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sessão nocturna de 9 de maio de 1879

Presidencia do ex.ª sr. Francisco Joaquim da Costa e Silva

Secretarios - os srs.

Antonio Maria Pereira Carrilho Augusto Cesar Ferreira de Mesquita

Discute-se o orçamento do ministerio doa negocios ecclesiasticos e da justiça. — São approvados todos os seus capitulos.

Abertura — Ás oito horas o meia da noite.

Presentes á abertura da sessão 50 deputados — Os srs.: Adolpho Pimentel, Adriano Machado, Carvalho e Mello, Braamcamp, Torres Carneiro, Pereira de Miranda, Avila, Lopes Mondes, Caril lho, Ferreira do Mesquita, Pereira Leito, Barão de Ferreira dos Santos, Caetano do Carvalho, Sanches do Castro, Cazimiro Ribeiro, Costa Moraes, Hintze Ribeiro, Firmino Lopes, Mesquita e Castro, Pinheiro Osorio, Francisco Costa, Sousa Pavão, Van-Zeller, Guilherme de Abreu, Paula Medeiros, Palma, Jeronymo Pimentel, Anastacio de Carvalho, Brandão e Albuquerque, João Ferrão, Sousa Machado, Dias Ferreira, Tavares de Pontes, Frederico Laranjo, Frederico Costa, Namorado, Rodrigues de Freitas, J. M. dos Santos, Taveira do Carvalho, Julio de Vilhena, Lopo Vaz, Almeida Macedo, Freitas Branco, Faria o Mello, M. J. Vieira, Macedo Souto Maior, Aralla e Costa, Pedro Jacome, Rodrigo de Menezes, Visconde de Andaluz, Visconde do Balsemão, Visconde do Sieuve de Menezes.

Entraram durante a sessão — Os srs.: Agostinho Fevereiro, Osorio de Vasconcellos, Alfredo Peixoto, Alipio Leitão, A. J. Teixeira, Mendes Duarte, Fuschini, Carlos de Mendonca, Silveira da Mola, Jeronymo Osorio, Scarnichia, Almeida e Costa, J. J. Alves, José Guilherme, Figueiredo de Faria, Borges, Sousa Monteiro, Sá Carneiro, Luiz de Lencastre, Manuel d’Assumpção, Correia do Oliveira, Pinheiro Chagas, Miranda Montenegro, Miguel Dantas, Pedro Correia, Pedro Roberto, Visconde da Aguieira.

Não compareceram á sessão — Os srs.: Fonseca Pinto, Tavares Lobo, Alfredo de Oliveira, Gonçalves Crespo, Emilio Brandão, Arrobas, Pedroso dos Santos, Barros e Sá, Pinto de Magalhães, Telles de Vasconcellos, Neves Carneiro, Saraiva de Carvalho, Victor dos Santos, Zeferino Rodrigues, Avelino de Sousa, Bernardo de Serpa, Conde da Foz Diogo de Macedo, Moreira Freire, Emygdio Navarro, Goes Pinto, Filippe de Carvalho, Fortunato das Neves, Francisco de Albuquerque, Mouta e Vasconcellos, Gomes Teixeira, Pereira Caldas, Frederico Arouca, Freitas Oliveira, Costa Pinto, Melicio, Barros e Cunha, J. A. Noves, Ornellas de Matos, Pires de Sousa Gomes, José Luciano, Ferreira Freire, Teixeira de Queiroz, Pereira Rodrigues, Mello Gouveia, Barbosa du Bocage, Lourenço de Carvalho, Luiz de Bivar, Luiz Garrido, Pires de Lima, Rocha Peixoto, M- J- de Almeida, Alvos Passos, M. J. Gomes, Nobre de Carvalho, Marçal Pacheco, Mariano de Carvalho, Miguel Tudella, Pedro Carvalho, Pedro Barroso, Ricardo Ferraz. Thomás Ribeiro, Visconde de Alemquer, Visconde da Arriaga, Visconde da Azarujinha, Visconde de Moreira da Rey, Visconde do Rio Sado, Visconde de Villa Nova da Rainha.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

Officio

Da mesa da camara dos dignos pares do reino, enviando a proposição de lei que auctorisa a applicação do extincto convento de Santo Agostinho do Chellas, o sua dotação, á fundação de um collegio filial das missões ultramarinas portuguezas.

Enviado á secretaria.

ORDEM DA NOITE

Discussão do orçamento do ministerio dos negocios ecclesiasticos e do justiça

O sr. Presidente: — Vae ler-se, para entrar em discussão, o capitulo 1.° do orçamento do ministerio dos negocios ecclesiasticos e de justiça.

Leu-se.

Capitulo 1.° — Secretaria de estado....... 32:218$296

O sr. Dias Ferreira: — Desejo apenas fazer duas perguntas ao sr. ministro da justiça, a respeito do registo civil.

Parece-me este o logar mais proprio para fallar, comquanto rapidamente,.em similhante assumpto, porque o capitulo em discussão abrange o pessoal e o serviço da nova direcção do registo civil no ministerio da justiça.

Está pendente do exame do parlamento uma proposta tendente a organisar o registo civil em todo o paiz.

Não discuto agora essa proposta; não quero antecipar os debates. Não tenho fé em que ella venha á discussão. Mas essa circumstancia não me obriga a alterar a ordem natural das questões para discutir um assumpto que depende ainda do exame das commissões respectivas.

Não quero, todavia, reservar a minha opinião sobre um assumpto tão grave, e de tão largas e fecundas consequencias para as liberdades individuaes, e sobretudo para a liberdade de consciencia o para a liberdade religiosa. N'este ponto sigo, no estado actual da civilisaçào do paiz, estricta u puramente as doutrinas que vinham consignadas no projecto do codigo civil apresentado pelo governo ás côrtes em 1866.

As disposições d'aquelle projecto, elaborado por um dos nossos primeiros jurisconsultos o homens de letras, e revisto por algumas das maiores illustrações do paiz, e de opiniões politicas avançadas, como Alexandre Herculano, Marreca, Ferrer, e outros cavalheiros distinctos, soffreram, na materia do casamento civil, modificação importante, votada n'esta assembléa, e approvada na outra casa do parlamento.

N'esta occasião tomei eu uma parte activa nos debates, combatendo as modificações introduzidas por esta assembléa no projecto primitivo, e sustentando na sua pureza as doutrinas consignadas n'esse projecto que o governo apresentara ás côrtes, sem emendas nem alterações, exactamente como tinha saído das mãos da commissão revisora, mas declarando desde logo que no seio da commissão d'esta camara daria a sua opinião sobre os pontos em que não podia estar do accordo.

Neste projecto não se estabeleciam ainda assim a respeito do casamento civil as idéas de liberdade religiosa, mais largas e avançadas que se observam n'outros paizes: com outro regimen, com outros costumes e com outra civilisaçào.

Ainda ha pouco se apresentou uma proposta no parlamento brazileiro, em que o casamento era considerado unica e exclusivamente como contrato civil.

Não ía tão longe o projecto do nosso codigo civil.

Não reconhecia ainda as doutrinas mais avançadas da escola liberal, transigia com os sentimentos religiosos de um paiz essencialmente catholico como é o nosso, e transigia talvez com os principios adoptados na constituição do estado.

Mas em todo ò caso reconhecia igualmente o casamento

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celebrado na igreja catholica e o casamento celebrado nos termos da legislação civil. Assim garantia completamente a liberdade do todos, som offensa de religião de ninguem. Esse principio é o que eu acceito, no estado actual da civilisação do paiz, e na situação melindrosa da fazenda publica, para todos os actos do estado civil.

Por esta rapida exposição já v. ex.ª e a camara vêem que eu não posso dar o meu voto á proposta sobre registo, pendente do exame das côrtes. E tanto mais que o governo em presença das providencias, que se julgou auctorisado a adoptar no decreto do 28 de novembro de 1878, bem podia decretar o registo civil para todo o paiz independentemente de nova auctorisação parlamentar.

Ponho de parte esta questão, porque não devo agora discutir a proposta sujeita ao exame do parlamento, o vou fazer duas perguntas ao sr. ministro da justiça. Primeira, qual foi o numero dos registos, nascimentos, obitos e casamentos effectuados no continente do reino nos termos do decreto de 28 de novembro de 1878, no primeiro trimestre do anno em que estamos?

A segunda pergunta, para a qual chamo a particular attenção do sr. ministro da justiça e da assembléa, refere se a um telegramma publicado ha dias em todos os jornaes da capital.

Não pergunto o que ha de verdade na noticia dada n'esse telegramma.

Conheço o faço justiça aos sentimentos liberaes do nobre ministro da justiça, para suppor por um momento, que elle quizesse associar o seu nome a uma grande affronta ás liberdades publicas.

Entretanto são decorridos tantos dias sem que alguma das folhas mais affeiçoadas ao ministerio tenha desmentido aquella noticia, que me pareceu conveniente provocar o governo a explicar-se sobre o assumpto.

Faço justiça, repito, aos sentimentos liberaes do nobre ministro, e por isso pretendo apenas que s. ex.ª declare perante os representantes do paiz, que o telegramma não tem fundo algum de verdade, publicando uma noticia que, a ser verdadeira, importaria grave humilhação para a dignidade do governo portuguez; diz o telegramma:

« O Vaticano não se opporá ao estabelecimento do registo civil obrigatorio em Portugal, sendo precedido o casamento civil do casamento religioso.»

Não creio que o governo entrasse em negociações do especie alguma com a curia romana para o estabelecimento do registo civil.

Não é necessario ir ad sacra limina por este motivo. A troco da ingerencia da santa sé em similhante assumpto, preferia eu não ter registo civil em Portugal, porque o nosso primeiro dever é zelar a independencia o dignidade do imperante civil.

Desde que esta noticia veiu publicada em todos os jornaes de Lisboa, e que por ninguem foi desmentida, era dever meu provocar explicações da parte do governo a este respeito.

Espero que o sr. ministro da justiça desminta de uma maneira clara, categorica e terminante esta noticia.

Se, porém, tiver algum fundamento a noticia, espero que. o sr, ministro da justiça diga do uma maneira explicita o positiva ás côrtes, em que negociações entrou sobre este assumpto com a curia romana, e se julga necessario, ou mesmo conveniente, entender-se com a santa sé para se estabelecer definitivamente o registo civil em Portugal.

O sr. Ministro da Justiça (Conto Monteiro): — Com relação ás perguntas que me foz o illustre deputado o sr. Dias Ferreira, direi que não posso n'este momento indicar qual é o numero de obitos, nascimentos o casamentos que têem sido registados em virtude do decreto do 28 de novembro de 1878: devem existir esses esclarecimentos no ministerio da justiça, o posso fornecel-os ao illustre deputado, se s. ex.4 os desejar.

Pelo que respeita ao telegramma, recordo-me de o ter

visto nos jornaes?, mas não lhe dei importancia alguma, nem essa noticia a tem. Mão rei qual foi a sua origem: é apenas uma noticia da agencia Havas, sem caracter algum official.

Posso asseverar ao illustre deputado que não ha negociação alguma com Roma sobre este assumpto, o não a póde haver, nem é precisa. (Apoiados.)

O sr. Dias Ferreira: — Depois das explicações do nobre ministro da justiça, dou-me por satisfeito, e creio que não fiz mau serviço ao paiz, dando occasião a que s. ex.ª se explicasse de uma maneira categorica perante os representantes do paiz hobre assumpto tão importante.

Posto a votos o capitulo 1.° foi approvado.

Capitulo 2.° — Dioceses do reino......... 145:263$161

O sr. Dias Ferreira: — Se eu receber agora do sr. ministro da justiça explicações tão satisfactorias como as que ha pouco ouvi, declaro que saio contente d'esta sessão.

Parece-me que o sr. ministro da justiça vao em bom caminho; assim espero que me dê explicações ácerca do assumpto em que agora vou falar, tão completas como a3 que deu a respeito das negociações com a curia romana, por causa do estabelecimento do registo civil.

Todos sabem que ainda não ha muitos mezes e haverá pouco mais de um anno, levantei eu n'esta casa a questão da nomeação do3 conegos sem estar feita a circumscripção das diocese..

Eu não approvo a nomeação de conegos antes de realisada a circumscripção diocesana. Sei que estas nomeações são necessarias para algumas dioceses, onde por falta do conegos, se prejudica o esplendor do culto.

Mas não quero ser mais papista do que o Papa, o se o Summo Pontifice se não incommoda com essa desgraça para o culto catholico, não quero eu incommodar-me tambem mais, confiando eu, como confio, na docilidade e no espirito evangelico, de mansidão e de paz da curia romana, e convencido, por isto, de que a santa sé vem a todos os accordos. que sejam em beneficio da igreja e do estado, não desejo ainda assim largar de mão as armas indispensaveis para a trazer a um accordo, e para que o governo portuguez possa manter o seu logar. (Apoiados.)

Nós precisámos de reduzir o numero das dioceses por muitas rasões, não só economicas mas tambem politicas.

