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Sessão de 19 de agosto de 1868
PRESIDENCIA DO SR. JOSÉ MARIA DA COSTA E silva
Secretarios — os srs.
José Tiberio de Roboredo Sampaio.
José Faria de Pinho Vasconcellos Soares de Albergaria.
Chamada — 60 srs. deputados.
Presentes á abertura da sessão — os srs.: A. E. de Seabra, Alves Carneiro, Costa Simões, Villaça, Sá Nogueira, Falcão de Mendonça, Gomes Brandão, Ferreira Pontes, Barros e Sá, A. L. de Seabra Junior, Arrobas, Magalhães Aguiar, Faria Barbosa, Lopes Branco, Barão da Trovisqueira, Cunha Vianna, B. F. Abranches, B. F. da Costa, Pereira Brandão, E. Tavares, Albuquerque Couto, Silva Mendes, Gavicho, Bicudo Correia, Van-Zeller, Gaspar Pereira, G. A. Rolla, Guilhermino de Barros, Faria Blanc, Freitas e Oliveira, Judice, Assis Pereira de Mello, Gaivão, Cortez, J. M. da Cunha, João M. de Magalhães, Calça e Pina, Fradesso da Silveira, Gusmão, Bandeira de Mello, Correia de Oliveira, Dias Ferreira, Faria Pinho, Carvalho Falcão, Teixeira Marques, Vieira de Sá Junior, Costa e Silva, Menezes Toste, Mesquita da Rosa, José de Moraes, Batalhoz, Rodrigues Coelho do Amaral, José Tiberio, Alves Ferreira Junior, Motta Veiga, Penha Fortuna, Aralla e Costa, Pereira Dias, P. A. Franco, P. M. Gonçalves de Freitas, R. V. Rodrigues, Sebastião do Canto.
Entraram durante a sessão — os srs.: Annibal, Braamcamp, Ferreira de Mello, Azevedo Lima, A. J. da Rocha, A. J. de Seixas, A. J. Pinto de Magalhães, Torres e Silva, A. de Faria, Montenegro, Garcez, C. J. Freire, Faustino da Gama, Fernando de Mello, F. F. de Mello, F. M. da Rocha Peixoto, Silveira Vianna, Noronha Menezes, Silveira da Motta, I. J. do Sousa, Homem e Vasconcellos, Almeida Araujo, Santos e Silva, Matos e Camara, J. Pinto de Magalhães, J. T, Lobo d'Avila, Xavier Pinto, Costa Lemos, Mardel, Sette, Achioli de Barros, Rodrigues de Carvalho, Sá Carneiro, Lourenço de Carvalho, M. B. da Rocha Peixoto, Lavado de Brito, Limpo de Lacerda, Mathias de Carvalho, Paulino e Sousa, Ricardo de Mello, Deslandes, Vicente Carlos, Visconde dos Olivaes.
Não compareceram - os srs.: A. R. de Azevedo, Fevereiro, A. Ornellas, Rocha París, A, do Azevedo, Ai B. de Menezes, Correia Caldeira, Silva e Cunha, Antas Guerreiro, A. J. Teixeira, Falcão Povoas, Costa e Almeida, Araujo Queiroz, Falcão da Fonseca, Saraiva, de Carvalho, Vellosa do Carvalhal, Carlos Testa, Carlos Vieira, da Motta, Conde de Thomar (Antonio), E. Cabral, Coelho do Amaral, Dias Lima, F, L. Gomes, Pinto Bessa, Xavier de Moraes, Meirelles Guerra, Baima de Bastos, J. A. Vianna, Ayres de Campos, João de Deus, Aragão Mascarenhas, Pinto de Vasconcellos, Albuquerque Caldeira, Ribeiro da Silva, Faria Guimarães, J. A. Mais, J. A. Ferreira Galvão, J. Klerk, Firmo Monteiro, Pereira de Carvalho, Lemos e Napoles, Frazão, Ferraz de Albergaria, J. M. Lobo d'Avila, José Maria de Magalhães, Silveira e Sousa, Mendes. Leal, Pinto Basto, Levy, Camara Leme, Balthasar de Vasconcellos, Julio Guerra, Sabino Galrão, Theotonio de Ornellas, Thomás Lobo.
Abertura — Á uma hora da tarde.
Acta — Approvada.
EXPEDIENTE
A QUE SE DEU DESTINO PELA MESA
Officio
Da camara dos dignos pares, remettendo uma relação das proposições de lei adoptadas por aquella camara, e que vão ser reduzidas a decretos das côrtes geraes. A secretaria.
Participações
1.ª Participo a v. ex.ª e á camara que o sr. deputado Costa e Almeida não compareceu á sessão de hontem, não comparece á de hoje, nem a mais alguma, por motivo justificado. = M. Aralla.
2.ª Estou encarregado de participar a v. ex.ª que o sr. deputado José Maria de Magalhães não póde comparecer á sessão de hoje por incommodo de saude. = João Maria de Magalhães.
Inteirada.
Requerimentos
1.° Requeiro que, pelo ministerio do reino, seja remettida a esta camara, com urgencia, a copia da ordem que mandou suspender a reunião da junta revisora no districto de Villa Real, acompanhada de documento ou documentos officiaes, e na falta d'estes de quaesquer outros que determinaram a ordem para a referida suspensão. = O deputado, Sá Carneiro.
2.° Requeiro que seja mandado á camara na proxima sessão, o plano da defeza de Lisboa, a que se refere o projecto n.° 12, que foi já discutido. = Cunha Vianna = M. Cortez.
Foram remettidos ao governo.
Nota de interpellação
Desejo interpellar o nobre ministro do reino sobre a validade do concurso feito na academia polytechnica do Porto para o provimento das 11.ª e 12.ª cadeiras. = Freitas e Oliveira, deputado por Arganil.
Mandou-se fazer a devida communicação.
Leu-se na mesa e foi approvado sem discussão o seguinte
Parecer
Senhores. — Á commissão de guerra foi presente o requerimento do tenente reformado, Manuel Maria Eloy da Cruz Sobral, em que pede melhoria de reforma.
Conforma-se a commissão com o parecer exarado em 3 de junho de 1868 pela illustre commissão de fazenda, recusando aquelle melhoramento de reforma. Attendendo porém a que o requerente se julga no caso de continuar a servir, e restabelecido dos padecimentos que deram logar a uma reforma prematura, entende que o requerimento póde ser remettido ao governo, para que, verificado em junta de saude o bom estado de saude do official em questão, elle seja readmittido ao serviço activo, se por considerações de economia, o governo o julgar conveniente.
Sala da commissão, 18 de agosto de 1868. = Innocencio José de Sousa = José Bandeira = Sebastião do Canto = sr. A. Rolla = Barros e Sá = Belchior José Garcez.
O sr. Lopes Branco: — V. ex.ª sabe que, em virtude da uma proposta do sr. Gavicho, a camara deliberou que fosse nomeada uma commissão para proceder a um inquerito sobre os diversos ramos de administração publica, e apresentar as reformas que entendesse necessarias para reduzir a despeza publica, tanto na organisação dos quadros, como na simplificação do serviço das differentes repartições do estado.
Esta commissão installou-se, o que participou a camara; em seguida reuniu-se algumas vezes para deliberar sobre a maneira por que havia de encetar os seus trabalhos; e posso affirmar a v. ex.ª e á camara que todos os seus membros collectivamente, e cada um em particular, tinham a maior vontade de se desempenhar do seu encargo com todas as forças que estivessem ao seu alcance.
Quando iam progredindo os trabalhos da commissão, succedeu ser apresentada n'esta camara, por parte do ministerio que se acha hoje investido do poder, uma proposta de lei para que a camara lhe concedesse auctorisação para organisar os quadros e simplificar o serviço de todas as repartições publicas.
Logo que esta proposta foi apresentada á camara, a commissão entendeu que devia reunir-se para saber o que lhe cumpria fazer no caso d'ella ser approvada; entretanto deliberou esperar pela resolução da camara; o, logo que esta foi tomada no sentido de se conceder ao governo a auctorisação pedida, a commissão reuniu-se de novo para definitivamente resolver o que havia, de fazer, e veiu ao accordo unanime de que fosse apresentada por mim, que tenho a honra de ser seu presidente, a seguinte declaração:
«Que, visto serem as faculdades que a camara concedeu á commissão simples e puramente consultivas, emquanto que as concedidas ao governo são a delegação do proprio poder legislativo para, por decreto do poder executivo, levar desde logo a effeito as reformas que a camara tinha incumbido á commissão de apresentar, para o parlamento resolver sobre ellas, a commissão não devia continuar nos seus trabalhos; e n'estas circumstancias convinha cerrar as suas funcções, participando n'esta conformidade á camara. E; ainda mesmo que não se dessem as circumstancias referidas, e podesse porventura suppor-se que as faculdades que eram concedidas ao governo tambem tinham o quer que fosse de consultivas, já se vê que a commissão não podia estar em contradicção com ias funcções que o governo assumiu.»
Portanto fiquem V. ex.ª e a camara na intelligencia de que a commissão, com muito sentimento seu, não póde, em virtude da, resolução que a camara tomou, continuar no exercicio das funcções que a camara lhe concedeu.
O sr. Presidente: — Eu. creio que este assumpto só se deve discutir na presença de algum dos srs. ministros.
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O Orador: — Isto é uma participação que faço em nome dos meus collegas.
O sr. Presidente: — Mas eu não sei se a commissão póde de motu proprio julgar-se dissolvida.
O Orador: — Não sei se v. ex.ª comprehendeu o que eu disse.
A camara deu á commissão de inquerito faculdades puramente consultivas, porque ella encarregou-a de proceder a um inquerito, sobre o estado em que se achava a administração publica, em todos os seus diversos ramos e de trazer aqui as propostas que entendesse no sentido de reduzir os quadros e simplificar os serviços.
A camara depois concedeu ao governo a delegação do proprio poder legislativo, para por meio de decretos, levar a effeito essas providencias.
Já se vê pois que a auctorisação concedida á commissão, está expressamente revogada, concedida ao governo, e que por consequencia não tem já a faculdade de se desempenhar de funcção alguma.
O sr. Mendonça Cortez: — Tinha pedido a palavra, porque desejava chamar a attenção do sr. ministro da fazenda para o estado em que se acha a repartição de fazenda do districto de Faro.
Esta questão parece especial e apenas peculiar da provincia do Algarve; mas não é assim; interessa em geral ao paiz, porque diz respeito tambem em geral ás nossas finanças.
Ha no districto de Faro, sr. presidente, muitos bens e direitos immobiliarios pertencentes ao estado, que andam perdidos, sonegados, em summa extraviados por mãos que sejam quaes forem, não são as do estado.
Ora, esses direitos, é necessario recolhe-los; pede-o a justiça e bem do estado, porque montam a algumas dezenas de contos de réis; mas para que se possam recolher, é necessario que sejam examinados os titulos que o estado póde fazer valer para os tornar realisaveis, e isso offerece grandes difficuldades, não só porque são muito numerosos, e o seu exame por essa circumstancia, ha de levar muito tempo, mas porque muitos são escriptos, nos, caracteres hoje pouco vulgarmente conhecidos, dos seculos XIV, XV e XVI, demandando por isso um individuo competentemente habilitado, que alem dos conhecimentos de fazenda, tenham os conhecimentos paleographicos indispensaveis.
Por consequencia é necessario, sr. presidente, augmentar o pessoal da repartição de fazenda de Faro, de modo que satisfaça a esta necessidade imperiosa.
Esta falta existe já de ha muito tempo, e por isso poderá dizer-se que tanta necessidade tem hoje aquella repartição de fazenda de augmentar o seu pessoal, como tinha anteriormente. Não é tanto assim. Pelas disposições do capitulo 2.°, parte 2.ª, livro 1.°, titulo 4.°, se me não engano, artigos 505.° e seguintes do codigo civil portuguez, quando trata das prescripções, sendo pelo artigo 516.° o estado equiparado aos particulares emquanto ás prescripções; é evidente que por isso, e pelas demais disposições dos artigos 507.°, 517.º, 523.°, 528.°, 529.°, 530.°, 535.°, 543.°, etc. o estado póde ficar seriamente prejudicado pela legislação actual, se quanto antes não tratar do fazer reconhecer os seus direitos esquecidos.
Insto portanto para que quanto antes o sr. ministro da fazenda dê as necessarias providencias para que sejam examinados os titulos e mais documentos que existem no archivo da repartição de fazenda de Faro, e que sem isso serão inuteis.
Sei muito bem que o funccionario que está dirigindo aquella repartição, o sr. delegado do thesouro João Eduardo Lobo de Miranda, é digno dos mais bem merecidos elogios pelas provas que tem dado do ser um funccionario intelligente, de uma grande probidade o incontestavel zêlo no cumprimento dos seus deveres. (O sr. Gaivão: — Apoiado.)
Digo incontestavel, porque as provas materiaes e moraes do que elle tem feito a bem da sua repartição e do estado, constam do seu excellente relatorio dirigido em 5 de março d'este anno ao sr. ministro da fazenda. Para esse relatorio chamo tambem a attenção do nobre ministro.
Mas o sr. Lobo de Miranda não póde fazer milagres, sr. presidente, com o pouco pessoal a que está reduzida a sua repartição, o por isso peço ao sr. ministro da fazenda que -se digne olhar para isto, dando as providencias necessarias e que as circumstancias do thesouro permittirem.
