro que para ser real a utilidade desta se torna indispensável que a pauta, sem prejudicar o pensamento fiscal, seja methodica e obedeça a principies e regras perfeitamente definidos e em harmonia com o plano que se julgue mais apropriado e mais conveniente á elaboração da estatística. Sem isso não podem obter-se as bases para muitos estudos que aos governos se torna frequentemente necessario realisar.
Ora com a organisação das pautas anteriores, onde, por exemplo, se encontravam dispersos por differentes classes, direitos que taxavam substancias alimentícias, e até agrupados no mesmo artigo productos que servem para alimentação e para outras applicações, não é fácil nem talvez possível apurar-se com exactidão qualquer elemento que se procure, relativamente a um dado ponto.
Alem disso, uma pauta methodica e racionalmente classificada, ao mesmo tempo que facilita o serviço de despacho, permittindo que o verificador desempenhe as suas funcções com a maior presteza, proporciona ao commercio vantagens que ninguém desconhece.
Actualmente as conservas alimentícias estão espalhadas por cinco classes e dezeseis artigos da pauta:
As de carne na l.ª classe;
As de peixe e mariscos na 3.ª classe;
As de feculas na 9.ª classe;
As de especiarias na 10.ª classe;
As de fructas e hortaliças na ll.ª classe.
Na proposta que temos presente, sem prejuízo, antes com vantagem para às industrias, para o commercio e para o fisco, são todas incluídas na 9.ª, e só num artigo, o n.º 268.
Os mais rudimentares conhecimentos da missão do verificador habilitam para uma inteira comprehensão das vantagens de tal simplicidade.
Acontece, por exemplo, apparecerem com frequência nas caixas, submettidas a despacho com aquelle género de mercadoria, conservas de diversos productos. Sendo cada uma das qualidades taxada com direitos differentes, torna-se indispensável separar escrupulosamente os pequenos volumes, examinar com cuidado o conteúdo de cada um, sondar-o que representa prejuízo para o commercio os que são hermeticamente fechados e ainda muitas vezes, alem de todas estas demoradas operações de cuja execução depende o trabalho de contagem, é necessario fazer cálculos especiaes para deducção de taras, cuja percentagem é diversa para cada espécie de volumes.
Como é evidente, resultam de tudo isto demoras e embaraços, discussões e contestações que de todos é interesse evitar.
Mas, não obstante o grande melhoramento que para o fisco e para o commercio nos parece advirá do que deixamos apontado, uma outra vantagem de não inferior alcance se nos afigura existir na proposta.
Reúne ella numa só verba, o direito actual, acrescentado, quando o foi, da taxa complementar de 2 por cento ad calorem e do imposto addicional de 6 por cento. Esta conversão, alem de tornar promptamente exequível o serviço de contagem que hoje se encontra envolvido numa serie interminável de operações, de excepções e de difficuldades, que estonteiam o contador e o sujeitam a extraordinária responsabilidade, consegue tambem uma considerável diminuição no trabalho do verificador, que fica assim dispensado de descriminar no bilhete de despacho, as verbas sobre que recaem ou deixam de recair os impostos addicionaes.
Vem aqui a propósito, visto que nos propozemos reunir todos os subsídios para completa apreciação da proposta, apresentar, antes de proseguirmos nas considerações que temos a fazer ainda, uma
Relação de todos os artigos da pauta em vigor, com o numero que corresponde a cada artigo, unidade para o direito, direito actual, e direito total com inclusão da taxa complementar de 2 por cento, e do imposto de 6 por cento addicional.

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(a) O bacalhau. 37,12.

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Proseguindo nas considerações que interrompemos para inserir o mappa que acabamos de intercalar na presente exposição e que era indispensável para elucidação da proposta, devemos insistir ainda na grande vantagem que resultará da incidência de um único direito sobre as mercadorias que transitam pelas alfândegas. Vindo este principio invariavelmente estabelecido nas pautas submettidas ao nosso exame, entendemos da máxima utilidade tornar bem saliente que só por leis especiaes promulgadas, como já dissemos, no intuito de acudir momentânea e transitoriamente a dificuldades financeiras, tem sido prejudicada tão sensata como salutar idéa. Mas entre nós é uso tambem invariavelmente estabelecido tornarem-se permanentes e definitivas todas as medidas de caracter interino e transitorio e disso tem resultado o lastimável complexo de formalidades e operações, que converteram o serviço interno aduaneiro, que bom seria simplificar sempre, na sciencia que hoje são obrigados a professar todos os que se occupam dos negócios das alfandegas.
Assim, postergando o pensamento que presidiu á elaboração das differentes pautas, crearam-se, como vimos na resenha que fizemos, addicionaes aos direitos e taxas complementares ad valorem, transtornando-se gravemente o movimento e expediente das casas fiscaes, embaraçando se as transacções do commercio, aggravando-se os já em muitos casos excessivos direitos fiscaes, augmentando-se às industrias a protecção em algumas hypotheses pouco justificáveis, e finalmente prejudicando-se seriamente a importação das matérias primas.
Em nome da imperiosa necessidade de crear receita de fácil cobrança e que não offerecesse grandes resistências têem sido decretados successivamente diversos impostos indirectos, cujo producto se calculou logo com approximação notável, mas cujos resultados económicos não foram devidamente apreciados.
Decretando-se, de 1841 a 1802, addicionaes de 5, 7 e 10 por cento sobre os direitos de importação, desde essa epocha até á actualidade, só no periodo decorrido de 1860 a 1873, cobrámos, nas importações, unicamente os direitos estabelecidos na pauta. N'este ultimo anno foi promulgada a lei que auctorisou o governo a cobrar a taxa complementar de 1 por cento, sobre o valor das mercadorias, a qual, em 1880, subiu a 2 por cento, sendo finalmente, em 1882, decretado o imposto de 6 por cento, addicional aos direitos.
Assim, temos promíscua e simultaneamente era execução dois systemas antagónicos, sustentados e defendidos por escolas diversas. Com direitos ad valorem, incidem nas mercadorias direitos especificos por unidade, peso ou medida, o que representa a necessidade, para se realisarem os despachos, de pesar, medir ou contar todos os géneros e productos, e seguidamente, quando o despachante não dê o valor jurado, de examinar com minuciosidade e reflexão as facturas para as indagações sempre difficeis do valor de cada artigo sujeito á classificação do verificador.
D'isto advém, como não póde deixar de advir, sejam quaes forem os esforços empregados para a evitar, enorme morosidade no expediente, que todos desejam rápido e simples, attribuindo exclusivamente á responsabilidade dos funccionarios aduaneiros o que principalmente se deve às disposições das leis.
À taxa que se chama complementar chega, na importação de certas matérias primas, a representar cinco e seis vezes o direito principal, como acontecia, por exemplo, com o algodão em rama, que, pagando pela pauta O,5 réis por kilo, deve de taxa complementar 2,8 réis!
É, porém, justo mencionar que o próprio auctor da lei que creou a taxa complementar, tanto reconheceu os inconvenientes resultantes da execução da mesma lei, que em 1879 nomeou uma commissão especial a que presidiu, e que devia elaborar uma reforma das pautas, sendo uma das bases da reforma a encorporação da taxa nos direitos que se estabelecessem. Concluiram-se os trabalhos d'essa commissão e imprimiu se um projecto de nova pauta, mas nada chegou a ser submettido á apreciação do parlamento por haver mudado a situação política.
Depois disto cada vez se tem accentuado mais o mal a que acima nos referimos, de não ser applicado á importação um imposto único e esse especifico. Do reconhecimento

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D'esta necessidade nasceu sem duvida o pensamento que presidiu á organisação da proposta que estamos analysando.
Muito se tem discutido se mais convém taxar, com direitos estatísticos, as matérias primas importadas, ou se, pelo contrario, é mais vantajoso conceder-lhes inteira uberdade de entrada com isenção completa de direitos.
Sustentam os partidários do primeiro systema que os direitos estatísticos sendo, como são, geralmente exíguos, não tolhem nem difficultam a importação, ao mesmo tempo que obrigam a fiscalisar com maior cuidado a entrada das mercadorias, verificando-se o seu valor e quantidade, e obtendo-se elementos sempre vantajosos e necessários para os trabalhos da estatística, cuja utilidade não póde ser contestada. Em contrario defendem os partidários da liberdade e isenção completas, a opinião de que os alludidos direitos, produzindo pequena receita, não chegam sequer para remunerar os funccionarios reclamados pelas minuciosas averiguações inherentes ao serviço do despacho, e ainda de que taes imposições, por serem mínimas, não deixam de onerar as matérias primas com todos os encargos representados pelas demoras de verificação, e pagamento de serviço de trafego, que indubitavelmente embaraça a importação dos elementos indispensáveis ao exercício das industrias nacionaes.
Não pretendemos apreciar ou discutir agora esta questão de- princípios, nem ainda investigar qual das opiniões será mais vantajosa e favorável, em presença da nossa situação económica. Devemos entretanto reconhecer que, estando, como já dissemos, dependente das estipulações dos tratados em vigor, a elaboração da proposta submettida ao nosso exame, e que sendo pelos mesmos tratados convencionada a liberdade de importação, em Portugal, de muitas mercadorias, não podia o auctor da proposta deixar de acceitar como regra geral este principio, a menos que não desejasse fazer trabalho totalmente afastado das precisas- condições de applicação pratica, e cheio de innumeros convenientes, que maior anarchia viriam ainda introduzir no serviço de verificações.
Assim, vemos na proposta, com a designação de livres, os seguintes artigos:
Animaes vivos não especificados;
Pérolas;
Despojos e productos de animaes não especificados;
Lã em rama;
Lã artificial ou de trapo;
Ourelos e trapo;
Casulos;
Desperdícios de tear e borra de seda;
Pannos para peneiras;
Algodão em caroço ou em rama;
Fios para tratamento de feridas;
Madeira em bruto e folhas para marcenaria;
Cortiça em bruto, limpa ou preparada;
Lenha, carvão e serradura;
Minérios;
Enxofre em bruto ou refinado;
Matérias primas para construcção e para as artes;
Carvão de pedra ou de coke;
Mineraes em bruto não especificados;
Gommas;
Vidro e crystal quebrados;
Oiro em bruto, pó ou objectos quebrados;
Oiro em moeda;
Prata em bruto, pó e objectos quebrados;
Prata em moeda;
Ferro em metralha;
Aço em metralha;
Cobre puro, bronze e ligas análogas, fundido e em metralha ;
Cobre puro, latão, bronze e ligas análogas, em moeda, com curso legal;
Chumbo em liga com antimonio;
Estanho fundido e laminado em bruto e em metralha;
Estanho em liga para soldar;
Zinco fundido, laminado em bruto e em metralha;
Antimonio metallico simples ou sulphurado;
Azougue ou mercúrio;
Metaes não especificados era bruto;
Ovos;
Forragens;
Plantas e sementes para cultura;
Resina commum, colophana, terebinthina grossa, lacca, sangue de drago, alcatrão, breu e pez;
Óleos fixos concretos;
Óleos voláteis de terebinthina ;
Cautehue e gutta-percha;
Sementes oleosas não especificadas;
Matérias seccas para as artes;
Matérias filamentosas vegetaes;
Matérias e productos corantes, bromio, iodo e phosphoro;
Acido arsenioso;
Acido acético;
Azotato de soda;
Carbonato de soda natural;
Borato de soda;
Caixas de reagentes para estudo ;
Espoletas de mineiro;
Aparas, retalhos e trapo para massa de papel;
Gelo;
Adubos para agricultura;
Redes de pesca;
Matrizes para typos;
Gravuras de madeira stereotypadas em metal;
Atlas, mappas, gravuras, estampas, desenhos e musicas;
Livros brochados;
Tela para pintura;
Modelos de machinas, de apparelhos ou instrumentos, de construcção, etc.;
Embarcações a vapor de mais de 100 metros de arqueação ;
Cordame velho para desfiar.
Em alguns dos artigos genéricos que acabamos de enumerar estão comprehendidos muitos productos que actualmente têem inscripção especial, sem vantagem alguma para o serviço. Assim, no dizer «despojos e productos de animaes não especificados» estão incluidos: pergaminho em bruto, pelles em desperdícios, raspas e retalhos, cordas em bruto, pennas em bruto, dentes não especificados, ossos em bruto, unhas em bruto, nervos, tripas em folhas, sangue secco, sebo em bruto, ovos, albumina secca, coral em bruto, madrepérola em bruto, tartaruga em unhas, barba de baleia em bruto, pescarias não especificadas. Outro tanto acontece no dizer «Matérias e productos corantes», em que estão englobados muitos productos animaes, vegetaes e mineraes, que fastidioso seria enumerar.
Em nenhuma das pautas anteriores foi alargada, como nesta, a liberdade de importação das matérias primas indispensáveis às industrias portuguezas. E esta, a nosso ver, uma protecção bem mais útil e efficaz do que o favor resultante das taxas exageradamente proteccionistas.
Todas as industrias reclamavam a liberdade de entrada do carvão de pedra e do coke, e, sem perda ou prejuízo dos interesses do thesouro, lhes foi concedida essa, liberdade, que de ha multo estava naturalmente indicada numa pauta pela qual eram livres matérias primas de insignificante valor e até productos fabricados. Da necessidade de crear receita proveiu a imposição de direitos sobre o carvão de pedra, que na actualidade é, sem duvida, a mais valiosa das matérias primas; mas os resultados nocivos

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que d'esse tributo resultam para a industria são tantos e taes que o auctor da proposta não hesitou em o extinguir, empregando todavia os meios precisos para compensar o estado de qualquer desfalque nos seus rendimentos.
Para mais completa apreciação deste ponto da proposta que examinamos, parece-nos conveniente apresentar a nota das quantidades de carvão, importadas durante os últimos seis annos, e bem assim das importâncias restituídas durante o mesmo período pelo carvão embarcado para consumo de navios a vapor.
É o que se vê dos seguintes mappas:

Quantidades e direitos de carvão de pedra despachado para consumo nas alfândegas do continente e das ilhas adjacentes nos annos de 1880-1885.

[Ver mapa na imagem]

Restituição de direitos por carvão de pedra embarcado para fornecimento de embarcações de vapor nos annos de 1880-1885.

[Ver mapa na imagem]

Abatidas nos rendimentos mencionados no primeiro mappa as importâncias restituídas e que constam do segundo, foi a receita effectivamente arrecadada em:

[Ver mapa na imagem]

o que equivale em numeros redondos ao rendimento medio de 84:000$000 réis annuaes. Suppondo mesmo que se não deve considerar a menor importação realisada nos três primeiros annos, e calcular em 100:000$000 réis a media dos tres ultimos, de sobejo é compensada a perda desta receita pelo augmento, aliás insignificante, introduzido em outros artigos, como adiante indicaremos. Demais, alem dos inconvenientes economicos que podem provir de taxar tão. importantissima materia prima, grandes embaraços e é complicações resultam do trabalho indispensavel á regularidade do serviço das restituições, que a lei auctorisa e que não podem deixar de considerar-se justas.
Incontestavelmente é o imposto ad valorem o mais equitativo. Sendo proporcional ao valor dos géneros, não dá em theoria logar aos absurdos que a respeito de muitas mercadorias resultariam na pratica dos direitos específicos Não é, porém, menos certo que, sendo o valor dos objectos de commercio geralmente muito variável e dependente de innumeras circumstancias, que nem sempre ë possível apreciar com a rapidez inherente ao acto de despacho e com a segurança reclamada pelos interesses do fisco, se torna complicada e às vezes quasi inexequível a applicação justa do imposto ad valorem que, em taes casos, inevitavelmente conduz á duvida, na qual são frequentes as contestações, quando se não dêem, o que é peior ainda, fraudes e abusos que tanto podem prejudicar o commercio como o thesouro, ao mesmo tempo que estabelecem desigualdades injustificaveis no tributo.
De sobejo tem a pratica demonstrado quanto são improfícuos os direitos ad valorem. Reconhecendo esta verdade, todos os paizes os substituíram já, tanto quanto têem podido, por taxas especificas. Da pauta hespanhola, por exemplo, desappareceu completamente este systema de imposto.
Assim o entendia já, como vimos, o auctor da pauta de 1837, e assim o julgavam tambem em 1844 os verificadores da alfândega de Lisboa, a quem o governo, pela portaria de 4 de dezembro, mandou ouvir sobre «se convinha que os direitos de importação fossem em todo ou era parte substituídos por direitos ad valorem», e os quaes responderam unanimemente, baseando-se em numerosos argumentos suggeridos pela theoria e pela pratica, que da adopção de tal systema resultariam quebra sensível nas receitas publicas e prejuizos e embaraços para o expediente das alfandegas e para o movimento do commercio. Outro tanto disseram em 1873 os mesmos funccionarios das alfandegas de Lisboa e Porto, ao serem consultados ácerca de uma proposta de pauta, que foi presente às cortes, e na qual appareciam, como em logar competente indicámos, taxadas com direitos ad valorem numerosas mercadorias.
Actualmente ninguém põe já em duvida o que a opinião dos homens competentes tem mais de uma vez sustentado e a pratica continuada em tantos annos demonstrou e confirmou tão categoricamente.
A proposta que analysámos seguiu evidentemente esta ordem de idéas. Restringindo, tanto quanto pôde, o numero de taxas ad valorem, manteve todavia uma excepção que não existe na pauta hespanhola, mas que é indispensável para evitar desigualdades gravosas na applicação do tributo, que incide sobre certa classe de mercadorias.
Assim conservou as referidas taxas nos artigos que abrangem generalidades ou agrupamentos constituídos por numerosos e diversos productos de pouca importância fiscal o de valor muito dissimilhante, como acontece com aquelles que se incluem nos dizeres: «despojos e productos de animaes, não especificados, em obra; suecos e materiaes vegetaes, não especificados; productos chimicos, não especificados; substancias para medicina, perfumaria, etc.»
Com effeito, tributar com direitos específicos todos os variadissimos productos que estão comprehendidos nas generalidades que exemplificámos, tornaria indispensavel descrevel-os e especificai-os minuciosamente, o que, alem de pouco pratico, era sem duvida extremamente difficil. A não ser assim, e taxando com um só direito especifico cada um dos grandes agrupamentos, equivaleria a impor direitos prohibitivos a alguns productos, e diminutos a outros, sem vantagem para a receita do thesouro, e com perturbação grave para o commercio e sobretudo para as industrias.
Considerando estes inconvenientes que, em nossa opinião, justificam a existência excepcional das taxas ad valorem, geralmente condemnadas, e respeitando tambem as disposições dos tratados em vigor, reconheceu por certo o auctor da proposta a necessidade de conservar ainda na pauta de importação, com aquella taxa, trinta e três dos quatrocentos e quarenta artigos que a compõem.
Pela actual pauta são as madeiras para construcção (tábuas serradas, vigas, ripas, etc.) tributadas com direitos especificos. Na proposta que apreciamos foram esses direitos r convertidos na taxa de 20 por cento ad valorem.
E esta conversão justificada pelo ex-ministro da fazenda, o sr. Hintze Ribeiro, no relatorio que antecede as suas propostas de fazenda, com a facilidade que d'ella ha de resultar para o expediente das alfândegas e com a vantagem de pôr termo às numerosas fraudes, que repetidas vê-