Eu desejo que o numero dos funccionarios, ou sejam de ordem civil, ou de ordem ecclesiastica, ou se chamem conegos, ou pertençam a qualquer outra categoria, seja o mais diminuto possivel.

Desde largos annos, varias providencias têem sido tomadas pelo governo o pelo parlamento portuguez para se poder effectuar a reducção das dioceses, e ainda se não póde conseguir esse desideratum.

Provavelmente é devida esta demora a cireumstancias superiores á vontade do governo portuguez e ás disposições conciliadoras em que deve encontrar se sempre a santa sé.

Mas por esta demora, o por outras rasões, seria altamente inconveniente que empregássemos o nosso tempo em nomear conegos, emquanto a santa sé não vier a um accordo com respeito á circumscripção diocesana.

N'esta parte contento-me com a declaração do governo de que não nomeará conegos emquanto não se resolver a questão da circumscripção diocesana.

Feita a circumscripção das dioceses é necessario fixar os quadros dos cabidos, e para a fixação dos quadros dos cabidos creio ou que não é precisa a intervenção da corte do Roma, e que o governo portuguez só por si a póde fazer.

A abstenção na nomeação do conegos é, no meu entender, indispensavel por via da circumscripção diocesana.

Se largarmos de mão este recurso, que eu reputo importante, no estado em que se encontram actualmente os ca-

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Lidos, a santa sé ha de vir a um accordo racional e sensato para to effectuar essa circumscripção.

E já que fallo em assumptos ecclesiasticos, aproveito a occasião para fazer outra pergunta ao sr. ministro da justiça, a que s. ex.ª dará a resposta compativel com as conveniencias reclamadas pelas negociações pendentes.

Refiro-me á confirmação do reverendo bispo eleito do Algarve.

Creio que a santa sé raras vezes terá o incommodo de confirmar um prelado tão illustrado o tão virtuoso. (Apoiados.)

Ainda não pude descobrir as rasões, que de certo excedem a minha previsão, porque a nomeação dos prelados puramente romanos não encontram difficuldades na sua confirmação.

Dentro de dois ou tres mezes estão promptos os processos, e dada a confirmação.

Se, porém, os prelados apresentados, alem dos seus sentimentos verdadeiramente religiosos e catholicos, passam por amigos da liberdade, e gosam de bom conceito no publico, como suceedeu com os bispos de Coimbra e do Porto, a santa sé demora dois o tres annos a confirmação, não obstante a illustração, as virtudes, a respeitabilidade, e em summa as altas qualidades que adornam esses prelados. (Apoiados.)

Igual procedimento está tendo agora a santa sé com o sr. bispo eleito do Algarve.

Insistindo pela confirmação do reverendo bispo eleito do Algarve, não me deixo cegar pela amuado e respeito que lho dedico. Presto apenas homenagem á minha consciencia o ás minhas convicções.

Conheço o ha largos annos, desde Coimbra, onde fui estudante, e onde sou lente com elle; e por isso repito ainda, que poucas vezes a santa sé terá occasião de confirmar um prelado com tanta illustração e com tantas virtudes como as que exercam aquelle cavalheiro. (Apoiados.)

Não costumo aconselhar os governos, sobretudo áquelles a quem não dou o meu apoio politico, a que façam exactamente o que ou faria, e já li. estando á frente dos negocios.

Convido-os apenas, como convido agora o sr. ministro da justiça, a que se mantenham na senda liberal. Eu não me resignava com este procedimento da curia romana.

Quando tive a honra de occupar o logar, que hoje occupa, de certo mais dignamente do que eu, o sr. Couto Monteiro, esteve dependente da santa sé a confirmação dos dois prelados de Coimbra o do Porto.

Repetidas vezes eu pedi ao representante da curia romana a exposição das rasões por que demorava, ou antes recusava, a confirmação d'aquelles dois prelados, porque se ellas fossem procedentes não teria eu duvida em declarar sem effeito os decretos que os haviam apresentado nas respectivas dioceses.

Eu não queria por fórma alguma insistir com a santa sé para ella proceder do modo menos digno e menos conveniente aos verdadeiros interesses da religião e do estado. Mas acrescentava logo, que se a curia romana continuasse no caminho da obstinação, nem confirmando dois prelados tão respeitaveis, nem dando as rasões da recusa, eu usaria, bom contra minha vontade, de armas iguaes, porque não tinha outras para manter a dignidade do governo portuguez; e não apresentaria um só bispo nas dioceses do reino sem que a santa sé confirmasse áquelles dois prelados, ou desse as rasões por que não os confirmava.

Cumpri pontualmente a minha palavra.

Não aconselho o sr. ministro da justiça a que faça o mesmo. Digo-lho apenas o que fiz, e o que faria ainda hoje collocado em iguaes cireumstancias.

Desejo evitar conflictos e questões, sempre que seja possivel, e sobretudo conflictos e questões que prendam com assumptos religiosos.

As questões religiosas são as mais graves para a governação do um paiz, as que mais podem irritar o espirito dos povos, e as que mais difficuldades. podem crear á marcha do poder temporal.

Mas uma cousa é não querer conflictos com o representante da igreja catholica, outra cousa é ter o poder civil A mercê do poder ecclesiastico.

Quero que ò governo se mantenha n'esta questão na mesma altura em que se mantinham os nossos governos de outras eras, ainda no tempo do absolutismo.

Foi em Portugal que a santa sé sempre encontrou as resistencias mais obstinadas e mais heróicas a qualquer tentativa de reacção ultramontana.

Desejo, pois, que o sr. ministro da justiça declaro de uma maneira positiva e formal, se está resolvido a não fazer nomeação do conegos, emquanto a santa sé não chegar a accordo definitivo comnosco sobre a circumscripção diocesana, e que diga o que tiver por conveniente a respeito da confirmação do reverendo bispo eleito do Algarve, que merecia estar confirmado ha muito, porque ha de ser um dos prelados mais digno3 da christandade. (Apoiados.)

Tenho concluido.

O sr. Ministro da Justiça: — O governo está auctorisado pela lei de 20 de abril de 1876, se bem me recordo a proceder, de accordo com a santa sé, á reducção, annexação e nova circumscripção das dioceses, segundo for mais conveniente aos interesses dos povos.

N'essa lei se estatuiu que não fossem providos os beneficios ecclesiasticos que estavam vagos n'aquella data, ou que viessem a vagar, emquanto não se fizer a nova circumscripção diocesana, salvo o caso excepcional de ser absolutamente indispensavel prover alguns d'esses beneficios, para occorrer a necessidades impreteriveis do culto, do ensino nos seminarios ou do governo das dioceses.

A reforma da circumscripção diocesana tem caminhado lentamente, porque, como a camara sabe, é trabalhoso e difficil chegar a um resultado em um negocio tão importante e complicado.

Por um lado o ministerio da justiça tem já trabalhos muito adiantados, e actualmente estão-se ali fazendo os mappas da projectada circumscripção; por outro lado, o ministerio dos negocios estrangeiros tem tratado de obter, o necessario accordo com a santa sé, accordo que em principio está já feito, comquanto não esteja ainda definitivamente marcado o numero das dioceses que devem ficar. Entretanto espero que brevemente se chegará a um accordo • sobre este ponto, e que dentro em pouco tempo a nova circumscripção estará effectuada. Emquanto o não estiver, eu entendo, como o illustre deputado, que não se devem fazer nomeações de novos conegos, (Apoiados.) e posso declarar á camara que não estou por emquanto resolvido a fazel-as. (Apoiados.)

Os concursos a que s. ex.ª se referiu ficaram sem effeito algum, nunca se fizeram as nomeações, e ninguem mais faliou n'ellas.

Quanto á confirmação do sr. bispo eleito do Algarve, esse negocio não corre pela secretaria a meu cargo, corro pela secretaria dos negocios estrangeiros; ha negociações pendentes, e, n'estas cireumstancias, s. ex.ª comprehende que não é conveniente dar explicações a esse respeito; nem eu as poderia dar porque não sou o ministro competente.

Vozes: — Muito bem.

O sr. Visconde de Sieuve de Meneses: — Mando

para a mesa a seguinte proposta: (Leu)

No capitulo que está em discussão vem designadas as differentes verbas que competem aos parochos dos Açores e da Madeira, mas não vem designados os vencimentos relativos aos thesoureiros do tres parochias; e como isto é importante, porque importa, para assim dizer, uma grave injustiça, porquanto os thesoureiros de todas as outras parochias dos districtos dos Açores o da Madeira são subsidiados pelo estado, peço a v ex.ª que tenha a bondade de

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mandar esta proposta á commissão para que ella a tome na considerarão que merecer. Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Ministerio da justiça — Capitulo 2.°-—Artigo 5.°—Secção 1.ª — Proponho que n'esta secção sejam inseridas as competentes verbas de 30120 réis para as tres parochias da ilha Terceira, Cinco Ribeiras, Nossa Senhora dos Milagres o S. Francisco Xavier, que no respectivo orçamento não têem verba alguma para os respectivos thesoureiros. — Visconde de Sieuve de Menezes.

Fui admittida.

O sr. Hintze Ribeiro: — Mando para a mesa o parecer da commissão do fazenda sobre o projecto de lei n.º 101-11.

Foi a imprimir.

O sr. Paula Medeiros: — Chamo a attenção do sr. ministro dos negocios da justiça para o estado em que se acha o clero da diocese do Angra, pois dá-se n'aquella diocese a anomalia de haverem conjunctamente duas legislações diversas, uma que é a antiga que se observa nos districtos de Angra o Horta; e o decreto do sr. Mousinho da Silveira, de 16 de maio do 1832, que só está em vigor era S. Miguel, o é do clero d'esta ilha que eu me proponho apresentar á camara as más circumstancias em que de acha. t

Apenas ha ali cinco priorados que são de nomeação regia, e o restante das parochias são servidas por parochos que vencem uma mui insignificante congrua, a qual apenas lhes dá para viverem na mais austera economia, o alem d'isso os seus provimentos são passados annualmente, ou de tres em tres annos pelo bispo, que póde transferil-os ou demittil-os a seu arbitrio: e quando se impossibilitam por doença, ou têem de abandonar o curato para viverem na miseria, ou de repartir a sua escassa congrua com quem lhes faça as suas vezes!

Para" todos os mais servidores do estado se têem decretado reformas, jubilações o aposentações, para os pobres ecclesiasticos ainda não chegou a ser melhorada a sua triste condição!

Já por mais de uma vez tenho levantado n'esta casa a minha debil voz a favor d'esta respeitavel classe, e ainda o anuo passado, quando se discutiu o orçamento, me dirigi ao ilustre antecessor do s. ex.ª, o sr. Mexia, o qual me prometteu que para este anno providenciaria, persuadindo-se s. ex.ª que ainda hoje se conservasse no poder! (Riso.) e como s. ex.ª, por motivos estranhos á sua vontade, não póde cumprir a sua solemne promessa, recorro a s. ex.ª para que se digne fazer o que o sr. Mexia não póde pôr em pratica.

Sr. presidente, a continuar este estado de abandono em que está o clero não haverá quem se queira dedicar á vida ecclesiastica: antigamente, n'aquella ilha, haviam rendosas vibrarias, logares estes que oram providos por concursos e provas publicas, e era este um poderoso, incentivo para que a esta profissão se dedicassem estudantes talentosos o de bom comportamento; hoje não offerece vantagens algumas o sacerdócio. É, pois, urgente providenciar para que saia d'este abatimento a condição dos parochos, que se tornam tão dignos de serem protegidos pelos poderes publicos como os mais servidores do estado.

O sr. Ministro da Justiça: — Tomo nota das indicações apresentadas pelo illustre deputado; e pula minha parte, sem contar estar aqui por muito ou pouco tempo, farei quanto estiver ao meu alcance para satisfazer aos seus

desejos..

O sr. Dias Ferreira: — Provavelmente não faço hoje mais perguntas ao sr. ministro da justiça, porque me tem deixado satisfeito com as suas respostas.

Não me atrevo a agradecer a s. ex.ª as explicações que deu á representação nacional, porque emfim cumpriu o seu

dever de ministro, como eu estou persuadido que ha de cumprir sempre. (Apoiados.)

Felicito porém a camara, por termos um ministro que nos negocios da sua repartição responde ás perguntas que lhe são feitas pelos membros do corpo legislativo, e respondo sem hesitação e sem tergiversações, sustentando os bons principios e zelando a dignidade do imperante civil, que é a sua primeira obrigação. (Apoiados.)

Vozes: — Muito bem.

O sr. Adriano Machado: —... (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Ministro da Justiça: — Primeiro que tudo cumpre-me agradecer ao sr. Dias. Ferreira as palavras benevolas que me dirigiu, e que estou muito longo de merecer.

Conheço perfeitamente que não tenho qualidades que me possam tornar dignos de tão subido favor.