(Interrupção que não se ouviu.)
Um dos meus collegas me nota uma circumstancia que eu julgo muito attendivel. E que a repartição de fazenda de Faro é tão importante; este objecto é de tanto momento não só para a provincia do Algarve, mas em geral para o paiz, que o cavalheiro que ha pouco saíu do ministerio, -onde geria a pasta da fazenda, o meu amigo e collega o sr. José Dias Ferreira, mandou para ali um empregado do thesouro, perito em palleographia, a fim de examinar aquelles titulos e aquelles documentos.
Por tudo isto é urgentissimo que o sr. -ministro da fazenda dê providencias a este respeito.
Verdade é que isso ha de trazer comsigo um. certo augmento de despeza, mas, como a receita que d'ahi ha de vir, necessariamente será muito superior á despeza, os encargos ficarão muitas vezes compensados (apoiados).
Era sobre isto que eu desejava chamar a attenção do nobre ministro, pedindo instantes providencias.
Aproveito agora a occasião para agradecer a v. ex.ª o ter-me dado a palavra, porque n'esta conjunctura é cousa para agradecer a concessão da palavra, mórmente para os que, como eu, têem de lutar contra a liga do acaso e da presidencia, igualmente adversos, e direi mesmo infestos (riso).
Parece-me que devo realmente agradecer este favor da concessão da palavra, assim como devo manifestar a v. ex.ª o desejo que tenho de que ella me chegue sobre a questão que se ventilou hontem, e que ainda se ha de ventilar hoje, para poder apresentar a minha opinião e mostrar, como tenho a intima convicção que mostrarei, que a argumentação, aliás bella na fórma, dos meus illustres collegas Motta Veiga e Santos e Silva,.pecca essencialmente pela base... (para o sr. Motta Veiga).
Estou convencido de que a argumentação de s. ex.ª pecca essencialmente pela base, que lhe acho vacilante, e até mesmo, note v. ex.ª, sr. presidente, a extraordinaria coincidencia! Escorregadia do parecer da maioria para o da minoria, á qual eu pertenço, e com a qual hei de votar, embora seja vencido, salvo se apparecerem argumentos convincentes que me demovam d'este proposito, mas que eu não espero que appareçam.
Esquecia-me de notar, sr. presidente, em favor do que ha pouco disse ácerca da repartição de fazenda de Faro, e esta observação a devo agradecer ao, meu illustre collega o sr. deputado por Lagos, Antunes Gaivão, que os mesmos possuidores de direitos immobiliarios,.que pertencem ao estado, mas que ha muito andam desencaminhados, lucram com estas indagações; para lhes não acontecer o mesmo que aos foreiros do extincto convento das freiras de Lagos, que não achando durante muitos annos a quem pagar os seus fóros, têem agora que pagar muitos annos conjunctamente, com muito gravame para elles, e até vexame. É isto, sr. presidente, que eu desejo que o nobre ministro da fazenda evite na minha provincia (apoiado do sr. Gaivão).
Disse.
O sr. Bicudo Correia: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se permitte que se dispense o regimento, a fim de entrar em discussão antes da ordem do dia o parecer da commissão de obras publicas, rejeitando os contratos celebrados entre o governo e varios individuos para o estabelecimento de uma linha telegraphica entre a America e a Inglaterra, tocando nos Açores e em Portugal.
O parecer creio que não soffrêra grande discussão. É mesmo conveniente resolver quanto antes este negocio, para que o governo fique habilitado a contratar novamente com qualquer empreza, a fim de que o mais breve possivel se estabeleça aquella communicação "telegraphica, que é de tanta importancia, como. a camara facilmente reconhece.
Eu já consultei o sr. ministro das obras publicas a este respeito, e s. ex.ª está tambem de accordo em que se discuta desde já o parecer a que me refiro.
Peço portanto a v. ex.ª que ponha o meu requerimento á votação.
O sr. Faria Rego: —Eu lembro tambem a v. ex.ª a urgencia que ha em entrar em discussão, quanto antes, o projecto sobre os depositarios do geral.
O sr. Presidente: — Vae votar-se o requerimento do sr. Bicudo Correia.
Vozes: — Ordem do dia.
O sr. Pereira Dias: — Peço á camara que preste toda a sua attenção ao assumpto de que se trata. Rogo mesmo a v. ex.ª que me esclareça sobre o que se vae votar.
Ouvi dizer que o requerimento era para entrar em discussão, antes da ordem do dia, um parecer da commissão de obras publicas; mas de que trata o parecer?
O sr. Secretario (José Tiberio): — O parecer declara nullos e de nenhum effeito os contratos celebrados entre o governo e varios individuos...
O sr. Pereira Dias: — Bem; já sei. Creio mesmo que da parte do governo ha empenho em que isto se discuta, e de mais a mais trata-se de rejeitar contratos, o que é sempre summamente agradavel á camara.
O sr. Fernando de Mello: — Não me seduz tanto a idéa de rejeitar contratos. O parecer foi n'este momento distribuido; parecia-me pois conveniente que ao menos se desse tempo á camara para tomar conhecimento, já não digo dos contratos mas ao menos do parecer.
Vozes: — Votos, votos.
Posto á votação o requerimento do sr. Bicudo Correia, não houve vencimento.
O sr. Mathias de Carvalho: — A camara concordou hontem em que a interpellação, que eu havia annunciado ao sr. ministro das obras publicas sobre a portaria de 30 de julho ultimo, tivesse logar hoje, visto que s. ex.ª se tinha promptificado a responder a ella. Pouco tempo tomarei á camara com esta questão,.o portanto peço a v. ex.ª que me dê a palavra para eu verificar a minha interpellação.
O sr. Arrobas: — Peço a palavra para um requerimento sobre este assumpto.
O sr. Presidente: — Devo prevenir o sr. ministro das obras publicas de que lhe está annunciada pelo sr. Arrobas uma interpellação sobre objecto, identico ao do sr. Mathias de Carvalho. Portanto declare s. ex.ª se esta habilitado para responder á interpellação do sr. Arrobas
O sr. Ministro das Obras Publicas (Sebastião Calheiros): — Eu só tenho conhecimento das interpellações annunciadas pelos srs. Mathias de Carvalho, e Magalhães, ás quaes estou prompto, a responder; entretanto logo que tenha premente a nota da outra interpellação, tratarei ide-a examinar para une habilitar a responder.
O sr. Arrobas (para um requerimento): - Peço a v. ex.ª que mande verificar na secretaria, porque listo é uma accusação a camara, sé ella effectivamente cumpriu o seu dever, e depois hei de pedir que se consulte a camara sobre se me dá licença para tomar parte na interpellação.
É-me indifferente a consideração que por mim tenham como; individuo mas como deputado hei de ser respeitado, e como homem desprezo-a.
O sr. Presidente: — Manda-se verificar.
O sr. 1° Secretario (Tibério): — Em 6 de agosto foi expedida ao sr. ministro das obras publicas a nota de interpellação annunciada pelo sr. Arrobas. Estou sempre prevenido para responder a qualquer pergunta a respeito ide interpellações e requerimentos que devem ser expedidos pela mesa.
A mesa cumpre o seu dever em transmittir pontualmente os requerimentos e notas de interpellação que são apresentadas para serem dirigidas ao governo.
O sr. Presidente: — Participo pois ao sr. deputado Arrobas que a mesa cumpriu o seu dever; não lhe posso porém dar a palavra, porque o sr. ministro não se julga, habilitado para responder.
O sr. Mathias de Carvalho: — Serei muito breve, porque a camara deseja entrar na ordem do dia.
O sr. ministro das obras publicas publicou em 30 de julho ultimo uma portaria, em virtude da qual mandava sobreestar em differentes trabalhos de viação, comprehendendo-se n'esses trabalhos dois lanços de estrada que estavam em construcção entre Murça e Mirandella.
Poder-se-ha á primeira vista suppor, que eu venho defender pequenos interesses do circulo que tenho a honra de representar, ou que venho tratar, como se diz vulgarmente, de uma questão de campanario. Engana-se quem assim o pensa; eu venho tratar de uma questão altamente importante, venho tratar da viação de uma provincia que, até hoje tem sido pouco attendida pelos poderes publicos, no que respeita a melhoramentos materiaes...
Quem conhece Traz os Montes sabe bem qual é a riqueza daquella provincia. Não tratarei agora, porque o tempo me falta, de enumerar quaes são as condições vantajosas em que ella se acha, quaes são os excellentes productos que a sua agricultura fornece em larga escala.
Esta provincia não tem uma unica estrada; os dois lanços de que se trata servem para unir Bragança com o Porto. Traz os Montes, pouco alem de Villa Real, é completamente intransitavel (apoiados).
Eu tive occasião de ir a Mirandella me fim do anno passado cumprir um grato dever. Honrado com os votos, independentes dos eleitores do circulo n.° 48, desejava apresentar-me diante d'elles para lhes agradecer a confiança que lhes havia merecido, e expor-lhes desenvolvidamente as minhas idéas politicas e a maneira, por que entendia dever cumprir o mandato que me fôra conferido. Quando me approximava de Mirandella tive de atravessar um trato de terreno, em que não é facil descobrir vestigios de estrada. Fiquei arrependido de não ter previamente feito o meu testamento.
Durante o trajecto, e quando cheguei ao ponto a que, me dirigia, reconheci que era grande a riqueza d'aquella, provincia o doeu-me o coração de a ver tão abandonada, por isso não pude deixar de ficar profundamente impressionado quando li a portaria do sr. ministro das obras publicas.
Esta provincia é a que cumpre mais religiosamente com as suas obrigações, quando se trata do pagamento de impostos, tanto de dinheiro como de sangue.
O sr. ministro da guerra ainda ha poucos dias nos apresentou um mappa com designação do contingente fornecido pêlos differentes districtos. E que vimos nós? Vimos que a provincia de Traz os Montes, do contingente que lhe competia dar desde 1856 a 1867 apenas deve quatro recrutas, e eu posso affirmar a v. ex.ª e á camara pelo que respeita a contribuições em dinheiro, que a provincia de Traz os Montes tem sido pontual no pagamento d'ellas.
N'estas circumstancias, pugnando eu pelos interesses daquella provincia, pugno pelos interesses do paiz, e, chamando a attenção do sr. ministro e, provocando uma explicação a este respeito, faço um serviço ao proprio governo e mostro que me interesso pelos negocios publicos apelas justas pretensões dos meus constituintes (apoiados).
Não venho pedir que se faça uma estrada que passe pela porta de um ou outro influente; venho, sim, pedir que se continue a estrada entre Murça e Mirandella, porque até hoje Traz os Montes não tem uma estrada unica por onde possa transportar os seus productos.
Quer V. ex.ª saber, em outubro ultimo, a differença de preços de differentes productos agricolas entre Mirandella e o Porto? A batata estava em Mirandella a 50 réis o alqueire, a castanha a 60 réis, e no Porto estava a batata a 550 réis e a castanha a 600 réis o alqueire!
Na provincia a que me refiro não havia, meio algum, de consumir aquelles dois productos, porque a colheita tinha sido abundantissima, nem possibilidade de os transportar a outros centros de consumo.
Parece-me pois que o governo e o paiz lucram muito que taes trabalhos continuem e se concluam o mais breve possivel.
Estou persuadido de que o governo ha de attender a estas Justas reclamações; quanto a mim hei de pugnar sempre pelos verdadeiros interesses que me cumpre defender.
O sr. Ministro das Obras Publicas: — Já aqui tenho explicado por differentes vezes quaes as rasões que motivaram, a portaria a que se referiu, o illustre deputado, e é escusado repeti-las agora.
Responderei relativamente á estrada a que s. ex.ª se referiu.
N'esta estrada não foram suspensos os trabalhos, e não o foram mesmo no lanço em que, o sr. deputado fallou, que é comprehendido entre Murça e Mirandella.
Entre estes dois, pontos, está dividida a extensão em quatro lanços. Nos dois lanços extremos da parte de Murça e Mirandella, continuam os trabalhos da maneira que estavam, progredindo, e ainda se está longe da sua conclusão, porque falta, a despender 38:000$000 réis, para se acabarem.
-Quanto ás duas pequenas porções que estão encravadas entre aquellas ainda ali se continuam os trabalhos, porque se estão construindo duas pontes.
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Estão-se pois construindo duas pontes orçadas em réis 8:500$000, e ainda falta a despender 55:000$000 réis, que, juntamente com os 38:000$000 réis mencionados, e réis 17:000$000 precisos para a conclusão de dois lanços entre Murça e Villa Real, perfaz pouco mais ou menos a quantia de 100:000$000 réis necessarios para a conclusão d'esta estrada.
Concordo com o illustre deputado emquanto á importancia da estrada, e não duvido, estimo até comprometter-me a que empenharei todos os esforços e muito boa vontade para que se conclua até Bragança, pois é uma das mais importantes (apoiados. — Vozes: — Muito bem.).
Não só liga o alto da provincia e Bragança com o litoral, mas uma parte de Traz os Montes com a Beira.
Por esta occasião poderia responder tambem á interpellação do illustre deputado, o sr. Magalhães, ácerca da estrada a que s. ex.ª se refere...
Uma voz: — O sr. Magalhães não esta presente.
O Orador: — Mas eu podia dar as explicações necessarias, porque trata-se do mesmo assumpto; a estrada é da mesma importancia que a outra...