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zes se têem dado no importantíssimo despacho das madeiras de que se trata, - fraudes, sem duvida, difficeis de evitar, subsistindo o systema da medição a bordo, ou o da medição em terra, como actualmente se pratica. Alem d'estas rasões, que effectivamente justificam o procedimento d'aquelle ministro, outras existem que não devem deixar de ser consideradas e que, a nosso ver, confirmam plenamente a conveniencia da transformação operada.
Pagam as tábuas serradas o direito de 10, 20, 30 ou 40 réis, por metro de comprimento, conforme a sua espessura for de 2,75 centimetros, de 5,50, 8,25 ou mais, isto é, para a imposição de menor ou maior taxa, attendeu-se ao comprimento e espessura e desprezou-se por completo a largura, não obstante representar ella um factor que muito póde fazer variar o valor de tal mercadoria. Esta fórma de tributar serve, como facilmente se comprehende, de incitamento ao emprego de meios de que resultam prejuízos para a solidez das construcções a que se destina a madeira importada, mas que tornam mais avultados os lucros dos importadores, que para isso, como o demonstra a estatística, introduzem quasi exclusivamente no mercado tábuas de espessura extremamente reduzida.
Outro tanto se dá com as vigas. Pagando 100 réis por metro de comprimento, sem que para a fixação d'esta taxa se considerem as dimensões das faces, é evidente que os importadores só propõem a despacho vigas com as maiores dimensões de espessura e largura, que, depois de desembaraçadas pela alfandega, mandam serrar, conseguindo por este meio evitar em parte o pagamento do que realmente devem pelos direitos de entrada do genero que expõem á venda. Alem d'isso ninguem desconhece os inconvenientes que para a duração e resistencia das madeiras resultam dos cortes, que lhes dividem, ao correr das fibras, as camadas internas, e que as tornam improprias para construcções solidas.
Todas estas rasões aconselham a mudança em direitos ad valorem das taxas especificas que actualmente existem para a madeira em a nossa pauta de importação. Demais, importando-se sempre, ou quasi sempre, de tal mercadoria carregamentos completos, torna-se necessário, caso a verificação se faça sobre agua, empregar numeroso pessoal, pois que é indispensavel ter um verificador a bordo de cada navio á descarga. Fazendo-se a medição em terra, como ultimamente se tem praticado, são inevitáveis os perigos de desvios consideraveis, o pejamento dos caes e a obrigação, para os importadores, de excessivas delongas e despezas de remoção, às quaes ainda se addiciona a remuneração de serviço extraordinario a verificadores e reverificadores, constituindo tudo isto uma serie de encargos pesadissimos ao commercio.
Applicando um direito ad valorem á importação d'esta mercadoria, facilita-se o acto do despacho ao mesmo tempo que se difficultam os desvios, sem que se levantem os inconvenientes que em muitos casos acompanham tal systema de imposto.
As circumstancias especiaes d'esta importação não dão logar á simulação de valores falsos, de que resulte prejuízo para o thesouro, pois, sendo a maior parte das madeiras estrangeiras que consumimos procedentes da Suecia e da Noruega, e sendo a madeira nestes paizes oficialmente classificada, e marcada, póde com precisão ser conhecida a qualidade que é sem duvida a principal bago para a apreciação do valor, o qual por contraprova se póde tambem conhecer pela importancia do seguro do frete e do manifesto.
Taes são, a nosso ver, as rasões que, alem dos preceitos dos tratados, justificam a existencia das taxas ad valorem em alguns dos artigos de maior importancia fiscal incluídos na pauta proposta para a importação.

Tendo percorrido e apreciado nos seus lineamentos geeraes a parte da proposta que respeita á imposição de direitos d e entrada de mercadorias estrangeiras, e havendo apresentado os motivos principaes que em nosso parecer a tornam recommendavel e digna de ser transformada em lei, cumpre-nos ainda encaral-a sob o ponto de vista tambem importantíssimo da receita que a sua execução produzirá, e da defeza que dispensa aos interesses legítimos da industria nacional.
Pelo que se refere a esta ultima parte, como muito bem diz no seu eloquente relatorio o conselho superior das alfandegas, não foi introduzida innovação alguma, que deixe abandonada á esmagadora e invencível concorrencia estrangeira qualquer industria portugueza, cuja existencia e futuro desenvolvimento reclamem um discreto proteccionismo.
Obedecendo a este pensamento e respeitando aquella necessidade commum a muitas das nossas industras que, longe de prosperar, esgotam as melhores das suas forças na lucta que sustentam entre si para obter meios de prolongar o attribulado viver, foram por certo dirigidos e organisados os trabalhos de que saiu a proposta que discutimos.
E rasoavelmente ninguem poderá qualificar de insensato tal procedimento.
Suffocadas por necessidades que não conseguem vencer, sentindo os irremediaveis e lamentaveis effeitos da falta de ensino profissional largamente ministrado aos operarios, não podendo obter capital senão mediante juro exorbitante ou pelos fabulosos preços que a usura exige, e gosando ainda ha poucos annos do beneficio que para a circulação dos seus productos provém dos promptos e rapidos meios de transporte, têem as industrias portuguezas, ainda que pouco, desenvolvido a sua actividade e melhorado os seus artefactos.
E este resultado, que justifica a prudência com que foi, sob o ponto de vista da protecção ás industrias, elaborada a proposta da pauta de importação, surprehende tanto mais quanto é certo que os nossos industriaes, alem de todas as difficuldades que deixamos summariamente indicadas, possuem, com raras excepções, uma decidida tendência para não abandonar a rotina, na gerencia de muitas emprezas, que têem o dever e a possibilidade de desenvolver largamente.
Entretanto, porque da indolencia de alguns rotineiros provém o estacionamento deploravel de certas industrias não é justo nem conveniente que entremos, sem respeito pelos interesses legítimos e dignos de protecção, num caminho de amplas liberdades que tragam a ruina e o aniquilamento completo áquelles que ainda têem o patriotismo de empregar os seus capitães no desenvolvimento do trabalho nacional.
Basta este serviço relevante para justificar qualquer favor que a pauta, lhes dispense, e para cuja apreciação, como para calculo das futuras receitas do estado, convém examinar e estudar os artigos de maior importancia fiscal, enumerando-os segundo a ordem das sommas que produzem.
Para isso apresentamos o seguinte:

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Mappa das mercadorias que pagam direitos de importação superiores a 100:000$000 réis calculando este rendimento pelos resumos estatísticos de 1884

[Ver quadro na imagem]

Do exame d'este mappa, isto é, da comparação do rendimento produzido pela importação de mercadorias cujos direitos de entrada excedem annualmente 100:000$000 reis, com aquelle que se presume será arrecadado, approvando-se os direitos propostos, resulta o conhecimento de que as receitas do estado terão uma quebra de 51:000$000 réis. Mas este calculo está sujeito a correcções que convertem em augmento real a perda que apparentemente advirá da adopção das novas taxas.
Têem os impostos indirectos dados limites que não podem ser ultrapassados impunemente. Ainda quando se encarem sob o ponto de vista puramente fiscal, é preciso mantel os em condições de não affectarem o consumo dos generos sobre que recaem, ou de não convidarem á fraude aquelles a quem pertence o seu pagamento.
De sobejo tem a pratica demonstrado entre nós quanto é inconveniente a elevação irreflectida de certos direitos fiscaes, de cujo exagero desmedido têem resultado quebras importantes em receitas, que se julgava fazer subir, augmentando como se augmentaram as taxas, sem respeito pelos mais rudimentares preceitos a que devem obedecer taes medidas de administração.
Assim em 1879 foi decretado maior imposto para o tabaco; mas a receita que se esperava ver attingir quantia superior á que até ali produzira, decresceu por fórma que a todos os espiritos chegou logo a convicção de que o contrabando, exercido em larga escala, desviava dos cofres publicos sommas avultadissimas, sem que para lhe oppor embaraços valessem meios alguns de repressão. E com effeito, não diminuindo, como não diminuiu, o consumo do genero, é evidente que só a fraude podia operar este decrescimento no principal rendimento das nossas alfandegas.
A reducção agora proposta na taxa do tabaco em folha pretende, sem duvida, emendar esse funestissimo erro. D ella resulta, como vimos, uma diminuição de receita na importância de 130:000$000 réis; mas essa diminuição, que devemos considerar apenas apparente, é, a nosso ver e pelas rasões apresentadas, largamente compensada com o decrescimento real do numero dos descaminhos.
N'estas considerações se baseou por certo o auctor da proposta para baixar a 1$600 réis por kilogramma o direito, que actualmente incide sobre aquella especie de tabaco. E effectivamente, manter as taxas elevadas que presentemente a sobrecarregam, equivalia a estabelecer conflicto com todas as indicações aconselhadas pela rasão e pela pratica e a aggravar os males que tanto têem desfalcado a receita proveniente da importação d'aquelle producto, que é tambem materia prima para uma industria digna, como qualquer outra, de protecção e defeza.
Acceitas todas estas considerações, impunha-se naturalmente a cautelosa diminuição proposta, a qual, desde que se baixam tambem os direitos a alguns tabacos manufacturados, se torna indispensavel para que seja mantida a protecção que desde a sua infancia, em 1864, acompanhou e fez prosperar entre nós a industria da manipulação do genero de que se trata.
Do que deixâmos exposto póde, a nosso ver, concluir-se, que o apparente decrescimento indicado pelo mappa comparativo, nesta parte das receitas aduaneiras, se converterá dentro de curto praso em apreciável e vantajoso augmento para os cofres do thesouro.
No assucar a diminuição do rendimento, constante do mappa que apresentâmos, não tem importancia alguma. Arredondando o direito actual e desprezando os minimos, obtem-se da somma d'aquelle com os addicionaes existentes a taxa de 97,4 réis, que, pela proposta, se converte nos dois direitos de 90 e 100 réis. Considerando ainda que o assucar será classificado segundo a procedência e calculando, em harmonia com a divisão que se propõe, sobre a importação do Brazil e de outros paizes a receita a arrecadar, chega-se ao resultado indicado.
É entretanto dever nosso averiguar as causas que dictaram a modificação projectada e inquirir os fundamentos com que póde defender-se tal medida, cujo alcance economico não é licito pôr em duvida e cuja execução prende intimamente com a importação de um genero que, segundo a estatística official, occupa o segundo logar na lista dos que levam aos cofres publicos mais avultadas receitas. Para tal averiguação é preciso não esquecer quanto nos ultimos annos se transformaram as condições de producção do genero a que nos referimos, e quaes os resultados que para o nosso mercado advieram da concorrencia que, ao assucar oriundo da America do Sul e proveniente da canna, levantou a Europa com a fabricação do assucar de beterraba.
O Brazil, preso á rotina dos velhos processos usados nos engenhos, de que ainda continua a aproveitar-se para a exploração da grande riqueza dos seus cannaviaes, não póde acompanhar a industria européa na applicação dos modernos apparelhos e machinas de Dérosne e outros, que operaram uma profunda transformação nos methodos de

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fabrico e nas qualidades do assucar fabricado. Da creação dos novos typos d'este genero que a Europa introduziu no consumo de todos os paizes resultou naturalmente a necessidade de novas classificações, visto que as antigas, que dividiam os assucares em mascavados ou mascaves, brancos e areados, já não comprehendiam todos os productos fabricados, e só poderiam servir para o assucar brazileiro.
Diversas nações alteraram neste ponto as suas pautas de importação. Entretanto, pouco tardou que a pratica demonstrasse que essas alterações estavam bem longe de corresponder ao fim que se tivera em vista, pois que, na maioria dos casos, se afastavam enormemente do valor do producto nos mercados, e davam portanto logar a não pequenas perturbações economicas. D'aqui se originou a idéa da convenção celebrada, em 8 de novembro de 1864, entre a Hollanda, Belgica, Franca e Inglaterra, e na qual estes paizes acordaram e se obrigaram a adoptar, para a classificação dos assucares, os typos de uma escala, que ficou sendo conhecida pela denominação de escala hollandeza.
Por essa escala dividiam-se as qualidades d'aquelle producto em typos numerados, os quaes se classificaram segundo a sua cor e força saccharina.
Deve notar-se que, havendo sido aquelles typos organisados com assucares obtidos pelos modernos processos, isto é, com assucares de aspecto crystallino, eram por tal motivo muito dissimilhantes e não podiam servir para a classificação segura dos assucares do Brazil, que são mais amorphos, humidos e amelaçados.
Até 1856 Portugal só importou do Brazil o assucar não refinado ou em bruto. Dos mercados europeus recebia unicamente o refinado e crystallisado de qualidade superior, como o pile em fórmas ou cortado em cubos e o candi.
Desde essa epocha, porém, começaram a apparecer no nosso mercado, procedentes, primeiro das Mauricias, e seguidamente de França, da Allemanha, da Hollanda, etc., diversas marcas d'aquelle genero, entre as quaes algumas havia tão depuradas, e com tão perfeito aspecto que, sem nenhuma outra operação, podiam entrar directamente no consumo.
Este facto assustou a industria nacional de refinação e embaraçou gravemente o commercio, que se viu tolhido pelas duvidas que os verificadores suscitavam a cada passo, considerando refinados muitos assucares que realmente não haviam soffrido tal operação. Em presença disto foi pelo governo julgada insufficiente a classificação estabelecida para este genero, resolvendo-se, por carta de lei de 27 de dezembro de 1870, que da pauta se eliminassem os dizeres: "Assucar não refinado, ou refinado, areado ou por qualquer modo preparado," e se adoptassem os typos da escala hollandeza, com as seguintes taxas:

1.°, assucar n.ºs 1 a 12 dos typos hollandezes .... kilogr. 75 réis
2.°, assucar n.ºs 13 a 15 dos typos hollandezes .... kilogr. 85 réis
3.°, assucar n.° 16 em diante dos typos hollandezes ....kilogr. 95 réis
Assucar refinado .... kilogr. 125 réis