Quanto á pergunta que acaba; de me fazer o illustre deputado, o sr. Adriano Machado, relativamente ao chamado hospital do Porto, do que fallou ha dias o sr. Rodrigues de Freitas, respondo a s. ex.ª que não dei ordem para perseguir as pessoas que o dirigiam.

Quando soube que o illustre deputado, o sr. Rodrigues de Freitas, tinha desejado chamar a minha attenção para esse ponto, perguntei pelo telegrapho ao procurador regio o que havia a tal respeito; respondeu-me n'um telegramma, que lia camara, omittindo os nomes das pessoas indicadas, porque existindo um principio do processo, era forçoso guardar o segredo de justiça.

Constava do telegramma que tinha havido denuncia no commissariado de policia da existencia do um hospital sem habilitação alguma, onde se costumavam fazer tratamentos a doentes com agua do Lourdes; que tinham ali morrido duas pessoas, e que se havia dado conhecimento de tudo á auctoridade judicial.

Em vista d'isto, o mais que eu podia fazer era recommendar ao representante do ministerio publico o andamento do processo; mas nem isco mesmo fiz, como declarei á camara, por ter plena confiança no zêlo e inteireza dos magistrados que tinham do intervir n'este negocio.

Até hoje não me consta que tenha havido processo baseado no auto de investigação levantado pela policia.

E póde s. ex.ª estar certo de que eu nestes assumptos de administração de justiça só desejo e recommendo ao ministerio publico o cumprimento da lei, e em regra é desnecessaria qualquer recommendação, porque tanto os tribunaes como os agentes do ministerio publico sabem cumprir o sou dever. (Apoiados.)

S. ex.ª disso que tinha sido preso um homem por andar a vender biblias.

Vi, é certo, n'um artigo de um jornal, ou n'uma correspondencia, que tinha sido preso um individuo por andar a vender bíblias falsificadas, inculcando-as como completas e verdadeiras.

Não sei até que ponto é verdade o que dizia o jornal, não sei mesmo o seguimento que teve esse processo; mas sei que todas as vezes que algum individuo tem sido preso e processado nos tribunaes por andar a vender biblias, tem sido sempre absolvido na segunda instancia, ou no supremo tribunal de justiça.

Não se póde dizer que haja intolerancia, ou que se tem sido intolerante, tem-se apenas sido justo como entendo que sempre se deve ser. (Apoiados.)

Tambem s. ex.ª se referiu á necessidade de reduzir o laudemio á quarentena.

É assumpto este que dependo de uma proposta de lei, e de que não me occuparei n'este momento, porque me parece que não devo ser tratada incidentemente n'esta occasião.

Vozes: — Muito bem.

O sr. Pedro Roberto: — Mando para a mesa tuna

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proposta que vao tambem assignada pelo sr. visconde de Sieuve do Menezes, e que o a seguinte. (Leu.) _

Tanto isto é assim que o parocho da freguezia do Nossa Senhora da Luz, que é bastante populosa, na ilha da Graciosa, tem hoje uma congrua apenas do 139$000 réis, emquanto que se o trigo lhe fosso computado pelo preço corrente, a congrua seria de 230$000 réis.

Realmente não póde viver com aquella decencia que deve ter um parocho do com o ordenado de 139$000 réis, por se lhe ter arbitrado uma liquidação muito inferior.

Podia ser boa n'outra occasião, mas na epocha presente é bastante irregular.

Peço a v. ex.ª que dê a esta proposta o devido andamento.

Leu-te na mesa a seguinte

Proposta

Propomos que as congruas dos parochos e mais empregados ecclesiasticos do districto de Angra, cujas congruas são estabelecidas a trigo, sejam estas reguladas pelo preço das liquidações correntes, e não pelo preço arbitrario que ha dez annos se lhes estabeleceu com grave prejuizo destes empregados.

9 de maio de 1879. = Pedro Roberto Dias da Silva = Visconde de Sieuve de Menezes.

Foi admittida.

O sr. Dias Ferreira: — As ponderações que acaba de fazer o nosso illustre collega, o sr. Adriano Machado, obrigaram-me a tomar mais unia vez a palavra.

Quero deixar bem consignada e bom affirmada a minha opinião ácerca da reducção do laudemio á quarentena.

Ao sr. ministro da justiça, longe do dirigir-lhe qualquer pergunta a este respeito, porque não quero perturbar a paz que reina hoje na santa igreja, dou-lhe um conselho de. que s. ex.ª aliás não precisa, com respeito á reducção dos l::u-demios á quarentena; como este negocio deve ser objecto de uma proposta de lei que o sr. ministro da justiça não póde deixar de combinar com os collegas, lembro a s. ex.ª que o melhor é não os incommodar com similhante assumpto. (Riso.)

Ficará para occasião mais opportuna a reducção dos laudemios á quarentena.

A verdade é que o illustre deputado o sr. Adriano Machado votou em 1870, systematicamente com o seu partido, como era natural, contra todos os actos da ultima dictadura, da ultima dictadura não digo bem, porque nós todos os annos temos tido um ou dois decretos de dictadura: antes estamos em dictadura quasi permanente, porque o governo se colloca fóra da lei, gastando cem auctorisação legal, e assumindo attribuições que pertencem só ao parlamento. (Apoiados.)

Eu não intervi, nem podia intervir na escolha das medidas que foram legalisadas e desapprovadas pela carta de lei de 27 de dezembro de 1870.

Foi a situação, que se me seguiu, o a que eu fazia opposição, quem escolheu os medidas que julgou mais convenientes para as confirmar por lei.

A creação do ministerio da instrucção publica é effectivamente da minha iniciativa, e pelo menos da minha responsabilidade. Mas a esse respeito não tenho uma opinião tão radicada, como ácerca da reducção dos laudemios á quarentena.

Sobro instrucção publica não ha reforma util nem sensata sem uma base que eu reputo capital n'este ramo de administração publica.

Podemos organisar o ministerio da instrucção publica se os ministros, em vez de limitarem, a sua iniciativa a fazer os despachos do pessoal, se mostrarem dispostos a fazer as reformas profundas de que os serviços carecem. N'este caso seria muito conveniente a organisação do ministerio da instrucção publica.

Mas, para melhorar a instrucção publica não ha senão um remedio: tudo o mais são paliativos que nada melhoram.

O que é preciso é ter bons professores, sem bons professores todos os regulamentos são inuteis, e todas as reformas improfícuas.

E bons professores com tantos estabelecimentos de instrucção secundaria, e com tantas escolas superiores bons professores para todas as cadeiras ha de ser difficil encontral-os.

A reducção dos laudemios á quarentena nos bens das corporações religiosas reputo eu uma providencia altamente economica.

Quero-a, o hei do pugnar por ella embora levanto contra mim a resistencia das pessoas tementes a Deus, neguei sempre a estas corporações o direito do propriedade.

Pensaram assim tambem os primeiros homens, as primeiras capacidades e illustrações d'esta terra em epochas que já lá vão.

No tempo de El Rei D. José e do marquez de Pombal, isto é no tempo em que o nosso governo mais tinha de absoluto, redigiam-se os estatutos da universidade, onde se prescreviam, entro outras cousas, os deveres dos professores no officio de ensinar, e diz-se que os bens da igreja pela sua natureza propria só do poder temporal eram dependentes.

Até nas velhas ordenações do reino nós encontrámos monumentos valiosos do liberalismo dos nossos maiores.

Tambem os liberaes de 1820 tinham a reducção dos laudemios nos bens das corporações religiosas á quarentena, por uma medida do grande alcance economico sem ir offender o direito de propriedade.

Pela minha parte se as cireumstancias alguma vez me proporcionarem a occasião de fizer vingar nos corpos legislativos na minhas opiniões, os laudemios dos bens pertencentes ás corporações religiosas hão de ser reduzidos á quarentena.

Tenho concluido.

O sr. Pereira de Miranda: — Desejo dirigir uma pergunta ao nobre ministro da justiça, e desde já agradeço a resposta que s. ex.ª houver de me dar, por isso que naturalmente não fará para commigo uma excepção, em relação aos meus collegas.

N'um decreto do eminentissimo prelado do patriarchado, datado do anno proximo findo, foi approvado o regulamento para, os tribunaes ecclesiasticos.

Na minha ignorancia sobre esta materia, supponha eu que os regulamentos não podiam vigorar sem a approvação do governo, e creio mesmo que o regulamento a que me refiro foi enviado ha bastante tempo á secretaria dos negocios e eclesiasticos.

Esse regulamento no seu ultimo artigo revoga até a constituição do patriarchado e todas as disposições posteriores que estão em opposição com o mesmo regulamento, estabelecendo formalmente uma tabella nova que colloca as pessoas que têem de recorrer áquelles tribunaes em posição muito differente d'aquella em que estavam, por isso que foram aggravadas todas as tabellas, isto é, augmentou se o imposto que se. pagava, o que me parece que não é licito fazer senão pelos meios regulares. (Apoiados.)

Pergunto, portanto, ao nobre ministro da justiça se entendo que esse regulamento se póde executar independentemente da approvação do governo, e no caso negativo se s. ex.ª tenciona occupar-se do assumpto de que trata o referido regulamento, pelo qual, segundo me consta, se está já fazendo obra.

O sr. Ministro da Justiça: — O regulamento a que o sr. Pereira de Miranda acaba de se referir não está ha muito tempo no ministerio a meu cargo. Consta-me que já ali deu entrada, mas ainda não tive occasião de o examinar.

O sr. Pereira de Miranda: — Foi approvado por decreto do patriarchado em julho do anno findo.

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O Orador: — Assim será, mas não foi logo remettido á -secretaria dos negocios ecclesiasticos, ao contrario, como acabei de dizer, lia pouco que dou entrada na repartição competente, e por isso ainda não tive occasião de o examinar, e só depois de o fazer é que poderei responder a s. ex.ª Entretanto não tenho duvida em dizer ao illustre deputado que se n'esse regulamento houver algumas 'disposições que não possam ser confirmadas nem auctorisadas, de certo não o serão.

Posto a votos o capitulo 2.°, foi approvado.

Capitulo 3.°— Supremo tribunal do justiça 28:011$996

O sr. Visconde de Sieuve de Menezes: — Mando para a mesa a seguinte proposta. (Leu.)

V. ex.ª e a camara sabem que antes da publicação do codigo do processo civil, o supremo tribunal do justiça, que muito respeito, assim como todos os juizes de 1.ª o 2.3 instancia não tinham obrigação do fundamentar os accordãos do negação de revista.

O codigo do processo civil, em vigor, ordena que o supremo tribunal de justiça quando negar a revista, dê os fundamentos por que a nega, isto é, que se tenha pleno conhecimento das decisões d’aquelle respeitavel tribunal n'esta parte.

Pedia por consequencia ao sr. ministro da justiça que tomasse na maxima consideração este assumpto, que é importantissimo para todas as pessoas que têem litigios em juizo, porque assim ficam sabendo a jurisprudencia que aquelle respeitavel tribunal tem, quando decide as causas que lho são affectas, negando ou concedendo as revistas.

Leu se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho que se recommende ao governo a necessidade de se ordenar a competente publicação de todos os accordãos do supremo tribunal de justiça, que neguem a concessão da revista = Visconde de Sieuve de Menezes.

Fui admittida.

O sr. Paula, Medeiros: — Mando para a mesa a seguinte proposta, assignada tambem pelo meu amigo e illustre collega o sr. Alves.

(Leu.)

Sr. presidente, ha muito tempo estou convencido que qualquer proposta ou projecto apresentado por um membro d'esta casa não tem resultado algum, mas sem embargo d'isso, não deixarei de usar de um direito que me confere o meu mandato, indicando as medidas que entenda serem uteis ao paiz.

Sr. presidente, o supremo tribunal de justiça julga em ultima instancia de todas as causas que são appelladas dos cinco tribunaes de relação que existem no continente do reino o mais possessões portuguezas, e por consequencia são muitas questões que tem de julgar; alem d'isto, pelo novo codigo do processo civil, tem augmentado o numero dos aggravos sobre que tem do decidir.

Faço a devida justiça á respeitabilidade, A sabedoria e ao grande trabalho a que se dão os dignos conselheiros d'aquelle superior tribunal; porém elles, quer pelo seu limitado numero, quer pelos seus padecimentos na ultima quadra da vida, por muito que desejem e se esforcem, não podem dar expediente a todos os processos, e d'ahi provém haverem causas que ali jazem dois, tres e mais annos paradas, com grave prejuizo dos interessados, soffrendo estes muitas vezes na sua honra, vida e bens por taes delonga;

Sr. presidente, vejo n'esta discussão do orçamento votarem-se contos o contos de réis para despezas, cuja utilidade é problematica, e ha de esta camara a o governo regatear despeza feita com a creação de mais cinco juizes, a fim de que haja uma outra secção n'aquelle tribunal? Haverá

quem duvide ser uma das primeiras necessidades de um paiz a prompta administração da justiça? Desejava que o sr. ministro dos negocios da justiça me dissesse qual seja a opinião do governo sobre este importante assumpto. Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Propomos que se elevem a tres as secções do supremo tribunal do justiça, creando-se para esse fim mais cinco juizes. = Henrique de Paula Medeiros = Joaquim, José Alves.