(Interrupção do sr. Barros e Sá, que se não percebeu.)
A estrada a que me refiro tambem é importante, porque segue á fronteira e entra n'ella immediatamente.
E a estrada de Villa Real a Chaves. N'esta tambem não afrouxaram os trabalhos; apenas ordenei que não principiasse um lanço, que é o de Sabrosa á Vacaria, onde os não havia ainda.
É verdade que houve ordem para principiar ali os trabalhos, mas ainda não tinham começado. E este lanço ainda não é de pequena monta, deve importar em 63:500$000 réis. O resto esta em andamento e prestes a concluir-se.
Mas esta estrada tem ainda um outro lanço muito importante; é o que vae de Chaves até á fronteira. Estimo muito dizer aqui que ainda ha poucos dias mandei fazer os estudos d'esse pequeno lanço, que é de 8 kilometros.
Espero empregar n'esta, como na outra linha, todos os meus cuidados e toda a diligencia, porque julgo duas linhas das mais importantes que ha no reino (apoiados), e ambas ellas ainda importam n'uma somma consideravel; talvez não custem menos de 250:000$000 réis (apoiados).
Vozes: — Muito bem.
O sr. Presidente: — Requereram para tomar parte n'esta interpellação os srs. Arrobas, Barros e Sá, Penha Fortuna, e José Paulino; mas não lhes posso dar a palavra sem consultar a camara.
O sr. Arrobas: — Mas eu pedi a palavra para um requerimento, e é para ler um documento á camara.
O sr. Presidente: — Tem a palavra.
O sr. Arrobas: — É para ler o officio de remessa da minha nota de interpellação ao sr. ministro das obras publicas.
S. ex.ª acabou de declarar que não tinha recebido communicação da minha interpellação; naturalmente é porque se extraviou no caminho.
Aqui esta o officio (leu).
Foi em 7 de agosto. Agora avalie a camara se tenho ou não direito a tomar parte na interpellação, e a declaração do sr. ministro de que não esta habilitado para me responder, quando o assumpto é o mesmo da interpellação do sr. Mathias de Carvalho.
O sr. Ministro das Obras Publicas: — A interpellação do sr. Arrobas havia de ser communicada á secretaria, mas não tenho conhecimento d'ella, ou pelo menos não me lembra que me fosse apresentada; entretanto ámanhã, se s. ex.ª quizer, darei as explicações necessarias. Diz o illustre deputado que a interpellação é sobre materia já tratada n'esta casa, mas talvez que tenha algum ponto especial a que deva responder, e por isso declaro-me habilitado para ámanhã, depois de ver a nota que deve existir na secretaria.
O sr. Arrobas: — Como a minha interpellação nada tem de especial, parecia-me, para economisarmos tempo, que seria conveniente verifica-la hoje, e por isso requeiro a v. ex.ª que consulte a camara sobre se me concede a palavra para esse fim.
O sr. Presidente: — Eu vou consultar a camara sobre se permitte que se conceda a palavra aos differentes srs. deputados que a pediram para tomar parte n'esta interpellação.
Consultada a camara, decidiu negativamente.
O sr. Mathias de Carvalho: — Eu desejo unicamente dar uma simples explicação.
Declaro á camara e ao nobre ministro das obras publicas que estou completamente satisfeito com as explicações de s. ex.ª O nobre ministro prometteu, e a sua palavra é para mim um penhor seguro de que a sua promessa ha de ser cumprida. Portanto felicito s. ex.ª e os transmontanos, porque terão finalmente a estrada que desejam e que mesmo é necessaria.
Tenho concluido.
O sr. Arrobas: — Peço a v. ex.ª consulte a camara sobre se a minha interpellação se póde verificar ámanhã, ou se fica prejudicada.
O sr. Presidente: — Não preciso consultar a camara, porque o sr. ministro esta de accordo com os desejos que o sr. deputado acaba de apresentar.
ORDEM DO DIA
CONTINUA A DISCUSSÃO SOBRE O PARECER DA COMMISSÃO DE FAZENDA RELATIVO Á DESAMORTISAÇÃO
O sr. Presidente: — Tem a palavra para um requerimento o sr. Barros e Sá.
O sr. Barros e Sá: — O meu requerimento é para pedir licença, a fim de mandar para a mesa uma moção relativa ao projecto que esta em discussão. Não a fundamento, mas annuncio-a, porque póde ser que não tenha a palavra na discussão.
A moção é a seguinte (leu).
Esta moção é apenas uma differença de redacção, e por consequencia constitue uma emenda ao parecer da minoria da commissão. Se sobre ella versar a discussão, diligenciarei tomar a palavra para a defender.
Leu-se na mesa a seguinte
Proposta
Fica suspensa a execução da disposição d'este artigo, até que por uma lei especial seja regulada a applicação do producto da desamortisação dos passaes e direitos prediaes, que constituem a dotação do clero. =Barros e Sá.
O sr. Faria Blanc (na tribuna): — Serei muito breve nas observações que vou submetter á judiciosa consideração da camara. Na presente conjunctura, um longo discurso seria não só manifesta ociosidade, como indesculpavel inconveniencia, porque a estreiteza do tempo e a urgencia da medida que o governo solicita como expediente financeiro não comportam as delongas de uma discussão profunda e desenvolvida (apoiados), e que só deve ter logar quando o governo apresentar ao parlamento as propostas a que se refere o parecer da minoria da commissão de fazenda (apoiados).
Pedi portanto a palavra, não para fazer um discurso, mas com o fim especial de justificar o meu voto na questão de opportunidade, que é a unica de que nos devemos occupar (apoiados).
E porém indispensavel dizer duas palavras sobre o meu procedimento n'esta questão, para que desappareça toda a idéa de contradicção e incoherencia, que graciosamente se me attribue, bem como aos meus collegas signatarios do voto em separado.
A desamortisação obrigatoria dos passaes e de todos os bens que constituem parte da dotação do clero, é para mim uma questão de principios (apoiados), e a camara sabe que eu não transijo em questões d'esta natureza (apoiados).
A minha opinião sobre a conveniencia e necessidade da desamortisação de todos os bens ecclesiasticos, é já conhecida. Sustentei no parlamento o projecto, depois convertido na lei de 4 de abril de 1861, sobre a desamortisação dos bens das corporações religiosas, e os meus discursos publicados no Diario de Lisboa mostram evidentemente que os principios que emitti e as doutrinas que sustentei são o resultado das minhas convicções, ou a questão se considere pelo lado economico e financeiro, ou se encare pelo lado religioso.
Os srs. ministros do reino, da fazenda, e da justiça, que em 1860 eram meus collegas no parlamento, e como eu deputados da opposição, e que me honravam, como hoje me honram, com a sua amisade, devem recordar-se das occorrencias que n'aquella epocha tiveram logar quando um sr. deputado apresentou uma moção de ordem propondo que a lei da desamortisação se não executasse sem previa auctorisação pontificia, proposta que combati com todos os recursos da minha limitada intelligencia, e que a final foi rejeitada.
Fallo n'este assumpto não para renovar questões já definitivamente resolvidas, mas para fazer ver á camara que a minha opinião sobre a desamortisação obrigatoria dos passaes, e em geral de todos os bens ecclesiasticos, é antiga, e sempre e invariavelmente a mesma (apoiados. — Vozes: — É verdade)
Não receio portanto que o meu procedimento n'esta questão seja alcunhado de contradictorio, porque se como homem politico será difficil notar-se-me uma contradicção qualquer (apoiados), nenhum motivo podia na actualidade obrigar-me a versatilidades que detesto.
Podem circumstancias imprevistas, occorrencias de momento, e mesmo o interesse da causa publica exigir a suspensão temporaria da applicação de um principio que mais tarde deve ser levado á pratica (apoiados); mas este adiamento limitado, longe de significar a abdicação de opiniões, importa ao contrario um muito racional e justo expediente para segurar a realisação d'aquelle principio, o qual executado em occasião opportuna deve então produzir os seus salutares effeitos (apoiados).
Parece-me que ninguem poderá contestar a verdade d'esta doutrina.
A commissão de fazenda apreciando a proposta do governo, convertida no projecto de que se trata, entendeu que ella não passava de um simples e exclusivo expediente financeiro, de que o governo quer munir-se como adjutorio para se desembaraçar das difficuldades resultantes do estado em que se acha a fazenda publica, e por isso declarando que não renegava o seu pensamento consignado em um documento official, não duvidou approvar aquella proposta, porque não desejava crear difficuldades ao governo, nem dar pretexto a discussões extensas, que não podiam ter logar em uma sessão extraordinaria.
E se eu e os meus collegas na commissão de fazenda, approvando a proposta do governo sem alteração, e pelas rasões ponderadas, não duvidámos votar assim um adiamento indefinido com respeito á desamortisação obrigatoria dos passaes, não vejo motivo para que se estranhe hoje o procedimento dos que deram voto em separado, opinando pela desamortisação obrigatoria de todos os bens que fazem parte da dotação do clero, e propondo sómente quanto á applicação e execução d'este principio um adiamento definido e limitado!! (Apoiaãos.)
Parece-me portanto que da nossa parte não ha incoherencia nem contradicção alguma, porque tendo nós votado o adiamento indefinido, nada mais natural nem mais coherente e logico do que aceitar o adiamento limitado depois de consignado na lei o principio que não continha a proposta do governo approvada pela commissão (apoiados).
É verdade que a commissão declarou ao governo que, se porventura durante a discussão do projecto se apresentasse alguma proposta sobre a desamortisação obrigatoria dos passaes, a aceitaria; e essa proposta appareceu, sendo apresentada pelo sr. deputado Rodrigues de Azevedo, e votada pela camara. Mas aonde esta a contradicção entre essa proposta e o voto da minoria da commissão?
O que votou a camara, approvando a proposta do sr. Azevedo? Votou o principio da desamortisação obrigatoria dos passaes, e nada mais. E o que propõe a minoria da commissão? Propõe que aquelle principio seja consignado na lei, mas que a sua applicação se espace até á proxima sessão legislativa, isto é, propõe que o adiamento indefinido, que a commissão de fazenda tinha votado no seu primitivo parecer, seja limitado a um praso curto, certo e determinado.
A minoria da commissão portanto andou regularmente (apoiados), o longe de abdicar das suas opiniões veiu com o seu voto em separado sustentar os principios e as doutrinas que formam parte do seu credo politico (apoiados).
Não se confunda a questão de principios com a de opportunidade, porque são cousas inteiramente distinctas e diversas.
A questão de principios esta salva, e já não póde haver receio de que seja sophismada, porque aceito o additamento proposto; fica obrigatoria a desamortisação dos bens que fazem parte da dotação do clero.
E será conveniente dar, n'esta parte, immediata execução á lei? Esta é a questão de opportunidade que cumpre resolver.
A minoria da commissão de fazenda, ouvindo as explicações do governo, e reconhecendo que as necessidades do thesouro publico exigem que quanto antes se vote o projecto em discussão, que não passa de um expediente financeiro, mas na actualidade urgente e indispensavel, a fim de se obterem os recursos destinados á amortisação da divida fluctuante; e observando ao mesmo tempo que a immediata applicação do principio de desamortisação dos passaes embaraça a execução da lei, privando o governo daquelles recursos, porque se os passaes, que em algumas parochias são insignificantes, e em outras de grande valor e rendimento, mostram a desigualdade que se dá n'esta parte da dotação do clero, cumpre assim evitar essa desigualdade com a adopção de outras medidas, que indisputavelmente occasionam delongas na execução da lei, a qual em taes termos deixará de produzir os effeitos e resultados a que particularmente se destina, entendeu que devia propor, de accordo com o governo, o adiamento da applicação do principio de desamortisação dos passaes até á proxima sessão legislativa.
E parece-me que a minoria da commissão foi cautelosa e prudente, porque a rejeição do limitado adiamento que se propõe, póde acarretar para a camara a grave responsabilidade de crear embaraços ao governo, e difficultar a resolução do problema financeiro. E a esta grave responsabilidade nem eu nem os meus collegas que votaram em separado, nos queremos sujeitar (apoiados).
Não se diga que o que se passou no seio da commissão de fazenda não harmonisa muito com o additamento proposto pela maioria da mesma commissão, porque parece-me que são já conhecidas as causas que motivaram o voto em separado que esta em discussão.
Quando na commissão de fazenda se ventilou a questão da opportunidade, e a maioria opinou pelo adiamento limitado da desamortisação dos passaes, mostrou logo, pelo facto de sómente aceitar um adiamento definido, que não abdicava das suas opiniões; e vendo a minoria da commissão que o governo se compromettia a apresentar na proxima sessão legislativa uma proposta de lei sobre a desamortisação de todos os bens que constituem parte da dotação do clero, pareceu-lhe que, ficando assim salvo o principio da desamortisação obrigatoria, se conciliavam todas as opiniões. E porque a maioria não concordou n'este adiamento, foi esta discordancia de opiniões que motivou o parecer em separado que se discute.
Reuniu-se posteriormente a minoria da commissão para combinar na redacção do seu voto em separado, e meditando mais detidamente sobre este grave e importante assumpto, reconhecendo a conveniencia de se exarar desde já na lei o principio da desamortisação obrigatoria dos passaes para evitar contestações, e retirar duvidas e embaraços, resolveu, de accordo com o governo, que julgou prudente ouvir e consultar, consignar na lei aquelle principio, e propor em seguida o adiamento temporario da sua execução.