N'essa epocha ainda a nossa maior importação se fazia do Brazil, d'onde recebiamos annualmente 10.000:000 kilogrammas de assucar, emquanto de outras procedencias importavamos apenas 3.000:000.
Por tal motivo foi o conselho das alfândegas incumbido de organisar, era conformidade com a lei, os typos reguladores do despacho; e, desempenhando-se do encargo, formulou duas series de typos: uma de assucares crystallisados, a que deu o nome de assucares das Mauricias, e outra constituida pelos typos do Brazil.
Bem depressa se manifestaram as desvantagens de tal systema de classificação. Dos embaraços praticos, das reclamações e das difficuldades de applicação que elle provocou, dão larga noticia os documentos publicados durante o periodo era que se manteve em vigor; pois havendo sido apresentados desde 1854 a 1871 unicamente vinte e seis recursos por contestações originadas no despacho do assucar, logo nos dois primeiros annos em que vigorou a lei a que nos referimos, isto é, até o fim de 1873, foram publicadas cento e quatro resoluções esclarecendo duvidas, e decidindo contestações occorridas no despacho de tal genero.
No anno immediato cresceram as difficuldades, augmentou o numero de contestações, e por conseguinte o numero de injustiças relativas, que dia a dia vexavam o commercio. Em taes circumstancias foi, com geral applauso, revogada por lei de 9 de abril de 1874 a legislação, que em dezembro de 1870 mandára adoptar os typos da escala hollandeza, sendo inscriptos na pauta os dizeres: - Assucar refinado; assucar não refinado.
Convém advertir que no anno do 1874 já a importação do assucar procedente dos mercados europeus se avantajava á que realisavamos do Brazil, como se reconhecerá do mappa que abaixo inserimos.
Paga actualmente o assucar refinado 125 réis, e o não refinado 90 réis.
Exprime por certo esta differença de direitos o mesmo pensamento fiscal e protector, que se observa em todos os artigos da pauta a que fui possivel applical-o. Com ella pretendeu, sem duvida, a lei, não só distribuir com equidade o encargo que pesa sobre a mercadoria, accommodando-o ao valor do genero taxado, mas proteger tambem o trabalho nacional; pois ao mesmo tempo que alliviou a materia prima para a industria da refinação, tributou pesadamente o producto que se importar já prompto para entrar no consumo.
Não conseguiu entretanto tal distincção evitar na pratica as difficuldades que temos enumerado. Dentro de pouco tempo se reconheceu a insufnciencia da classificação decretada, porque os dizeres "refinado e não refinado", que vulgarmente exprimem a maior e menor pureza do assucar, nada significam para os effeitos fiscaes, em consequência dos resultados obtidos pelos modernos processos de fabricação.
Com effeito, um assucar que em relação a outro menos limpo póde ser considerado refinado, deixará de o ser comparado com um terceiro, que se apresenta em mais completo estado de pureza, não existindo por isso grau de depuração, convencional ou absolutamente determinado, pelo qual deva ou possa aferir-se o typo do assucar refinado a que se refere a pauta.
Assim, emquanto taes dizeres se interpretaram como significando o differente estado de pureza dos assucares, não cessaram as indecisões e os embaraços no despacho. A industria de refinação declarava-se prejudicada e o commercio embaraçado no exercicio das suas transacções. Para remediar e evitar estes males requereram ao governo em 1879 diversos negociantes e armadores de navios, que fosse estabelecido como base para o direito do assucar o limite do typo n.° 20 da escala hollandeza.
Por essa epocha expediu o conselho geral das alfandegas uma consulta, na qual sustentava que se devia, como fizera a Hespanha, onde se haviam dado as mesmas difficuldades, fixar uma taxa unica para o assucar; e, emquanto superiormente se não providenciasse para que tivessem um termo as duvidas constantemente suscitadas e as interminaveis divergencias de classificação, decidiu, comforme consta do seu relatório de 1879, que assucar refinado, para applicação do respectivo direito de 125 réis por kilogramma, se considerasse só o que houvesse sido effectivamente submettido aos processos de refinação e possuisse as caracteristicas e especiaes qualidades, que resultam de tal operação, realisada como se realisa em Portugal, e por estes principios decidiu os diversos recursos.
A refinação no nosso paiz está longe de obter os resultados que nos centros productores de assucar se conseguem

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1924 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

pelos modernos processos de extracção. Consiste elle em reduzir aquelle genero ao estado amorpho, deixando-lhe uma parte de melaço ou pó incrystallisavel, e tornando-o; por vezes alvo e expurgada de materias estranhas. Não acontece assim com os methodos usados presentemente em todos os paizes, com excepção do Brazil, nos quaes se produz o assucar todo em crystaes e completamente distincto do que provém das nossas refinações.
Em consequencia desta diversidade de caracteres e d'aquella resolução do conselho geral das alfandegas ficou; desprotegida a industria nacional, pois desde 1879 até o presente, nenhum assucar foi considerado refinado alem do pouco que se apresentou com as qualidades obtidas pela refinação portugueza; e como tal processo de refinação só é usado entre nós, deixou de applicar-se o direito de 125 réis, não obstante importarmos dos mercados europeus, enormes quantidades de assucar - quasi todo de beterraba - que, sem soffrer operação alguma, é logo introduzido ao consumo. De uma protecção gosa todavia aquella industria: é a que resulta do gosto do consumidor, que, era grande parte, prefere o assucar amorpho ao crystallisado, porque, alem da persuasão de que adoça mais, tem o paladar habituado ao sabor amelaçado, que a primeira d'aquellas qualidades possue accentuadamente.
N'estas circumstancias adopta a proposta que apreciâmos, nos artigos 255.° e 256.° da classe 9.ª, a classificação de "Assucar procedente do Brazil e assucar de qualquer outra procedencia estrangeira", o que, a nosso ver, simplifica a questão que, como acabâmos de demonstrar, é extremamente complicada e difficil de resolver.
Para o primeiro estabelece-se o direito de 90 réis, e para o segundo de 100 réis, desapparecendo a taxa de 97,4 réis, incluindo os addicionaes, que actualmente incide sobre o assucar não refinado.
Antes de proseguirmos nas considerações que vamos fazendo, apresentaremos, para intelligencia do que fica exposto e do que ainda temos a dizer, o seguinte mappa:

Quantidades, valores e direitos do assucar despachado para consumo nas alfandegas do continente do reino e ilhas adjacentes nos annos de 1843, 1851, 1861, 1871, 1881 e 1885

[Ver mapa na imagem]

a) Assucar refinado.
b) Os direitos foram calculados aproximadamente.

Importação de assucar do Brazil em toneladas metricas:

[Ver tabela na imagem]

A assucar não refinado do Brazil é o mais apropriado para materia prima da nossa industria de refinação. Apresentando qualidades diversissimas, desde o mascavo do Maranhão até o branco de Pernambuco, contém todo bastante melaço e subida percentagem saccharina. Entretanto, apesar do gosto do consumidor, que entre nós prefere, como acima dissemos, os assucares amelaçados, tem sido o do Brazil quasi por absoluto rejeitado nos mercados europeus, onde principalmente o assucar de beterraba lhe faz vantajosa concorrencia, por causa das condições desfavoraveis em que o elevado preço dos fretes e o estado de impureza em que é exportado o deixam chegar á Europa. Não podendo, como não póde, entrar no consumo sem demoradas operações de refinação, fica, em presença do que é oriundo de França, da Allemanha e da Hollanda, reduzido a simples materia prima para uma industria, que, embora relativamente pouco importante, merece alguma protecção.
Este facto justifica, a nosso ver, a fixação de um direito menor para o assucar precedente do Brazil, pois que assim se consegue preteger o trabalho nacional de refinação, ao mesmo tempo que se fornece um importante elemento de vida á nossa decadente marinha mercante, que insistentemente se queixa da falta de fretes, em retorno, d'aquelle imperio, desde que decresceu d'ali a nossa importação de assucar e que substituimos pelo café das nossas colonias o que lá iamos comprar. Alem d'isso, esta concessão feita ao Brazil póde habilitar-nos a encetar negociações para obter algum beneficio em favor da nossa exportação para aquelle imperio.
O assucar produzido na Europa pôde, sem duvida, com direito superior ao que se propõe para aquelle a que nos temos referido. Custando mais barato, pagando menores fretes e sendo produzido logo em condições de ser consumido, não lhe é desvantajosa a concorrencia do brazileiro, que, a não ser assim, em pouco tempo seria absolutamente rejeitado do nosso mercado, com prejuízo do commercio, e total aniquilamento da industria portugueza de refinação.
Não obstante o favor concedido a esta, appareceram, como é costume, reclamações de interessados, que não julgam sufficiente a differença proposta nos direitos do assucar de uma ou de outra procedencia. Assim, pela representação n.° 1, junta a este relatorio, diversos negociantes e refinadores, applaudindo a medida que se propõe, pedem que se inscreva um artigo pelo qual se tribute com 125 réis por kilogramma o "assucar refinado ou areado igual ao que se fabrica no paiz"; e defendem o pedido com o receio que dizem ter de que o Brazil se disponha a aproveitar a taxa reduzida de 90 réis, expedindo para os nossos mercados o seu assucar já areado ou refinado pelos processos usados em Portugal.
Afigura-se-nos, porém, que tal allegação não possue fundamentos acceitaveis, visto que o imperio brazileiro,

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1925

pelos motivos que expozemos, tem completa impossibilidade de tentar tal especulação. Para a realisar encareceria inevitavelmente o genero, que actualmente fabrica e exporta em estado impuro e incapaz de consumo immediato, e o qual, onerado com despezas que hoje o não sobrecarregam, chegaria aos mercados europeus em circumstancias de não poder luctar com o producto similar que a industria adiantadissima da Europa forneça por modico preço, e em excellentes condições de consumo.
Entretanto nenhum inconveniente vemos em que seja inscripto na pauta o dizer indicado pelos industriaes. Peio contrario tem essa inscripção a vantagem de socegar e tranquillisar os espiritos sobresaltados dos nossos refinadores, sendo, pelas rasões apresentadas, um artigo sem applicação pratica, e portanto sem consequencias economicas de especie alguma.
Depois do assucar é o trigo em grão o genero cuja importação maior receita produz.
Pagando de direitos e impostos addicionres 11,7 réis por kilogramma, fica, pela proposta, tributado com a taxa de 12 réis.
Houve, como se ve, arredondamento para a fixação do imposto; mas esse arredondamento é tão insignificante, que nada soffre com elle o consumidor, como nada lucraria se deixasse de se operar. Os 0,3 de real que abrangeu e que produzirão para o estado, mantida a actual importação, 63:000$000 réis, iriam cair inevitavelmente nas mãos dos intermediarios, que são os que mais lucram sempre com as alterações pouco sensiveis dos direitos das alfandegas.
E demais, continuando a agricultura nacional a queixar-se de falta de protecção, e a reclamar, em numerosas publicações, em artigos de imprensa, em conferencias dos seus homens mais competentes qualquer providencia que suste a invasão, que a suffoca, dos trigos dos Estados Unidos da America, não seria por certo bem recebida qualquer diminuição no direito do género a cuja importação ella attribue todos os seus males e desventuras. Do pequeno augmento proposto não lhe virá, porém, a nosso ver, remédio que a levante do profundo abatimento em que se encontra, porque, segundo cremos, as causas de tal decadencia não são unicamente as que a maioria dos lavradores invoca. Póde elle entretanto servir para demorar a agonia e adiar a morte de uma exploração agricola, que já, em epochas remotas, foi entre nós florescente, mas que hoje opiniões auctorisadissimas sustentam estar destinada a terminar e a ser substituida por outra mais adequada ás condições presentes dos nossos terrenos e que, pelo seu custo, esteja mais em harmonia com a situação dos mercados e com os interesses do consumidor.
Não podiam de certo ser attendidas completamente as exigencias de alguns agricultores, que chegam a, pedir direitos prohibitivos para a importação do trigo. É geral e commum a todos os paizes da Europa o mal que afflige a nossa cultura cerealifera, e todavia nenhum desses paizes tem na sua pauta e para aquelle genero direitos tão subidos como nós, o que prova, como em toda a parte se reconheceu já, que não basta a elevação das taxas para evitar a entrada dos trigos extraordinariamente baratos, que a America envia para o velho continente.
Segundo esta opinião, buscam alguns dos nossos lavradores mais intelligentes remediar por meios diversos os incenvenientes e os prejuizos, que outros menos esclarecidos desejam evitar prejudicando os consumidores. Para isso não pedem que se augmente o direito do trigo, mas que se baixe o da farinha estrangeira, que hoje não póde vir aos nossos mercados luctar contra o monopolio das emprezas de moagens, que são as que regulam os preços dos cereaes portuguezes, pagando-os por menos do custo por que lhes ficam os precedentes da America. D'aqui provém as grandes difficuldades em que frequentemente se vê o nosso agricultor, que é não poucas vezes obrigado a sacrificar o producto das suas colheitas, que ainda são importantes, e representam avultado capital.
N'estas circumstancias era sem duvida pouco acertado enjeitar aquelle ramo da nossa industria agricola a maiores contrariedades e desvantagens do que aquellas que lhe resultam, alem de outras causas, da concorrencia, americana e mais particularmente da preferencia que é dada á farinha dos trigos estrangeiros. Foi por certo este pensamento o que presidiu á elaboração da proposta, n'esta importantissima parte, que prende intimamente com a questão sempre grave da alimentação publica. Harmonisar os interesses dos agricultores com o dos consumidores seria a solução completa do problema; mas a existencia da industria das moagens, que tambem é importante, difficulta o emprego de meios energicos, porque, embora os seus effeitos sejam simultaneamente nocivos aos agricultores portuguezes e aos vendedores de pão, de quem o consumidor depende directamente, é certo que o capital n'ella empregado possue tambem direito a protecção e defeza.
Não é nossa intenção discutir com largo desenvolvimento esta complicadissima questão. Alem de não ser este o logar mais proprio, difficilmente o conseguiria a nossa pouca competencia. Precisávamos entretanto de averiguar os motivos por que se mantinha ou antes augmentava ligeiramente a taxa do trigo, que em Portugal e, como dissemos, superior á que se encontra nas pautas de todos os outros prazos da Europa, e de indicar os perigos e prejuizos que para a grande massa dos consumidores adviriam de serem completamente attendidas as exageradas exigencias de alguns dos nossos agricultores. Subindo com o arredondamento que referimos o direito do trigo, e baixando o direito da farinha, procurou evidentemente o auctor da proposta, se não evitar de todo as cansas de tantas reclamações, ao menos attenuar os males existentes, sem ferir interesses que, tenham os inconvenientes que tiverem, foram adquiridos legitimamente, porque os crearam e desenvolveram as disposições da lei.
N'estes termos e n'estas considerações vemos nós a justificação das alterações propostas, que, alem das vantagens indicadas, produzirão, segundo os calculos baseados na estatistica, um augmento de 63:000$000 réis na receita.

iiTamma, innian-io-sc
Segue-se o petroleo, cujo direito sobe a 60 réis por kilogramma, juntando-se 53,6 réis, que formam o direito actual e addicionaes respectivos, a taxa de 6,4 réis.
Era este augmento indispensavel para attenuar o deficit proveniente da liberdade concedida ao carvão de pedra, e póde esperar-se que, mantendo-se a actual importação, produza, approximadamenie 61:000$000 réis de receita.
No relatorio do conselho superior das alfandegas, publicado com a proposta, justifica-se cabalmente o procedimento adoptado n'este ponto. Effectivamente, não é aquelle producto substituivel na illuminação em que hoje tem emprego geral, e portanto póde suppor-se, com grande probabilidade, que o seu consumo se não retrahirá. Introducção clandestina tambem não deve receiar-se, porque a natureza da mercadoria se não presta a essas operações arriscadas. Afigura-se-nos por consequencia certa a receita calculada, sem que da sua cobrança resultem pesados sacrificios ao consumidor.
Ao milho foi augmentado o imposto do 0,7 de real, o qual, com a taxa actual o respectivos addicionaes, perfaz o direito proposto de 11 réis; e aos demais artigos enumerados no mappa que apresentâmos, ou se mantiveram as taxas que presentemente vigoram, ou se fizeram pequenos arredondamentos quando d'elles se viu não resultarem inconvenientes ao fisco, ao commercio, ou ás industrias, attendendo-se sempre com fundada rasão á receita que devera produzir as alterações projectadas na pauta, visto que se trata em geral de direitos fiscaes.
Continuando na apreciação dos artigos que maior receita produzem, apresentaremos agora o seguinte:

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Mappa das mercadorias, cujos direitos de importação cobrados annualmente, excedem a 20:000$000 réis, e são inferiores a 100:000$000 réis, calculados os direitos em vista dos resumos estatisticos do anno de 1884, e comparados com os da proposta

[Ver mapa na imagem]

Como se ve do mappa antecedente, calcula-se em cerca de 40:000$000 réis o augmento de receita que resultará da approvacão das novas taxas, apesar de se haver diminuido o direito dos charutos das proporções da redacção que se propõe para o tabaco em folha, e da differença para menos na madeira. Esta differença, porém, embora a comparação feita no mappa a indique na importancia de mais de 24:000$000 réis, parece-nos que não existirá, pois muito esperamos da substituição, em tal mercadoria, dos direitos fixos pelas taxas ad valorem.
Com o fim de proteger os géneros similares nacionaes elevou-se o direito da banha, do unto o do carbonato de soda secco; e reunindo-se em um os dois artigos porque os queijos são actualmente classificados em finos e ordinarios, propõe-se uma taxa que deve produzir um augmento de mais de 20:000$000 réis de receita. Alem d'esta vantagem para o thesouro é indispensavel que desappareca a distincção de queijos finos e ordinarios, visto que não ha regras definidas pelas quaes o verificador possa separar com segurança uma da outra qualidade.