Foi admittida.

Posto a votos o capitulo 3.°, foi approvado. Capitulo 4.°-— Tribunaes do 2.º instancia.. 69:963$319

O sr. Hintze Ribeiro: — Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que o ordenado do guarda mór da relação de Ponta Delgada seja equiparado aos guardas mores do Lisboa e Porto = Hintze Ribeiro.

Foi admittida.

O sr. Adriano Machado: —... (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Ministro da Justiça: — Começo por dizer ao illustre deputado que sympathiso muito com as considerações que apresenta para o augmento de uma secção de tres juizes no supremo tribunal de justiça; entretanto não entendo que seja esta a occasião de a crear. (Apoiados.) Entendo tambem como o illustre deputado que o numero do juizes d'aquelle tribunal é insuficiente para a multiplicidade de processos que ali affluem; mas nas circumstancias em que nos achamos não me parece conveniente augmentar as despezas publicas, e por isso entendo que devem ser mantidos por emquanto os quadros que estão marcados por lei e que vem designados no orçamento do estado.

Pelo que respeita ao codigo do processo criminal, de que tambem fallou o sr. Adriano Machado, direi a s. ex.ª que me consta que a commissão encarregada d'esse trabalho se reuniu differentes vezes, mas que, começando a discutir um projecto apresentado por um dos seus membros, não passou do segundo ou terceiro artigo, interrompendo logo as suas sessões.

Tenho tenção do pedir a reunião não só d'essa commissão, mas de outras que estão nomeadas pelo ministerio da justiça, uma das quaes é a que está encarregada da reforma do codigo commercial, reforma que eu julgo importantissima e muito necessaria.

Esta commissão tem muito adiantados os seus trabalhos, e ainda ha pouco a completei com um membro que lhe faltava; tenho tenção, como disso, do promover a reunião d'essas commissões, a fim de que continuem os trabalhos encetados.

O illustre deputado sabe muito bera que a maior parto dos membros d'estas commissões pertencem a esta ou á outra casa do parlamento, e que portanto só nos intervallos das sessões se podem occupar assiduamente dos seus trabalhos especiaes, mas eu espero que encerrada a, sessão actual os trabalhos encetados progridam convenientemente e que alguma cousa util se possa brevemente conseguir.

Quanto ás fianças de que s. ex.ª tambem fallou, é assumpto que deve ser tratado n'essa reforma que se está elaborando.

A respeito da severidade que o illustre deputado notou no codigo penal, eu digo que, comquanto essa lei seja severa em algumas das suas disposições, os tribunaes são benevolos na applicação d'ellas, e têem para isso as faculdades necessarias conferidas por artigos do mesmo codigo, creio que pelos artigos 82.° e 83.°, em virtude dos quaes se podem substituir as penas umas pelas outras, quando ha circumstancias attenuantes, podendo até as do artigo 360.º,

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a que o illustre deputado se referiu, ser substituidas por uma pena de tres dias do multa, que póde descer a 300 réis.

Parece-me que d'esta maneira a indulgencia dos tribunaes corrige suficientemente o rigor da lei penal.

Isto, porém, não quer dizer que se devem conservar estas penalidades, antes entendo que muito convem reformar o codigo penal do modo que ellas sejam substituidas por outras mais em harmonia com os principios de justiça, para o que, repito, ha já nomeada uma commissão de homens competentes, que eu espero que no intervallo da sessão se occuparão do assumpto. (Apoiados.)

Vozes: — Muito bem.

O sr. Dias Ferreira: — Eu ratifico com o maior prazer o com a maior publicidade os applausos com que a opposiçâo parlamentar acaba de receber as declarações do nobre ministro da justiça, de que não concorda agora no augmento dos quadros dos funccionarios judiciaes, attendendo á situação da fazenda publica.

Assim procedem os homens de governo, que comprehendem a responsabilidade dos negocios, e que prestam antes do tudo homenagem ás conveniencias publicas. (Apoiados.)

Dado mais este voto de louvor ao sr. ministro da justiça...

O sr. Paula Medeiros: — Mas sejam as economias para todos os ministerios; não sejam só para o ministerio da justiça.

O Orador: — Dada esta explicação, devo dizer ao sr. ministro da justiça e ao meu antigo amigo o sr. Paula Medeiros, porque não quero deixar correr sem reclamação propostas ou indicações tendentes a augmentar n'esta occasião o numero dos funccionarios em qualquer repartição do estado, que por ora não estou convencido da necessidade impreterivel e urgente de crear desde já mais juizes no supremo tribunal do justiça. r

É certo que muitas causas se demoram largos annos n'aquelle tribunal, como nos outros tribunaes inferiores, sem resolução definitiva.

Mas não haverá senão uma medicina, senão um remedio para evitar a demora no julgamento dos processos?

Parece que toda a nossa sciencia se reduz a augmentar o pessoal 1

Ora eu comprometto-me a indicar á camara remedio melhor, mais prompto, mais rapido e mais conducente á boa administração da justiça. Mas antes de tudo direi que os processos se demoram menos nas mãos dos juizes do que nas dos advogados das partes. (Apoiados.)

A legislação não dá os meios sufficientes para que os magistrados judiciaes possam arrancar as causas das mãos dos advogados com a rapidez que seria para desejar. (Apoiados.)

No projecto do codigo do processo civil, hoje lei do estado, que se discutiu em 1876 n'esta casa, introduziram-se, sob proposta minha, disposições mais eficazes para obrigar os advogados, como era absolutamente indispensavel, a entregarem os processos, findo que fosse o tempo da vista concedido por lei.

Aconteceu, porém, com esta classe respeitabilissima o que acontece com todas as classes sociaes. Ninguem quer a justiça em sua casa. Levantou-se a associação dos advogados de Lisboa contra essas disposições, e foi representar á outra casa do parlamento. E a camara dos dignos pares, no uso liberrimo do seu direito, e na plenitude da sua jurisdicção, eliminou do codigo do processo quasi todas aquellas disposições, alem de introduzir outras emendas, que nós em seguida votámos aqui com o fundamento de que o projecto de processo era ainda assim preferivel á legislação então vigente.

Quanto ao ponto principal, sem querer fazer agora perante a camara uma prelecção sobre assumptos judiciaes, Cessão nocturna de 9 do maio de 1879

devo declarar que em muitos casos a demora nas mãos dos juizes provem dos defeitos da legislação existente.

Pois que necessidade haverá de manter na legislação vigente uma disposição pela qual os processos de ausentes, por exemplo, não podem ser julgados no supremo tribunal de justiça, sem o visto de sete juizes, quando basta a presença de cinco para o julgamento? (Apoiados.)

Pois não seria preferivel ao augmento do numero de juizes simplificar a legislação de processo, e acabar com um grande e escusado apparato de formalidades judiciaes, que não têem outro resultado senão tirar aos juizes o tempo preciso para examinarem com brevidade os processos? (Apoiados.)

Não podiamos ampliar aos processos crimes a disposição estabelecida para os processos eiveis, nos quaes bastam em regra tres juizes para o julgamento o vencimento? (Apoiados.)

Nós estamos ainda regidos, triste é dizel-o, pôr um codigo de processo criminal, referendado pelo sr. conde de Thomar, cujo nome eu muito respeito, mas que nunca foi o symbolo das liberdades avançadas em Portugal. E a novissima reforma judiciaria, a que eu chamarei a velhíssima reforma judiciaria. (Riso — apoiados.)

Mas nem os parlamentos, nem a opinião se preoccupam muito com as reformas da justiça.

Eu reputo urgentissima a reforma do codigo do processo criminal que, depois da promulgação do codigo do processo civil, poderá reduzir-se sem inconveniente a 200 ou 300 artigos, tornando applicaveis ao processo criminal as disposições do processo civil, com as modificações reclamadas pela natureza especial do assumpto, e ensinadas pela pratica do serviço criminal.

A nossa legislação criminal vigente está em taes condições, que basta um exemplo para todo3 conhecerem, mesmo sem serem da arte, a necessidade urgentissima de a reformar.

Qualquer individuo que ahi esteja muito socegado assistindo ás nossas sessões (salvo os membros do corpo legislativo, que têem privilegio de foro), póde á saída ser mimoseado com um mandado do prisão por um crime de morte, expedido por qualquer dos substitutos do juiz de direito da Moçambique, com o visto de formalidade do juiz de Lisboa, porque duas testemunhas lá afirmaram, ou no summario se diz que afirmaram, terem visto uma carta em que o pronunciado aconselhava o crime de homicidio.

E esse individuo começa por ser remettido, sem possibilidade de recurso algum previo, para Moçambique, a fim do se proceder ao interrogatório e se seguirem os mais termos do processo!

Mas estas questões de justiça, repito, e com grande sentimento, são as que menos nos preoccupam.

Agora devo dizer em boa paz ao meu illustre amigo o sr. Paula Medeiros, que não insista na sua proposta, é que se deixe de desencaminhar o sr. ministro da justiça. (Riso.)

Se fosse outro ministro presente ter-se-ia aproveitado immediatamente da sua idéa. (Apoiados.)

Consideremo-nos com a vantagem de possuirmos ao menos um ministro que não deita enthusiasmo pelo augmento de despezas.

Não sei o que fará o sr. ministro da justiça. Pelo menos as suas palavras têem sido excellentes. Ao menos separa-se dos collegas, que interrogados, ou não respondem, ou respondem com elogio á triste situação financeira em que nos achamos. Por isso não sejamos nós os primeiros a metter tambem o sr. ministro da justiça no mau caminho.

O meu amigo, o sr. Paula Medeiros de certo me perdoa este conselho, porque sempre o tenho visto pugnar pelas economias e pelas reducções do despeza.

Direi ainda mais duas palavras a respeito da necessidade de simplificar o processo criminal.

Os juizes do supremo tribunal de justiça são actualmente sufficientes para a resolução das questões, que lhe são affe

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ctas, Introduzidos na legislação respectiva os melhoramentos que ella reclama.

O processo criminal é muito complicado, e sem necessidade no processo de ausentes, por exemplo, de que já fallei, tres vezes depõem as testemunhas e tres vezes se escrevem de teor os seus depoimentos, no corpo de delicto, no summario, e na audiencia de julgamento, mesmo quando o depoimento não varia em qualquer d'estes actos do processo.

E preciso reformar o processo criminal, e no sentido liberal; é tambem indispensavel, no interesse da liberdade individual, alargar a area -das fianças; hoje com as convenções internacionaes, que temos com quasi todos os paizes, não ha motivo nenhum para não admittir amplamente as fianças, salvo em tres ou quatro casos.

Não é só a questão do fazenda que deve chamar a nossa attenção, tambem nos serviços da justiça ha muito que fazer e que reformar no nosso paiz.

Entre nós, sobretudo em Lisboa e Porto, prende se com uma semceremonia, como em paiz nenhum do mundo, o ha pouco escrupulo em reter em custodia os presos antes de serem entregues aos magistrados judiciaes.

E tambem necessaria o urgente a reforma do codigo commercial. Este codigo foi confeccionado muitos annos antes do decreto de 18 de setembro de 1833, que lho deu força de lei.

E portanto completamento omisso a respeito de barcos a vapor, do caminhos do ferro, e do outros serviços modernos. Tambem nomeei uma commissão, sendo ministro da justiça, para reformar a nossa legislação commercial. Mas hoje estou desenganado de que não se consegue a reforma do codigo commercial senão entregando a um homem só este trabalho, comquanto seja revisto depois por uma com missão de pessoas competentes.

Ha muito que fazer na legislação reguladora dos actos de commercio.

Primeiro que tudo é preciso eliminar do codigo commercial todas as disposições da lei civil. O codigo commercial, redigido n'uma epocha em que não tinhamos corpo de direito civil propriamente dito, porque este direito andava espalhado pela legislação romana e canonica, pelas ordenações do reino e mais leis extravagantes, compendiou muitas disposições que só têem verdadeiro cabimento na legislação civil, e que foram consignadas no codigo civil.

É ainda urgente a reforma do codigo commercial para harmonisar muitas das suas disposições que brigam com o codigo civil, especialmente nas relações juridicas entre marido o mulher, e em materia de creditos o de privilegios.

É necessario que o sr. ministro trate de effectuar esta reforma e outras de grande importancia nos serviços judiciaes.

No ministerio da justiça ha muito que fazer. Felizmente está á frente dos negocios d'aquelle ministerio um magistrado distincto, o eu contento-me com que s. ex.ª desempenhe tão bem as funcções de ministro, como tem desempenhado as funcções do magistrado. (Apoiados.)

O sr. Adriano Machado: —... (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

Posto á votação o capitulo 4.°, foi approvado.