Assim accordou em reunião particular a minoria da commissão de fazenda, procedendo com tanta lealdade para com os seus collegas que immediatamente lhes communicou a resolução tomada, lendo-lhes o seu voto em separado, que ss. ex.ªs se recusaram assignar.
Sendo esta a verdade dos factos, parece-me que o procedimento dos signatarios do voto em separado foi regular, e não merece a menor censura (apoiados).
Não podendo dispensar-me de responder a alguns dos argumentos apresentados na sessão de hontem pelos srs. deputados Motta e Veiga e Santos e Silva, contra o parecer da minoria da commissão de fazenda, cumprirei este dever, limitando quanto possivel as minhas reflexões.
O sr. Motta Veiga irritou-se tanto contra os signatarios d'aquelle parecer, que, pondo de parte todas as conveniencias parlamentares, não duvidou fazer referencia a uma conversa particular que, em boa paz, s. ex.ª teve commigo no salão do theatro da Trindade. Permitta-me o nobre deputado que eu lhe observe, com a franqueza que me é propria, que este seu procedimento foi pouco regular, porque as conversas particulares não podem vir á discussão sem que denunciem abuso de confiança (apoiados). S. ex.ª estou certo que não quiz abusar, faço-lhe essa justiça, mas é conveniente que seja mais cauteloso de futuro (apoiados).
O sr. Motta Veiga, a quem eu muito respeito pelos seus
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talentos e elevada intelligencia, chamou a questão para o campo das generalidades, e deu tanta latitude á sua argumentação, que claramente manifestou o seu intento de protrahir o debate, a ponto de embaraçar que o projecto que se discute seja convertido em lei do estado. E se as intenções de s. ex.ª se tornassem uma realidade, ficaria assim o governo privado de todos os recursos que espera obter com o expediente financeiro, que submetteu á approvação do parlamento (apoiados).
É difficil de combinar este procedimento de s. ex.ª com os seus precedentes. O sr. deputado por Ceia apresentou na camara um projecto de lei para se deduzirem 50 por cento nos ordenados e vencimentos de todos os funccionarios publicos, e isto com o fim especial de applicar a importancia de metade dos vencimentos dos servidores do estado para as urgencias do thesouro; e hoje, esquecendo-se das doutrinas da sua nova escola, e promovendo a rejeição do projecto em discussão, nem 50 por cento quer dar ao governo dos recursos que elle pede!! Notavel contradicção!! (Riso.)
S. ex.ª, lendo o § 2.° do additamento proposto pela minoria da commissão de fazenda, declarou que o não votava, porque elle denunciava um pensamento reservado da parte do governo.
O illustre deputado, fazendo esta declaração perante o parlamento, declaração que importa a desconfiança, não se arreceiou tornar politica uma questão simples, e que não passa de um expediente financeiro (apoiados).
Nem da parte da minoria da commissão, nem da parte do governo, ha pensamento reservado, e a este respeito reporto-me ao que hontem disse o sr. ministro do reino, em quem a honra, a probidade, a inteireza e imparcialidade são qualidades proverbiaes (apoiados).
Argumentou o sr. deputado por Ceia, perguntando: «Mas para que serve o adiamento da applicação do principio da desamortisação obrigatoria dos passaes, se as diligencias previas á effectividade da desamortisação occasionam um adiamento mais prolongado, do que aquelle que se propõe? E não ficará assim a execução da lei dependente do arbitrio do governo?»
Creio que s. ex.ª se serviu d'este argumento, á mingua de rasões fortes e concludentes, para combater o parecer da minoria da commissão.
Pois a camara vota leis, para ficar a sua execução dependente do arbitrio do governo? Cabe porventura nas attribuições do governo, suspender a execução da lei? Não sabe s. ex.ª que fazer leis, interpreta-las, suspende-las e revoga-las é attribuição exclusiva do poder legislativo, nos termos do § 6.° do artigo 15.° da carta constitucional? O illustre deputado, distincto professor do primeiro estabelecimento litterario, do paiz, não póde ignorar os mais triviaes principios do direito publico constitucional.
Votado o principio da desamortisação obrigatoria com a limitação proposta, a lei tinha de ser immediatamente executada; e com relação á maxima parte dos passaes, nem soffreria as delongas do inventario e avaliação, porque ha já muitos inventarios e avaliações feitos com todas as formalidades legaes (apoiados).
A rasão que principalmente justifica o adiamento que se propõe, é a que eu já apresentei; a necessidade de se estabelecer a indispensavel igualdade na dotação do clero; para este fim cumpre adoptar novas medidas, as quaes, embaraçada a execução da lei, inutilisariam o fim principal a que ella se destina (apoiados).
O sr. deputado pelo circulo de Ceia insurgiu-se contra a disposição do § 1.° do artigo 2.° do additamento proposto pela minoria da commissão de fazenda, sustentando que não era possivel deixar ao arbitrio do governo designar os terrenos dos passaes que deviam ser reservados para goso e serviço dos parochos, porque podia dar-se abuso fazendo-se excessivas concessões, que prejudicariam os beneficos resultados da desamortisação. E para evitar estes abusos mandou para a mesa um additamento ou substituição, propondo que os terrenos concedidos aos parochos não excedessem a 2 hectares.
Persuadiu-se s. ex.ª que a camara não comprehenderia o alcance da sua proposta; enganou-se porém o nobre deputado, porque todos viram na sua proposta a mais exuberante prova dos desejos que s. ex.ª tem de obstar á desamortisação dos passaes, comquanto apparentemente tenha sustentado doutrina contraria.
É engenhoso o expediente de que o sr. Motta Veiga lançou mão para conseguir os seus fins.
A minoria da commissão de fazenda e o governo entenderam conveniente que dos terrenos que compõem os passaes se reservasse o sufficiente para horta e goso dos parochos, e o sr. deputado por Ceia considerando excessiva esta concessão, quer que sómente se lhes concedam 2 hectares de terra, isto é 20:000 metros quadrados de terreno II!
Observe a camara que esta substituição foi apresentada por um representante do povo, que se horrorisa com a idéa da conservação dos passaes; que vota contra o parecer da minoria por entender que elle póde prejudicar a realisação do seu pensamento, já por differentes vezes manifestado; que leve a rigidez do seu caracter a ponto de não admittir um adiamento ainda quando reclamado pelo interesse da causa publica; e que proclama a desamortisação dos passaes como um principio liberal que os poderes publicos devem respeitar.
E este digno representante do paiz sustenta as suas idéas altamente liberaes, propondo que a cada um parocho se conceda para seu goso e serviço 2 hectares de terreno que medem uma superficie de 20:000 metros!!! (Riso.)
A proposta do sr. Motta Veiga presta-se a muitos commentarios e a variadas considerações, que me abstenho de fazer para não offender a susceptibilidade de s. ex.ª; basta que a camara saiba que são poucos os passaes que medem
20:000 metros de superficie, pelo que approvada a substituição do illustre deputado, ficavam os passaes por desamortisar na sua maxima parte!!! (Apoiaãos.)
O sr. Santos e Silva, combatendo o additamento proposto pela minoria da commissão, disse que não podia approvar o § 1.°, porque elle não isentava da desamortisação sómente as casas da residencia dos parochos, exceptuava mais os terrenos que o governo julgasse indispensaveis para goso e serviço dos mesmos parochos, o que importava não auctorisação dada ao governo para dispor a seu bel-prazer dos bens dos passaes. E notou a circumstancia de se ter alterado a redacção do § unico do artigo 1.° da proposta de lei do governo transacto sobre a desamortisação, substituindo-se as palavras =goso e serviço do publico = pelas que se lêem no additamento =para goso e serviço d'elles = parecendo-lhe que a substituição era inadmissivel.
O illustre relator do parecer da maioria da commissão de fazenda, argumentando assim, não se recordou dos termos em que esta concebida a proposta do governo transacto de que tambem foi relator (apoiados).
A minoria da commissão de fazenda não fez, n'esta parte, alteração alguma na liberal proposta do sr. Dias Ferreira, copiou o § unico do artigo 1.° d'esta proposta, e se substituiu as palavras = serviço do publico = pelas =serviço d'elles =, foi por que o projecto de que se trata refere-se exclusivamente aos passaes, quando a proposta do sr. Dias Ferreira comprehendia, alem d'estes, os bens pertencentes aos estabelecimentos de instrucção publica e aos municipios, os quaes effectivamente possuem bens destinados ao serviço publico; e por isso, tratando nós sómente dos parochos, não podiamos deixar de fazer a arguida substituição (apoiados).
Portanto nem póde haver receio de que o governo abuse, porque uma insignificante porção de terreno dado aos parochos não prejudica a desamortisação dos passaes, nem a substituição em que se fallou importa disposição nova que altere o principio consignado na lei.
Ao que acresce não poder o illustre relator do parecer da maioria da commissão de fazenda impugnar, n'esta parte, "o da minoria, porque s. ex.ª já aceitou e votou a mesma doutrina como relator, que foi, da proposta do sr. Dias Ferreira.
Disse mais s. ex.ª que = estabelecendo nós o principio da desamortisação obrigatoria dos passaes, garrotamos este principio no § 2.° do nosso additamento =. Já demonstrei a inexactidão d’esta asserção, apresentando as causas que motivaram o adiamento proposto, e apenas acrescentarei, que eu e os meus collegas estamos convencidos que a suspensão temporaria da applicação d'aquelle principio, longe de o prejudicar, ha de dar em resultado ser elle executado por um modo mais conveniente e mais proficuo do que seria na actualidade (apoiados).
Por ultimo disse o sr. Santos e Silva, que =não comprehendia o considerando do parecer da minoria, emquanto fallava em modificações na legislação sobre desamortisação, tanto na sua extensão como na essencia das suas disposições; porque n'estas providencias nunca fallou a maioria da commissão, sendo a minoria que as phantasiou =.
Não é facil descobrir o motivo por que este considerando causou tanta estranheza a s. ex.ª, que de certo não ignora que ha muitos bens que ainda estão fóra da circulação, e que devem tambem ser desamortisados (apoiados).
Sem querer comprometter a opinião dos meus collegas signatarios do voto em separado, e unicamente como lembrança minha, mas sem caracter de opinião definitiva, pergunto ao illustre relator da commissão, não entende s. ex.ª que é um grande contrasenso applicar o principio da desamortisação ás camaras municipaes, ás corporações religiosas, aos hospitaes, misericordias e de mais estabelecimentos de caridade e beneficencia, aos cabidos, ás mitras, aos passaes dos parochos, e a todos os bens comprehendidos nas anteriores leis, e estabelecer uma odiosa excepção em favor, por exemplo, da companhia das lezirias?
Esta excepção não importará um revoltante absurdo, principalmente depois da publicação do codigo civil que no artigo 1:561.° prohibe ás associações e companhias a compra de bens immobiliarios? Parece-me que sim.
A existencia do contrato e da lei que auctorisou a constituição d’aquella companhia, não embaraçam a adopção da medida que lembro, porque se por utilidade publica se decretou a desamortisação de todos os bens ecclesiasticos e municipaes, pelo mesmo principio se póde ordenar por uma nova lei a desarmortisação dos bens possuidos pela companhia das lezirias.
N'estas circumstancias existem outros bens fóra da circulação, e por isso não me parece o considerando do nosso parecer tão destituido de fundamento como se pretende inculcar.
Vou concluir, porque desejo cumprir a promessa que fiz de ser breve e conciso. E se o fim principal que tive em vista, pedindo a palavra, foi justificar o meu voto em separado, no pouco que disse satisfiz ao meu intento, mostrando que da minha parte e da parte dos meus collegas não houve reconsideração, incoherencia ou contradicção alguma (apoiados).
Pedimos que na lei se consigne o principio da desamortisação obrigatoria dos passaes, e isto em harmonia com a opinião da camara, manifestada por occasião da votação da proposta do sr. deputado Azevedo, e propomos que o adiamento indefinido da applicação d'este principio, adiamento que a commissão de fazenda votou no seu primitivo parecer, se torne definido e limitado; e n'esta parte houve effectivamente reconsideração, da qual nem eu nem os meus collegas nos arrependemos (apoiados).
Não devo alongar mais as mal coordenadas reflexões que ousei submetter ao superior juizo da camara, porque é de urgente necessidade que o projecto em discussão se converta quanto antes em lei do estado; e eu, como já ponderei, não quero concorrer nem directa nem indirectamente para crear embaraços ao governo que tem sobre seus hombros a pesada cruz da governação publica e o difficil e melindroso encargo de resolver a questão de fazenda (apoiados).
Vozes: — Muito bem, muito bem.
O sr. Freitas e Oliveira: — Preciso perder o medo a este logar e habituar-me a fallar d'aqui (a tribuna) com algum sangue frio, porque gosto mais e prefiro este sitio á minha cadeira. D'aqui posso inspirar-me da physionomia aberta e eloquente do meu moderno, mas já prezado e sempre respeitado amigo o sr. ministro da fazenda, e do semblante mais carregado, mas não menos expressivo, do meu antigo amigo o sr. ministro do reino.
Sr. presidente, se eu não fosse o auctor do artigo addicional que a maioria da commissão de fazenda adoptou, não tomaria parte n'este debate, nem viria abusar da benevolencia com que esta camara se tem dignado, já por tantas vezes, attender-me; mas sendo o auctor do artigo, mal pareceria deixar-me ficar alheio a esta discussão.
