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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
É indispensavel que na, lei das promoções se attenda muito ao merecimento; é o unico estimulo para que os officiaes se appliquem deveras a estudos militares.
O sr. Fontes concordou commigo, disse que eram estas as suas idéas, prometteu trazer á camara uma proposta do lei ácerca das promoções; onde está essa proposta. (Apoiados.)
Todas as suas idéas são desmentidas, todas as suas promessas ficam sem realisação; não chegam a traduzir-se na pratica, ficam na theoria!
A unica cousa que s. ex.ª fez foi apresentar a proposta para o augmento de soldo aos officiaes.
Era justo que se augmentasse o soldo aos officiaes por causa das exigencias da vida moderna, mas o exercito ficaria muito mais agradecido a s. ex.ª se lhe garantisse um futuro em voz de lhe dar essa elevação de 5$000 réis no soldo que lhes deu o anno passado, depois de oito annos de ministerio como a unica consolação de todos os seus desapontamentos.
E eu não quero alargar muito as minhas considerações, porque não desejo de fórma alguma incorrer na censura da camara, afastando-me do terreno stricto em que se mantem o debate.
Limito-me, portanto, ao capitulo que está em discussão, e nos outros capitulos terei occasião de fazer mais algumas observações ao sr. ministro da guerra, a quem farei só as que dizem respeito a este capitulo.
Por exemplo, o sr. ministro da guerra de certo foi prevenido pelo sr. presidente da camara do que eu tencionava interrogal-o quando tivesse occasião de me encontrar aqui com s. ex.ª, a respeito de um facto que julgo perfeitamente illegal.
A leitura do orçamento não fez mais do que confirmar-me na idéa que eu linha da illegalidade d'esse facto.
Sabe o sr. ministro da guerra que os officiaes que estão nas escolas não recebem os 5$000 réis do augmento de soldos que foram votados no anno passado pelo parlamento.
Isto é tão perfeitamente illegal que eu embalde procurei no orçamento a verba de officiaes arregimentados sem augmento de soldo.
O que vi no orçamento foi que a respeito de todos os officiaes arregimentados, e os officiaes que frequentam as escolas estão n'este caso, porque elles, pelo facto de terem licença para estudar, não deixam de pertencer aos regimentos, lá vem descriptos os soldos pela tarifa nova de 1878.
Por consequencia como é que a secretaria da guerra, em presença da lei expressa, e tão expressa que em conformidade com ella e sem excepção alguma, organisou o orçamento, como é que a secretaria da guerra e o sr. ministro da guerra não póde deixar de ter conhecimento d'este facto, se recusa a pagar os 5$000 réis aos officiaes que estão nas escolas?
É inexplicável' este procedimento!
Pois se se reconhece que o augmento é legal, e tanto que se marcam no orçamento 03 vencimentos pela tarifa de 1878, como é que se pagam os 5$000 réis a uns e se recusam obstinadamente a outros?
Sei que estes officiaes requereram ao sr. ministro da guerra o pagamento d'esta quantia, mas consta-me que esses requerimentos, nem ao menos tiveram despacho.
Chamo a attenção do sr. ministro da guerra para este facto, que é completamente absurdo.
Eu confesso a v. ex.ª que este orçamento me inspira as mais serias duvidas a respeito da sua exactidão, e o peior é que não tenho meio algum de a verificar.
Ha apenas um ou outro facto de que posso ter conhecimento por informações não officiaes, o que me fez desconfiar da exactidão do orçamento.
Este facto que apresentei é um d'elles. Têem por lei todos os capitães, tenentes e alferes arregimentados um augmento de 5$000 réis mensaes, mas este augmento figura
no orçamento para todos, e recusa-se na realidade a alguns.
Mas ha ainda mais, e eu peço desculpa á camara do me referir a um capitulo que já passou; ha ainda mais factos que mostram que o orçamento não nos póde inspirar confiança.
No capitulo dos commandos das divisões militares vê-se o seguinte. (Leu.)
Ora, eu sei positivamente que o commandante da segunda divisão, aqui apresentado como general de divisão, é general de brigada, e um dos generaes de brigada mais modernos.
Se elle é general de brigada, como vem aqui marcado como general do divisão?
Ha outro facto a apontar ainda no capitulo de que nos estamos occupando agora.
Aqui vem designado o vencimento de cada praça a 100 réis; 75 réis de pret o 25 réis de fardamento. Ha aqui uma falsidade manifesta, por isso que o desconto é effectivamente de 35 réis e não de 25.
Devo tambem chamar a attenção do sr. ministro da guerra para um facto que me parece illegal e que se está praticando nos differentes corpos do exercito.
Por ordem do ministerio da guerra está-se lançando um imposto de 1,5 sobre o vencimento do soldado, a pretexto de compra e concerto de machinas de costura.
Ora, em primeiro logar este imposto é excessivo para tão pequena despeza, e em segundo logar não me parece que o sr. ministro da guerra, sem a auctorisação do parlamento, esteja auctorisado a lançar um imposto sobre o soldado, que, pelo facto de o ser, não perde a qualidade de cidadão. (Apoiados.)
E note a camara que esta illegalidade levou-se a tal ponto, que não tendo os officiaes que compunham o conselho administrativo do um regimento lançado o referido imposto, por verem que não era necessario, o sr. ministro da guerra obrigou esses officiaes a entrarem com as sommas correspondentes á importancia d'esse imposto, que se não lançou, nem se podia lançar, porque era perfeitamente illegal. (Apoiados.)
Permitta-me v. ex.ª, sr. presidente, que eu interrompa esta ordem de idéas para me referir a um ponto que ainda indiquei, e de que posso occupar-me porque já tenho diante de mim o Diario da camara de 1878, isto é, ás promessas feitas pelo sr. ministro da guerra na sessão do anno passado.
Vou ler á camara o que s. ex.ª então disse. (Leu.)
Onde estão, portanto, as propostas de s. ex.ª? Não se falla, nem se pensa n'isso. (Apoiados.) '
Mas o sr. Fontes é sempre assim; habituou-se já a não cumprir aquillo que promette. (Apoiados.) Desde 1872 que anda a prometter a organisação do exercito, e são decorridos perto de oito annos e nada absolutamente tem feito n'este sentido. (Apoiados.)
Disse-nos o sr: ministro da guerra, não ha ainda muito tempo, e note a camara a contradicção entre as palavras proferidas por s. ex.ª n'essa occasião e o que dissera sobre o mesmo assumpto o anno passado, que não valia a pena apresentar uma proposta para a organisação do exercito, e que havia uma immensidade d'ellas apresentadas pelos seus antecessores, citando entro outras a do nobre marquez de Sá, de 1869.
Não se lembrou, porém, o sr. Fontes, que só depois da guerra franco-allemã é que se reconheceu a necessidade absoluta de se reformarem os exercitos das differentes nações segundo as indicações da sciencia militar? (Apoiados.)
Parece-me, portanto, que o sr. ministro deve expor á camara quaes os motivos que têem obstado a que elle cumpra a sua promessa do anno passado, sem a realisação da qual é impossivel que o exercito possa attingir a altura