Capitulo 4.°—Juízos de 1.ª instancia..... 89:536$043

O sr. Paula Medeiros: — Pedi a palavra, sr. presidente, para rogar ao sr. ministro dos negocios da justiça, se digne dar as devidas providencias, a fim do que as comarcas do archipelago dos Açores se conservem preenchidas com os seus respectivos juizes de direito, e delegados.

Sei que ha comarcas que estão sem estas auctoridades ha mais de dez mezes, e isto com grave prejuizo da boa e necessaria administração da justiça; este estado não póde, nem deve continuar.

O que é verdade é que muitos bachareis desejam ser promovidos para ali; e mal tomam posse, do que cogitam, é pedir licenças para voltarem para o continente, a fim do melhorarem do comarcas.

Tambem não posso deixar de reconhecer que aos magistrados despachados para fóra do continente se devem conceder algumas vantagens, do outra maneira tem de continuar este estado de cousas.

Peço pois ao sr. ministro da justiça se digne tomar alguma providencia para que se melhore este importante ramo de serviço a seu cargo, apresentando alguma proposta de lei a este respeito.

E tambem aproveito a occasião para dizer a s. ex.ª que a tabella judicial está reclamando uma grande reforma em muitos dos seus emolumentos; consta-me que é interpretada por diversos modos, em algumas comarcas, com grande sacrificio das partes.

As custas de caminhos em alguns casos, são excessivas; na parte orphanologica, tambem carece ser diminuida.

Acha-se em tal estado o foro, que quem quizer propor uma demanda para haver 100$000 ou 200$000 réis, é tão avultada a despeza que faz, que não vale a pena intental-a.

N'este ramo de serviço ha muito que reformar. Tenho toda a confiança que s. ex.ª se dignará attender a estas necessidades, que são por todos conhecidas e no que prestará um relevante serviço.

O sr. Ministro da Justiça: - Era resposta ao que acabou de dizer o sr. Paula Medeiros, tenho a declarar a s. ex.ª que ha poucos dias recebi as propostas apresentadas pelo supremo tribunal de justiça, para promoção de alguns juizes, o quando fizer os despachos, tenho tenção do prover todos os logares que estiverem vagos nas comarcas dos Açores, que creio serem poucas, e fazer cora que os juizes que estão com licença, recolham todos aos seus logares, salvo os que forem transferidos para o continente, como alguns têem podido, e merecem, porque já ali estão ha muito tempo, e tratarei de prover esses logares com juizes que queiram ir para lá, ou com delegados que sejam promovidos á terceira classe, e declaro tambem que não transferirei para o continente juizes que não tenham um certo serviço nos Açores, attenuando assim os inconvenientes que apontou o illustre deputado.

O sr. Visconde de Sieuve de Meneze3 (sobre a

ordem): — Mando para a mesa duas propostas, que têem intima relação com as respostas apresentadas pelo sr. ministro da justiça ás considerações feitas pelo illustre deputado e meu amigo o sr. Paula Medeiros.

São as seguintes.

(Leu.)

Abstenho-me de fundamentar estas duas propostas. Elias vão para a commissâo, e quando se discutirem aqui eu mostrarei a conveniencia que ha em o sr. ministro da justiça adoptar ou o projecto do sr. Gaspar Pereira da Silva, que estabelecia o concurso para os juizes dos Açores, ou o meu projecto que estabelecia o augmento do terço do ordenado, depois de um certo tempo de serviço, ou o que augmentava em 100$000 réis os vencimentos dos magistrados que fossem para as ilhas, ou emfim outro qualquer alvitre que s. ex.ª apresente, e que do certo será acceitavel.

A respeito das tabellas já o illustre deputado o sr. Dias Ferreira apresentou uma proposta para ellas serem alteradas, porque muitos dos seus artigos são altamente vexatorios para os povos.

0 facto da apresentação d'essa proposta, basta para mostrar a conveniencia d'essa alteração.

Leram-se na mesa as seguintes

Propostas

1.ª Proponho que a camara recommende ao governo a

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necessidade de regular a administração da justiça nas comarcas dos Açores e Madeira, em ordem a que as mesmas comarcas estejam sempre providas com os competentes magistrados. = Visconde de Sieuve de Menezes.

2.ª Proponho que se recommende ao governo a necessidade do alterar a tabella judiciaria que se acha em muitas partes completamente vexatoria para os povos = Visconde de Sieuve de Menezes.

Foram admittidas.

O sr. J. J. Alves: — Julgo a proposito n'este capitulo chamar a attenção do sr. ministro da justiça, para mandar que sejam removidas as pessimas condições em que se encontra o edificio onde funccionam os tribunaes de 1.ª instancia em Lisboa, geralmente conhecido pelo nome de tribunal da Boa Hora.

V. ex.ª e todos sabem que existe uma lei auctorisando o governo a mandar construir um novo edificio, onde se possam accommodar os differentes ramos da administração da justiça.

Desejo pois, que s. ex.ª me diga se ha alguns trabalhos no sentido de se começar aquella importante obra, substituindo-se o actual edificio, que esta nas condições as mais desvantajosas, por outro que reuna ás condições exigidas, a magnitude do um estabelecimento digno da capital de um paiz civilisado.

Outros paizes, e entre elles, um mais pequeno que o nosso, a Belgica, possue na sua capital um palacio de justiça digno de admiração; entro nós, porém, nada por emquanto se tem feito, apesar do haver para isso lei que auctorisa. -

Creio, comtudo, que ao governo não faltam os bons desejos para dar começo a este grande melhoramento nacional.

Quem frequenta o edificio do tribunal da Boa Hora, observa bem os gravissimos defeitos e inconvenientes que o distinguem, o quanto é improprio para o fim a que é destinado......

.Não tem salas com a capacidade para as audiencias, não sem repartimentos que offereçam condições para acommodações dos cartorios, o diga-se francamente, ha occasiões em que o ar que ali se respira é mephitico. (Apoiados.)

Peço, portanto, ao sr. ministro da justiça informe a camara se ha esperanças do vermos em breve satisfeita esta urgente necessidade..

O sr. Ministro da Justiça: — Eu concordo com o illustre deputado que acabou de fallar em que o tribunal da Boa Hora está n'um estado indecoroso e não póde continuar assim.

Alem d'isso entendo que elle é insusceptível de transformações ou melhoramentos, o que o que é indispensavel é erigir um novo edificio, um palacio de justiça com todas as accommodações necessarias para o fira a que se destina.

E isto é tanto mais necessario quanto é fóra de duvida que o tribunal da Boa Hora chegou ao estado mais deploravel a que póde chegar um tribunal de justiça.

O governo está auctorisado a contrahir um emprestimo até á quantia de 100:000$000 réis com o encargo de juro e amortisação que não exceda a 9 por cento. Alem do em-1 préstimo é applicavel á construcçâo do palacio da justiça o producto da venda da cadeia do Limoeiro o do tribunal da Boa Hora, quando chegar a vender-se.

Por ora não ha local escolhido, nem os estudos indispensaveis que devem preceder a construcçâo.

Seria para mim motivo de grande satisfação ligar o meu humilde nome ao menQ3 á inauguração d'esses trabalhos; (Apoiados.) o farei quanto em mim couber não só para que os estudos se encetem quanto antes, mas que se dê começo ás obras, precedendo o levantamento do emprestimo que ha de ser feito pelo ministerio da fazenda.

Vozes: — Muito bem.

O sr. Adriano Machado (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n’este logar.)

O sr. Ministro da Justiça: — Direi ao illustre deputado, que acaba de fallar, que a commissão a que se referiu está incompleta; faltam-lhe alguns membros; tratarei do a preencher quanto antes, encarregando-a de rever as reclamações que lhe forem presentes, a fim du propor ao governo as alterações que julgar necessarias para emendar os defeitos que porventura se encontram na ultima divisão comarca.

O sr. Presidente: — Tenho a declarar ao sr. deputado Adriano Machado, que o projecto do lei a que se referiu, que tem o n.º 108, será posto em discussão logo que haja opportunidade, porque já está dado para ordem do dia.. O sr. Adriano Machado: — Agradeço muito a v. ex.ª Foste á votação o capitulo 5.°, foi approvado.

Capitulo 6.° — Ministerio publico........ ¦ 84:183$332

, O sr. Laranjo: — Eu tenho de chamar a attenção do sr. ministro da justiça para umas ordens illegaes dadas pelo procurador regio de Lisboa ao seu delegado em Portalegre;, não quero, porém, prolongar a discussão do orçamento do ministerio da justiçai, e por isso peço ao sr. ministro que declare 86 posso esperar que s. ex.ª aqui appareça em uma sessão, antes da ordem do dia," para se tratar esta questão.

O sr. Ministro da Justiça: — Declaro ao illustre deputado que, virei, quando tiver opportunidade, antes dá Ordem do dia.

O sr. Laranjo: — Combinarei com s. ex.ª Posto a votos o capitulo 6.% foi approvado.

Capitulo 7.° — Sustento dos pregos e policia

das cadeias..........................98:2986000

;. O sr. Firmino Lopes: — Mando para a mesa, pára ser tomada na devida consideração, a seguinte

; - Proposta >,

* Proponho que o ordenado do cada um dos delegados da procurador regio nas comarcas fóra de Lisboa i? Porto seja de 400$000 réis. = Firmino João Lopes.

Foi admittida.

O sr. Adriano Machado: —... (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n’este logar) O sr. Ministro da Justiça: — Pedi a palavra para dizer ao illustre deputado, o sr. Adriano Machado, que» tomei nota das indicações que acaba de fazer, e que dou a maior consideração ao assumpto que s. ex.ª me recommendou.

Supponho tambem, segundo as informações que tenho recebido ultimamente, que o edificio de S. João Novo não é o mais proprio para os tribunaes judiciaes.

Mandaram-se fazer os reparos indispensaveis, aliás a estai hora o edificio estaria em ruinas, mas supponho que ella não é susceptivel de transformação que o colloque em estado de servir convenientemente para o fim de que se trata.

O sr. J. J. Alves: — Existe no capitulo 7.°, que está em discussão, a verba de 6OO$O0O réis, com applicação a exames toxicológicos.

Não posso deixar passar esta occasião sem notar á camara os serviços prestados n'esta especie de trabalhos, pela sociedade pharmaceutica lusitana desde 1834 até hoje, trabalhos que ella executa gratuitamente, e apenas receba a despeza consumida com os reagentes.

Muitos outros trabalhos scientificos tem ella desempenhado, taes como a analyse de differentes aguas potáveis e mineraes, de muitos generos alimenticios suppostos sophisticados, e por todos estes serviços tem sido aquella corporação justamente louvada pelos governos.

Estas minhas declarações teem unicamente por fim lembrar á camara que não é sem rasão que aquella corporação

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-se julga com o direito do ser attendida nas suas incessantes reclamações sobre a reforma de instrucção, que pede para a classe que tão dignamente representa.

E isto sómente o que tinha a dizer.

O sr. Paula Medeiros: — Tenho a honra de mandar para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que se consigno no orçamento o ordenado do capellão da penitenciaria do Ponta Delgada, que hoje se está pagando pelas despezas diversas da ministerio da justiça. =-= Paula Medeiros.

Foi admittida.

Posto a votos o capitulo 7.° foi approvado. Capitulo 8.° — Diversas despezas........ 12:100$000

Approvado sem discussão.

Capitulo 9.°—Exercicios findos......... 400$000

Approvado sem discussão.

Capitulo 10.°—Aposentados............ 38:129$988

Approvado 'sem discussão.

Capitulo 11.°— Subsidios a religiosas.... 600:554$735

O sr. Pereira de Miranda: — Chamo a attenção do sr. ministro da justiça para alguns fact03 que se têem dado ultimamente, e que destoam completamente dos sentimentos piedosos do nosso paiz.

Creio que ultimamente o estado tem tomado conta de alguns conventos por morte das ultimas freiras, como succedeu, por exemplo, não ha muito ainda com o convento de Chellas, que era rico.

N'estes conventos, alem das freiras havia senhoras que o não eram, como rodeiras, pupillas, etc, e que, segundo parece, têem ficado ao desamparo.

Em Chellas consta-me que havia tres pupillas do mais de setenta annos; e, tomando a auctoridade administrativa conta d'aquelle convento, viu-se era graves difficuldades sem saber o destino que havia de dar a essas senhoras, porque as não queria deixar morrer á fome.

Duas d'essas pupillas creio que foram depois recolhidas na misericordia de Lisboa o a outra no asylo de Santo Antonio dos Capuchos.

Julgo que era uma cousa conveniente que o sr. ministro da justiça providenciasse de alguma maneira, como creio que é das suas attribuições, para que aquellas pessoas no ultimo quartel da vida não ficassem ao desamparo e esmolando, (Apoiados.) porque é um espectaculo que, como disse, destoa inteiramente dos sentimentos piedosos do paiz. (Apoiados)

O sr. Ministro da Justiça: — Quando se extingue qualquer convento, pelo fallecimento da ultima religiosa, toma immediatamente conta d'elle o ministerio da fazenda; o qual tem sempre o maior cuidado, quando ha pessoas ieculare3 recolhidas no edificio do que toma posse, em as conservar ali, até poderem arranjar outro destino.