Afigura-se-nos que temos dado uma idéa bastante clara do pensamento que presidiu á elaboração da pauta proposta para a importação. Havendo apresentado os elementos indispensaveis e mais importantes para a apreciação do trabalho que está submettido ao julgamento das cortes, julgámos ter evitado a quem desejar apreciar a proposta, a fadiga de um estudo minucioso e demorado que de certo não poderia dispensar para uma discussão especial e completa como reclamam sempre medidas economicas de tão largo alcance. Comparando, nos géneros de mais elevada importancia fiscal, o resultados dos direitos actuaes com o que se presume produzirão os que se propõem, fizemos os apanhamentos estatisticos precisos para que se possa avaliar seguramente as vantagens da medida sujeita á nossa consideração.
Do exame comparado da proposta e das representações que os industriaes portuguezes dirigiram ao conselho superior das alfandegas, e que foram publicadas no relatorio do ex-ministro da fazenda, reconhece-se que quasi todas foram attendidas no todo ou em parte. Outras, porém, se receberam depois de ter sido entregue ao parlamento o trabalho que apreciâmos.
Essas serão por nós incertas na presente exposição para que haja inteiro conhecimento das ligeirissimas objecções que no paiz levantou a modificação proposta na pauta.
Alem da que é assignada pelos negociantes e refinadores de assucar e á qual nos referimos em logar competente, appareceu uma (documento n.° 2) dos proprietarios das fabricas de moagem, pedindo a elevação do direito da farinha estrangeira a 19 réis por kilograrnma, isto é, a mais 3 réis do que a taxa actual.
Já dissemos que alguns lavradores pedem calorosamente que se reduzam os direitos da farinha estrangeira. Para isso indicam a taxa de 15 réis por kilograrnma.
Entretanto, a proposta mantém o actual imposto de 16 réis, sendo certo que, existindo esta taxa, nenhuma farinha estrangeira virá aos mercados portuguezes.
Portanto, a elevação pedida dava logar á elevação de preço na farinha nacional e conseguintemente á do preço do pão, sem vantagem alguma para a nossa agricultura, com beneficio exageradissimo de alguns, e com grave e profundo prejuizo de muitos, da quasi totalidade.
O documento n.° 3 é a representação dos industriaes do Porto, que fabricam tecidos e artefactos de malha. Pedem estes industriaes que se mantenha o direito da pauta actual para as obras de malha e ponto de meia, feitas com algodão.
Não ignora de certo a commissão o avultadissimo contrabando que atravez a nossa fronteira terrestre se exerce com esta classe de mercadorias. Na existencia d'este facto, que ninguém desconhece, que prejudica o thesouro e que muito mais prejudica os próprios industriaes, se funda, por certo, a diminuição proposta no direito, que, apesar de estipulado no tratado de commercio com a França, se julgon necessario reduzir. Entretanto, em vista das allegações dos industriaes, que declaram positivamente não poder a sua industria subsistir sem a protecção actual, pois que já muito a enfranqueceu o golpe que em 1882 lhe vibrou o tratado referido, e attendendo a que por identicas considerações se dispensa analogo favor a outras industrias, parece-nos que deverá conservar-se, para os productos de que se trata, o direito actual.
No documento n.° 4 podem os fabricantes de sabão e vé-

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las de stearina, que seja mantida a liberdade para os alcalis causticos, e que o sebo coado ou em bruto seja incluido no artigo 22.° da proposta.
Pelo que respeita ao sebo, está elle já incluido no artigo mencionado, visto que se comprehende no dizer "despojos e productos de animaes em bruto". Emquanto aos alcalis causticos, é bem conhecida a nossa opinião, desde que fomos quem apresentou á camara o projecto de lei approvado em 1885, e pelo qual se concedeu áquelle producto a liberdade, que então reclamavam as associações commerciaes de Lisboa e Porto, e as industrias da saboaria, do papel, das velas, etc.

Pauta de exportação

Pela proposta reduzem-se a 18 os 26 artigos que tem a actual pauta de exportação, e desses 18 só 12 apparecem tributados.
São de certo as condições melindrosas em que se encontra o thesouro publico a causa de se conservarem ainda direitos, que todos os bons principios económicos e o exemplo de outros paizes mais poderosos e adiantados do que o nosso, indicavam dever ser abolidos de vez. Assim continuamos a negar a liberdade absoluta, na saida, ao nosso primeiro género de exportação, o vinho, que vae por este motivo, em circumstancias menos favoraveis, concorrer nos grandes centros consumidores com igual producto de origem hespanhola e italiana, que é exportado dos respectivos paizes com isenção completa de direitos.
Entretanto na alteração proposta na taxa dos vinhos, algum beneficio resultará para os seus productores e exportadores.
Pagando actualmente os vinhos communs exportados, por cada decalitro:

Direito fixo .... 7 réis
2 por cento sobre 600 réis .... 12 réis
6 por cento addicionaes .... 1,1 réis
20,1 réis

e os vinhos licorosos, tambem por decalitro:

Direito fixo .... 7 réis
2 por cento sobre 1$800 réis .... 36 réis
6 por cento addicionaes .... 2,6 réis
45,6 réis

pagarão de futuro, se forem approvadas a tabella e taxas propostas, o direito fixo de 18 réis os primeiros, e de 50 réis os segundos.
Não póde contestar-se que estas taxas estão mais do que os direitos actuaes, em harmonia com os valores dos géneros sobre que incidem, sendo, como é, beneficiado o vinho commum; podendo esperar-se que para a receita produzam o resultado accusado pela seguinte comparação:

[Ver tabela na imagem]

Alem do vinho nenhum outro genero de exportação portugueza merece, a nosso ver, consideração especial, senão a cortiça para a qual subsistiu o estado actual.

Reexportação e baldeação

Frequentes vezes teem subido aos poderes publicos representações das associações commerciaes, pedindo a abolição dos direitos de reexportação e baldeação, com o fundamento de que a sua cobrança obriga a formalidades que embaraçam gravemente as operações do commercio. E de facto assim é, sem que a receita produzida compense o estado da despeza que faz com o pessoal occupado em tal cobrança.
Estas circumstancias, já de si lastimáveis, tendem a aggravar-se logo que se realisem os melhoramentos projectados no porto de Lisboa, que no futuro ha de ser um dos mais importantes portos de escala, em toda a Europa. Para isso o destinam a sua especial situação geographica e a frequencia, que necessariamente augmentará, dos vapores que fazem a navegação transatlantica, e que não poderão deixar de realisar aqui avultados fornecimentos para seu consumo, e valiosas operações commerciaes, que lhe deem carga para outros pontos da Europa ou para os centros consumidores da America.
Foi por certo em obediencia a este pensamento que o auctor da proposta que examinamos extinguiu de vez os direitos referidos.

Pauta do consumo em Lisboa

Resta-nos tratar da pauta dos direitos do consumo de Lisboa, á qual se propõem alterações mais ou menos importantes, mas de que deve resultar consideravel augmento de receita.
Antes, porém, de entrar na apreciação da tabella proposta, julgámos conveniente, pelos motivos que apresentámos ao tratar da pauta de importação, fazer uma resenha das pautas decretadas para este imposto, desde 1833.
Assim, temos a pauta de 27 de dezembro de 1833, que foi executada pela alfandega chamada das Sete Casas e estabeleceu direitos sobre o vinho, aguardente, azeite, vinagre, carnes frescas e preparadas, banha, lã lavada e suja, sebo, cera, mel, couros, tripa secca, bacalhau, alhos, azeitonas, bolota, canas, carvão, casca para cortir. castanhas, ervas e raizes, fructos verdes e seccos, hortaliças, junco, lenha, marisco, ovos, palha, queijos, sumagre, tojo e carqueja, consumidos em Lisboa. Outros géneros havia tributados, pelo consumo no termo de Lisboa, com taxas menos elevadas do que as que existiam para consumo da cidade.
Esta pauta vigorou até que foi posta em execução a de 11 de setembro de 1852, epocha em que acabaram os direitos cobrados no termo, adoptando-se para os géneros consumidos em Lisboa os que constam da referida pauta de 1852, que era dividida em cinco classes:
1.ª Carnes;
2.ª Cereaes;
3.ª Legumes seccos;
4.ª Liquidos;
5.ª Varios artigos.
Estas cinco classes comprehendiam cincoenta artigos com diversos direitos.
Em 23 de agosto de 1860 decretou-se nova pauta, para ser executada pela alfandega, que em 1852 passara a denominar-se municipal, e recebera as attribuições das extinctas alfandegas do Terreiro e das Sete Casas. Esta nova pauta continha as mesmas classes que a antecedente, sendo porém o numero de artigos n'ella reduzidos a 44, com taxas diversas.
Depois d'isso, em 23 de junho de 1870, foi decretado ainda novo diploma, modificando o anterior e convertendo em fixos alguns direitos ad valorem, e tributando a cerveja e os oleos para illuminação.
Dividia-se em quatro classes:
1.ª Carnes;
2.ª Farinaceos;
3.ª Liquidos;
4.ª Varios generos.

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Subdividindo-se estas era 58 artigos com direitos diversos, foram geralmente elevadas, por esta occasião, as taxas anteriormente em vigor.
Em 1875 passou a alfandega municipal a denominar-se alfandega do consumo, conservando-se, porém, a pauta de cretada em 1870, que ainda actualmente vigora, com ligeirissimas alterações promulgadas desde essa epocha. Na edição de 1885 continua a divisão deste diploma em quatro classes, e no mesmo numero dos artigos.
Na pauta agora proposta são tributados quatro géneros até aqui livres, mantêem-se as quatro classes, e eleva-se a 55 o numero dos artigos.
O augmento proposto no direito das carnes abatidas fora do matadouro municipal visa principalmente um fim hygienico, e tende a reprimir o abuso, com extraordinaria frequencia commettido, de ser introduzida, a retalho, no consumo, carne de rezes rejeitadas no mesmo matadouro. Da desigualdade de direitos resultará, sem duvida, para os fornecedores e negociantes de carne, a necessidade de levarem as suas rezes aos matadouros publicos municipaes, onde a fiscalisação sanitaria se exerce desassombradamente.
Não ha rasão, pois, para receiar de tal augmento de imposto nenhuma elevação no preço do genero.
Estabelece-se direito para a caça e creação, que são agora completamente isentas de imposto de consumo.
Esta resolução é profundamente justificada. Tributadas como são as carnes que servem de alimento às classes pobres, não ha motivo para deixarem de o ser as que constituem, em geral, alimento das classes mais abastadas. Reconhecendo isto, o auctor da proposta pretende fazer desapparecer esta injusta desigualdade, propondo, para os artigos em questão, um direito que deve produzir receita consideravel, mas que pela sua modicidade não fará, a nosso ver, retrahir o consumo.
As bebidas gazosas e refrigerantes, que têem actualmente largo consumo e fazem concorrencia ao vinho e á cerveja não podiam rasoavelmente deixar de ser tributadas com o imposto que pesa sobre o, ultimo d'aquelles generos.
Aos ananazes eleva-se o direito, attendendo a que são uma fructa muito apreciada e sempre de subido valor entre nós.
No vinho augmenta-se a taxa, como meio de obter mais receita. Passando de 31 a 35 réis o direito por kilogram-ma, não cremos que o consumo diminua, e portanto confiámos que será real e importante a receita produzida por aquella elevação de imposto.
Deve observar-se que a receita que resultará da adopção das inovas taxas, e que se póde calcular, segundo a estatistica official:

No vinho .... 90:972$00
Nas fructas frescas .... 9:190$000
Nos queijos não especificados .... 2:088$000
102:256$000

será largamente augmentada, logo que o imposto do consumo se cobre em toda a área recentemente conquistada para a cidade de Lisboa.
Alem d'aquelle augmento outro se dará com o estabelecimento de direitos para a caça e para a creação; mas este, como o que deve provir do despacho das carnes abatidas fóra do matadouro municipal, não pôde, por falta de base; ser devidamente calculado.
Pela pauta do consumo são tributados unicamente os géneros consumidos dentro da circumvalação de Lisboa; vigorando em todas as demais terras do reino a taxa do real de agua, sem distinccão alguma para cidades, villas ou aldeias.
Não acontece assim em outros paizes, em que as povoações, para o effeito deste imposto, são classificadas segundo a sua importancia. A Hespanha, por exemplo, tem a Tarifa del impuesto de consumo, com 78 artigos e diversas taxas, maiores ou menores, conforme devem ser applicadas a povoações de maior ou menor população. Estas dividem-se em seis classes segundo teem até 5:000, 12:000, 20:000, 40:000, 100:000, ou mais d'este numero de habitantes.
Em Franca, a pauta do Octroi de Paris tem 78 dizeres genericos, tributando todos os productos alimenticios, muitas materias primas para construcção e até algumas manufacturas. Ali sobre os direitos do Octroi recáem 20 por cento addicionaes para o thesouro. Nas demais cidades e povoações d'aquelle paiz existem pautas especiaes.

Terminando aqui as considerações que entendemos conveniente adduzir como auxilio ao estudo e comprehensão da proposta de pautas que está sujeita á apreciação parlamentar e que, em nosso parecer, merece ser convertida em lei, pela prosperidade que d'ella deve resultar para o desenvolvimento commercial do paiz, e pela simplificação que traz ao serviço das alfandegas, apresentamos os documentos a que nos referimos já e que constituem as reclamações que se levantaram contra o trabalho de que acabâmos de dar conta.
Lisboa, 20 de março de 1886. = Antonio de Sousa Pinto de Magalhães.

N.° 2

Senhor. - Dignou-se o governo de Vossa Magestade mandar ouvir o parecer do conselho superior do commercio e industria ácerca da proposta de lei;. apresentada ao parlamento pelo exmo. ministro da fazenda, reformando a pauta geral das alfandegas.
A reforma da pauta das alfandegas, senhor, é dos assumptos mais importantes e complexos na legislação dos estados modernos.
No nosso paiz, porém, acresce a circumstancia de que a pauta das alfandegas tem de ser organisada por forma que salvaguarde, pelo lado fiscal, a melhor parte da receita publica e pelo lado económico a existencia e prosperidade das industrias, quer agricolas, quer de outra espécie, em que o trabalho nacional, base em que deve assentar a riqueza publica, carece, para o seu desenvolvimento, do estorvo opposto pela pauta á concorrencia estrangeira.
Mas o conselho superior do commercio e industria, attendendo á urgencia que lhe foi recommendada, não póde emittir sobre este assumpto opinião tão circumstanciada e desenvolvida como lhe cumpria e desejava, limitando-se portanto a adduzir as considerações que lhe occorreram na revisão rapida d'este importante trabalho.
Para se conhecer cabalmente do organismo económico de uma pauta, e das conveniencias ou inconveniencias que poderão resultar da sua applicação, é indispensável conhecer, não só o indice remissivo e explicativo da mesma pauta, mas tambem as respectivas instrucções preliminares. O rigor technologico das classificações pautaes tambem só em face do indice remissivo se póde apreciar. Se o indice é indispensável para a comprehensão de uma pauta, como a que actualmente vigora, cujas classes são dezenove e contêem seiscentos sessenta e um artigos, muito mais necessario se torna o indice para compulsar uma em que o numero dos artigos foi reduzido a trezentos noventa e nove e no qual portanto os agrupamentos ou generalidades devem abranger muito maior numero de especies de mercadorias.
O conselho applaude a idéa que presidiu na organisação da proposta de se substituir quanto possivel os direitos ad valorem por direitos especificos, visto que a pratica tem sobejamente demonstrado os inconvenientes de tal systema, que é cumulativamente prejudicial ao estado e ao commercio licito, sendo para sentir que os tratados de commercio

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não permitiam que desde já se proceda á substituição d'aquelle genero de imposto em grande numero de artigos que ainda actualmente são assim tributados.
E porque o conselho reconhece que a legislação da pauta convencional com a França, extensiva hoje a todas as nações na parte em que regula o modo de resolver os pleitos que frequentemente se travam entre o commercio e o fisco, com respeito á discordancia nos valores dados ás mercadorias, não salvaguarda os interesses do estado, tem a honra de propor que nos preliminares da nova proposta de pauta se estabeleçam os seguintes preceitos regulamentares com respeito ás dissidencias nas declarações de valores:
1.° Que as alfandegas possam exercer o direito de preempção, adquirindo por conta do estado as mercadorias cujos valores forem contestados, dando immediatamente aos commerciantes o valor que houver sido declarado com mais 8 por cento.
2.° Que, não querendo as alfandegas usar d'essa faculdade, os pleitos sobre valores sejam resolvidos por peritos. As direcções das alfandegas deveria competir a nomeação de um dos arbitros, sendo o outro offerecido pelo commerciante interessado. Os peritos nomeados escolherão o terceiro, de desempate, e quando não cheguem a accordo, caberá igualmente ás direcções das alfandegas a nomeação do perito de desempate, o qual não poderá todavia ser escolhido de entre os empregados fiscaes.
Conviria igualmente estabelecer nos preliminares que a percentagem do abatimento nos direitos concedido aos generos importados das nossas possessões ultramarinas fosso calculado por uma forma proporcional em relação ao estado de desenvolvimento agricola e commercial das diversas possessões, tendo-se em consideração os recursos dálias, a distancia a que ficam da metrópole e as dificuldades da navegação e portanto dos transportes.
O conselho propõe todavia que essa protecção pautal concedida nunca seja inferior a 40 por cento.
Tratando-se da reforma dos preliminares da pauta, lembra o conselho a necessidade de se insistir na execução de um preceito, já hoje felizmente estabelecido na nossa legislação fiscal, e que com este assumpto muito se relaciona, qual é o de se adoptar nas nossas alfandegas o systema de despacho por declaração, regulamentado por modo que possa ter execução pratica, na qual se traduzam todas as vantagens que tal methodo offerece ao commercio e ao fisco, nos paizes em que elle ha muito se acha implantado, garantindo a indispensavel rapidez no expediente do despacho, escudada por um severo regimen penal para os infractores.
Nas classes do novo projecto de pauta o conselho tem a honra de apontar a conveniencia de se fazerem as seguintes alterações, abstendo-se de consultar ácerca dos artigos que se acham incluidos na tabella pautal do tratado com a Hespanha, visto que sobre esta matéria foram mandados ouvir em especial pelo governo de Vossa Magestade os conselhos superiores de agricultura e de commercio e industria reunidos.
O conselho superior do commercio e industria julga de conveniencia que se estabeleça na legislação respectiva o preceito de que as tabellas pautaes devem ser revistas em periodos determinados, não inferiores a seis annos nem superiores a dez, a fim de que os interesses do commercio e da industria fiquem devidamente garantidos, e parece-lhe igualmente conveniente que taes revisões, ou quaesquer alterações sejam sempre precedidas da consulta das entidades interessadas.
Na classe 3.ª da proposta, artigo 57.°, propõe o conselho que os tecidos a que se refere este artigo, quando cortados para coberturas de guardas-sol tenham a reducção de 50 por cento, satisfazendo assim a uma justificada reclamação das industrias respectivas, e em harmonia com a equitativa protecção que lhes é concedida no artigo 38.° da classe 2.ª para as coberturas de tecidos de lã.
Na classe 4.ª, artigo 72.°, propõe o conselho que o dizer d'este artigo seja redigido pela seguinte fórma:
"Sarjas cruas ou brancas para estamparia."
Este alvitre tem por fim evitar duvidas na classificação, especificando com clareza os tecidos d'esta especie que devem ficar ao abrigo do direito protector da industria da estamparia.
Propõe igualmente o conselho, no intuito de conciliar os interesses importantissimos das industrias de tecelagem e estamparia de algodão, attendendo ao mesmo tempo á imprescindivel necessidade de manter vantajosamente os redditos fiscaes adstrictos a uma das mais valiosos partes da nossa importação, que no artigo 75.° o direito dos tecidos de algodão tapados lisos não especificados crus seja elevado de 150 a 160 réis por kilogramma, e que no artigo 76.° o direito de iguaes tecidos brancos seja reduzido de 190 a 180 réis.
No artigo 80.° propõe o conselho que sejam incluidas as belbutinas, tecidos avelludados muitas vezes mais valiosos que os denominados velludilhos, e que nenhuma rasão aconselha a que sejam equiparados no imposto ás bombasinas.
Na classe 5.ª o conselho, desejando que seja protegida quanto possivel a industria da fiação e tecelagem do linho, como o são identicas industrias do algodão e da lã, mas tendo por outro lado em consideração quanto deve ser igualmente protegida a industria agricola da cultura d'aquella preciosa materia textil, propõe que o direito do linho e outros filamentos similares não especificados, em rama, escuros, ou brancos, seja reduzido de 8 a 5 réis.
É tambem de parecer que em seguida ao artigo 92.° se inscreva o seguinte artigo:
"Fios de juta ou de quaesquer filamentos vegetaes não especificados que contenham linho ou canhamo, 75 réis por kilogramma."
O actual direito para os fios especificados no artigo 95.° da proposta, ampliado como está pelos preliminares da pauta em vigor aos nos mixtos do linho e juta, e cumulativamente prejudicial ao estado e á industria da nação do linho.
O commercio póde, á sombra de tal regimen, que lhe garante um direito de 9 réis, que n'um producto relativamente valioso é por assim dizer estatistico introduzir no mercado fio de linho com ligeiras libras de juta, com grave prejuizo da industria da fiação de linho e não menor perda nos rendimentos do estado, que dificilmente póde evitar as fraudes n'este genero.
Os fios mixtos de linho e juta são, é verdade, materia prima indispensavel á industria de tecelagem de grossarias e de outros tecidos grosseiros denominados de embalagem, industria que ha poucos annos se estabeleceu no paiz e tem prosperado, e é tambem certo que a antiga industria nacional de fiação de linho não póde, por emquanto fornecer nem em quantidade nem em preço o preciso para satisfazer as necessidades d'aquella nascente industria de tecelagem; porém, a taxa de 75 réis nos fios mixtos de juta e linho, de que tal industria só necessita para as urdiduras, não é exagerada, visto que nas tramas emprega sómente fios de juta que estão sujeitos á taxa unica de 9 réis, ficando portanto rasoavelmente protegida com a manutenção do actual direito de 85 réis nos tecidos d'esta especie.
Na 6.ª classe o conselho propõe que o direito ad valorem estabelecido na proposta para a madeira não especificada, tábuas, folhas, barrotes, vigas, varas, etc., seja substituido pelo direito especifico de volume, lendo por unidade o metro cubico, para o tabuado e para as vigas, que constituem a parte principal da importação, mantendo-se os direitos por unidade para as restantes espécies, cuja importancia não avulta nem em quantidade nem em valor.
É sobejamente conhecida a difficuldade de manter nas