Comprometto-me porém, a ser muito breve, mesmo porque felizmente vejo que esta salva a patria, que vae fechar-se o templo de Jano, e que os mais eximios patriotas effectuaram já a sua airosa retirada para os lares, berço dos seus penates (apoiados).
E fizeram bem em fugir, porque effectivamente Lisboa, a preguiçosa, continua a morrer á sede e a respirar o ar envenenado pelas exhalações mephiticas da sua pessima canalisação; verdade seja que para compensar os meios que o thesouro lhe absorve, por um principio de descentralisação que não comprehendo, mas que admiro, meios de que ella carece para os seus melhoramentos, deu-lhe a camara ainda ha pouco 100:000*000 réis para artilhar as suas fortalezas com peças de calibre tal, que possam salvar com mais estrondo no dia da restauração da carta (riso).
Esta camara que estava abatida e condemnada, phrase de outrem, que não minha; quando pedia ao ministerio passado reformas rasgadas e consideraveis economias, redimiu-se votando a este governo a auctorisação para se crearem mais de 3.500:000$000 réis de inscripções, o para se gastarem 100:000$000 réis para artilhar fortes sem força! Tudo isto era motivo para se cantar Te Deum em todas as dioceses do reino, e para irmos todos em romaria ao Bom Jesus de Braga, se não fosse a mofina questão dos passaes.
Esta questão dos passaes parece-me que tem sido ultimamente discutida sobre bases falsas, salvo o respeito devido aos illustres oradores que entraram no debate. A historia. d'este assumpto foi feita hontem pelo nobre ministro do reino com toda a fidelidade; pena foi que s. ex.ª não completasse a historia.
Apresentou-se á discussão um projecto de lei a que se chamou financeiro, mas que podia ser encarado, como o foi por muitos, financeiramente; podia ser olhado pelo lado economico, como o foi tambem por alguns; e podia finalmente ser apreciado pelo lado politico, como creio que o foi só por um.
O ministerio passado tinha apresentado uma proposta de lei, de que este projecto é apenas uma porção; n'essa proposta que era a base de plano financeiro d'esse governo estava incluida a desamortisação dos passaes. O governo actual, adoptando parte d'essa medida, tambem como questão financeira, prescindiu da desamortisação dos passaes. A camara porém por uma proposta, não bem claramente redigida pelo meu illustre collega, o sr. Rodrigues de Azevedo, entendeu dever dar ao governo maiores recursos para acudir á penuria do thesouro, porque o nobre ministro da fazenda lhe dissera que todos os meios eram poucos para salvar as finanças do estado precario em que se achavam, e que desejava mesmo habilitar-se com differentes auctorisações, porque quantas mais tivesse mais facil lhe seria contratar qualquer emprestimo em melhores condições. A camara portanto, attendendo a estes desejos do nobre ministro da fazenda, votou nominalmente que os passaes dos parochos fossem incluidos n'aquelle projecto financeiro, bens cuja desamortisação ficou desde logo sendo obrigatoria; e note v. ex.ª que esta votação da camara, longe de ser uma votação de opposição, foi uma votação positivamente ministerial, porque por ella se deram ao governo meios que elle não pedia, mas que a camara entendeu dever dar-lhe depois das ponderações do nobre ministro.
N'esta votação entrou o meu voto, mas não no mesmo sentido, porque eu, que tinha votado contra a generalidade do projecto do ministerio passado, votei tambem contra a generalidade d'este; mas encontrando na votação da especialidade uma proposta que tornava desde já obrigatoria a desamortisação dos passaes; proposta que encarei como questão politica, como questão de principios do partido progressista, dei-lhe o meu voto. Dc maneira que o governo obteve a minha cooperação n'uma questão ministerial, sem o esperar. E digo questão ministerial, porque o governo tanto se contentou com aquella votação, com aquella manifestação da camara, que o nobre ministro da fazenda que se achava presente, não fez reflexão alguma sobre a conveniencia ou inconveniencia do addicionamento da proposta ao projecto de lei.
No dia seguinte áquelle em que isto se passou, houve reconsideração ministerial, d'onde nasceu a necessidade de reconsideração da camara; e para preparar esse terreno, serviu de pretexto a má redacção da proposta do sr. Azevedo, pretexto futil, porque, como muito bem disse hontem o nobre ministro do reino, a proposta e a votação tiveram um só intuito, que foi tornar desde já obrigatoria a desamortisação dos passaes.
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Mas já que fallei em reconsiderações, permitta-me v. ex.ª que responda a uma observação feita hontem pelo nobre ministro do reino, que disse que = nem todas as reconsiderações são condemnaveis =.
Estou perfeitamente de accordo com s. ex.ª Um individuo póde reconsiderar, e este acto, longe de ser um acto reprehensivel, póde ser um acto digno de elogio. Agora as reconsiderações feitas por um corpo collectivo, não digo que sejam sempre actos condemnaveis, mas tambem não me parece que possam ser actos regulares e elogiáveis (apoiados).
Eu bem sei que a reconsideração de um corpo collectivo, como esta camara, póde ser filha de dois principios. Um d'elles o verdadeiro amor da patria, o desejo de que não haja no governo do estado uma perturbação, de que resultariam males muito mais consideraveis do que aquelles que podem resultar da não desamortisação obrigatoria e immediata dos passaes; mas a malevolencia póde dizer que a reconsideração é filha do desejo de não collocar o governo na alternativa de escolher entre a sua conservação, e a conservação da camara (apoiados).
Se a camara reconsiderar n'esta materia, hei de ser o primeiro a fazer justiça ás suas intenções, acreditando que reconsidera por motivos muito nobres e justos; mas os inimigos da camara, e creio que não irei muito longe, dizendo que ella os tem no seu proprio seio, porque do alto d'esta tribuna já se disseram cousas muito desagradaveis, que infelizmente vi apoiadas por dois ou tres collegas; esses inimigos podem dar á reconsideração da camara um motivo que realmente não é muito digno de elogio.
Mas, continuando, direi eu que n'esta questão dos passaes não me parece que haja senão duas opiniões definitivas e completamente distinctas; a do nobre ministro do reino e a minha.
O nobre ministro do reino disse — votemos o principio da desamortisação obrigatoria dos passaes, consinto n'isso; mas é um consentimento forçado. S. ex.ª passava muito bem sem esta ceremonia, e tanto que nos disse hontem, que desde o momento em que a minoria da commissão de fazenda votava a desamortisação dos passaes e suspendia a execução da lei era melhor não ter votado cousa alguma. Arrependendo-se porém d'esta sinceridade, disse que se conformava com o voto da minoria, e que tambem lhe parecia conveniente e necessario que a execução da lei ficasse suspensa até que o governo apresente a lei da dotação do clero; lei que elle havia de fazer toda a diligencia para apresentar em janeiro, mas que não podia comprometter-se a apresenta-la.
Depois de uma declaração d'estas, saída da bôca de homem tão franco e sincero, é para mim claro que não apresenta nenhuma lei de dotação do clero; porque se s. ex.ª tivesse a convicção de o poder fazer, affirmava-o. S. ex.ª não é homem d’estes expedientes de palavra para encobrir a verdade. Se tem algum defeito, na minha opinião, é de ser franco de mais. Basta a manifesta allusão que hontem fez ás inscripções, allusão que foi levantada por um illustre deputado, que eu não levantaria, porque se a phrase foi inconveniente na bôca do estadista, póde vir a ser uma grande verdade, se continuarmos n'este systema de vender inscripções, que me parece o systema do ministerio.
Como dizia, não ha senão duas opiniões. O nobre ministro do reino consente que se vote a desamortisação dos passaes, mas põe pedra sobre isso até quando se podér apresentar a lei da dotação do clero, que será em janeiro. Note v. ex.ª que estas promessas do governo vão-se parecendo com as promessas do governo transacto, a quem tive tambem a honra de fazer opposição.
Aqui ha oito ou quinze dias fallava-se muito em se reunirem as camaras em outubro, agora já se não falla senão em janeiro. Apresentar-se-ha pois em janeiro a lei para a dotação do clero, e se se apresentar, ou então quando estiver prompta. A minha opinião é que a desamortisação dos passaes se comece a realisar desde já, porque, quer ella sirva para a dotação do clero, quer sirva como expediente financeiro, como para ella se realisar são precisos trabalhos preparatorios que levam muito tempo, mais rasão ha para que fique obrigatorio desde já, o escusado é o adiamento que nos propõe a minoria da commissão de fazenda, o adiamento forçosamente ha de realisar-se pelos trabalhos preparatorios que é necessario fazer para a execução da lei. E este adiamento ha ser maior se o producto da desamortisação dos passaes para a dotação do clero, porque, como muito bem disse o sr. ministro do reino, é preciso fazer a circumscripção das freguezias, e só isso é trabalho para um anno. Mas se os bens desamortisados forem simplesmente para acudir ao nosso estado financeiro, basta sómente fazer a avaliação dos bens, mas para isso mesmo são precisos pelo menos seis mezes, que é exactamente o adiamento pedido.
Portanto a questão para mim é politica, e só politica. Assim como tambem o é para o sr. ministro do reino. Elle não quer a desamortisação dos passaes; mas tolerante, conciliador e habil politico, como é, não arrosta com esta opinião, não a combate, e concede á camara que a inscreva como artigo d'esta lei. Mas em seguida, note v. ex.ª que o caso é novo, diz o nobre ministro, façam a lei, mas ponham-lhe um artigo que diga = fica suspensa a lei =. Parece-me que uma lei não se póde suspender senão por outra lei; mas decretar na mesma lei a suspensão d'ella, é caso novo (apoiados).
Portanto s. ex.ª não quer a desamortisação dos passaes (apoiados).
Não entro nas questões caseiras da maioria e da minoria da commissão; lá estão os seus illustrados membros, que todos elles são muito competentes para deslindarem esses negocios.
Se o governo não quiz esta auctorisação dada pela camara para a desamortisação dos passaes, para melhorar o estado das finanças, eu folgo muito com isso; porque vejo que o nosso estado não é tão precario como se dizia a principio. Suspeito que o ministerio tem grandes recursos, que as praças estrangeiras lhe abrem as suas bolsas, e que o nosso governo tem hoje n'essas praças mais credito do que tinha hontem. E são tão importantes os recursos que o governo nos esconde, que até prescinde de uma receita tão consideravel como seria esta da desamortisação dos passaes; porque logo que a lei passasse e se soubesse emquanto estavam avaliados os bens, como no artigo da lei primitiva se auctorisaram quaesquer operações hypothecarias sobre esses mesmos bens, é certo que a receita para o governo era immediata (apoiados).
As nossas opiniões, a do illustre ministro do reino e a minha, são tanto mais distinctas que elle pareceu-me ser partidario da dotação do clero; e declarou que era partidario d'essa dotação, não só porque a religião catholica apostolica romana era a religião do estado, mas porque era mais alguma cousa; era a religião do povo portuguez.
Ora, eu que sou exactamente da mesma opinião do sr. ministro, que tambem entendo que a religião catholica apostolica romana é mais do que a religião do estado, é a religião do povo portuguez; sou por isso mesmo partidario de que não haja religião do estado, e por consequencia de que não haja dotação do clero; que a dotação do clero seja feita pelo povo, que por isso mesmo que é catholico apostolico romano sustente a sua religião (apoiados). O estado não deve sustentar religião alguma, mas tolerar e proteger todas. Estes é que são os meus principios liberaes; e posso fallar n'elles, apesar da carta constitucional determinar que a religião do estado é a religião catholica apostolica romana, porque este sentimento em mim é uma aspiração, e as aspirações no systema liberal podem manifestar-se neste logar (muitos apoiados).
Portanto insisto na minha primitiva e unica opinião, em votar que a desamortisação dos passaes seja obrigatoria, e comece desde já a ter execução; isto é, que comecem desde já a fazer-se os trabalhos necessarios e preparatorios para a sua execução. E este meu voto que é perfeitamente politico, desejo que fique muito bem explicado, porque logo na votação dos pareceres da maioria e minoria da commissão, V. ex.ª verá a trovoada que ahi se levanta. Verá V. ex.ª quantas pessoas lhe pedem a palavra sobre o modo de propor, porque isto realmente esta muitissimo confuso para quem quizer ser ministerial aqui e patriota no campanario.
O que diz o parecer da maioria da commissão no artigo que eu apresentei na sessão de 6 do corrente e que ella admittiu? Diz o seguinte (leu).
Mas o artigo da minoria da commissão e os seus §§ dizem o seguinte (leu).
Ora, eu que me contentava com o artigo da minoria da commissão, vendo este, quero já este (apoiados); gosto mais d'elle, porque é mais largo; apesar de alguem dizer que os outros bens e direitos prediaes que fazem parte da dotação do clero, já estavam desamortisados pela lei de 1861. Se já estavam desamortisados é uma sobejidão apresenta los aqui para so desamortisarem; se não estavam ficam agora tambem desamortisados. Em todo o caso é sempre bom prevenir esta hypothese e votar o artigo; se a votação do artigo se fizer em separado da votação dos §§, eu não voto o § 1.º nem o 2.° d'este parecer da minoria.
