O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

2106

ou vomitar a sua bilis, porque eu hei de dizer o que quizer, e as suas interrupções não me fazem mal. Mas fará melhor pedir a palavra, discutir e derrocar pela base os argumentos dos seus adversarios, porque assim conquista mais palmas e maiores glorias, para o que está habilitado. Faço justiça á sua intelligencia. Advirto-o pois que essas aggressões á queima roupa não produzem effeito, porque eu estou disposto a continuar.

O sr. Teixeira Marques: — Póde continuar.

O Orador: — Muito obrigado. Ainda mesmo que v. ex.ª me não desse licença, estava disposto já a continuar.

Vamos á historia do parecer primitivo da commissão; não ha outro remedio.

O sr. ministro da fazenda apresentou á commissão a sua proposta n.° 1, e lá não vinha a desamortisação obrigatoria dos passaes. É uma cousa conhecida de todos e que de certo não precisava a revelação do illustre deputado, que se apresentou com ares de quem descobria um segredo. A cousa é tão publica e official, que dispensava a denuncia do sr. Teixeira Marques.

A commissão foi unanime em dizer ao governo = para não crear embaraços, nós aceitâmos este parecer como está; mas olhe que se for presente alguma moção que tenha por fim tornar obrigatoria a desamortisação dos passaes, aceitâmo-la =.

Isto já tem sido dito, explicado e confessado, um cento de vezes. Ninguem o nega. Ninguem o póde, ninguem o deve negar.

Os embaraços não consistiam só na desamortisação obrigatoria dos passaes; para mim a questão principal era a collocação das inscripções a 50 por cento. Era este o principal embaraço que eu previ sempre ao ministerio transacto, e não desejava nem desejo crear ao actual.

A questão dos passaes podia não ser votada por um certo espirito de provincialismo que dirige aqui os passos de alguns collegas nossos, mas havia de ser votada pela maioria da camara.

Quanto á questão das inscripções a 50 por cento, considerei sempre o caso mais serio, porque sendo esta medida applicada a diversos estabelecimentos de todo o paiz, muitos deputados arreceiavam-se de uns suppostos prejuizos que iam arruinar todas as corporações.

Este foi sempre á ponto principal para mim.

Poucos dias antes de caír a situação passada, disse eu a alguns srs. ministros que não fizessem questão da collocação das inscripções, porque encontrava grandes repugnancias na maioria da camara.

Desde o momento pois em que se apresentou uma moção que tinha por fim tornar obrigatoria a desamortisação dos passaes, a commissão aceitou-a, cumpriu a sua palavra, palavra empenhada nas suas sessões, e no seio do parlamento. Esta é a verdade. A questão dos passaes não a considerâmos nós um embaraço para o governo. Pelo contrario, colloca-o em melhor situação; dá-lhe maior massa de bens, para mais facilmente saír das difficuldades em que se encontra e para poder amortisar a divida fluctuante (apoiados).

Passemos a outra face da questão. Não direi que ha aqui o latet anguis, que tanto incommodou ha pouco o sr. ministro do reino. Ha porém o quer que é revelando o estado contradictorio da politica do governo. No ministerio ha quem queira a desamortisação dos passaes, e quem não a queira. Para satisfazer a uns, proclamou-se o principio no corpo do artigo; para satisfazer a outros, enxertou-se um celebre § no mesmo artigo.

O sr. ministro da fazenda; que sinto não esteja presinto, afigura-se me que pertence aos dois lados do ministerio. O sr. Carlos Bento não póde deixar de estar com aquelles, não que querem a desamortisação dos passaes, porque tem a este respeito a sua opinião mui bem definida e clara, como passarei a provar; e não póde tambem deixar de estar contra os seus collegas, que querem e já prometteram a dotação do clero. Em resumo, o sr. Carlos Bento não quer a desamortisação dos passaes, nem quer a dotação official do clero. No ministerio ha quem queira metade d'isto e rejeite a outra metade, ou a aceite violentadamente.

S. ex.ª, quando era membro da commissão de fazenda, não queria a desamortisação, por isso que podia trazer como consequencia a dotação do clero.

Se no parecer da minoria, o qual foi accordado com o governo, não ha latet anguis, deve haver alguma cousa, que se pareça com uma retractação da parte do sr. Carlos Bento. Uma de duas. Ou este artigo significa o estado desconnexo em que está a politica do governo, que se acha dividido em dois bandos, pertencendo o illustre ministro da fazenda talvez a ambos, ou então não lhe acho significação precisa. Esta é a minha opinião a respeito do modo por que está concebido e redigido este artigo.

Quanto ao § 1.° tambem tenho alguns reparos a fazer.