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alfandegas a perfeita exacção dos impostos quando ella tem por base o valor dos generos ou mercadorias declarado poios commerciantes.
As actuaes providencias regulamentares coercivas para os abusos não dão resultado.
A impunidade é mantida com escandalo e prejuizo do commercio honrado e do fisco.
N'este ramo importante da nossa importação acresce ainda a circumstancia ponderosa de que, constituindo ella para o estado uma boa fonte de receita, de certo convem mantel-a illesa.
Reconhece o conselho que Q regimen de classificação que desde muito tempo estava estabelecido era, não só absurdo na fórma e desigual na distribuição, mas tambem moroso, difficil e vexatorio na pratica.
Obrigava na verificação do tabuado á separação por grossuras e tamanhos, visto que para os diversos direitos havia a considerar ao mesmo tempo espessura e extensão; no vigamento exigia a medição de todas as vigas sujeitando-as ao pagamento pela medida de extensão, sem ter em conta a espessura e largura.
As fraudes neste processo de expediente foram grandes e reclamaram portanto extraordinarios e justificados rigores de fiscalisação.
N'esta parte, porém, não se conseguiria melhoria adoptando-se o systema do imposto ad valorem para e"te género e traria como consequencias grandes morosidades no expediente do despacho, visto que os verificadores se veriam forçados a ter em consideração, não só as quantidades e medições das madeiras para conhecer da verdade das declarações ou facturas, mas teriam tambem de attender ás quantidades, que são variadissimas e de valores mui diversos, circumstancia esta que até ao presente não tinha de ser levada em conta para a verificação das madeiras nas alfandegas senão como insignificante factor para o imposto.
A medida cubica é de facilima avaliação; podendo até estabelecer-se em principio que nas alfandegas fosse adoptado para a verificação das madeiras o systema de despacho por declaração.
Os navios que transportam este genero vem quasi sempre com carga completa. A tonelagem da arqueação, combinada com as declarações dos manifestos consulares, daria seguro elemento para se conhecer a cubagem dos carregamentos transportados; reservando-se todavia ás alfandegas o direito de reconhecer directamente a medição cubica de qualquer carregamento sobre cuja declaração duvidasse.
Parece, pois, ao conselho que os direitos d'este genero ficariam equitativamente estabelecidos pelo seguinte modo:
"Tabuas de madeira ordinária serrada, ou em folhas, 2$250 réis por metro cubico.
"Vigas e vigotas, 1$600 réis por metro cubico.
"Barrotes, barrotões e ripas, 20 reis cada um.
" Varas e paus, 45 réis cada um."
Na classe 7.ª o conselho, attendendo ás reclamações da industria do fabrico de cimento, cujo aperfeiçoamento se tem evidenciado de um modo notavel, justificando o protector auxilio dos poderes publicos, mas desejando distinguir este producto de outro que, comquanto industrialmente análogo, não se acha nas circumstancias d'aquelle, e cuja importação convem aliás facilitar, visto que é materia prima tambem indispensavel nos trabalhos de construcção architectonica, propõe que este artigo se divida em dois, redigidos pela seguinte fórma:
"Cimento, 3 réis por kilogramma.
"Cal hidraulica, 0,5 por kilogramma."
No artigo 126.° é o conselho de parecer que o respectivo dizer deverá ser assim alterado:
"Garrafas e outras vasilhas de vidro ordinario de qualquer cor, 12 réis por kilogramma."
Esta alteração tem por fim consignar de um modo definido a classificação das vasilhas de vidro ordinario, acabando com as inadmissiveis disposições dos indices remissivos e explicativos em que se estabeleciam distincções industrialmente absurdas e injustificáveis na classificação das vasilhas de vidro ordinario, de cor verde ou preta, das de cor roxa, amarella, azul ou branca, etc.
Na classe 9.ª o conselho, desejando que se consiga conciliar quanto possivel os importantissimos interesses da industria agricola, a cujo desenvolvimento e prosperidade se acham intimamente ligados os mais valiosos interesses nacionaes, com a legitima e equitativa protecção a que têem direito as industrias de distillação e moagem, propõe que o direito do trigo seja elevado acima de 13,5 réis por kilogramma até ao limite em que tal elevação não produza augmento no preço do pão.
Esta proposta, que poderá parecer á primeira vista paradoxal não o é na realidade, se se attentar em que, havendo decrescido o preço do trigo nos ultimos vinte annos desde 700 réis a 500 réis e, tendo por outro lado crescido o rendimento dos seus productos pannificaveis em virtude dos novos e aperfeiçoados processos de moagem, o pão, em vez de diminuir de preço, tem augmentado.
D'esta fórma a proposta tenta derivar em proveito do estado e dos lavradores nacionaes uma parte dos lucros que parecem resultar dos factos apontados.
Que o direito do milho seja de 12 réis por kilogramma. Que o da cevada, centeio e aveia seja de 11 réis por kilogramma. Que da mesma forma o direito da farinha seja equitativo e proporcionalmente desdobrado em tres especies, a saber:
"Farinha de trigo, 21 réis por kilogramma, quando o direito do trigo em grão seja fixado em 13,5 réis. Se, porém, o direito sobre este cereal for elevado, o da farinha deverá ter proporcional elevação.
"Farinha de milho, 10 réis por kilogramma, quando o direito do grão respectivo seja fixado em 12 réis.
"Farinha de cavada, centeio e aveia, 14 réis por kilogramma, pagando os cereaes respectivos 11 réis por kilogramma."
O conselho julga poder affirmar que, adoptando-se estas modificações, ficariam equitativamente harmonisados os interesses das industrias referidas e mantidos os redditos do estado nos correspondentes direitos fiscaes.
Os artigos 194.°, 195.° e 196.° propõe o conselho que sejam unificados debaixo do seguinte dizer pautal:
(Assucar, 115 réis por kilogramma."
A experiencia tem de sobra mostrado, não só no nosso paiz como em outras nações, que é inutil tentar a manutenção de direitos differenciaes para as diversas qualidades de assucar, quer se tenha em consideração a sua pureza, distinguindo-se entre refinado e não refinado, quer a cor, discriminando-se as diversas qualidades mais ou menos valiosas, quer finalmente a riqueza saccharina, procedendo-se ás necessárias analyses chimicas nas alfandegas.
O primeiro systema foi noutros tempos e é actualmente o regimen legal estabelecido para a classificação; porém, as diversas interpretações dadas pelos tribunaes competentes á classificação, levaram as alfandegas a tributar igualmente o mais ordinário assucar mascavado do Brazil ou de Cabo Verde e o pilé purissimo, que é destinado aos mais abastados consumidores.
Tentou-se estabelecer na classificação o systema de typos, em que a cor era a base para comparação adoptando-se as series de typos orficiaes da escala hollandeza. O resultado deste systema foi a anarchia da classificação; chegando ao ponto de ser reclamada a sua abolição pelos commerciantes e pelas auctoridades fiscaes.
O systema de classificação pela analyse saccharimetrica, de todas por certo a mais racional, traria no entretanto graves embaraços ao expediente das nossas alfandegas.
Na actual proposta estabelece-se em primeiro, logar um direito differencial para o assucar areado pelo systema portuguez, qualidade esta que é produzida por uma pequena

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e imperfeita industria, se assim se lhe póde chamar, que tem sido a causa permanente de perturbações no regimen da classificação d'este genero, com grande prejuizo do estado e dos consumidores. Estabelece-se igualmente outro direito para o assucar que for superior ao typo 20 da escala hollandeza.
Sem fallar da difficuldade que ha na pratica em se comparar o assucar, que no mesmo sacco, barrica, caixa ou feixe apresenta tres e mais cores diversas, não sabendo o verificador por qual d'ellas se ha de decidir para a comparação, as difficuldades hão de renascer com este methodo de classificação, resultando contestações nos despachos e recursos dos commerciantes, que, embora resolvidos pelos tribunaes superiores, não darão remédio ás difficuldades, porque as amostras dos assucares cuja classificação houver sido superiormente resolvida ou assentada ficarão servindo de outros tantos typos para a classificação e d'ahi a repetição do estado de anarchia da classificação d'este genero, do qual todo o commercio conserva ainda viva memoria.
Estabelece finalmente a proposta um terceiro direito para os assucares que forem inferiores ao typo 20 citado. N'esta hypothese as questões hão de suscitar-se tambem, ainda que por forma inversa da precedente para certas qualidades de assucar.
Propõe o conselho que na classe 4.ª deve ser unificado o direito dos artigos 240.° e 241.°, passando a ser de 20 réis por kilogramma a taxa para o carbonato de potassa em qualquer estado.
O direito de 7 réis proposto para o carbonato de potassa em bruto é tão diminuto quanto é excessivo o de 55 réis para o refinado, que é materia prima indispensavel para muitas industrias.
No artigo 247.° parece ao conselho que se deve alterar o dizer do mesmo artigo pela seguinte fórma: "Aguas mineraes naturaes, incluindo terras de grés ordinario", e propõe igualmente, que seja livre a importação d'este genero.
O direito proposto de 100 réis por kilogramma, incluindo taras, seria prohibitivo, e julga o conselho que nenhuma rasão póde justificar similhante alvitre.
A importação das aguas mineraes naturaes nenhuma concorrencia seria póde estabelecer ao commercio das aguas similares portuguezas.
A prosperidade deste commercio consiste unicamente no valor therapeutico d'estes medicamentos.
Se algumas das aguas mineraes nacionaes são especifico seguro e comprovado para o tratamento de quaesquer enfermidades, não ha motivo para que se receie a concorrencia das aguas estrangeiras quando ellas não possuam qualidades superiores.
Mas se ao contrario ha aguas mineraes estrangeiras com propriedades especialissimas para o tratamento de certas doenças, propriedades que não se encontram nas nossas, ou se ha outras que as possuem superiores, seria de todo o ponto injusto difficultar ou quasi prohibir a importação d'essas aguas, que, pelo fim a que se destinam, convém aliás facilitar.
Com o fim de tornar claro e preciso o dizer pautai do artigo 248.°, o conselho propõe que seja modificado pela seguinte forma: "Medicamentos compostos, incluindo as taras", mantendo se assim a antiga redacção d'este artigo nas pautas anteriores.
Na classe 11.ª lembra o conselho a necessidade de se determinar no indice remissivo e explicativo, por modo claro e preciso, o que se deve, para a classificação pautal, entender por machina, apparelho, instrumento e utensilio, em ordem a que se evitem constantes e prejudiciaes controversias nas classificações de taes artefactos; originadas pela confusa e nebulosa technologia das pautas anteriores.
Na classe 12.ª o conselho propõe que o direito de 25 réis, estabelecido para o fio de cautchouc na pauta em vigor, seja mantido na proposta, visto que este producto é materia prima da industria de tecidos elasticos, que mal poderia existir mantendo-se para o fio de cautchouc o direito de 500 réis indicado na actual proposta.
Propõe finalmente o conselho que na pauta A de importação seja incluido o algodão originario das provincias ultramarinas; e que na pauta B sejam igualmente incluidas as madeiras para mastreação ou em vigas, vigotas, paus, varas ou tabuas serradas, quando procedentes e originarias das referidas provincias ultramarinas.
Taes são, senhor, os principaes pontos da proposta da pauta a respeito dos quaes o conselho superior do commercio e industria, julga dever propor alterações, sentindo, pelas rasões que deixa expostas, não poder analysar mais minuciosa e circumstanciadamente o assumpto importantissimo, sobre que foi chamado a dar parecer.
Deus guarde a preciosa vida de Vossa Magestade por muitos e dilatados annos.
Sala das sessões do conselho superior do commercio e industria, em 26 de maio de 1887. = Ernesto Madeira Pinto = Ernesto Driesel Schroter, vencido quanto á proposta de augmento no trigo acima de 13,5 réis = João de Sousa Cabral Magalhães = José Maria Pereira de Lima = Julio José Pires = Jorge O'Neill = Carlos de Lima Mayer = Alfredo Mendes da Silva = Antonio Augusto de Aguiar (com declarações) = André Meyrelles de Tavora do Canto e Castro, secretario.

N.° 3

Illmo. e exmo. sr. - Os abaixo assignados, marchantes, proprietarios de talhos e creadores de gados e mais interessados, sabendo que v. exa. é o mui digno relator da proposta de lei da reforma da pauta geral, vem respeitosamente pedir a v. exa. que o artigo 20.° seja modificado por fórma a comprehender o sebo em rama ou refinado com um direito não inferior a 50 réis por kilogramma.
Os supplicantes veem na sobredita proposta que as intenções do governo de Sua Magestade são libertar de direitos, quanto possivel, a materia prima de differentes industrias, tributando os respectivos productos, consoante ao estado de desenvolvimento das mesmas industrias, harmonisando a protecção que a estas é devida, com os justos interesses do estado.
Não pretendem os supplicantes combater um tal systema, antes o applaudem. entretanto, fundando-se n'aquelles principios, pedem permissão a v. exa. para fazerem algumas considerações em abono do seu pedido.
Sabe v. exa. perfeitamente que o paiz produz algumas materias primas e não pode deixar de importar outras que as não produz, nem as poderá nunca deixar de importar em rasão do seu solo, clima, etc. Que estas se libertem parece acceitavel, mas que num regimen de mais ou menos accentuada protecção é que os supplicantes julgam não pode estar no animo do governo de Sua Magestade, nem do parlamento, nem de v. exa., como digno relator da mencionada proposta, que aquellas sejam exceptuadas d'essa protecção.
N'estas condições, exmo. sr., se encontra o artigo que os supplicantes entendem seja tributado, ainda aggravado com os impostos de consumo geral e especial de Lisboa.
O sebo estrangeiro entra no paiz, em Lisboa livre de direitos, em concorrencia com o nacional, que, longe de ser protegido, é onerado com direitos locaes de que aquelle é isento.
Entre diversos factos que os supplicantes poderiam citar para comprovarem a justiça do seu pedido, apresentarão um unico, pois elle dispensa mais dizer sobre o assumpto.
O creador de gado deixa de promover a engorda do gado vaccum, para obter melhor preço, por isso que o gado gordo dá muito menos carne limpa, e por conseguinte

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menos preço do que o gado magro ou de meia engorda e o sebo não alcança no mercado o preço da carne e sim o preço que lhe dá a cotação do preço sebo importado do estrangeiro, isto é, ao passo que o medio da carne limpa é de 280 a 300 réis o kilogramma, o sebo vende-se a 80 réis o kilogramma!
Se o testemunho dos supplicantes é imperfeito, independente da evidencia dos factos, na camara municipal de Lisboa póde v. ex.s encontrar dados officiaes que comprovam as allegações dos supplicantes. Na escripturacão da camara municipal se deve provar que a carne do gado gordo se compra por menos de 150 réis por 15 kilogrammas do que a carne de meia engorda ou de gado magro; acrescentando que o referido gado em Lisboa está ainda sujeito, como se sabe, ao elevado imposto de consumo local, que é de 60 réis por kilogramma de carne limpa que comprehende o sebo aggregado na proporção de 10 a 14 por cento (vide Esboço historico sobre o matadouro municipal de Lisboa apresentado na exposição universal de Paris em 1878 pelo distincto inspector e lente de veterinária no instituto geral de agricultura o exmo. sr. Joaquim Sabino Elauterio de Sousa).
O que fica ponderado parece aos supplicantes que foi em tempo devidamente attendido pelo actual conselheiro director da alfandega de consumo, no antigo projecto da reforma da pauta, sendo depois alterada a proposta por motivos ou rasões apresentadas pela companhia união fabril (vide parecer do relator da antiga reforma da pauta, documento n.° 4), mas que de certo não concorrem com as rasões que os supplicantes acabam de expor. Se necessario é, as fabricas de velas podem ser attendidas, augmentando o direito de importação para a stearina em obra, em tanto quanto se augmente o direito da materia prima.
A entrada livre do sebo foi decretada quando o nacional se vendia a 3$200 réis por 15 kilogrammas, hoje que apenas o sebo fundido attinge no mercado o limitado preço de 1$500 a 1$600 réis pela mesma unidade de 15 kilogrammas, parece aos supplicantes que os direitos de importação devem favorecer o producto nacional, pondo-se ao sebo estrangeiro o direito pelo menos de 50 réis em kilogramma, ainda menos do direito de consumo que paga em Lisboa, como os supplicantes já deixam allegado.
Os supplicantes pedem a attenção de v. exa. para este assumpto, confiando que lhes será feita inteira justiça. - E. R. Mcê. - (Seguem as assignaturas.)