Quando essas pessoas têem farailia3, recolhem-se ao seio 4'ellas, e quando não têem familia, ha sempre o maior cuidado em que sejam recolhidas nos estabelecimentos de beneficencia.

É como se tem providenciado sempre. O governo tem tomado sempre as necessarias providencias para que não e quem ao desamparo as pessoas seculares recolhidas no3 0onventos que se extinguem.

O sr. Pereira de Miranda: — Em relação ao convénio de Chellas, consta-me que duas das senhoras que lá estavam, foram recolhidas na misericordia de Lisboa, e que emquanto á Outra, o sr. administrador do bairro oriental se viu em graves difficuldades, sendo-lhe preciso empregar muitíssimas diligencias para obter que ella fosse recolhida «o asylo da mendicidade, onde creio que falleceu poucos dias depois.

Entretanto, limito-me a chamar a attenção do sr. ministro da justiça para este assumpto.

O Orador: — Não tenho conhecimento d'esse facto, mas posso assegurar que ordinariamente se pratica do modo que eu disse em relação a essas pessoas.

Posto á votação o capitulo 11.°, foi approvado.

O sr. Presidente: — As differentes propostas apresentadas durante a discussão, vão ser enviadas á commissão.

A ordem do dia para ámanhã (J a continuação da de hoje e mais o projecto n.º 106. -Está levantada a sessão. Eram onze e meia horas da noite.

Discurso do sr. deputado Adriano Machado, pronunciado na sessão diurna de 9 do corrente, e que devia ler-se a pag. 1609, col. 1ª

O sr. Adriano Machado: — Ainda que o fim para que pedi a palavra, foi justificar uma pequena emenda que tenciono propor ao orçamento da academia polytechnica do Porto, aproveitarei a occasião para discorrer, se a camara m'o consente, sobre alguns dos ramos da instrucção publica, comprehendidos no capitulo que estamos discutindo.

Serei muito breve, não porque entenda que a discussão do orçamento deva ser rapida, mas porque principiámos muito tarde.

O que se diz, quando se discute este documento, não tem utilidade immediata, como a semente que se lança á terra, não fructifica logo, mas estabelecem-se os principios, elucidam-se os assumptos e propagam-se as idéas que mais cedo ou mais tarde se convertera em leis, melhores do que as anteriores. Por isso entendo que não é perdido o tempo que os parlamentos consagram ao estudo minucioso dos serviços publicos; mas achando se muito atrazados os nossos trabalhos não desejo -alongar o debate, e deixo para mais folgada occasião o tratar desenvolvidamente a materia aliás muito importante do capitulo em que estamos.

Começando pela instrucção primaria, reparo que este orçamento não attendeu a que a lei de 2 de maio de 1878 deve estar em execução em igual dia e mez do anno de 1880.

Assim, esta lei ficará sem orçamento, ou este orçamento sem lei nos dois ultimos mezes do anno economico a que é destinado. Mas o mal não será tão grande como parece, porque ha outro maior, que é o ser inexequivel a nova lei da instrucção primaria.

Um dos seus rasgos mais arrojados foi mandar inscrever no orçamento geral do estado a quantia de 200:000$000 réis para subsidiar as juntas de parochia na construcçâo de edificios escolares. Mas para que a utopia f isso completa, a lei determinou que este subsidio nunca excederá a metade do custo total das despezas de construcçâo.

A este fim costumavam já os nossos orçamentos desde 1867 destinar uma verba de 10:000$000 réis, e segundo umas instrucções do sr. Mártens Ferrão, os subsidios do estado não podiam exceder a metade da despeza. A verba era pequena, e podiam concorrer a ella não só as juntas de parochia, mas tambem as camaras municipaes, e todavia creio que só n'um anno se despendeu toda, e annos houve pelo contrario que ficou intacta.

Se o paiz, antes de estar onerado com os encargos que ás localidades impoz o novo codigo administrativo, não tinha 10:000$000 réis por anno para pedir ao governo outro» 10:000$000 réis, como é que se póde esperar que tenha agora 200:000$000 réis para levantar outra igual quantia que a lei manda incluir no orçamento do estado?

A construcçâo de escolas é um dos maiores serviços que se póde prestar á instrucção popular, mas se o sr. ministro do reino o quizer realisar (e de certo quer), terá de propor a alteração da lei, offerecendo ás localidades um auxilio mais generoso, e seguindo com as modificações que

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forem apropriadas, o systema adoptado na execução do testamento do conde de Ferreira.

As instrucções do sr. Mártens Ferrão, apesar da generalidade com que foram redigidas, tiveram principalmente por fim a execução d'este testamento.

O conde de Ferreira mandara construir, por uma planta uniforme, 120 escolas em capitães de concelho, não podendo haver mais de duas escolas em cada concelho, nem podendo. gastar-se em cada uma alem do 1:200$000 réis, incluindo a mobilia.

Esta quantia fundava-se no orçamento do umas plantas que eu algum tempo antes havia mandado levantar. Era eu então commissario dos estudos no districto do Porto o não tinha um ceitil para escolas.

As minhas plantas, modeladas pelas de França, não podiam deixar de sentir-se d'esta pobreza. Demais, no orçamento d'aquellas plantas não se contava com a mobilia nem com o custo do terreno.

Os testamenteiros não eram obrigados a gastar réis l:200$000 era cada escola, não podiam exceder esta quantia, mas podiam despender menos. A planta devia ser a mesma para todos os concelhos, e como as despezas de construcçâo variam muito nas diversas localidades, os testamentenros precisariam de adoptar uma planta muito acanhada, de maneira que a obra não passasse da quantia designada, ainda nos logares onde estas despezas fossem mais avultadas.

Não havia lei ou regulamento que determinasse as condições a que devia satisfazer uma casa de escola. Por isso os testamenteiros podiam fazer um risco muito simples, e, de certo modo, arbitrario.

Viu o sr. Mártens Ferrão estas difficuldades, diante das quaes o precioso legado do conde de Ferreira não produziria a beneficio da instrucção popular todas as vantagens a que visava o generoso instituidor.

As instrucções d'este ministro definiam o que era uma escola. Desde então se os testamenteiros quizessem fazer uma obra diversa, a auctoridade publica poderia dizer-lhes: «Isso é um armazem ou um barracão, não é uma escola, segundo a legislação vigente, e o testamento está por cumprir».

Mas estas instrucções tornavam o testamento inexequivel. O edificio que se. regulasse por ellas, devia consumir, pelo menos na maior parto das terras, uma quantia superior ao maximo auctorisado, tratando-se da construcçâo em capitães de concelho, onde geralmente os terrenos não se podem adquirir senão por um preço elevado.

A este inconveniente havia o sr. Mártens Ferrão obviado com uma lei que auctorisava as camaras municipaes e juntas de parochia a contratar com os testamenteiros a construcçâo das escolas.

Assim, estas corporações, desejando ser contempladas com o legado do conde, poriam o que faltasse para o complemento da obra; figurariam como uma especie de empreiteiras, e os testamenteiros não tinham que indagar se ellas perdiam na empreitada.

Ao mesmo tempo facilitava-se aos testamenteiros levar a cabo uma empreza de não pequeno tomo, qual era construir edificios importantes em muitas terras do reino.

Elles pozeram a concurso a concessão das escolas, e assim poderam desempenhar-se da sua ardua missão.

Foi n'esse tempo que o sr. Mártens Ferrão inscreveu no orçamento geral do estado os 10:000$000 réis para subsidiar as corporações que se propozessem a construir as escolas primarias.

Não disse nem convinha dizer que se propunha a favorecer as corporações que aspirassem a ter nas suas localidades escolas do conde de Ferreira, mas ficava habilitado para o fazer, se tanto fosse necessario para que o pensamento do testador tivesse a mais proficua realisação.

As instrucções do sr. Mártens Ferrão foram censuradas e expostas á zombaria por pessoas muito auctorisadas. Os Sessão nocturna de 9 de maio de 1879

censores desviavam um pouco os golpes do ministro para os descarregarem sobre mim. Chamavam-lhe utopias, -o tanto o disseram, que eu mesmo estive quasi para o acreditar.

Hoje, porém, a utopia é uma realidade. As 120 escolas estão construidas, e valem muito mais do que os réis 144:000-5000 que para ellas deixara o benemerito testador. E, pois, tempo de mudar as criticas em louvores do ministro que se houve em todo este negocio com uma habilidade que o successo recompensou. '

N'um livro premiado com o elogio de todos os que "entendem da instrucção popular, notou o sr. D. Antônio da Costa nas escolas do conde de Ferreira, se bem me lembro, dois defeitos: o de não ter uma sala separada da aula e o de lho -faltar uma certa extensão de terreno fóra da escola....... -.v..

Pôde ser que o illustrado escriptor visse alguma escola a que faltassem estas condições. E possivel que; algum administrador de concelho menos zeloso deixasse cercear a planta, ou fechasse os olhos á incoherencia: d'ella.

Mas estes casos devem ter sido muito raros, e o certo $ que no desenho não havia nenhum dos defeitos indicados.

A planta da aula propriamente dita teve por modelo o systema americano. Acrescentou-se-lhe, como ordenava o testador, a casa para o mestre, que falta na maior parto das escolas dos Estados Unidos, o que em muitas nações da Europa é cora rasão considerada como uma parte essencial das instituições escolares.

A residencia do professor não é muito ampla.

O terreno tambem não é tanto que abunde para horta do professor, para um pequeno jardim botanico, e para os exercicios gymnasticos; mas era mister attender a que estas escolas tinham do ser construidas em cabeças de concelho, onde os terrenos são mais ou menos caros, e n'aquelle tempo poucos exemplos se podiam citar em França de escolas que tivessem uma extensão de terreno superior, nem ainda igual ao que circumda as do conde de Ferreira.

Referindo a historia do que se passou na execução d'este testamento, deixo indicado o caminho que se deverá seguir, se se quizerem aproveitar os 200:000$000 réis que o governo espera poder incluir no orçamento annual do estado para a edificação de escolas.

A lei actual n'este ponto é manifestamente inexequivel.

Outro defeito capital da lei está, quanto a mim, em repousar nas camaras municipaes.

Parece-me que fóra das cabeças de concelho não póde produzir effeito algum.

Duas vezes demonstrei n'esta camara, com mais largueza do que o desejo fazer agora, que o elemento administrativo das nações, cuja legislação costumámos traduzir, não é um territorio como o nosso concelho, mas sim como a nossa parochia.

Da primeira vez que fiz esta demonstração causei uma certa surpreza. Não se tinha reparado n'este facto, importante para quem pretende copiar leis concebidas para territorios e populações muito mais pequenas.

A camara ouviu n'esse tempo a minha exposição com um lai ou qual interesse e curiosidade; mas infelizmente não se deduziram as conclusões que d'este facto deviam derivar. '•*.'•

A nova lei administrativa deu um passo a favor do governo parochial, mas muito breve e insufficiente.

Na verdade, se dividirmos a superficie da França pelo numero das suas communas, vemos que tocam a cada uma 1:466 hectares.

As nossas parochias do continente são maiores: têem cada uma 2:354 hectares, termo medio.

Dividindo a população da França pelas suas communas, e a do reino de Portugal pelas nossas parochias, achámos 1:023 habitantes n'uma communa franceza, e 1:070 n'uma parochia nossa.

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E note-se que não separamos communas excepcionalmente populosas, como París, Leão, Marselha, Bordéus, bastando a de París, que tem quasi 2.000:000 habitantes, para exagerar a população media de muitas communas ruraes.

Nunca pretendi que se tirasse o caracter municipal a terras do população densa, como as capitães de districto, e outras cidades ou villas, em que muitas parochias podem constituir um municipio; mas fóra d'estas terras uma parochia deve formar a base da nossa administração.

Isto é importante para muitos fins, mas particularmente para a instrucçâo popular. E tanto o entendo assim, que a alguns ministros disso que não contassem commigo para qualquer reforma do instrucçâo primaria, emquanto não houvesse uma lei de administração civil que assentasse sobre a parochia.

Assim progrediu o ensino popular na maior parte das nações da Europa, começando muito mais modestamente do que entre nós, mas caminhando com mais solidez o desenvolvendo-se muito mais rapidamente'.

Desde que a parochia tenha vida administrativa, acredito que se póde basear n'ella uma boa lei de instrucçâo primaria, como a da França, da Belgica, da Italia e de varios paizes allemães.

Nas camaras municipaes ha de o sr. ministro do reino, e todos os ministros que lhe succederem, encontrar difficuldades insuperaveis para a diffusão do ensino popular.

Tomemos para exemplo um concelho qualquer, o de Amarante.

Este concelho tem 41 freguezias. Devia ter 41 escolas, e se quizessemos satisfazer completamento ás necessidades da sua população, não nos contentaríamos com um pessoal docente de menos de 80 mestres e mestras.