O projecto de lei da commissão de fazenda, que recaíu sobre a proposta do sr. Dias Ferreira, exceptuava as residencias dos parochos e os edificios e terrenos que o governo julgasse indispensaveis a esses estabelecimentos e individuos para o desempenho de suas funcções, goso e serviço do publico. A lei de 22 de junho de 1866 exceptua da desamortisação os edificios, jardins, passeios e quaesquer terrenos que o governo, depois de havidas as necessarias informações das auctoridades, julgar indispensaveis a esses estabelecimentos, com previa audiencia dos seus administradores, para o desempenho de suas funcções, goso e servido do publico. Mas aqui, n'este § 1.°, já se não trata do goso e serviço do publico, já se não trata do bom desempenho das diversas funcções, porque se diz: «Não são comprehendidos os terrenos que o governo julgar indispensaveis para goso e serviço particular d'esses individuos». Quer dizer, o governo fica armado do latissimo arbitrio para fazer presente de quaesquer porções de terreno aos individuos a quem diz respeito o artigo da minoria, mas para seu uso particular, ainda que não sejam precisos para uso e goso do publico e para o exercicio das suas funcções. Ora estes terrenos não serão só para os parochos, são tambem para os bispos, são para todos os individuos a quem dizem respeito os bens e direitos prediaes que fazem parte da dotação do clero.

Que estas concessões sejam cohonestadas como rasoaveis exigencias para o desempenho de funcções e para o serviço do publico, vá; mas fazerem-se exclusivamente para uso particular, e para goso de alguns individuos, é realmente uma cousa que eu não posso votar. Votaria o § se elle estivesse pouco mais ou menos redigido nos termos das disposições que citei. D'esta fórma sim, mas para goso particular de individuos, parece-me altamente inconveniente que similhante arbitrio seja exarado em uma lei.

Agora perguntaria eu á minoria da commissão e aos srs. ministros: se porventura o governo não trouxer ao parlamento na proxima sessão legislativa as taes propostas para regular a applicação do principio consignado do seu artigo, considera-se, ou não, effectiva a desamortisação?

Supponhamos que o governo por uma circumstancia qualquer não apresenta as propostas, ou desaba este ministerio e o outro que lhe succede se não julga obrigado a apresenta-las, e por consequencia não as apresenta na proxima sessão legislativa, pergunto: fica ou não effectiva a desamortisação, ou está, sempre, em todos os casos, em todas as circumstancias, dependente das propostas que um governo qualquer haja de trazer ao parlamento?

É este tambem um ponto sobre o qual provavelmente vou ser esclarecido, e com sinceridade desejo se-lo.

Sr. presidente, visto ter-se fallado em dotação do clero, vou, em poucas palavras, consignar as minhas opiniões a tal respeito.

Declaro positiva e terminantemente, que tenho gravissimos escrupulos em aceitar o principio da dotação do clero com verba especial no orçamento (apoiados). Que o clero seja convenientemente dotado, de accordo; quero, exijo e peço a sua condigna remuneração. Aceitarei a proposta de lei, de qualquer governo, conducente a conseguir similhante fim. É tambem um dos meus desideratums. Mas na occasião em que é urgente simplificar serviços, reduzir o pessoal, descentralisar, e alijar muitas despezas do orçamento para os districtos, municipios e parochias, não posso aceitar uma reforma que vae sobrecarregar o orçamento com umas poucas de centenas de contos de réis (apoiados).

Desamortisem-se os passaes; subroguem-se por inscripções; constitua-se um fundo commum com estas rendas, e preencha-se o que faltar com derramas ou collectas parochiaes. É a fórma por que aceitarei a congrua sustentação dos parochos. Este é o pensamento fundamental, que quaesquer attendiveis circumstancias poderão modificar ou ampliar. Verba no orçamento, no actual estado de cousas, e com as nossas tendencias para simplificar o orçamento, não me parece admissivel.

A desamortisação dos passaes é pois util em todas as hypotheses. Util porque, a continuar o statu quo, melhora a situação do parocho o do freguez; util, porque é uma base indispensavel para a futura dotação do clero official, nos termos em que eu a concebo; util, porque liberta uma grande massa de bens.

A desamortisação obrigatoria dos passaes não está logica e essencialmente presa á dotação do clero. Se os passaes forem desamortisados, e continuar para os parochos a mesma ordem de cousas, lá lhes fica o rendimento d'elles, igual, e, na maxima parte dos casos, superior ao que recebem hoje.

Sr. presidente, vou concluir as considerações que tinha a fazer com o trecho de um discurso do sr. ministro da fazenda.