O meu illustre amigo, o sr. ministro da marinha, sabe perfeitamente que não votei ao ministerio passado este § 1.°, porque vejo n'elle uma arma eleitoral, como disse então, porque diz o seguinte (leu).
Ora, eu que me opponho a que no § se determine quaes são os bens que não ficam sujeitos á desamortisação, não quero todavia que se dê ao governo o arbitrio de julgar quaes são os bens indispensaveis o quaes os bens que o não são. Se isto assim passar é uma arma eleitoral que se colloca na máo do governo de que elle póde abusar. Não digo que o faça o governo actual, mas elle não ha de estar sempre naquellas cadeiras (as dos ministros), ao que eu não me oppunha, mas póde acontecer que sáia o que sáia muito breve e muito por sua livre vontade, desde o momento que não póde cumprir o seu programma; eu sei que o sr. ministro do reino é homem para isso. Póde portanto vir um ministerio que se sirva d'esta lei como arma eleitoral. Póde a respeito do parocho A dizer-se = basta-lhe uma casinha e uma horta para sua habitação =, emquanto que um parocho B que tenha maior influencia nos seus freguezes e que os leve arregimentados não só ao culto divino mas tambem ao culto ministerial, esse, em logar de casa, fique com um palacio, em logar de horta, fique com uma quinta (apoiados). Isto é que eu quero prevenir (apoiados).
Resumindo, direi que se me demonstrassem que viria um cataclysmo social da execução d'esta lei, isto é, da desamortisação immediata dos passaes, não teria duvida nenhuma em votar, não um paragrapho da mesma lei, mas outra lei que dissesse == fica suspensa a execução de tal lei, porque n'este momento é perigosa a sua execução =; mas como não julgo que se verifique esse cataclysmo, como não tenho medo dos padres de Braga, e não tenho medo delles, porque n'esse ponto, confio muito na energia, na rectidão e no zêlo patriotico do sr. ministro do reino, entendo que a desamortisação dos passaes póde ter logar desde já.
Pois um padre de Braga ou de qualquer provincia do reino havia de revoltar-se contra uma lei do estado? Havia de abusar da religião e do Evangelho e prégar ao povo a desobediencia ás leis do paiz? Era impossivel; confio plenamente em que o sr. ministro do reino, se algum padre assim procedesse, havia de castiga-lo e custar-lhe-ia cara esta intervenção no poder temporal (riso). Por consequencia não tenho medo nenhum da tão fallada influencia dos padres que gosam ricos passaes.
"Não quero cansar mais a camara; prometti ser breve, quero cumprir a minha palavra. Mas como provavelmente será esta a ultima occasião de eu fatigar a camara com as minhas palavras n'esta sessão, não quero despedir-me d'este logar sem dizer duas palavras a meu respeito.
Peço desculpa á camara de lhe occupar dois minutos com assumpto de tão pouco valor.
Eu fiz opposição ao ministerio passado. Estão presentes na camara quatro illustres ministros d'essa administração, que podem certificar se fiz opposição áquelle ministerio por despeito pessoal ou por interesse particular offendido. A nenhum dos anteriores ministros eu importunei com as minhas solicitações (apoiados).
Faço tambem opposição a este ministerio, não por despeito pessoal, porque de todos os srs. ministros tenho obtido favor e immerecida distincção e consideração, nem tambem por interesse particular. Os meus requerimentos não têem de certo A minha opposição a este ministerio para quem me leva o coração, assenta n'um só motivo, e perdoe-me o membro amigo, o sr. ministro do reino, a franqueza com que o declaro. Os meus sentimentos liberaes, vendo na pasta politica um ministro da igreja (e note-se que não vejo incompatibilidade em que um ministro da igreja seja um ministro da liberdade, porque para mim o Evangelho é o primeiro codigo das liberdades publicas) não digo que se encrespem, que se irritem; não ha phrase propria em portuguez para exprimir o meu sentimento; só os francezes no seu verbo agacer, têem um derivativo que exprime bem o sentimento que me inspira, vendo na administração politica do meu paiz entregue a um principe da igreja, que no meu entender obedece sempre a dois réis. E desde o momento em que as liberdades publicas estão á mercê da direcção de dois reis são réis de mais, temo por ellas e por isso não posso dar a este ministerio o meu fraco e leal apoio como desejava, ainda que tenho pelas pessoas dos srs. ministros a maior sympathia, a maior consideração e o maior respeito. Vozes: — Muito bem, muito bem. (O orador foi comprimentado pelos srs. deputados do lado esquerdo da camara.) O sr. Secretario, J. Tiberio: — A commissão de redação não fez alteração nos projectos n.ºs 16 e 2. O sr. Presidente: — -Tem a palavra para uma questão previa o sr. Motta Veiga. O sr. Lobo d'Avila: — Então V. ex.ª, quando estamos quasi no fim d'esta discussão, vae conceder a palavra a um sr. deputado que já fallou sobre esta questão, impedindo que outros srs. deputados, que ainda não fallaram sobre o assumpto que se debate, apresentem a sua opinião?! O sr. Presidente: — O regimento é explicito a este respeito. O sr. Motta Veiga pediu a palavra para uma questão previa, e por consequencia tem a preferencia a qualquer outro sr. deputado. O sr. Motta Veiga: — Não pedi a palavra para uma questão previa com o fim de tirar a outrem o direito de fallar, ou, como costuma dizer-se, com o fim do escalar a palavra, sr. presidente; pedi a palavra para effectivamente apresentar a questão previa que vou ler á camara (leu). E sabe v. ex.ª a rasão por que eu apresento esta questão previa? E pelas considerações que hontem aqui fez o sr. ministro do reino. O sr. ministro do reino, dignando-se hontem responder ás considerações que fiz aqui d'esta tribuna, pareceu magoar-se um pouco por eu ter procurado o latet anguis e por dizer que me parecia haver n'este projecto do lei um pensamento reservado. Mas foi s. ex.ª mesmo que demonstrou que esse latet anguis effectivamente existiu. Eu me explico. Eu disse: «Não comprehendo bem o parecer da minoria da commissão, por isso que ha aqui um quid que não concebo.» Depois veiu s. ex.ª e disse: «Aqui não ha latet anguis; e se houve pensamento reservado foi da parte do nobre deputado, do governo, não.» E quando eu concluia, dizendo que fazia votos para que a camara na sua alta sabedoria fosse coherente e logica na sua votação sobre o projecto, disse s. ex.ª: «Se a censura é feita á camara, a camara que lh'a agradeça, mas deve rejeita-la; se a censura é dirigida ao governo, o governo tambem a rejeita.» Mas s. ex.ª disse pouco depois: «O governo é que não aceita nem póde aceitar a votação que esta camara fez na sessão de 6 de agosto!» Pergunto eu agora: se a questão volta hoje á camara para ser votada, e se o governo declara que não aceita a votação que se fez em 6 de agosto, como é, e o que é que o governo quer que se vote? O mesmo que na sessão de 6 do corrente? Não, visto que o sr. ministro do reino declara que o governo o não aceita. Uma cousa differente do que então se votou? Mas então quem é que quer fazer reconsiderar a camara? Eu entendo que é o governo, e vou dar a rasão d'isso. O governo estava aqui representado pelo nobre ministro da fazenda, quando a emenda do sr. Rodrigues de Azevedo foi mandada para a mesa; e s. ex.ª não disse uma palavra a respeito da conveniencia ou inconveniencia d'ella ser admittida á discussão. Na sessão de 6 d'este mez a emenda foi votada, e s. ex.ª tambem não disse uma só palavra sobre a conveniencia de ser approvada ou rejeitada. Quem é pois que não póde aceitar a votação do dia 6, é o governo do sr. ministro do reino ou o governo do sr. ministro da fazenda? Eu sinto que o sr. ministro do reino declarasse que não aceitava nem podia aceitar a votação de 6 d'este mez! Tem aqui todo o cabimento, e vem a proposito, as palavras do
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Evangelho, que o nobre ministro do reino bem conhece: Omne regnum in se ipsum divisum desolabitur, et domus supra domum cadet; pois parece fóra de duvida que lavra o scisma na igreja ministerial, se não ha lá já politica herética...
Uma voz: — Peço a palavra sobre a questão previa.
(Differentes srs. deputados pedem a palavra sobre a questão previa.)
Uma voz: — A questão prévia ainda não está admittida.
O sr. J. T. Lobo d'Avila: — Então falla-se na questão previa sem ser admittida á discussão?
O Orador: — Eu estou fundamentando a minha questão previa.
O sr. J. T. Lobo d'Avila: — Peço a v. ex.ª consulte a camara sobre se admitte a questão previa.
O Orador: — Se a camara me retirar a palavra, eu obedeço á sua resolução. Estou fundamentando a minha questão previa (apoiados).
O sr. Presidente: — E permittida pelo artigo 37.° do regimento.
Vozes: — Mas não está na ordem, porque está fallando na materia respondendo ao sr. ministro do reino.
O Orador: — Eu creio que estou na ordem e posso fallar (apoiados). Não invado o direito de ninguem (apoiados).
Vozes: — Falle, falle.
O sr. J. T. Lobo d'Avila: — Falle, e fallem todos, mas falle quem tem direito de fallar.
O Orador: — Eu creio que tenho direito de fallar agora (apoiados).
Dizia eu que tinha muitas duvidas ácerca do resultado que terá a approvação do parecer da minoria da commissão, por isso apresentava esta questão previa.
O sr. ministro do reino lembrou-me, e lembrou-me muito bem, e até lhe agradeço a lembrança, que havia um principio de moral que manda não devassar as intenções alheias. De accordo. E veiu isto a proposito de eu dizer alguma cousa a respeito dos fins que parecia terem em vista, no meu entender, os parochos do Minho que vieram representar á camara contra o projecto de lei que determinava a desamortisação obrigatoria dos passaes. Mas s. ex.ª lembrando-me este principio de moral, foi o primeiro que violou completamente esse principio invocado por s. ex.ª attribuindo-me pensamento reservado e o tal latet anguis, que tanto o magoou, e affirmando que isso estava da minha parte e não da parte do governo. Eu já mostrei que o pensamento reservado e o tal latet anguis estava da parte do governo, e era só do governo, á vista da declaração apresentada pelo proprio sr. ministro do reino.
O sr. J. T. Lobo d'Avila: — Permitta-me o illustre deputado dizer-lhe que a minoria da commissão no seu parecer, do modo que está redigido, é muito clara. Diz ella que = o governo apresentará ás côrtes na proxima sessão legislativa a conveniente proposta para regular a applicação do producto da desamortisação dos passaes dos parochos =. Agora digo mais, que se o governo não cumprir a lei n'esta parte, a camara ha de pedir-lhe contas, o a lei no resto ha de executar-se. Não ha pois motivo para a questão previa.
O Orador: — A declaração que acabo de ouvir não altera em nada as observações que preciso fazer.
Em terceiro logar s. ex.ª, o sr. ministro do reino, disse-me que havia contradicção entre o que eu tinha exposto á camara e a emenda que mandei para a mesa. É possivel. Mas é preciso que s. ex.ª saiba uma cousa, e é que no ministerio passado, quando esta questão veiu á discussão, já n'essa occasião eu mandei para a mesa uma emenda no mesmo sentido, como deve constar das actas d'esta camara.
A emenda do sr. Rodrigues de Azevedo, que aqui foi votada na sessão de 6 de agosto corrente, dizia respeito sómente á applicação do principio geral da desamortisação dos passaes, pela mesma fórma obrigatoria que fôra votado na lei do 4 de abril de 1861 e 22 de junho de 1866. De nada mais se tratava ahi.
Ora, eu não quiz de maneira nenhuma n'essa occasião embaraçar o principio geral por uma hypothese particular.
Além d'isso haveria contradicção, se o parecer da commissão fosse sobre essa emenda que apresentou o sr. Rodrigues de Azevedo, mas não foi sobre essa emenda que a commissão apresentou o seu parecer, maioria ou minoria, foi sobre a emenda do sr. Freitas e Oliveira, emenda que já não era exactamente o que se tinha votado na sessão de 6 de agosto, pois que veiu com um paragrapho modificando um pouco o principio geral. Por consequencia não se discute agora aquillo que já está votado em 6 de agosto, discute-se uma outra cousa, uma hypothese, subordinada ao principio geral; discute-se a emenda, do sr. Freitas o Oliveira, que traz uma tal ou qual modificação. Portanto não ha contradicção em mim desde o momento que veiu a modificação. A minha emenda é a mesma que tinha apresentado no tempo do ministerio transacto, e se não é apresentada, á emenda votada em 6 do corrente, mas sim additada á do sr. Freitas e Oliveira, não póde dizer-se contradictoria, visto não dar-se sub eodem respecta, o que seria preciso para haver contradicção.
S. ex.°, o sr. ministro do reino, brincou um pouco com o termo obrigatorio.
Todo o mundo sabe o que quer dizer desamortisação obrigatoria. Não quer dizer ficar o governo obrigado; o termo obrigatorio diz respeito propriamente aos parochos, isto é, o que até agora era facultativo, ficou obrigatorio. Por outra, segundo a lei de 22 de junho de 1866, dependia da vontade dos parochos desamortisarem ou não os seus passaes, agora não; agora quer elles queiram quer não, os seus passaes hão de ser desamortisados; fica dependente"do governo mandar desamortisar esses bens quando julgar opportuno, e nunca obrigado a desamortisa-los de repente, de uma só vez, e por assim dizer de um jacto; o que até aqui era facultativo para os parochos, tornar-se-ha d'aqui em diante obrigatorio. Mais nada.