Supponhamos, piorem, que lhe bastam 41 professores. Dando-se a cada um o ordenado minimo que lhe marca a nova lei, que é de 100$000 réis, terá este concelho uma despeza annual de 4:1005000 réis para a instrucçâo elementar, que de presente lho custa apenas 400$000 réis.

Ora, este concelho tem uma receita de 8:000$000 réis, o para a realisar vê-se já obrigado a lançar uma contribuição directa de 35. por cento.

, Ali ha freguezias que soffrem uma derrama propriamente parochial de 33 por cento, e ha-as n'outros concelhos com 50 por cento, e mais.

Já se vê que esse municipio não póde, por mais que o deseje, conseguir meios de pagar a todo o pessoal docente de que precisa.

Se a lei se baseasse nas parochias, podia o concelho auxiliar aquellas que estão muito oneradas com a congrua do parocho, e no caso de lhe faltarem os recursos, acudir-lhes-ia o estado. a

A lei que temos vae perturbar consideravelmente a economia dos concelhos, e não dá resultado nenhum.

Os nossos concelhos ruraes têem um territorio muito extenso. Os professores ficam longe da vista das auctoridades a quem a lei commetteu vigial-os. Depois, passamos o tempo a censurar os administradores, que não fazem caso das escolas, e não nos lembrámos que se todos os administradores incorrem n'esta culpa, é porque o systema é vicioso e falso.

Uma auctoridade parochial, ainda que menos condecorada com titulos litterarios, veria melhor se o professor cumpre ou não, pelo menos materialmente as obrigações do seu magisterio.

Quem estudar o modo como se foi desenvolvendo a instrucçâo primaria em outras nações, e o comparar com o nosso systema, encontrará n'este uma aspiração ambiciosa que terá de ficar no papel.

Mr. Guizot na sua lei, que tão gabada tem sido, o ainda hoje o é, não tanto pelo que fez, como pelo que permittiu fazer, mandava estabelecer uma escola em cada communa, permittindo, todavia, ás communas associarem-se temporariamente para sustentarem uma escola.

0 ordenado minimo que elle garantiu aos professores não era de 100$000 réis, mas de 200 francos, que são réis 36$000.

Parece impossivel que se vivesse com tão pouco, mas as communas acharam quem fizesse este milagre.

Encontrei nas aldeias do districto do Porto muitos mestres particulares que levavam 60 réis por alumno e por mez. Visitando o districto no anno seguinte, notei que este honorario se tinha elevado a 80 e 100 réis.

Professor que tivesse trinta alumnos, o poucos eram os que tinham mais, podia fazer 3$000 réis por mez.

Levaria melhor vida, e mais opulenta,.se fosse creado de servir em qualquer cidade, onde teria maior soldada o seria sustentado pelo amo.

Mas isto prova que ha gente que ensina por paixão mais do que por interesso.

O ensino d'essas escolas era geralmente muito fraco, mas valia mais do que nenhum. Os milhões que annualmente nos vem do Brazil, principiaram a ser ganhos ou merecidos em escolas tão miseraveis como estas.

Sempre ensinam a ler e escrever melhor ou peor, e isto é muito importante. A escripta é uma extensão da faculdade de fallar: por meio d'ella, falíamos para distancias o para tempos aonde não póde chegar a nossa voz fraca o mortal.

A leitura é uma extensão da faculdade de ouvir; com o auxilio d'ella ouvimos os que nos fallam de longe, ou dos tempos passados.

E quem lê ou escreve mal, está para quem não lê e não escreve nada, como o que tem mau ouvido ou dificuldade de fallar, está para o surdo-mudo, destituido da instrucçâo que hoje se sabe dar a esta classe infeliz.

As nações a que me estou referindo, não tinham no seu principio, como nós temos, pretensões ao ensino gratuito, que se traduz praticamente na ausencia total do ensino na maior parte das aldeias.

A este respeito ha muita illusão. A gente engana-se muito com o que vê nos livros.

Eu tinha lido que a instrucçâo primaria era gratuita na Prussia.

Creio que poucos leram outra cousa. Todos os livros o apregoavam, ainda os que eram escriptos por grandes homens que observaram n'aquelle paiz as suas admiraveis instituições de educação publica.

Em 1866, te bem me recordo, mr. Duruy, ministro da instrucçâo publica em França, dirigiu um relatorio ao imperado]-, propondo um ensino gratuito e obrigatorio para a França.

O ministro apoiava-se muito no exemplo da Prussia. O seu relatorio foi admirado em toda a parto, traduzido em todas as linguas. O jornal official da instrucçâo publica da Prussia publicou-o em allemão, e não lhe fez rectificação alguma, devendo lisongear-se muito do que a sua patria fosse digna de ser tomada para mestra por uma nação como a França.

Alem, d'isso, a constituição prussiana de 1850 determinava que a instrucçâo primaria seria gratuita. Não havia, pois, que duvidar.

Estava escripto. A instrucçâo primaria era gratuita na Prussia.

Eu tinha porém lido uns mappas officiaes, que me fizeram scismar muito tempo. Entre estes mappas, referidos a 1861, havia um que tinha varias. columnas, indicando as procedencias dos ordenados dos professores de instrucçâo primaria da Prussia.

A primaria d'estas columnas tinha por epigraphe Schulgeld, que quer dizer á letra «dinheiro escolar» e significa a retribuição que o alumno paga ao mestre. Eu quereria traduzir por minerval.

Os nossos sabios disseram que esta palavra tinha saído

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da cabeça do sr. bispo do Vizeu, como a deusa que saíu armada da cabeça do Jupiter, e n'esse tempo não se encontrava esta palavra em nenhum dos diccionarios das linguas neo-latinas, posto que andasse em alguns livros de pedagogia francezes e italianos, e até nos regulamentos da Belgica.

Hoje encontra-se no Diccionario encyclopedico do seculo XIX, de Larousse, que não concedeu ao sr. bispo de Vizeu as honras de inventor d'este barbarismo.

O certo é que o Schulgeld avultava no mappa a que me refiro.

Montava a 2.321:000. thalers, que são perto de réis 1.507:000$000, e mais de 31 por cento da somma dos ordenados do magisterio primario na Prussia.

Isto não era possivel n'uma nação que tinha a instrucção elementar gratuita.

Conclui, pois, que não sabia traduzir ou entender aquella palavra.

Passado algum tempo, encontro uma proposta do governo prussiano ao parlamento, para que fosse revogado o artigo da constituição, que promettia dar do graça a instrucção elementar. ¦

Essa proposta era. precedida do um substancioso relatorio, em que se dizia que de facto a instrucção primaria só por excepção ora gratuita em partes de algumas provincias da Prussia.

A proposta não passou, mas fiquei então percebendo o que era o mysterioso Schulgeld, e conclui que os sabios citando levianamente o exemplo da Prussia alimentavam nos povos a illusão de que se podiam civilisar, começando logo por prescindir de nina fonte de receita que n'aquelle paiz concorria com 31 por conto para a subsistencia dos seus professores.

Nós temos pela carta a instrucção gratuita; mas o que temos na verdade é uma pesada ignorancia.

A falta do retribuição escolar, que não podemos estabelecer por ser contra a constituição, augmenta a difficuldade em que se hão de ver os nossos municipios, que desejarem acompanhar as nações mais adiantadas, encontrando fechado um dos caminhos que as levaram á prosperidade relativa que hoje lhes invejámos.

Parece-me escusado continuar na demonstração da impossibilidade de tirar algum proveito da nova lei do instrucção. primaria. E creio que estaremos convencidos da necessidade do estudar o modo de resolver a questão na proxima sessão legislativa. (Apoiados.)

Quanto á instrucção secundaria, o seu estado é lastimoso. Todos o reconhecem, o escuso do o demonstrar.

O decreto do sr. bispo de Vizeu melhorava-a muito, na minha opinião. Por meu voto não teria sido publicado sem um relatorio; porque tinha algumas disposições, antigas para outros paizes mais adiantados, mas novas para nós, o deviam surprehender o indispor a opinião publica, mal informada.

O ministerio do sr. bispo havia pedido a demissão, o esteve em crise durante muitos dias. O sr. bispo de Vizeu não quiz, o com rasão, fazer um relatorio com antedata, e mandou publicar o decreto para que os seus successores (dizia elle) tivessem o trabalho de o revogar.

Este decreto elevava a seis annos o curso dos lyceus que até ali era de cinco. O augmento do um anno era insufficiente; mas não se podia dizer rapidamente ás familias que seus filhos tinham de passar mais tempo nas escolas antes de poderem entrar nos empregos publicos. Na Prussia a instrucção secundaria gasta oito annos, o uma longa pratica tem mostrado que este tempo é necessario e sufficiente.

Não podiamos fazer tanto, de repente. Para o realisar-mos, teriamos de abreviar os cursos de instrucção superior, que entro nós são demasiadamente longos, e n'esse caso teriamos do luctar com as tradições dos nossos, estabelecimentos de instrucção superior, que são instituições naturalmente conservadoras.

A prudencia recommendava que se caminhasse lentamente. Augmentou-se um anno, o quando o publico estivesse acostumado ao curso do seis annos, podia este curso ser elevado a sete annos, que me parecem indispensaveis para a boa instrucção dos alumnos..

A principal novidade do decreto do sr. bispo de Vizeu, pelo menos a que mais se estranhou, foi o ensino simultaneo de muitas disciplinas, cujos titulos pomposos faziam suppor a muita gente que não eram para estudantes novos.

Ora, a supposta novidade é uma das cousas mais antigas que ha no mundo. Os filhos do pae Adão foram de certo educados por um methodo analogo, aprendendo muitas cousas ao mesmo tempo. (Riso)

Provavelmente, quando tinham sete annos, já sabiam distinguir o sol da lua, e das estrellas, o dia da noite, etc. Sabiam, pois, alguma cousa de astronomia. Differençavam a raiz do tronco e das folhas, etc.; conheciam o seu boca; do de botanica. Não confundiam o coelho com o carneiro, nem o boi com o cavallo, e tinham noções do zoologia.

Bem dizia Rousseau, que aos sete annos sabemos mais do que havemos do aprender no resto da nossa vida. Sabemos milhares de palavras a que correspondem outras tantas idéas, e temos uma infinidade de conhecimentos do mundo, physico e do mundo moral, que fomos adquirindo simultaneamente. Na verdade, os homens mais sabios, os Aristoteles, os Humboldt não sabem no fim da sua, vida

O ponto é sabel-o escolher e preparar......-

Os nossos professores, com os ordenados que tinham, não podiam dedicar ao ensino por este methodo o tempo que era indispensavel.

O sr. bispo de Vizeu procurou augmental-os sem'aggravar a situação da fazenda. O augmento, comquanto não fosse qual se requeria, podia montar em alguns lyceus a cerca do 200$000 réis, o este augmento estava n'uma certa relação com o trabalho dos professores. Demais, se a idéa tivesse sido acceita, era possivel ir lentamente acrescentando os ordenados, sem que o thesouro o sentisse.

Hoje, se não se quizer restaurar o systema introduzido pelo illustrado bispo de Vizeu, ainda ha um remedio. É ir buscar ao orçamento o dinheiro que se gasta com as commissões de exames, e repartil-o pelos professores dos lyceus. (Apoiados.) Assim póde prohibir-se-lhes o ensino particular, como o fazia o sr. bispo de Vizeu, e entregar-se-lhes. nos respectivos lyceus o exame dos alumnos. (Apoiados.) Já se vê que estou do accordo com os representantes dos lyceus de fóra das capitães das circumscripções actualmente estabelecidas,

Feito isto, deve restabelecer-se o exame de madureza (Apoiados.)

Dizia-se que este exame era contrario á attenção devida aos examinadores dos lyceus. Não é tal. Este exame tem um caracter diverso e abrange ou deve abranger todas as materias da instrucção secundaria.

O examinador que approvou um alumno n'uma disciplina qualquer, não é obrigado a conservar n'esse alumno a instrucção que tinha quando foi approvado. Se elle perde n'um anno o que sabia no anno antecedente, o examinador não é o culpado, nem deve reputar-se por desconsiderado se o estudante não satisfaz como deve ao exame da' madureza,.

A indole de exames nunca foi bem comprehendida entre nós. Antes que o sr. Sampaio os abolisse, já tinham, sido muito cerceados, o nunca foram estabelecidos com q caracter que lhes é proprio, •

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As familias não gostam d'estas difficuldades. Têem pressa do diploma que habilita os seus filhos pura adquirir um emprego; mas o governo deve ter coragem para arrostar cora a impopularidade que lhe vem de um justo rigor. A maioria do paiz estará com elle, porque interessa em que 03 cargos publicos sejam bem desempenhados.

Muito quereria ou dizer do ensino secundario, a que a Allemanha chama real, a Belgica professional, a Italia technico, e a França especial.

Isso não se podia fazer em breves palavras, o não desejo demorar a approvação d'este orçamento.

Vamos á proposta que annunciei. Tom por fim encorporar com a verba das despezas diversas da academia polytechnica do Porto a quantia de 4:000$000 réis votada para as obras do edificio.