Preciso demonstrar á camara, que não avancei uma opinião infundada, quando declarei o sr. Carlos Bento inimigo da desamortisação dos passaes, e da dotação do clero, que alguns dos seus collegas querem, e s. ex.ª parece ter aceitado em principio, no parecer da minoria da commissão, contraias suas bem conhecidas e bem definidas opiniões (leu). É o seu notavel discurso de ha um mez. Ainda s. ex.ª era deputado. Discutia-se o projecto de desamortisação do ministerio passado.

«Em primeiro logar, discursava o sr. Carlos Bento, supponho que para o effeito financeiro d'esta lei, a importancia dos passaes não é tão grande, que, exceptuados da desamortisação, provenha d'ahi grande damno á lei. Em segundo logar, quando eu vejo que a desamortisação, com relação á residencia dos parochos é determinada de modo, que fica ao governo a faculdade de indicar a parte d'esses bens, que devem ser desamortisados, é os que devem ficar isentos da desamortisação, vejo que se dá um arbitrio ao governo, arbitrio que eu, como não aceitava, tambem não dou.»

O sr. Carlos Bento não dava ao governo passado um arbitrio, que não aceitaria para si, e aceita-o um mez depois! Que é isto? Onde estão as opiniões do nobre ministro? Então agrada-lhe agora o arbitrio, para fazer presentes, a seu talante, aos parochos e aos bispos, para seu uso particular? Valha-nos Deus com estas contradicções!

Continua s. ex.ª: «e não dou (o arbitrio) por deixar de confiar no governo, mas porque não tenho a certeza da sua duração no poder. Póde estar ali muito tempo, mas póde tambem saír muito breve... Se este ministerio caír, e vier, supponhamos, outro menos solicito e menos escrupuloso no integral cumprimento do pensamento que dictou esta medida, póde com este arbitrio que lhe fica, fazer, em logar de uma lei financeira, uma lei eleitoral».

Já se vê que o nobre ministro da fazenda, a não ser por um grande rasgo de modestia, não podia deixar de se considerar mais solicito e mais escrupuloso do que qualquer outro ministro, que em sonhos s. ex.ª já via como successor do sr. Dias Ferreira. Foi por isso que o sr. Carlos, Bento aceitou o arbitrio, que é incapaz de transformar em arma eleitoral. S. ex.ª é incapaz de abusar do arbitrio, transformando-o em instrumento politico e eleitoral!! Esta pecha já agora ficará para o seu successor, porque s. ex.ª, quando saír do poder, ainda ha de deixar muito pedaço d» terra para presentear o clero official. Acrescenta ainda o nobre ministro da fazenda: «As considerações apresentadas pelo illustre relator da commissão (era eu), sobre ser esta uma medida efficaz para encaminhar o estado a estabelecer a dotação do clero (s. ex.ª attribuiu-me uma opinião que não era inteiramente a minha), a este respeito estou ainda de accordo com o sr. Belchior José Garcez... Se este projecto tem por fim encaminhar para essa dotação, que o estado nas circumstancias actuaes não me parece possa garantir com toda a segurança, é mais um motivo para que eu me confirme na opinião que sigo». Aqui estão as modernas opiniões do sr. Carlos Bento.

Veja tambem o nobre ministro do reino a sorte que espera a sua predilecta dotação do clero. O sr. Carlos Bento não crê em promessas, não quer que se façam, nem quer que se cumpram. S. ex.ª parece que n'esta occasião estava já a atalhar um epigramma previo, para o seu futuro collega do reino. O sr. bispo de Vizeu faz hoje promessas sobre, a dotação do clero; o seu collega da fazenda já ha um mez se ria dellas (riso).

S. ex.ª é tão descuidado n'estes epigrammas, que até os talha para si (riso). E n'este trecho que eu li, e n'estas allusões de s. ex.ª, ha, se me não engano, muita cousa, que assenta perfeitamente no nobre ministro.

S. ex.ª combateu pois o parecer da commissão de fazenda no tempo do ministerio passado, principalmente por dois motivos. Primeiro porque se podia deprehender d'elle a promessa da dotação do clero, e s. ex.ª não aceitava tal dotação. Em segundo logar s. ex.ª rejeitava-o na parte em que dava ao governo um arbitrio larguissimo a respeito de concessões e terrenos, e edificios aos individuos a quem a lei se referia.

Já se vê pois, quando eu fallei no notavel desaccordo entre as opiniões actuaes do sr. ministro da fazenda, e as opiniões de s. ex.ª ha um mez, avancei uma proposição, que felizmente posso sustentar e provar com os trechos que acabo de ler.

Nada mais direi. As outras apreciações pertencem á camara e ao paiz.

A hora deu; eu estou fatigado; as observações que tinha a fazer dou-as aqui por concluidas, encerrando por esta fórma o meu modesto e desalinhado discurso.

Vozes: — Muito bem, muito bem.

(O orador recebeu comprimentos de alguns srs. deputados.)