Chamou s. ex.ª sophisma ao meu argumento sobre vantagem ou desvantagem da desamortisação. Eu não sei se foi sophisma; mas o argumento de s. ex.ª, se não foi sophisma (e Deus me defenda de o dizer), foi pelo menos um paralogismo. Apesar disso aceito-o.
O meu argumento era este; se a desamortisação dos bens pelas leis de 1861 e 1866 é vantajosa, não ha rasão nenhuma para que se privem d'essa vantagem os parochos; se é desvantajosa, pede a justiça e a igualdade que ou se applique essa desvantagem a todos, ou a nenhum, e que não se façam excepções. Disse o nobre ministro do reino que =este argumento era um sophisma porque, se uma disposição é desvantajosa, não se deve applicar a ninguem =. Em todo o caso aceito o argumento, ou seja paralogico ou não. Mas então direi a s. ex.ª que, desde o momento em que a desamortisação dos passaes pelas leis de 1861 e 1866 é desvantajosa, visto que s. ex.ª deixou hontem perceber, que entendia que effectivamente não havia vantagem na desamortisação, então s. ex.ª deve cautellosamente entender-se com o nobre ministro da fazenda sobre a proposta que apresentou, porque de certo não póde fazer as operações financeiras que premedita, visto que a logica de s. ex.ª o sr. ministro do reino exige que se acabe com as leis de 1861 e 1866, exige que sejam revogadas por desvantajosas, e o projecto do nobre ministro da fazenda caducou. É mais um symptoma do scisma ministerial, e o caso de dizer-lhe de novo: Omne regnum in se ipsum divisum desolabitur, et domus supra domum cadet. Cumpre-me dizer agora algumas palavras ácerca da minha questão prévia, que eu apresentei, porque desejo que a camara seja bastante esclarecida a este respeito, e que vote com pleno conhecimento de causa.
Já ouvi dizer a um nobre deputado, que en muito respeito, que o § 2.° do parecer da minoria é perceptivo. Concordo com isto; mas o governo chega em janeiro a camara e não apresenta as propostas de lei sobre dotação do clero ou para dar applicação ao producto dos passaes desamortisados; e póde ainda dar-se o caso de as apresentar e não serem approvadas pela camara. Pergunto eu — fica suspensa a lei indefinidamente até que o governo apresente essas propostas, ou, caso elle as apresente e não sejam approvadas, até que um dia o sejam? Continua suspensa a lei indefinidamente até que haja propostas approvadas pela camara? Ou tenciona ainda o governo, mesmo que as propostas não sejam apresentadas ou approvadas, executar effectivamente a lei votada? É o que eu pretendo saber: e digo isto porque o nobre ministro do reino, que tão benevolamente nos tinha promettido a dotação do clero, disse já hontem que isso era uma cousa difficil, e n'isto concordo eu; disse tambem que era preciso fazer antecipadamente a reducção das freguezias, e que isso era ainda mais difficil, no que eu tambem concordo. Disse porém s. ex.ª que = um bom governo devia acceder e contemporisar com os prejuizos, opiniões erroneas, preconceitos e interesses particulares e mesmo mesquinhos, interesses de campanario, n'uma palavra =. Ora s. ex.ª, que decerto ha de querer seguir as normas de um bom governo, tem de ceder a tudo isto, tem de contemporisar com todos esses preconceitos.
Eu estou de accordo em que a reducção das freguezias tem grandes difficuldades, impossibilidades mesmo, disse s. ex.ª; mas se tem impossibilidades e se não póde haver dotação do clero sem a reducção das freguezias, então s. ex.ª quando nos prometteu a dotação do clero, foi porque não sabia que havia essas impossibilidades, ou foi com intenção de prometter e não cumprir? Não direi que foi com essa intenção, não me atreveria a dize-lo com respeito a qualquer pessoa, quanto mais com respeito a um principe da igreja, mas em todo o caso desejei que esta questão previa apparecesse.
Eu não quiz devassar as intenções dos padres do Minho. S. ex.ª disse hontem que os padres do Minho tinham rasão para representar contra esta medida, porque elles bem veem que os bens em terras valem mais do que os titulos fiduciarios, quaesquer que elles sejam.
Ora, o sr. bispo de Vizeu poderá pensar assim, mas o sr. ministro do reino não. S. ex.ª de certo disse isto por lapso, e tanto que o illustre deputado, o sr. Santos e Silva, com a sua brilhante e vehemente linguagem, estranhou que dos bancos do governo saísse uma expressão tão inconveniente.
O nobre ministro veiu logo porém levantar essa expressão, dizendo que não era em seu nome que fallava, mas em nome dos padres, e que nem s. ex.ª partilhava essa opinião. Mas se os parochos allegavam fundamentos erroneos, como é que o nobre ministro do reino affirma que elles tinham rasão? Só se for tambem erroneamente.
Eu não quero tomar muito tempo á camara, porque não desejo que se diga que pretendo tirar a palavra a outros illustres deputados que estão inscriptos. Já ouvi até a alguem dizer que o que eu queria era protrahir a discussão. É um engano; parece-me que esta questão quanto mais discutida for melhor, por isso que ella é muito, grave, mas eu é que não faça d'isto questão politica.
Digo só ao orador que neste, mesmo logar (a tribuna) veiu declarar que eu abusei do que particularmente me havia dito no theatro da Trindade (note a camara que foi diante de quem quiz ouvir) ácerca do parecer da minoria por elle assignado, querendo fazer-mo, em certo modo, uma insinuação descortês, de falta de cortezia, direi, repito, a s..ex.a, que não admira que um homem da côrte, de costumes e habitos tão puros, delicados e cortezes, como s. ex.ª, dê lições de cortezia a um provinciano; mas s. ex.ª sabe que, se eu quizesse virar as armas e fazer recriminações, podia faze-lo triumphantemente. Mas deixemos isso, é uma cousa tão pequena e tão impertinente que não vale a pena perder tempo com isso. Mas saiba a camara que a grande confidencia particular, que s. ex.ª me fez no theatro da Trindade, foi que tinha votado o principio da desamortisação obrigatoria em 6 do corrente, e não a sua applicação. Avalie a camara!
Não disse que não votava este projecto ao governo, voto-o, mas de uma maneira clara e franca, e não destruindo n'um paragrapho o que se estabelece no artigo.
S. ex.ª fez uma comparação com o meu projecto em que se estabeleciam 50 porcento de deducção nos ordenados dos servidores do estado, e disse que, havendo eu apresentado um tal projecto, agora tinha duvida em votar a medida que se apresenta. S. ex.ª ou não entendeu ou não quiz entender a idéa do meu projecto, que já aqui tive a honra de explicar. E d'isso não tenho eu culpa. O que é verdade é que, quem recorre a taes argumentos para defender o seu parecer, tem pouca consciencia do mesmo parecer. Voto-a toda e estou prompto a vota-la ainda hoje, mas não como ella se apresenta por parte da minoria da commissão; voto-a, mas não de uma fórma que se possa abusar.
Diz-se que o governo não póde abusar. Póde, e nós não sabemos qual será o governo que tenha de executar esta lei. Disse-se que desde o momento, em que se faz uma lei, o governo tem obrigação de a cumprir. Eu pergunto a quem assim argumenta se o governo cumpriu a lei da extincção dos juizes ordinarios? E incontestavel que a lei está feita, mas é tambem certo que nunca se cumpriu; e portanto o mesmo póde acontecer com a lei que discutimos. Portanto as palavras do parecer de minoria não me agradam, porque desejava que ellas fossem mais claras e positivas, mais determinadas e precisas.
Eu podia dizer mais alguma cousa ácerca do que disse o sr. Faria Blanc, mas a camara apreciou bem os argumentos que s. ex.ª adduziu para destruir os que eu tinha empregado. Não comprehendeu mesmo s. ex.ª a força da minha emenda, porque dizendo eu na minha proposta, não excede não a dois hectares de terreno, podia ser um hectare, meio hectare, hectare e meio. Marquei o maximo. Mas ainda aqui s. ex.ª não entendeu, ou não quiz entender, em boa fé lá se vê.
Mas eu não desejo abusar. Mando a minha questão previa para a mesa, estimarei muito que seja admittida, e se o não for sujeito-me ás resoluções da camara, como devo.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bem.
Leu-se na mesa a seguinte
Proposta
Questão previa:
Dada a hypothese de ser approvado o parecer da minoria, e o governo não apresentar no proximo janeiro a proposta de lei para a dotação do clero, ou para a applicação do producto da desamortisação dos passaes, ou ella não for approvada pela camara, continua indefinidamente a suspensão d'esta lei até que essa proposta appareça, ou o governo tem tenção de executa-la desde logo independentemente d'isso e assim o declara? = M. E. da Motta Veiga.
O sr. Presidente: — -Devo dizer ao illustre deputado que a moção que mandou para a mesa não é uma questão previa, e que me parece que devia antes formular uma pergunta ao governo, mas o illustre deputado não fez uma nem outra cousa. Entretanto vou consultar a camara sobre se admitte a sua moção como questão previa.
Não foi admittida.
O sr. Presidente: — O sr. Lobo d'Avila pediu a palavra sobre a ordem, mas devo lembrar a s. ex.ª que no principio d'esta discussão eu disse que não podia haver moções de ordem; agora se o illustre deputado quer a palavra, concedo-lh'a.
O sr. Lobo d'Avila: — V. ex.ª deixou fallar o sr. deputado Motta da Veiga, sobre a questão previa e depois declarou que não havia questão previa (riso). Eu desejava responder a algumas perguntas do illustre deputado e v. ex.ª que deixou por formular as perguntas não póde com justiça privar-me de dar as respostas como membro da minoria (apoiados). Se, pois, V. ex.ª me dá licença direi duas palavras.
Vozes: — Falle, falle.
O Orador: — Eu não queria privar do uso da palavra o illustre deputado que me precedeu; gosto até muito de o ouvir. Nem foi por espirito de intolerancia que o interrompi, quando elle se serviu sem a menor advertencia de v. ex.ª de um. estratagema parlamentar, para fallar segunda vez sobre a mesma questão, preterindo os seus collegas na ordem da inscripção (apoiados).
Julgo que, tendo todos nós o mesmo direito de fallar n'esta casa, havemo-nos de sujeitar a certas regras no uso j da palavra, para manter a ordem nas discussões, e para que nenhum deputada seja offendido no exercicio do seu direito (apoiados). Desejava, pois, que estas regras que estão consignadas no regimento da camara fossem mantidas igualmente para todos (apoiados). Dito isto, vamos á questão.
Dirigiu o illustre orador algumas perguntas que se referiam ao governo. N'essa parte nada tenho que dizer, o governo respondêra conforme julgar conveniente.
Agora, pelo que respeita á minoria da commissão, tenho algumas respostas a dar a s. ex.ª
Perguntou o illustre deputado se o governo podia deixar de apresentar a proposta que se refere á desamortisação dos; passaes na proxima sessão legislativa.
É claro que a disposição do artigo é perceptiva, porque diz: o governo apresentára na sessão immediata uma proposta regulando a applicação da lei (apoiados).
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Se o governo deixar de cumprir este preceito da lei, acha-se na mesma posição em que se póde achar qualquer governo, que deixa de cumprir os preceitos de uma lei.
A camara cumprirá o seu dever, porque esta aqui não só para fazer leis, mas para velar que ellas se cumpram (apoiados).
Pela minha parte, se não apparecer uma proposta que torne effectiva na sessão proxima a desamortisação obrigatoria dos passaes, desde já me comprometto a apresentar essa proposta, porque a falta de iniciativa do governo não inhibe a iniciativa do deputado; o parlamento pronunciará então francamente a sua opinião e o governo tomará perante ella a attitude constitucional que julgar mais conveniente (apoiados).
Agora não se trata de nenhuma questão de reconsideração, nem se põe em duvida o principio da desamortisação obrigatoria; trata-se de uma questão de opportunidade (apoiados). A questão resume-se n'isto e nada mais.
Tem-se querido explorar estes melindres de reconsideração, esta repugnancia que ha sempre em todos os corpos collectivos em reconsiderar quaesquer deliberações que tomaram. Se póde ser justo, rasoavel em muitas circumstancias que um corpo collectivo reconsidere em presença de uma grande conveniencia publica, é certo que deve evitar sempre collocar-se n'esta situação, porque d'ahi mais ou menos sempre resulta uma certa desconsideração para o corpo collectivo, pelo menos a accusação de pouco reflectido nas suas deliberações.
Isto não quer dizer que se elle reconhecidamente vê que a modificação de uma disposição que votou póde ser de inconveniencia publica, não tenha mesmo, por dever, sacrificar o seu amor proprio no altar do bem publico.
Mas agora não se dá este caso (apoiados). E escusado invocar estas regras e melindres. O que votou a camara quando approvou a proposta do sr. Rodrigues de Azevedo? Qual foi o pensamento que quiz consignar?
A proposta infelizmente não estava redigida com aquella clareza que era indispensavel para fixar de um modo bem preciso o pensamento da camara, e tanto se julgou que a proposta não estava redigida nos termos convenientes para definir bem o pensamento da camara que o sr. Freitas e Oliveira reputou indispensavel apresentar uma proposta mais definida.