A verba de 1:730$000 réis para o material da academia não é só insufficiente, é vergonhosa. D'essa verba saem as despezas do expediente, os premios para os alumnos, os livros para a bibliotheca, os instrumentos para o gabinete de physica, os utensilios o reagentes para o laboratório, os jornaes dos operarios do jardim botanico, os exemplares de mineralogia o zoologia, etc, etc. Todos os professores querem dinheiro para os estabelecimentos que dirigem, e aquella quantia que apenas bastaria para um, tem de repartir-se por todos, e não chega a nada. O professor de chimica passa todo o dia, e quando Deus quer, grande parte da noite, no laboratório. E um consumidor infatigavel de reagentes, e estou vendo que um dia desanima por falta de materiaes com que satisfaça a sua curiosidade scientifica. Até agora os outros professores tem o auxilia do, como a um irmão mais novo, que se trata com mimo; mas já se vão desgostando com a insignificante dotação que lhes fica para os seus estabelecimentos. Todos são de um notavel zêlo pelo ensino, e custa muito ver perdido todo esse zêlo por falta dos meios indispensaveis.

Não quero, (nem ainda para este fim sacratissimo, propor, augmento da despeza publica.

E por esta occasião tenho de declarar á camara que na qualidade do membro dá commissão de instrucçâo publica tenho dado e continuarei a' dar parecer favoravel a algumas propostas, das quaes resulta augmento do despeza; mas esse parecer significa que considero a proposta do utilidade para a instrucçâo, porque este é o lado por onde me cumpro encarar as questões, como membro d'aquella commissão.

Reservo-me, porém, o direito, e imponho-me o dever de votar na camara contra qualquer augmento do encargos para o thesouro.

A minha proposta não os augmenta; apenas habilita o conselho da academia polytechnica a applicar para fins de mais urgente necessidade uma parte da verba já incluida no orçamento para as obras do edificio.

Já que estou fallando na academia polytechnica, não terminarei sem tocar n'uma questão que muito importa aquelle estabelecimento, o creio que ao paiz. Refiro-me ao curso preparatorio para a escola do exercito.

Reconheço que a academia o a escola polytechnica são dois estabelecimentos de indole diversa.

Á escola polytechnica de Lisboa é modelada pelo systema francez; a do Porto pelo systema allemão, posto que uma e outra estejam muito afastadas dos seus typos.

A França é muito infeliz nos nomes com que baptisa os seus estabelecimentos de instrucçâo.

A idéa quasi sempre é contraria ao nome que lhe põe.

Assim, ás escolas populares mais completas, chamou escolas primárias superiores. Ao ensino secundario, destinado á instrucçâo das classes mais numerosas, como artistas, commerciantes, etc. chamou ensino especial, quando elle é verdadeiramente geral. E á uma escola, que é simplesmente preparatoria das escolas de applicação, que, portanto, não ensina arte nenhuma, deu o nome de polytechnica, que quer dizer de muitas artes,

Na Allemanha, os estabelecimentos polytechnicos lêem. por fim habilitar os estudantes, quanto e possivel nas escolas, para as profissões que dependem de conhecimentos mathematicos e á as ciências physico-chimicas, e historiso naturaes.

Por isso, ainda que já n'esta camara se tentou uma vez metter a ridiculo a academia polytechnica por ter a pretensão de formar engenheiros de todas as especies, os institutos polytechnicos allemães, que são muitos, o alguns mui ricamente dotados, têem todos os cursos do engenheria civil (excepto o de minas, que aliás não é incompativel com a instituição), cursos florestaes, de chimica technica, pharmacia, ele. Correspondem, pois, ao seu titulo, e distinguem-se essencialmente da escola polytechnica de França.

A academia polytechnica do Porto foi dado por missão o habilitar os engenheiros civis, ao mesmo tempo que ministrava o curso preparatorio das escolas medico-cirurgicas.

Mas no tempo em que foi instituida, ou antes reformada, o paiz não carecia, ou pensava que não carecia, de engenheiros do especie alguma. Havia apenas umas tres minas em exploração, e não se faziam estradas nem obras hydraulicas, porque não havia dinheiro para ellas.

Por isso, aquelle estabelecimento desejou cooperar desde logo com a escola polytechnica de Lisboa o a universidade para a instrucçâo preparatoria dos alumnos da escola do exercito.

Diversas leis lh'o prometteram mas nunca se cumpriram, e allegava-se a falta de um regulamento, que a dizer a verdade não era mais necessario para ella do que para os outros estabelecimentos.

Veiu por fim o regulamento, cuja data não cito, para evitar uma questão politica, que não quero introduzir n'esta especie de conferencia pacifica.

Esse regulamento limitava a tres annos o curso da academia preparatorio da escola do exercito. Dava muito trabalho aos professores, mas todos estavam dispostos a facilitar a sua execução. Alguns prescindiam do feriado da quinta feira, outros accumulavam a regencia de dois cursos; da nossa minguada dotação tirámos uma quantia para o ensino da gymnastica, e não faltava nada para se tentar lealmente se era possivel vencer no triennio o curso preparatorio.

Um estudante militar havia requerido ao governo licença para cursar a academia, e oitavado tal regulamento. O ministerio da guerra deferiu, mas acrescentou: apara a escola polytechnica».

Não se reparou na differença, e o alumno apresentou-se com a competente guia na academia, onde frequentou o primeiro anno.

Era um moço de talento e applicação, muito bom para a experiencia.

Acabou o anno, e requereu nova licença para continuar o segundo. O ministerio da guerra respondeu-lhe que tinha perdido o seu tempo, e que se quizesse, fosse matricular-se no primeiro anno da escola polytechnica!

O regulamento não estava suspenso de direito, mas estava-o de facto, por uma vontade superior ás leis.

Vou lembrar um modo muito simples de acabar com esta questão. Tem o inconveniente de ser tambem muito economico, e por isso não póde ser acceito n'esta quadra. E o seguinte:

Não se dá licença a militares para frequentarem com preferencia um ou outro estabelecimento. Poupa-se o que se despende com os militares que frequentam os estabelecimentos civis, o abre-se todos os annos um concurso, com provas publicas, para os logares de alumnos que se propõem frequentar os cursos das diversas armas na escola do exercito, exigindo-se-lhes um curso preparatorio em qualquer dos estabelecimentos do sciencias physico-mathematicas de Lisboa, Coimbra ou Porto.

Quem souber mais, entra; quem souber menos, fica de!

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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

fóra, e 03 estabelecimentos em vez de se guerrearem para ter um privilegio artificial, rivalisarão entre si para ver quem prepara melhor os seus alumnos para o certamen scientifico, que annualmente se debaterá perante a escola do exercito.

Tinha muito mais que dizer; mas fico por aqui, e peço licença para redigir a proposta que vou mandar para a mesa.

N.° 254-E

Junta geral do districto de Bragança

Senhores — A junta geral d'este districto vem por intermedio da sua commissão executiva, a quem para este fim dou especial mandato, solicitar dos representantes do paiz a auctorisação necessaria para uma reforma, que pretendo fazer no orçamento districtal.

Sabeis, que uma administração sabia e racional exige primeiro que tudo uma severa e rigorosa economia e a eliminação de todos os serviços dispendiosos, cuja utilidade não estiver pratica e sufficientemente demonstrada.

A observancia d'estes principios, sempre util e proveitosa, torna-se de impreterivel necessidade hoje que as despezas obrigatorias a cargo das juntas geraes augmentaram muito pela reforma ultimamente decretada.

Senhores. Em 1876 a junta geral d'este districto por iniciativa do ex. mo governador civil, votou no seu orçamento a verba destinada á sustentação de um corpo do policia civil, que foi immediatamente organisado, ficando composto de 1 commissario, 1 chefe de esquadra, 2 cabos de secção e 12 guardas.

As cireumstancias financeiras do districto não permittem que elle seja mais numeroso.;

Este corpo faz ao districto a despeza annual de réis 2:836$000, concorrendo a camara de Bragança com réis 888$666.

O numero reduzido de agentes, de que o corpo policial se compõe, tem feito com que os seus servidores se tenham limitado quasi exclusivamente á capital do districto, o que as outras povoações que elle encerra tenham contribuido para a sustentação de uma corporação, que só á capital póde aproveitar.

Dá-se, porém, a circumstancia de que é exactamente em Bragança onde uma instituição d'esta ordem mais se póde dispensar.

A indole pacifica e ordeira do povo brigantino é proverbial, não tendo sido até hoje a policia forçada a intervir n'uma desordem ou motim de gravidade; n'esta cidade, que apenas conta 5:445 habitantes, ha dois corpos de linha, o regimento de cavallaria n.º 7 o batalhão do caçadores n.º 3, que tem cinco postos militares permanentes estabelecidos na cidade a pequenas distancias; existe aqui tambem um corpo de guardas fiscaes, alem dos outros funccionarios, que se encontram em todas as terras d'esta ordem, como são os regedores, cabos de policia, zeladores municipaes, officiaes de diligencias, etc, e que directa ou indirectamente velam pela segurança publica.

Um corpo de policia de 15 homens é, portanto, aqui uma perfeita superfluidade, e tanto que elle se tem occupado em boa parto de serviço pertencente á policia municipal.

Se por outra parte se confrontar o estado actual com o' anterior a 1876, não se encontra differença sensivel no bem estar dos cidadãos, na segurança das vidas e da propriedade e no respeito da lei.

Não se tem melhorado com a creação da policia, pois que antes d'ella todos estes principios se achavam sufficientemente garantidos.

No districto de Villa Real não existe corpo de policia e entretanto esta villa tem do guarnição apenas um destacamento; em muitos outros districtos tambem não existe policia, sem que por isso a ordem e a liberdade corram perigo, e sem que os administrados reclamem a sua creação.

E fundada em todas estas considerações, cuja verdade e valor são indiscutíveis, que ajunta gorai do districto de Bragança, interpretando o modo de pensar dos seus constituintes, projecta eliminar do seu orçamento a verba destinada á policia, o vem solicitar dos poderes competentes a necessaria auctorisação.

Senhores, as juntas geraes têem pela nova lei administrativa uma larga esphera de acção, e a sua livre iniciativa póde produzir grandes e uteis melhoramentos; se, porém, se lhes não permittir cortar as demasias o superfluidades dispendiosas, que se encontrarem entre 03 ramos da sua administração, essa ampla faculdade que lhes concedeu um systema descentralisador, tornar-se-ha illusoria, porque as despesas consideradas obrigatorias absorverão toda a receita; a administração districtal tornar-se-ha um corpo sem vida, sobra que não poderá haver discussão nem reformas, e o orçamento reduzir-se-ha a uma resenha sacramental de verbas de despeza, que todos os annos se repetirá invariavelmente.

Mas a actual camara dos representantes do paiz, em que figura a maior parte dos membros da camara que votou a reforma administrativa, de certo interpretará esta lei segundo o espirito liberal e autonómico que a inspirou, e decretando que esta despeza cesse de ser obrigatoria para os districtos que estiverem no caso do de Bragança, annuirá á justa pretensão d'esta junta.

Pedem a v. ex.ª hajam por bem deferir-lhes.

Bragança, 16 de maio de 1879. — (Seguem as assignaturas.)

Acta da sessão de 6 de maio de 1879 — Logar respectivo. — Foi lido o parecer da commissão de fazenda, que é o seguinte:

4.° Que votaria contra a verba destinada á sustentação de um corpo de policia na capital do districto, por lhe parecer uma instituição inutil n'uma cidade onde ha dois corpos de linha e um corpo de guardas fiscaes, alem dos outros empregados que directa ou indirectamente velam pela segurança publica, acrescendo o exemplo de outros districtos que a não têem; mas que o não faz por ser esta despeza obrigatoria dos districtos, em virtude do artigo 32.9 da carta de lei de 2 de julho de 1867.

Propõe, porém, que se represente ás côrtes para se poder eliminar esta despeza do orçamento.

Opina a commissão que todos os esforços o sacrificios pecuniarios do districto devem dirigir-se no sentido do desenvolvimento da viação.

A final, foram votadas todas as conclusões do parecer.

Resolveu-se que ficasse a commissão districtal, encarregada de elaborar e mandar ao seu destino, em nome da junta geral, todas as representações que haviam sido votadas. — (Assignados na acta) Visconde da Bouça — Antonio Bernardo Teixeira — Manuel de Mello Vaz de Sampaio — Francisco Xavier de Moraes Pinto — Antonio Caetano de Oliveira — Sebastião Maria 'de Azevedo Lobo — Antonio José Machado — Manuel Paulo de Sousa — Augusto Trajano de Oliveira — Antonio José Dias — Antonio Julio Pimentel Martins.

Está conforme. — Bragança e secretaria da commissão districtal executiva, 16 de maio de 1879. = 0 secretario da commissão, Antonio Julio Pimentel Martins.

Sessão nocturna de 9 de maio de 1879

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