N.° 3-A

Illmo. e exmo. sr. - Peço licença para expor algumas considerações com respeito ao augmento do direito sobre o melaço, conforme o projecto submettido á approvação do parlamento.
Pela pauta actual (artigo 282.°), o direito sobre o melaço é de 20 réis por kilogramma. Nos termos do projecto da nova pauta, o direito fica elevado a 30 réis, artigo 197.°
Até ainda ha pouco, justificava-se plenamente a elevação do direito, até o ponto talvez de se considerar prohibitivo. A cultura das cannas doces era a mais importante da Madeira e convinha dar-se toda a protecção, bem como auxiliar as industrias do fabrico de assucar e da aguardente com o emprego da materia prima produzida na localidade.
Mas as circumstancias são hoje inteiramente diversas. As plantações das cannas doces estão completamente perdidas em todos os pontos da ilha e começa-se agora em ensaios de novas plantações, com plantas vindas do estrangeiro e das nossas possessões. Só mais tarde, d'aqui a tres ou quatro annos póde a cultura das cannas doces na Madeira, adquirir o desenvolvimento e importancia que tanto será para desejar.
Ao passo que é este o estado actual relativamente á cultura das cannas, o certo é que a produccão do vinho é já de importancia e começa a fazer-se cultura de vinhas em larga escala, com probabilidades de bom resultado.
Por outro lado fabricam-se na Madeira grandes porções de vinhos artificiaes.
Para o preparo e tratamento dos vinhos de uvas e de peros, ha necessidade de aguardente, que na actualidade não póde ser produzida nesta ilha, por falta da materia prima, as cannas doces, porque em todo o districto não ha outra que possa ser aproveitada com vantagem no fabrico da aguardente.
D'aqui a necessidade de importar aguardente ou melaço para fabricar aguardente. O direito da aguardente é hoje um pouco diminuido, e tal facto, ao lado do augmento sobre o melaço, importa necessariamente a prohibição de importar melaço, porque para tanto é equivalente não dar a importação resultado proveitoso ao negociante.
E sendo assim, a diminuição na aguardente e o augmento no melaço, beneficiando os estranhos, e em especial os Açores, ataca directamente importantes interesses madeirenses. Desde que os negociantes de vinhos tenham necessidade de comprar aguardente por preço elevado, serão obrigados a comprar o vinho mais barato, em prejuizo dos agricultores, e a cultura das vinhas é na actualidade a mais valiosa da Madeira, carecendo de todo o auxilio e de toda a protecção dos poderes publicos.
Demais, ha a attender ás circumstancias lastimosas em que se acham as fabricas na Madeira.
Por falta de cannas doces já fechou a fabrica de assucar madeirense, e as machinas vão ser empregadas fóra da ilha, no exercicio da industria, que aqui não póde ser exercida, e, se o mesmo se der com respeito a outras fabricas, acontecerá que mais tarde, quando houver cannas doces em todo o sul da ilha, a falta das fabricas annullará os esforços dos cultivadores e a produccão não terá valor.
Convem, pois, proteger as fabricas por causa da industria que agora é exercida, e em attenção ao futuro da cultura das cannas. O meio é collocar as fabricas em condições de poderem usar do melaço para fabricar aguardente. Poderão assim sustentar-se, esperando melhores dias.
Mas o augmento do direito sobre o melaço e a diminuição no direito sobre a aguardente, impede a importação do melaço, porque as fabricas não podem laborar com prejuizo. Não ha muito, tendo as camaras do disstricto lançado um importo maior sobre o melaço, aconteceu que a importação foi tão limitada, que o rendimento da alfandega, durante o anno da vigencia do imposto, foi de pouco mais de 500$000 réis, e sendo extincto o imposto, logo no anno seguinte foi grande a importação, e o rendimento para o thesouro passou logo a ser excedente a 15:000$000 réis.
Deve tambem notar-se que são avultadas as operações entre a Madeira e a colonia de Demerara. Era troca de batatas, cebolas, fructas e generos madeirenses, recebe a Madeira melaço de Demerara. Difficultada ou impedida a importação do unico producto que da colónia ingleza póde vir para a Madeira, aggravar-se-ha, e muito, o estado de decadencia em que a Madeira se encontra.
Por ultimo, e desde que a molestia das cannas se tornou mais intensa, tem augmentado progressivamente o rendimento da alfandega do Funchal, em relação ao direito do melaço.
Conforme as notas juntas, vê-se que o rendimento no anno de 1885 foi de 16:510$705 réis; no anno de 1886, do 31:348$130 réis; e no primeiro trimestre do corrente anno, já chega a receita á importancia de 13:111$320 réis.
Parece-me, pois, de toda a vantagem e de grande urgencia a adopção de uma providencia, que, sem prejudicar o futuro da Madeira, quando houver produccão de cannas em grande escala, considere desde já e preste o devido auxilio á cultura das vinhas, á industria e commercio dos vinhos, e á industria local, unica que as fabricas podem

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exercer, habilitando-as a viver para mais tarde poderem prestar grande serviço aos cultivadores de eannas, providencia que por outro lado garante uma boa receita para o estado, e essa providencia, seria, emquanto a mira, deixar por espaço de quatro annos suspenso o novo direito, subsistindo o anterior da pauta de 1885, ou ainda modificado para menos com respeito ao melaço. E por outro lado, não diminuir, mas deixar subsistente, o direito anterior sobre a aguardente.
Passado aquelle tempo, poderia a medida ser prorogada, se, por infelicidade da Madeira, não fossem modificadas as condições actuaes, com respeito á producção de cannas doces.
O que tudo tenho a honra de levar ao conhecimento de v. exa.
Deus guarde a v. exa. Alfandega do Funchal, 4 de maio de 1887. - Illmo. e exmo. sr. conselheiro administrador geral das alfandegas e contribuições indirectas. = O director, Pedro Maria Gonçalves de Freitas.

N.° 4

Illmos. e exmos. srs. - Os abaixo assignados, tendo examinado o projecto da nova pauta apresentada á camara dos senhores deputados, sob n.° 4, de 9 de abril corrente, notaram n'ella alterações que os prejudica mui sensivelmente, e ás industrias nacionaes, sem vantagem correspondente aos interesses do thesouro.
Esses artigos são os seguintes: n.ºs 22 e 28. Em qual d'estes numeros estará comprehendido o sebo, que se importa em larga escala do estrangeiro, e sem o qual muitas industrias portuguezas não podem subsistir?
Parece que é no n.° 28, mas póde tambem sustentar-se que é no n.° 22, o que convem seja esclarecido, porque se a duvida ficar de pé e mais tarde se julgar que essa materia prima se acha comprehendida no n.° 22, a consequencia segura era fecharem-se todas as fabricas de velas e sabão, porque nenhuma podia viver estando tão aggravada de direitos a sua principal materia prima.
Portanto, pede que se explique estar o sebo comprehendido no n.° 28.
"N.° 319. Alcalis causticos propriamente dito solidos ou dissolvidos, 20 réis por kilogramma."
Sobre este artigo têem os supplicantes a ponderar que na sessão legislativa de 1885 foi presente a v. exas. Um requerimento assignado pelas principaes fabricas de tecidos, tinturarias e fabricas de stearina, sabão, papel, etc., em numero talvez de cincoenta, allegando e demonstrando a impreterivel necessidade de permittir a livre entrada dos alcalis causticos. As côrtes, reconhecendo a justiça que lhes assistia, votaram a livre entrada d'essas materias, e essa resolução foi convertida em lei de 22 de julho de 1885.
Hoje, decorridos apenas vinte e um mezes, esses mesmos industriaes que, em virtude d'essa lei, modificaram o seu fabrico, os seus processos industriaes, os seus apparelhos, etc., vêem-se ameaçados com um direito correspondente a 50 por cento d'essa materia prima; pois que, como provam pelos preços correntes estrangeiros, o valor da soda caustica é de £ 8,16 a £ 9 ou sejam 39,6 a 40,5 por kilogramma posto em Lisboa.
E nenhum motivo póde haver para similhante medida, a não ser a infundada representação dos fabricantes de productos chimicos, apresentada em 6 de fevereiro de 1886 (vide relatorio, fl. 177, n.° 82), ao que os supplicantes respondem que os interesses de uma unica fabrica, que não fabrica os alcalis causticos, não póde servir nunca para prejudicar direitos creados, nem oppor-se aos interesses dos cincoenta fabricantes, e dos mais importantes do paiz, que reclamaram a livre entrada dos alcalis causticos como do uma necessidade tão absoluta, que, como acima dizem, foi votada pelas côrtes, e votada sem discussão.
Pedem por esse motivo que não seja alterada a pauta de 17 de setembro de 1885, e que se conserve livre a entrada d'essas materias.
Pelos motivos acima expostos, os supplicantes esperam que sejam attendidas as suas reclamações.
Lisboa, de abril de 1887. - E. R. Mcê. - (Seguem as assignaturas.)

N.° 5

Copie. - Je soussigné, E. Bérand, entrepreneur de la compagnie du chemin de fer de la Beira Alta, et chargé par la même de faire la conduite des eaux das Alhadas à Figueira da Foz, qui est la station principale de la ligne, je declare, qu'après un sérieux examen et plusieurs essais du ciment de la compagnie Mineira e industrial do Cabo Mondego, et en vue de l'excellant résultat obtenu, je fus autorisé par la commission technique de la compagnie du chemin de fer de la Beira Alta, à employer ce ciment pour la construction des canaux, réservoirs, etc., dont j'avais entreprise pour canaliser les eaux das Alhadas à Figueira da Foz.
Je reconnais que la qualité de ce ciment est égale aux meilleurs ciments Portland étrangers dont je me suis servi pour les divers travaux hydrauliques que j'ai exécutés dans ma carrière d'entrepreneur.
Les deux qualités de ce ciment se travaillent avec facilité, l'une est de prise rapide et l'autre lente, ce qui en permet l'emploi pour grand nombre de travaux dont la solidité ne laisse rien à désirer.
Je declare aussi avoir été très satisfait de ce ciment et engage vivement son emploi aux personnes qui désirent un ciment de bonne qualité et d'un résultat incontestable.
Figueira da Foz, 27 septembre 1887. (Signé) = E. Birand.

Figueira, 16 de setembro de 1886. - Illmo. e exmo. sr. Bracourt, director da empreza exploradora das minas e industrias do cabo Mondego. - Accuso a carta de v. exa. de 14 do corrente, em que me pede o meu parecer a respeito de umas experiencias de cimento e cal hydraulica feitas no meu escriptorio.
Cumpre-me dizer a v. exa. que muito me satisfizeram taes experiencias, não tendo a menor duvida em consentir que nos trabalhos da minha secção sejam empregados, tanto o cimento como a cal hydraulica do cabo Mondego, igual ás amostras que serviram em taes experiencias. - Sou, etc. = (Assignado) Antonio de Albuquerque, engenheiro chefe da terceira secção do caminho de ferro de Torres-Figueira-Alfarellos.

Opiniões sobre os productos hydraulicos do Cabo Mondego

Entre outros, apresentâmos os seguintes documentos:
Copia: - Domingos Pinheiro Borges, tenente-coronel do estado maior de engenheria, etc.

Certifico que, tendo ha annos visitado o estabelecimento da companhia mineira e industrias do Cabo Mondego, encontrei e indiquei, dentro dos limites da propriedade da mesma companhia, uma vasta formação de terreno, proprio para produzir cimento natural de qualidade igual se não superior ao de Portland, e em todo o caso mais seguro nos resultados da sua applicação do que os cimentos artificiaes que abundam no nosso mercado.
Certifico mais que, tendo a referida companhia fabricado cimento, foi o producto por mim experimentado em encanamentos, platibandas, e em substituição de lagedos, e que o resultado tem correspondido á minha espectativa, embora no fabrico se não tenha empregado até agora processo regular que assegure tempo determinado para fazer presa e intensidade uniforme no periodo de consolidação; é comtudo certo que depois de consolidado apre-

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senta resistêncla igual á dos melhores cimentos que tenho empregado durante trinta annos de construcções.

E por este me ser pedido, assigno convicto na futura prosperidade da empreza que enriquecer a industrla nacional com um producto de grande applicação e consumo.
Lisboa, 25 de novembro de 1885. - (Assignado) Domingos Pinheiro Borges.

Copie.- Le soussigné certifié que la chaux hydraulique blutée du cap Mondego a été ernployée depuis le commencement des travaux du pont du cherain de fer de Torres Vedras à Figueira sur le Mondego jusqu'à ce jour, et que cette chaux a toujours donné d'excellents résultats tant au point de vue de la rapidité de la prise qu'au point de vue de la dureté des mortiers.
Il certifie en outre avoir employé du ciment à prise rapide de la même provenance ayant donné des résultats très-satisfaisants.
Lares, le 6 mars 1887. = Le chef de travaux de la companhie de Fives Lille, (Signé.) G. Sabouroux.

Vu et certifié. = L'ingénieur chef de service de l'entreprise générale de construction, (Signé.) F. Aubert.

Confirmo e tenho como exacta a informação superior. = (Assignado.) José Gonçalves Pereira dos Santos, capitão do engenheria, chefe de secção da fiscalisação do governo.

Analyse e ensaio de amostras de rochas calcareas procedentes do Cabo Mondego

[Ver tabela na imagem]

(Assignado) Ferreira Lapa.

Apreciação. - Resulta dos dados acima expostos, que todas estas cinco amostras são de calcareo argilloso mais ou menos hydraulico. O mais hydraulico de todos é o da amostra n.° 4, cuja hydraulicidade iguala a do cimento de Portland, seguindo-se-lhe por sua ordem as amostras dos n.ºs 2 e 1. As amostras n.ºs 3 e 5 são cales hydraulicas fracas.
Todos estes calcareos, mesmo o n.° 2, foram pulverisados a fino, e o pó calcinado em capsula de platina ao rubro vivo durante uma hora. É possível que com uma melhor cozedura em forno apropriado rendam aos ensaios maior grau de hydraulicidade. E é o que se deve fazer na propria localidade da extracção d'estes calcareos com todas as condições exigidas em taes ensaios. Entretanto, devo advertir que os que se fizeram foram realisados em comparação com os que tiveram logar com o cimento Portland, o qual endureceu debaixo de agua e tem a pedra Vivot cinco horas depois da immersão.
Laboratorio chimico do instituto geral de agricultura, 3 de julho de 1886. = (Assignado) Ferreira Lapa.

Copla. - Eu abaixo assignado, visconde de Barreiros empreiteiro dos trabalhos do ramal do caminho de ferro de Campanhã á alfandega do Porto, attesto que tenho empregado a cal hydraulica da empreza ex loradora das minas e industria do Cabo Mondego, nos trabalhos do dito ramal, sempre com bom resultado.
Porto, 30 de abril de 1887. - (Assignado) Visconde de Barreiros.
O sr. Matoso Santos (relator}: - Peço a palavra sob a ordem.
O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Matoso Santos.
O sr. Matoso Santos: - Por parto, da commissão mando para a mesa os seguintes additamentos e emendas.
Leram-se na mesa.
São os seguintes:

Additamentos

Artigo 1.° n.° 2, alínea d) Depois das palavras - de emolumentos - acrescentar -ficando o governo auctorisado a elevar desta taxa os actuaes direitos da pauta de consumo.
Artigo 1.°, § 6.° Depois das palavras - alimentação publica - acrescentar - sem comtudo poder augmentar a protecção concedida ás ultimas por aquella mesma pauta.
Artigo 1.°, § 7.° Antes de expirar o praso da execução do tratado com a França, o governo apresentará ás camaras um projecto de lei fixando os direitos geraes das mercadorias até então sujeitas ao regimen de excepção do mesmo tratado.

