1635
DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
da cabeça do sr. bispo do Vizeu, como a deusa que saíu armada da cabeça do Jupiter, e n'esse tempo não se encontrava esta palavra em nenhum dos diccionarios das linguas neo-latinas, posto que andasse em alguns livros de pedagogia francezes e italianos, e até nos regulamentos da Belgica.
Hoje encontra-se no Diccionario encyclopedico do seculo XIX, de Larousse, que não concedeu ao sr. bispo de Vizeu as honras de inventor d'este barbarismo.
O certo é que o Schulgeld avultava no mappa a que me refiro.
Montava a 2.321:000. thalers, que são perto de réis 1.507:000$000, e mais de 31 por cento da somma dos ordenados do magisterio primario na Prussia.
Isto não era possivel n'uma nação que tinha a instrucção elementar gratuita.
Conclui, pois, que não sabia traduzir ou entender aquella palavra.
Passado algum tempo, encontro uma proposta do governo prussiano ao parlamento, para que fosse revogado o artigo da constituição, que promettia dar do graça a instrucção elementar. ¦
Essa proposta era. precedida do um substancioso relatorio, em que se dizia que de facto a instrucção primaria só por excepção ora gratuita em partes de algumas provincias da Prussia.
A proposta não passou, mas fiquei então percebendo o que era o mysterioso Schulgeld, e conclui que os sabios citando levianamente o exemplo da Prussia alimentavam nos povos a illusão de que se podiam civilisar, começando logo por prescindir de nina fonte de receita que n'aquelle paiz concorria com 31 por conto para a subsistencia dos seus professores.
Nós temos pela carta a instrucção gratuita; mas o que temos na verdade é uma pesada ignorancia.
A falta do retribuição escolar, que não podemos estabelecer por ser contra a constituição, augmenta a difficuldade em que se hão de ver os nossos municipios, que desejarem acompanhar as nações mais adiantadas, encontrando fechado um dos caminhos que as levaram á prosperidade relativa que hoje lhes invejámos.
Parece-me escusado continuar na demonstração da impossibilidade de tirar algum proveito da nova lei do instrucção. primaria. E creio que estaremos convencidos da necessidade do estudar o modo de resolver a questão na proxima sessão legislativa. (Apoiados.)
Quanto á instrucção secundaria, o seu estado é lastimoso. Todos o reconhecem, o escuso do o demonstrar.
O decreto do sr. bispo de Vizeu melhorava-a muito, na minha opinião. Por meu voto não teria sido publicado sem um relatorio; porque tinha algumas disposições, antigas para outros paizes mais adiantados, mas novas para nós, o deviam surprehender o indispor a opinião publica, mal informada.
O ministerio do sr. bispo havia pedido a demissão, o esteve em crise durante muitos dias. O sr. bispo de Vizeu não quiz, o com rasão, fazer um relatorio com antedata, e mandou publicar o decreto para que os seus successores (dizia elle) tivessem o trabalho de o revogar.
Este decreto elevava a seis annos o curso dos lyceus que até ali era de cinco. O augmento do um anno era insufficiente; mas não se podia dizer rapidamente ás familias que seus filhos tinham de passar mais tempo nas escolas antes de poderem entrar nos empregos publicos. Na Prussia a instrucção secundaria gasta oito annos, o uma longa pratica tem mostrado que este tempo é necessario e sufficiente.
Não podiamos fazer tanto, de repente. Para o realisar-mos, teriamos de abreviar os cursos de instrucção superior, que entro nós são demasiadamente longos, e n'esse caso teriamos do luctar com as tradições dos nossos, estabelecimentos de instrucção superior, que são instituições naturalmente conservadoras.
A prudencia recommendava que se caminhasse lentamente. Augmentou-se um anno, o quando o publico estivesse acostumado ao curso do seis annos, podia este curso ser elevado a sete annos, que me parecem indispensaveis para a boa instrucção dos alumnos..
A principal novidade do decreto do sr. bispo de Vizeu, pelo menos a que mais se estranhou, foi o ensino simultaneo de muitas disciplinas, cujos titulos pomposos faziam suppor a muita gente que não eram para estudantes novos.
Ora, a supposta novidade é uma das cousas mais antigas que ha no mundo. Os filhos do pae Adão foram de certo educados por um methodo analogo, aprendendo muitas cousas ao mesmo tempo. (Riso)
Provavelmente, quando tinham sete annos, já sabiam distinguir o sol da lua, e das estrellas, o dia da noite, etc. Sabiam, pois, alguma cousa de astronomia. Differençavam a raiz do tronco e das folhas, etc.; conheciam o seu boca; do de botanica. Não confundiam o coelho com o carneiro, nem o boi com o cavallo, e tinham noções do zoologia.
Bem dizia Rousseau, que aos sete annos sabemos mais do que havemos do aprender no resto da nossa vida. Sabemos milhares de palavras a que correspondem outras tantas idéas, e temos uma infinidade de conhecimentos do mundo, physico e do mundo moral, que fomos adquirindo simultaneamente. Na verdade, os homens mais sabios, os Aristoteles, os Humboldt não sabem no fim da sua, vida O ponto é sabel-o escolher e preparar......- Os nossos professores, com os ordenados que tinham, não podiam dedicar ao ensino por este methodo o tempo que era indispensavel. O sr. bispo de Vizeu procurou augmental-os sem'aggravar a situação da fazenda. O augmento, comquanto não fosse qual se requeria, podia montar em alguns lyceus a cerca do 200$000 réis, o este augmento estava n'uma certa relação com o trabalho dos professores. Demais, se a idéa tivesse sido acceita, era possivel ir lentamente acrescentando os ordenados, sem que o thesouro o sentisse. Hoje, se não se quizer restaurar o systema introduzido pelo illustrado bispo de Vizeu, ainda ha um remedio. É ir buscar ao orçamento o dinheiro que se gasta com as commissões de exames, e repartil-o pelos professores dos lyceus. (Apoiados.) Assim póde prohibir-se-lhes o ensino particular, como o fazia o sr. bispo de Vizeu, e entregar-se-lhes. nos respectivos lyceus o exame dos alumnos. (Apoiados.) Já se vê que estou do accordo com os representantes dos lyceus de fóra das capitães das circumscripções actualmente estabelecidas, Feito isto, deve restabelecer-se o exame de madureza (Apoiados.) Dizia-se que este exame era contrario á attenção devida aos examinadores dos lyceus. Não é tal. Este exame tem um caracter diverso e abrange ou deve abranger todas as materias da instrucção secundaria. O examinador que approvou um alumno n'uma disciplina qualquer, não é obrigado a conservar n'esse alumno a instrucção que tinha quando foi approvado. Se elle perde n'um anno o que sabia no anno antecedente, o examinador não é o culpado, nem deve reputar-se por desconsiderado se o estudante não satisfaz como deve ao exame da' madureza,. A indole de exames nunca foi bem comprehendida entre nós. Antes que o sr. Sampaio os abolisse, já tinham, sido muito cerceados, o nunca foram estabelecidos com q caracter que lhes é proprio, • Sessão nocturna de 9 de maio de 1979