Emendas

N.° 107. Tábuas de madeira ordinaria serrada e em folhas.
N.° 182. Supprimir as palavras finaes - ou artificlal.
Pauta de importação - artigos livres:
N.° 29. Chumbo em bruto, laminado e fundido e em metralha. = F. Matoso Santos, relator.
Foram admittidas.

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O sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade e na especialidade.
O sr. D. José de Saldanha (sobre a ordem e na tribuna): - Sr. presidente, pedi a v. exa. a palavra para dizer alguma cousa sobre o projecto de lei n.° 186, que está em discussão, projecto da pauta.
Entendo em consciencia que, uma vez que v. exa. me concedeu a palavra, não havendo quem desde logo se inscrevesse contra, eu sou obrigado moralmente a usar d'ella, pois não seria decente para esta camara que um projecto d'esta ordem passasse sem discussão.
De mais a mais dá-se uma outra circumstancia, muito importante, a de que o projecto tem apenas dois artigos.
Se acaso o projecto tivesse pelo menos tres artigos, eu não teria insistido em pedir a palavra, porque v. exa. seria, em virtude do regimento interno d'esta casa, obrigado a pôr a materia em discussão na generalidade e depois na especialidade; mas, como tem só dois artigos, tem de ter uma só discussão na generalidade e na especialidade, e como tambem se dá a circumstancia de que tenho forçosamente de submetter á apreciação da camara, do paiz, algumas considerações sobre a pauta, sou igualmente levado a usar da palavra, que v. exa., sr. presidente, se dignou de me conceder.
Sr. presidente, terei mais tarde de mandar para a mesa algumas propostas, que se referem a alguns dos artigos marcados na pauta; mas, da remessa dessas emendas ou modificações, não se conclua que eu vá atacar o projecto na generalidade.
A este respeito, e n'este ponto, invoco o que tem aqui sido dito por mais de uma vez, isto é, que, desde o momento em que se tratasse da discussão da pauta, o governo e a camara considerariam esta questão uma questão aberta, a discutir n'um terreno livre do campo politico, para cada um poder apresentar, em boa paz e com socego, tudo o que tivesse por conveniente dizer a respeito de cada um dos artigos da pauta. (Apoiados.)
Por outro lado, dá-se ainda outra circumstancia, muito attendivel; é a de que, como v. exa. sabe perfeitamente, este projecto foi distribuido hontem de manha pelos domicilios dos srs. deputados, sendo o appendice, pertence ou annexos, entregue a cada um de nós, deputados da nação portugueza, hontem á noite n'esta sala, do que resulta que eu e muitos outros srs. deputados quasi não tivemos o tempo material sufficiente para fazer uma leitura, ainda que rapida, d'estes documentos.
Quer isto dizer, sr. presidente, que o que eu vou expor, é resultado de estudos anteriores e de alguma pratica que tenho, relativamente a alguns pontos, para que vou chamar a attenção da camara e do paiz.
No que vou dizer procurarei não offender pessoa alguma.
A questão das pautas é talvez de todas as que, desde o principio d'esta legislatura, têem sido aqui trazidas, a mais importante, porque é aquella que se liga mais de perto com os rendimentos do estado. (Apoiados.)
Todos sabem que dois terços desses rendimentos provem de direitos pautaes.
A questão das pautas é sempre uma questão melindrosa, difficil, e principalmente o é em Portugal, porque no nosso paiz essa questão é complicada, pelas difficuldades que lhe provem dos nossos tratados de commercio, que estão em vigor com as outras nações.
A respeito de tratados de commercio, sr. presidente, preciso, quero tambem accentuar a minha opinião, porque poderei não ter outra occasião para o fazer, sendo provavel que a minha vida parlamentar seja novamente curta.
Sobre os tratados de commercio preciso, para ficar socegado, que o paiz saiba qual o meu modo de pensar, a minha opinião, e por isso vou dizer francamente o que entendo.
Entendo, sr, presidente que os tratados de commercio foram uma invenção diabolica, (Riso.) que as nações mais astutas, menos conscienciosas, mais egoistas, arranjaram contra as menos espertas, mais escrupulosas, e mais simples.
A pratica tem demonstrado que, em todos os tratados de commercio que têem sido feitos, em geral as nações mais poderosas, que dispõem de maiores meios e de pessoal mais esperto, levam a vantagem e a palma a todas as outras, que são mais fracas e menos astuciosas!
Tambem direi mais alguma cousa.
Affirmam os que defendem os tratados de commercio, sustentam esses que estar necessariamente filiados na escola livre cambista, que o regimen proteccionista consiste em tirar o dinheiro das algibeiras do maior numero para o passar para as algibeiras de alguns privilegiados.
Ora, sr. presidente, eu pelo meu lado, affirmo que não é isso exacto na pratica, porque o livre cambismo, sem concorrencia leal, acompanhado de monopolio, é que dá, esse triste resultado, e por isso inverto o argumento, que nas circumstancias que indico, se applica com mais propriedade, não aos proteccionistas, mas aos livres cambistas.
No decurso das considerações que vou expor, terei talvez ensejo para accentuar mais esta verdade.
Sr. presidente, esta pauta diz respeito aos seguintes direitos:
De importação;
De exportação de productos nacionaes;
De importação livre;
De importação tributada segundo a lei de 26 de junho de 1883;
De exportação, reexportação, baldeação;
Do consumo.
Aproveito agora a occasião para, sem que s. exa. m'o deva agradecer, affirmar ao sr. relator, o sr. dr. Fernando Matoso Santos, que o seu nome ficará vinculado a um trabalho, para o qual todos os elogios que se possam tecer, são poucos.
Sr. presidente, o projecto que se discute vem acompanhado de todos os esclarecimentos que se poderiam desejar, e o parecer é um trabalho de grandissimo valor, por que, valha a verdade, o sr. relator n'esse trabalho, escripto nos poucos dias de que dispoz para isso, procurou fazer um trabalho ao alcance de todos nós, mas conseguiu mais para honra e gloria sua.
Esse parecer, sr. presidente, evidenceia não só a alta especialidade scientifica do sr. relator, mas mostra tambem, o que é de grande importancia, que s. exa. reme aos seus esclarecimentos sientificos uma pratica intelligente e esclarecida dos differentes assumptos da pauta.
Por outro lado, o parecer está organisado por fórma, tal que habilita as pessoas, que quizerem tomar parte no debate, ou que queiram estudar e examinar a nova pauta, a fazer estudos comparativos a fim de ser possivel esclarecer bem, sem duvidas, sem hesitações, o que o governo tem em vista conseguir com a adopção d'esta pauta.
É conveniente que se saiba que ncste parecer se encontram esclarecimentos em grande quantidade e todos de grande, valor, o que nem sempre tem succedido n'esta casa.
Digo isto sem querer atacar pessoa alguma.
Isto posto, passarei a uma outra ordem de considerações, com as quaes calculo que estará de accordo o sr. relator, e refiro-me determinadamente ao sr. relator, porque se mo referisse ao sr. ministro da fazenda poderia succeder que s. exa. fosse levado a responder-me por deferencia do amisade, e eu desejo, pelo contrario, que o sr. ministro da fazenda trave batalha com qualquer outro membro do parlamento que, sendo mais valente luctador do que eu, de ainda mais occasião a que o debate te torne mais...
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Vou perdendo a esperança, porque não tenho visto pedir a palavra contra este projecto.

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O Orador: - Eu concordo, sr. presidente, já o dei a entender, creio eu, com o pensamento geral da pauta, que está em discussão, mas entendo que devo apresentar modificações ou emendas com relação a um ou outro ponto, um ou outro artigo da mesma pauta.
A missão das pautas, segundo o meu modo de ver, e segundo as circumstancias que actualmente se dão no mundo, abrange tres fins:
1.° Creação de receita para o estado;
2.º Reunião de dados estatisticos, para, por meio d'elles, se determinar bem a orientação e o caminho que leva a administração financeira e economica do paiz;
3.º Dar rasão de vida ou de morte ás diversas industrias.
Para este terceiro fim julgo eu dever chamar a ai tenção do illustre relator, e de toda a camara, do paiz, porque, é preciso dizei-o bem alto, a questão das pautas e questão de vida ou de morte para muitas industrias.
Por isso mais obrigação teem as pessoas, que tomarem parte no debate, que se empenharem na discussão, de pensar bem nas proposições que avançarem, nas theorias que defenderem.
Eu, sr. presidente, tomarei a responsabilidade dos factos que vou discutir, e em quanto aos outros factos, declino a minha responsabilidade sobre o sr. ministro, sobre o sr. relator.
Sr. presidente, é preciso que ninguem perca de vista que, conforme for votado um ou outro direito, assim poderá ser prejudicado, poderá ser morto, um ou outro ramo de industria.
Eu já tive occasião de ponderar, sr. presidente, se não n'esta casa do parlamento, pelo menos lá fóra e por mais de uma vez, que, na situação em que se acha actualmente o modo de ser da sociedade moderna succede muitas vezes uma cousa curiosa, e que é para lamentar.
Existe uma industria qualquer, industria que está em estado florescente, e de repente essa industria sente-se ferida, decáe, morre mais ou menos rapidamente, ignorando muitas vezes os proprios interessados a causa disso, ignorando quem lhes vibrara o golpe de morte!
Pois, sr. presidente, quando se vae perscrutar a verdade, o que é que se encontra muitas vezes?
Uma medida pautal mal tomada, ou um tratado de commercio mal feito!!!
Feita esta indicação direi que, reduzidos a tres os pontos principaes em que eu entendo que se deve, por assim dizer, conglobar a missão das pautas, não me occuparei do primeiro e do segundo, pela rasão seguinte.
Estou certo que o sr. ministro da fazenda teve o maior cuidado em acautelar a nova pauta de fórma a crear maior receita para o estado: e desde que s. exa. acautela isso, necessariamente acautelou tambem a questão de se colligirem os dados estatisticos mais exactos e minuciosos.
Mas se assim é, devo todavia insistir n'uma outra parte do problema referente ao primeiro facto, e é que n'esta questão das pautas, como fonte de receita para o estado ha duas outras questões ligadas e muito importantes.
Uma é a questão do contrabando; a outra a da facilidade de expediente, ou do serviço interno das alfandegas.
Para a questão do contrabando já eu tive occasião, na legislatura que findou em 1884, de chamar a attenção da camara, e chamal-a-hei agora de novo.
A maior parte da gente, não direi a maior parte da gente, direi um grande numero de pessoas, não considera o contrabando como um roubo.
Sr. presidente, é para lastimar que assim succeda, porque é esse um principio falso, e não sei qual ha de ser o motivo por que em legislação ha de ser considerado criminoso o individuo que rouba um bocado de pão para dar á sua familia, que está faminta, o individuo que se apropria illegitimamente de um bocado de pão para dar de comer á mulher e aos filhos, e não ha de cair sob a acção da mesma lei, como igualmente criminoso, de igual categoria, ou antes de categoria muito superior, o individuo que rouba por meio de contrabando. Eu bem sei que legalmente se applicam penas para um e outro caso; mas o que eu quiz e quero accentuar é que nós todos, um por todos, devemos, contra uma certa orientação, fazer vigorar este principio de que effectivamente quem rouba ao estado, rouba tanto como quem rouba a um particular.
Em quem rouba ao estado dá-se uma circumstancia aggravante, e bem aggravante, a de que o roubo feito ao estado traz, muitas vezes, se não sempre, prejuizos para maior numero de individuos do que póde trazer o roubo, feito a um determinado individuo, ou familia.
Desde o momento ein que nesta camara mais ds uma vez se tem fallado, e com toda a franqueza, na existencia do contrabando, como um facto com o qual tem de se contar, espero, e estou certo que o sr. ministro da fazenda ha de empregar todos os meios para extirpar da sociedade aquelles, que eu alcunharei, porque é moda, de epilepticos larvados. (Riso.) Se este nome se póde applicar com propriedade em algum caso, direi que esse caso é o do contrabando. (Apoiados.}
Direi mais; nós approvámos, ha dias, uma medida de alto alcance em relação ao porto de Lisboa, projecto de lei, n.° 134, e, agora, direi de passagem que estou convencido que, da sua execução, desses melhoramentos, resultarão outros tantos meios conducentes a evitar, ou pelo menos, a desnortear o contrabando.
A este respeito poderia insistir em que, quanto mais elevados são os direitos, maior estimulo ha para o contrabando.
Pelo conhecimento, que eu tenho do projecto, que está em discussão, parece-me que o illustre relator está de accordo commigo n'esta parte.
Não insistirei pois, sobre isso, mas direi ainda que o contrabando, sobre que se falla muitas vezes, tem existido no paiz generalisado por uma forma, de que pouca gente faz idéa.
Na legislatura que findou em 1884 tambem eu me referi nesta casa ao contrabando, e agora occorre-me que, haverá dois ou tres annos, quando estive no Porto, me succedeu um caso muito curioso que passo a expor.
Encontrando-me um dia de manha n'um d'esses carros americanos, que percorrem essa cidade com tanta rapidez, o assumpto geral da conversa entre um grande numero de passageiros, naturaes do Porto, era o facto, que se tinha dado na noite precedente, ou no dia anterior, da introducção, por meio do contrabando, de uma quantidade de pipas de vinho para o consumo.
Era isto considerado como um facto regularissimo, e da mesma conversação, feita em voz alta, se concluia que eram bem conhecidos os nomes dos individuos que tinham tomado parte na acção.
Desde o momento em .que se dão estes factos, é conveniente que nós todos, sr. presidente, tambem accentuemos no seio da representação nacional que effectivamente é necessario, e indispensável, para os interesses do fisco, para vantagem de todos, que se procure, que se empreguem todos os meios para reprimir toda a especie de contrabando.
Com respeito á outra questão, a da facilidade do serviço interno das alfandegas, do expediente, e consequentemente a da fiscalisação, tambem eu n'esta casa, quando na legislatura que findou em 1884 me dirigi mais directamente ao sr. ministro da fazenda de então, o sr. conselheiro, Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro, tive occasião de dizer á boa paz que, se s. exa. quisesse illustrar a sua gerencia na pasta da fazenda, deveria procurar fazer duas cousas: uma, facilitar o expediente do serviço das alfandegas por todas as fórmas possiveis; a outra, procurar fazer com que baixasse a taxa dos juros da divida fluctuante.
S. exa., não sei por que motivo, não póde realisar nem

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uma nem outra cousa, embora eu pelos documentos officiaes tenha conhecimento de que s. exa., na parte que diz respeito ao serviço interno das alfandegas, alguma cousa trabalhou.
Vejo com satisfação que o governo procura satisfazer a essas duas necessidades. (Apoiados.)
Já tive occasião, por mais de uma vez, de prestar homenagem ao actual sr. ministro da fazenda pelo grande serviço que prestou ao paiz com a baixa da taxa de juros da divida fluctuante, mas eu desejaria que s. exa. fosse mais longe.
Desejaria, sr. presidente, que no ministerio da fazenda os serviços relativos á divida fluctuante fossem organisados por tal forma que, mais tarde, quando s. exa., por effeito da rotação ordinária dos partidos, tivesse de abandonar a cadeira de ministro da fazenda, esses serviços ficassem organisados de maneira tal que nunca mais podessem voltar á fórma antiga.
Com respeito ainda ás pautas, tambem direi, que, debaixo de outro ponto de vista, o desideratum em questões de pautas, deve ser que n'ellas haja o menor numero possível do artigos.
O sr. relator, que é muito versado nestas questões, não ignora de certo que as pautas de alguns paizes do mundo têem um numero limitado de artigos.
No projecto de pauta, que está em discussão, encontra-se effectivamente uma reducção importante no numero d'elles, comparando-a com a pauta anterior e com a que aqui foi apresentada em 1866, e por isso limito-me a pedir a s. exa. que persista nesse louvável intento, e peça tanto quanto for possível, para reduzir os ainda mais para preparar a transição para esse desideratum a que já me referi e a que se deve aspirar em materia pautal ou aduaneira.
Em Portugal, sr. presidente, ha muitos artigos na pauta geral das alfandegas, e por isso tenho eu, ha muitos anuos, procurado saber qual é a origem d'este estado de cousas.
Segundo o meu modo de ver a origem deste mal vem do predomínio da burocracia na gerencia e administração dos negócios publicos.
Eu fui empregado publico durante dezeseis annos, e por isso tive occasião de estar não só em contacto intimo com a burocracia, mas de fazer parte d'ella.
O que eu vi durante esse largo período de tempo, o que se passou commigo em mais de uma conjunctura, o que tenho presenceado depois, tudo me leva a affirmar aquillo que eu sinto, que todos nós sentimos, isto é, que a burocracia, como entidade, devo ser contada hoje quasi como um poder do estado.
Admittindo, como admitto, a existencia das melhores intenções em muitos d'esses funccionarios publicos, é certo, porém, que desde o momento em que na apreciação de qualquer facto de administração publica, eu encontro pela proa esse outro poder do estado, não posso deixar de orientar os meus estudos por fÓrma tal que procure saber qual o predomínio e a influencia que esse outro poder pode ter tido na existencia d'esse facto.
Ora debaixo do ponto de vista do numero dos artigos da pauta, eu sou levado a crer que na pauta de Portugal o seu grande numero tem sido devido ao predomínio da burocracia neste ramo de serviço publico.
Vou dizer por que.
Entra um homem para os conselhos da corÔa, e nomeado ministro, e se é ministro da fazenda procura logo saber, não póde deixar de o fazer, qual o estado do thesouro publico, e procura ver se será possível crEar receitas novas.
Para isso manda chamar os empregados mais competentes, e pergunta-lhes naturalmente se ha algum projecto de lei pendente que ainda possa ser apresentado á camara, se dão noticia de alguma base para novos tributos, para novas receitas.
Terá succedido, mais de uma vez, ter um desses empregados, altamente collocados, chegado ao pé do novo ministro e ter-lhe dito: é possivel conseguir um augmento de receita, augmentando este ou aquelle imposto, esta ou aquella taxa.
Já alguem disse em linguagem pittoresca, vão já em alguns annos, que isto correspondia a fazer um orçamento a lapis, ao correr da penna, attendendo unica e exclusivamente á possibilidade de augmentar a receita publica com o augmento dos impostos e das taxas aduaneiras.
N'essas circumstancias partiu-se sempre, e infelizmente, de uma base falsa, que esse augmento de impostos e de taxas aduaneiras não havia de necessariamente actuar sobre a importação ou exportação das mercadorias, sobre a materia collectavel.
Attribuindo, como attribuo, á influencia da burocracia a existencia de grande numero de artigos na pauta de Portugal, e tendo dado disso a demonstração que julgo concludente, sou levado agora a prevenir o illustre relator de que, para simplificar para o futuro ainda mais esta pauta, ha de s. exa. no conselho superior das alfandegas ter em linha de conta a influencia desse outro poder do estado, a que me tenho referido.
Resumindo direi agora que, segundo o meu modo de ver, segundo a minha orientação em materia pautal, as minhas aspirações seriam as seguintes:
Indical-as-hei devagar, para que o illustre relator do projecto tenha occasião de tomar nota no que vou expor.
As minhas aspirações seriam:
Em primeiro logar, que houvesse um pequeno numero de artigos; em segundo logar, que não houvesse direitos de exportação sobre os producíos nacionaes, existindo apenas direitos estatísticos; em terceiro logar, que não houvesse tratados alguns de commercio, e que a havel-os fossem limitados no tempo e na quantidade dos artigos.
Já aqui declarei n'esta casa, na presente legislatura, e torno agora a fazel o incidentemente, que eu fui um dos que na camara dos senhores deputados da nação portugueza votaram contra o tratado de commercio com a Franca, tratado que vigora até 1892.
Acrescentarei tambem agora que o sr. ministro da fazenda nessa epocha, o sr. conselheiro Antonio de Serpa Pimentel, era já meu amigo e ainda hoje o é, que s. exa. durante a minha vida de funccionario publico me linha dado sempre as maiores provas de confiança que um ministro da corôa póde dar a um empregado seu subordinado.
Ora, apesar de todas essas circumstancias, eu entendi em consciencia que não podia votar pelo tratado de commercio com a França; votei contra e não estou d'isso arrependido, pelo contrario, applaudo me de ter votado contra esse tratado.
Entendo que, em um paiz pequeno como o nosso, o maior erro que se póde praticar em assumptos económicos e financeiros, é fazer tratados de commercio, principalmente de longo praso de tempo e com muitos artigos pautaes, com uma nação qualquer e peior com uma mais poderosa.
Sr. presidente, todos estamos lembrados do que, ainda ha poucos dias, se tem dado com o tratado de commercio com a Hespanha.
Todo o paiz desejou que chegasse a occasião de acabar, de expirar esse tratado.
Devemos ser muito cautelosos em relação aos tratados de commercio que hajam de fazer, ou que tenham de ser prorogados.
Em quarto logar, seria aspiração minha que houvesse direitos protectores para as industrias proprias, ou naturaes, e não artificiaes ou adaptadas com vicia ficticia.
Desejaria que houvesse direitos pautaes, que garantissem preços e aununciadores de venda para as industrias que,

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1938 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

para assim dizer, são innatas no paiz, ou que como taes podem ser consideradas.
Seria para desejar que deixassem de ser protegidas na pauta as industrias que são, por assim dizer, exploradoras do publico, do paiz, e que não teem rasão de ser, de existir.
Segundo o meu modo de ver, de sentir, deveriam desapparecer da pauta portugueza os direitos pautaes, que dão vida a essas industrias.
Em quinto logar, eu quereria prohibição absoluta de entrada para todos os generos, que nós produzimos, ou podemos produzir como por exemplo, a lã.
Nós produzimos a lã, temos fabricas de lã e o que succede? É que a maior parte d'essas fabricas empregam a 13, estrangeira; e só empregam as lãs portuguezas, com uma grande baixa de preço. Mais tarde me referirei talvez mais detidamente a este ponto.
Em sexto logar, quereria protecção para todos os generos coloniaes portuguezes. (Apoiados.)
Hei de insistir sempre n'esse ponto. Desde que temos colonias, nós devemos protegel-as, não só mandando para lá bom pessoal administrativo ou de qualquer outra ordem, mas principalmente promovendo a collocação no continente dos productos agricolas ou fabris que de lá possam vir, assumpto este de que, na minha opinião, não se tem tratado.
Em setimo logar, torno a insistir, quereria de uma maneira certa e pelo regimen pautal, a morte das industrias que têem uma vida artificial e que considero como outros tantos elementos phylloxericos. (Apoiados.)
Ora, pergunto eu, attenderá à pauta, que estamos discutindo, a todos estes pontos, a todas essas aspirações?
Deixo isto á consciencia do illustre relator.
Pela minha parte fiz o que devia fazer: apresentei qual era o desideratum, a que quereria que attiNgisse a pauta portugueza.
Se attinge ou não esse desideratum, se attende ou não a todos esses pontos, não o posso eu affirmar, baseado só na leitura rapida que fiz dos documentos que me foram fornecidos, mas o illustre relator está no caso de o affirmar, tanto mais quanto s. exa. tomou notas do que acabo de expor, e poderá fazel-o na sua replica, ou ao meu discurso ou ao de algum dos oradores, que só me seguirem.
Ha mais um outro ponto, e melindroso, para o qual chamo a attenção da camara, e ao qual me vou referir com todo o cuidado.
O governo e a commissão não podiam, necessariamente deixar de se ver muito perseguidos por pedidos de um ou outro lado, em relação aos assumptos da pauta.
Pois eu, sr. presidente, pela minha parte, eu que procuro representar aqui os interesses da agricultura portugueza, appello para o testemunho do sr. ministro da fazenda, e para o do sr. relator da commissão, e affirmo que não fiz a minima diligencia para a minha opinião intervir nos trabalhos do governo e da commissão, com respeito a qualquer ponto que seja do projecto de lei em discussão.
O sr. Ministro da Fazenda: - Apoiado.
O sr. Matoso dos Santos (relator): - Apoiado.
O Orador: - Mantive n'este caso expressamente aquillo que mais de uma vez affirmei, e que n'este momento está sendo confirmado, isto é que tudo que na qualidade de deputado tivesse de dizer ao governo ou a qualquer dos seus membros, sobre assumpto de administração publica, o diria sempre em voz alta, n'esta casa, como o estou fazendo agora.
Por consequencia, certo de que pela minha parte não procurei influir, junto do governo, nem junto do sr. relator de maneira alguma, do modo que fosse possivel julgar-se que eu tinha procurado exercer, um atomo sequer, de influencia na pauta, declaro que desejo que s. exas. não se tenham deixado influenciar em relação a todas as outras industrias.
Mas vou mais longe, e affirmo que faço a justiça de acreditar, que s. exas. procuraram há ver-se em todos estes trabalhos, com a maior imparcialidade, attendendo só ao bem do paiz e não aos interesses de uma ou de outra industria.
O terceiro ponto a que me referi, quando indiquei que a missão das pautas abrange tres fins, foi por mim posto em relevo, quando disse que pela situação actual da sociedade, pelas circumstancias que actualmente se dão no mundo, a questão das pautas é uma questão de vida ou do morte para muitas industrias.
Este estado de cousas faz com que, segundo já o declarei, devamos ser muito cautelosos em relação aos tratados de commercio que hajam de se fazer, ou que tenham de ser prorogados.
Desde o momento em que, e tambem já me referi levemente a este ponto, uma industria é ferida de morto pela pauta, como se ha de dar vida a essa industria?
O estado deve protecção ás industrias, para que ellas possam viver desafogadamente, para que tenham preços de venda remuneradores, e essa protecção, no caso em questão, só póde ser dada por meio da pauta ou por meio de tratados commerciaes.
Desde que eu sou contra os tratados commerciaes, tenho necessariamente de recorrer á protecção da pauta, tenho de aconselhar, do justificar, esse recurso unico, e talvez ainda n'esta sessão tenha occasião de dar mais desenvolvimento ás minhas idéas sobre este assumpto.
Tudo isto serve para fazer ver que, na minha opinião, tem a maior importancia a discussão da pauta.
Mas vamos continuando.
A camara sabe qual seria o meu desideratum em materia pautal, ou aduaneira.
Acrescentarei que entendo que a pauta póde ser discutida debaixo do ponto de vista dos principios geraes sobre que é organisada, e debaixo do ponto de vista dos impostos que vão pesar sobre os géneros, que a ella vão ficar sujeitos.
Em relação ao primeiro ponto de vista já apresentei as minhas idéas, e espero que o illustre relator da commissão, quando fali ar, procurará expor bem claramente á camara, ao paiz, as suas idéas, por forma que, ainda inclua do que pela leitura, do parecer, se possa ter completo conhecimento das suas opiniões, do seu modo de pensar sobre as bases que presidiram á organisação da pauta que se discute.
Resta a questão dos direitos.
Quanto aos direitos d'esta pauta, elles são tantos e tão variados, que um só orador não poderia ter a pretensão de tratar de todos elles com perfeito conhecimento de causa, ainda pondo do parte a questão da falta de tempo.
Faço uma excepção, e esta excepção refere se ao sr. ministro da fazenda, que é o auctor da proposta de lei de reforma da pauta aduaneira, e tambem comprehende os srs. membros da commissão de fazenda, os quaes necessariamente tiveram de tomar cabal conhecimento do assumpto, pois afigura-se-me que a proposta e o projecto tiveram de ser largamente discutidos no seio da commissão.
Affirmo, pois, que os membros da commissão e o sr. ministro da fazenda, são os que, n'esta camara, estão no caso de poder apreciar devidamente todas as alterações que no projecto se propõem.
Quer isto tambem dizer que eu não procurarei entrar, nem sequer, na apreciação, no exame, de muitos artigos da pauta, que se discute.
Entrarei na apreciação de alguns dos artigos da pauta, que se referem á industria agricola, declarando tambem que, abstendo-mc de entrar na apreciação da pauta debaixo do ponto de vista da industria fabril, farei uma excepção com respeito a alguns artigos relativos á industria fabril e para um dos quaes a minha attenção foi mais directamente chamada pelos proprios interesses.
Refiro-me, sr. presidente, aos gravadores em madeira,

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SESSÃO DE 20 DE JULHO DE 1887 1939

que, ameaçados de uma crise de trabalho pela descoberta de novos processos de gravura, ficam completamente indefesos pelo que o projecto dispõe no n.° 65 da tabella B, pauta de importação.
Julgo que a esta camara já foi dirigida uma representação da iniciativa da associação typographica lisbonense e artes correlativas, indicando a possibilidade d'essa crise de trabalho, e pedindo protecção para os artistas, interessados n'essa ordem de trabalhos, n'essa industria.
Tambem mandarei para a mesa outras duas propostas, ou emendas, relativas a alguns artigos, que sào importados do estrangeiro, e que nós não produzimos, e têem applicação na educação e na instrucção primaria e secundaria.
A hora está a dar, sr. presidente, e por isso peço a v. exa. que me reserve a palavra para a sessão da noite.
O sr. Marianno Presado: - Mando para a mesa um parecer das commissões de guerra e de fazenda sobre a proposta de lei do governo relativa á creação de uma escola de infanteria e de cavallaria.
O sr. Presidente: - Hoje ha sessão nocturna.
A ordem da noite é a continuação da discussão do projecto de lei n.° 186.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas da tarde.

Propostas de lei apresentadas n'esta sessão pelos srs. ministro da fazenda e ministro das obras publicas

N.° 195-A

Senhores. - Para se realisarem os fundos destinados a embolsar o banco nacional ultramarino da importancia por que era credor ás juntas de fazenda do ultramar em 30 de junho de 1885, foi o mesmo banco auctorisado por decreto de 29 de dezembro seguinte a emittir 9:119 obrigações de 90$000 réis cada uma, vencendo o juro de 6 por cento e amortisaveis em trinta annos, ficando garantido pelo governo, nos termos da carta de lei de 22 de julho d'aquelle anno, o respectivo juro e amortisação, na importancia annual de 59:309$400 réis.
Tendo, porém, o banco encontrado difficuldades na negociação das obrigações do referido typo, por não offerecerem attractivo remunerador na amortisação, parece conveniente, não só ao credito do banco como ao do estado, permittir que a operação se effectue em titulos de juro inferior sem augmento de responsabilidade para o thesouro.
N'esta conformidade tenho a honra de submetter á vossa consideração a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° É auctorisado o governo a permittir a conversão das obrigações emittidas pelo banco nacional ultramarino, em virtude do decreto de 29 de dezembro de 1885, e com fundamento na carta de lei de 22 de julho do mesmo anno, em outras de juro inferior, convtanto que não haja augmento no praso da amortisação fixado n'aquella lei, e na annuidade de 59:309$400 réis indicada no citado decreto.
Art. 2.° Continuam em vigor as demais prescripções da carta de lei de 22 de julho de 1885, que não são modificadas pelas disposições do artigo antecedente.
Art. 3.° A emissão das novas obrigações não poderá effectuar-se sem que sejam apresentados e cancellados no ministerio da fazenda todos os titulos provisorios da operação auctorisada pelo citado decreto de 29 de dezembro de 1885, e que foram registados, rubricados e sellados na direcção geral da thesouraria do mesmo ministério.
Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.
Ministerio da fazenda, 19 de julho de 1887. = Marianno Cyrillo de Carvalho.

Copia do decreto de 29 de dezembro de 1885

Tendo-me sido presente a representação do banco nacional ultramarino, datada de 7 de novembro ultimo, solicitando auctorisação para crear 9:119 obrigações de 90$000 réis amortisaveis em trinta annos, vencendo o juro annual de 6 por cento desde 1 de julho de 1855, a fim de com fundamento na carta de lei de 22 do mesmo mez poder representar a importancia de que é credor ás juntas de fazenda das provincias ultramarinas de Cabo Verde, S. Thomé e Principe, Angola e Moçambique, nos termos do mappa annexo á dita lei, levando em conta os juros decorridos e as amortisações effectuadas até 30 de junho anterior: hei por bem, vistas as disposições da citada lei e haver mostrado o banco que se acham devidamente attendidas as obrigações contrahidas com o Comptoir d'Escompte de Paris no contrato de 24 de agosto de 1880, determinar que se expeçam as auctorisações necessarias para se levar a effeito a indicada operação, tendo em consideração o seguinte:
1.° Que o juro e amortisação ficam garantidos pelo governo em conformidade do artigo 1.° da mencionada lei;
2.° Que a prestação annual destinada á amortisação d'estas obrigações e a pagar o respectivo juro dentro dos limites da auctorisação contida no § unico do referido artigo é de 59:309$000 réis;
3.° Que as obrigações definitivas creadas e emittidas pelo banco deverão ser apresentadas na direcção geral da thesouraria do ministerio da fazenda, para ali serem devidamente registadas, rubricadas e selladas;
4.° Que á medida que o banco for recebendo o producto da emissão será este applicado ao pagamento da divida contrahida com a responsabilidade do governo na importancia de 220:000$000 réis no banco de Portugal e de libras 51:800 por desconto de saques sobre a agencia financial em Londres, não devendo effectuar-se a entrega das obrigações apresentadas nos termos da condição antecedente sem que o referido pagamento se haja verificado.
Os ministros e secretarios d'estado dos negocios da fazenda e da marinha e ultramar assim o tenham entendido e façam executar. Paço, em 29 de dezembro de 1885.= REI. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Manuel Pinheiro Chagas.

N.º 195-B

Senhores. - Por virtude de auctorisação que ao governo confere o artigo 7.° do decreto de 25 de novembro de 1886 foi annunciada a venda, em hasta publica, do pinhal de Santa Citta, situado no concelho de Thomar.
Acontece, porém, que a camara municipal do mesmo concelho pondera que no referido pinhal se effectua desde remotissimas eras um mercado mensal de gados e uma feira annual a que concorrem os povos dos concelhos limitrophes, e por isso muito conviria que aquella propriedade do estado não passasse ao dominio particular, porque d'ahi resultaria a transferencia do mercado para outra localidade menos apropriada e deslocação de interesses que affectariam desfavoravelmente o concelho e susceptibilisariam o sentimento popular. N'estas circumstancias e por que o municipio de Thomar se promptifica a adquirir a mesma propriedade pelo preço que serve de base á licitação, com o intuito de conservar os habitos tradicionaes que a ella se acham ligados, tenho a honra de submetter á deliberação do parlamento a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° É o governo auctorisado a contratar e effectuar a venda do pinhal de Santa Citta, situado no concelho de Thomar, pelo preço que serve de base, á licitação no respectivo annuncio official, á camara municipal do mesmo concelho.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Ministerio das obras publicas, commercio e industria, em 20 de julho de 1887. = Emygdio Julio Navarro.
Foram enviadas ás commissões respectivas.

Redactor = Rodrigues Cordeiro.

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