Se a camara quiz votar o principio da desamortisação obrigatoria dos passaes, quiz votar uma resolução logica, em relação aos principios estabelecidos com referencia á desamortisação; assim como se tem desamortisado outros bens, pertencentes a corporações chamadas de mão morta, tambem por conveniencias economicas, politicas, administrativas e financeiras, a camara tratou de applicar a mesma doutrina aos passaes.
Eu entendo que se a camara teve este pensamento fez muito bem, e eu adopto-o completamente, e mesmo o governo na commissão tambem declarou que adoptava o pensamento da desamortisação obrigatoria dos passaes.
Portanto, consignando nós no parecer da minoria da commissão a doutrina da desamortisação obrigatoria dos passaes, não fazemos reconsiderar a camara, porque ella vota justamente aquillo que se entendeu que ella votou pela proposta do sr. Azevedo, sobre que houve diversas interpretações; e foi justamente o principio mais definido pelo sr. Freitas e Oliveira (apoiados).
Onde ha aqui reconsideração da parte da camara? Ella não renega os seus principios, vota a mesma doutrina, e confirma por uma nova votação esse mesmo principio que se suppõe ter votado; portanto onde ha aqui reconsideração da parte da camara?
Mas a camara tinha porventura prejudicado qualquer juizo que se formasse a respeito da occasião mais opportuna para a applicação d'este principio? Creio que não. A camara póde portanto votar o principio, e entender que não é opportuno que se applique desde já, marcando um praso para a sua execução, e por este modo a camara não adia de uma maneira arbitraria a execução d'esse principio, e não se póde dizer pois que ella renega o principio que votou nem que ha reconsideração alguma.
Ponhamos pois de parte esta questão da reconsideração; não ha tal reconsideração; nós votámos aquillo mesmo que se entendeu que já se votou, mas digo que do que se trata unicamente agora, é da questão da opportunidade, pelo que respeita á applicação (apoiados). Ora, essa questão já aqui tem sido ponderada.
As rasões que deu a commissão não são tão contradictorias como pretendeu o nobre deputado, que hontem fallou com alguma paixão e injustificavel acrimonia a este respeito.
A commissão não deu por unica rasão que haveria uma discussão muito protrahida. Eu se quizesse fazer referencias, podia citar o parecer da commissão de fazenda, que vem assignado por esse mesmo cavalheiro, que creio até era o relator, em que se excluia do projecto de lei a desamortisação dos passaes, para adoptar a proposta do sr. ministro da fazenda, que põe completamente de parte a questão da desamortisação dos passaes; nem consignava o principio; e todavia a commissão de fazenda entendeu, por um parecer assignado por esse illustre deputado, entendeu, digo, que podia adiar indefinidamente essa questão, po-la de parte, dando como rasão o evitar, como agora, uma discussão extensa na actual conjunctura (apoiados).
Portanto, se no parecer da minoria se invocou essa rasão, não se fez mais do que ir busca-la ao parecer, assignado por aquelle illustre deputado, e mal pensava ella que elle mesmo havia de vir negar a sua propria auctoridade.
Mas a commissão não se referiu só a esses fundamentos. Tem-se dito, e creio que é um facto incontestavel, que ha uma grande desigualdade entre os passaes dos parochos; que ha parochos que têem grandes passaes, e que ha outros que os têem muito pequenos; de modo que n'umas partes ha grandes congruas e rendosos pés de altar, emquanto que neutras as congruas são pequenas. O que é preciso é igualar devidamente as condições em que se acham as diversas freguezias (apoiados). Além da desigualdade na distribuição dos encargos aos povos, tem o inconveniente de crear difficuldades á boa divisão ecclesiastica; porque os freguezes que pertencem a uma freguezia, onde. têem de pagar uma congrua menor, não querem ir para outra, aonde tenham de pagar uma congrua maior (apoiados). E mais uma difficuldade para a boa divisão das freguezias (apoiados). Portanto o principio de dividir equitativamente o rendimento dos passaes entre os diversos parochos, é um principio geralmente admittido por todos (apoiados).
Pergunto, esse principio ganhava em que fossem já desamortisados os passaes? Não; pelo contrario perdia. Se fossem agora desamortisados todos os passaes, para que mãos iam as inscripções, pelas quaes se sobrogassem esses bens, ou direitos prediaes que constituem os passaes? Iam para as mãos dos parochos actuaes (apoiados). Lá permanecia a mesma desigualdade (apoiados).
Logo para aquelles mesmos que fundam os seus argumentos n'esta rasão da desigualdade entre os passaes, parece-me que esses taes devem admittir este meu argumento que tem alguma força.
Eu entendo que deve preceder á desamortisação uma medida que estabeleça a devida proporcionalidade na distribuição dos passaes, para que quando se desamortisarem, se distribuam os titulos da divida publica de modo que essas desigualdades não continuem (apoiados).
Aqui têem a meu ver uma rasão logica e justa do adiamento da desamortisação dos passaes (apoiados). Além disso a minoria da commissão dá outras rasões geraes que são obvias, e que a prudencia não deixa de aconselhar em medidas d'esta ordem; prudencia aliás altamente salutar com a qual, não só debaixo do ponto de vista economico, mas financeiro, se tem ido caminhando successivamente; porque só acaso o governo, convicto d'essa idéa, quizesse de um jacto levar esta reforma por diante, talvez não estivesse prevenido para o resultado, e achasse difficuldades que o obrigassem a adiar a resolução d'esta questão.
O que aconselha pois a prudencia? A que muitas d'estas reformas se vão fazendo successivamente dentro de um certo periodo. E necessario pois dar-lhes um praso mais longo. A prudencia aconselha que n'estas medidas se caminhe successivamente, que é o que se tem feito. Hoje desamortisa-se uma certa porção de bens, e ámanhã desamortisa-se o resto (apoiados).
Diz-se que esta resistencia não tem o valor que se lhe pretende dar. Não entrarei agora n'esta questão; mas entendo que se póde adiar a applicação d'estas doutrinas sem prejuizo da mesma medida para occasião mais opportuna, evitando todos os attritos na sua execução, a que acho sempre bom; alem do que todos concordam que é necessario proceder-se a certos trabalhos preparatorios para se fazer a desamortisação (apoiados).
O adiamento tambem não prejudica a execução d'esta medida, porque esses inventarios a que se tem de proceder póde o governo manda-los fazer, quer a lei tenha de ser desde já applicada, quer não. Portanto a execução d'este principio na occasião opportuna não é de modo nenhum prejudicada pelo adiamento (apoiados).
Eu gosto de definir bem francamente as minhas opiniões, por isso direi tambem que não ligo esta questão da desamortisação dos passaes com a questão da dotação do clero. Comquanto respeite muito as opiniões em sentido contrario, entendo que a desamortisação dos passaes não deve prender com a dotação do clero, não se devem ligar estas duas questões (apoiados).
E a respeito da dotação do clero, quando tive a honra de estar nos conselhos da corôa, já então sustentei a opinião de que essa dotação não deve figurar no orçamento do estado; e ainda a sustento hoje, porque as circumstancias não mudaram, nem ha motivo algum para que eu mude de opinião.
Eu entendo que nas circumstancias em que nos achâmos não devemos sobrecarregar o nosso orçamento (muitos apoiados), e portanto não admitto por inconveniente o systema da dotação do clero, que importa a necessidade de se consignarem no orçamento as sommas necessarias para satisfazer a esse encargo (apoiados).
Julgo preferivel distribuir os passaes mais equitativamente.
(Áparte que se não ouviu.)
Se devem ser conservados os rendimentos de pé de altar, ou se devem acabar, é outra questão, e não entro n'esta.
Como dizia, julgo preferivel distribuir os passaes mais equitativamente, e o que faltar ser pago pelas localidades do modo mais conveniente (apoiados).
Se entendem que não é conveniente serem as derramas, serem as congruas que se pedem para os parochos, recebidas directamente por elles, distribuam-se de outro modo que não ponha tanto em contacto o parocho com os freguezes; mas continue o pensamento das mesmas leis que fazem com que as localidades paguem ao seu parocho o que elle precisa para sua sustentação, e não vá figurar no orçamento do estado uma nova verba para essa dotação, porque eu acho que isso aggravaria muito o nosso estado financeiro (apoiados).
Portanto eu manifesto desde já esta opinião, que hei de sustentar quando essa questão aqui vier; mas entendo que a desamortisação não tem nada com esta questão (apoiados).
O governo comprometteu-se perante a commissão, e esta idéa consignou-se expressamente n'um artigo, a apresentar na sessão immediata uma proposta de lei que comprehendesse a applicação do principio da desamortisação em toda a sua amplitude, applicada a todos os bens e direitos prediaes que podem e devem ser desamortisados, porque ha de vir d'ahi uma grande utilidade publica (apoiados).
Se o governo não apresentar essa proposta, eu pela minha parte como deputado hei de tomar a iniciativa d'ella. (Vozes: — Muito bem.)
Agora pelo que respeita a comprehenderem-se n'uma excepção as habitações dos parochos, entendo que não ha ninguem que o não queira (apoiados); creio que não ha ninguem que queira negar aos parochos uma casa de habitação com um quintal ou uma horta (apoiados); todos concebem a necessidade de se lhes dar isto (apoiados); na proposta do sr. Freitas e Oliveira não vinha consignada esta idéa...
(Interrupção do sr. Freitas e Oliveira.)
Eu entendo, e creio que entende a camara toda, que ha provincias onde é essencial que o parocho tenha a sua casa e a sua horta ou quintal (apoiados), portanto não se podia deixar de consignar esse principio, mas ou se havia de definir a area da cêrca ou quintal, ou se havia do deixar o arbitrio ao governo para o fazer.
E demais o arbitrio já estava consignado nas leis vigentes, e foi consignado na proposta que á camara apresentou o sr. Dias Ferreira, quando ministro da fazenda.
Disse tambem um illustre deputado que se admirava de que a minoria da commissão dissesse no § 1.° do artigo que não são comprehendidas na disposição do mesmo artigo as casas de residencia dos individuos a que elle se refere, e os terrenos que o governo julgar indispensaveis para goso e serviço d'elles, em vez de dizer para uso do publico, como se dizia na primeira proposta.
A admiração do illustre deputado n'esta parte procede do s. ex.ª não ter prestado toda a sua attenção ao que dizem as duas propostas, porque, se não fosse assim, facilmente comprehenderia que a primeira proposta se referia aos estabelecimentos de instrucção publica, como, por exemplos o jardim botanico da universidade de Coimbra, a cêrca da escola polytechnica e outros, emquanto a segunda se refere especialmente á residencia dos parochos; portanto aquella referencia ao uso publico dizia respeito aos estabelecimentos e não aos individuos (apoiados). Nem se concebe como, concedendo-se um bocado de terra aos parochos, se pretenda que se dissesse que era para uso do publico; nós não podiamos estabelecer na lei uma disposição que não tinha um sentido racional e pratico (apoiados). Nós lemos todas as leis que havia a este respeito e definimos as cousas como deviam ser.
Tambem se notou uma contradicção do sr. ministro da fazenda, que disse aqui, quando deputado, que por esta disposição se ía dar ao governo uma auctorisação de que elle podia fazer uma terrivel arma eleitoral.
O nobre ministro já aqui disse, n'outra occasião, que todos tinham o seu capitulo maior ou menor no livro das contradicções (riso). Não sei se o nobre ministro tem ou não mais outro capitulo; creio que sim (riso). S. ex.ª é mais competente, para responder n'este ponto, do que eu; e por isso não me compete tomar a sua defeza.
Mas o que tambem é certo é que o illustre orador, que accusou o sr. ministro da fazenda de ter este capitulo no livro das contradicções, inscreveu ao mesmo tempo n'esse livro um novo capitulo que lhe diz respeito (riso), porque, como membro da commissão, e não sei mesmo se como seu relator, assignou o parecer que approva o projecto da desamortisação do sr. Dias Ferreira, onde vem consignadas as mesmas condições, deixando o arbitrio ao governo de poder designar os terrenos que houvessem de ser subtrahidos á desamortisação.
S. ex.ª n'essa epocha não lhe achou os perigos que lhe acha agora (riso). Portanto é uma questão de confiança politica, e não dê doutrina, nem podia dizer que o era, porque s. ex.ª já julgou que não havia esses inconvenientes doutrinaes no principio de conceder essa auctorisação ao governo, e entendeu que era este o melhor meio pratico d'elle se realisar. Portanto, se s. ex.ª entendeu que era este o melhor meio pratico de se realisar aquelle principio, não se admire de que outros o entendam tambem assim.
O illustre deputado vê agora as cousas de modo diverso; lá foi escrever um capitulo seu no livro das contradicções.
Todos nós as temos. O espirito humano está sujeito a estas fraquezas. As questões variam segundo as circumstancias e segundo o modo de as encarar, e a final todos têem mais ou menos capitulos no livro das contradicções.
A questão é que todos as tenhamos com a intenção de concorrer para o bem publico (apoiados).
O que é muito melhor é evitar estas recriminações, porque, se todos mais ou menos têem estas contradicções, o melhor é que todos se calem e tratem de acertar (apoiados).
Mais nada direi a este respeito. A camara avalia perfeitamente a questão. Não se trata de uma reconsideração. Consigna-se o principio da desamortisação obrigatoria dos passaes n'esta lei; de que se trata é apenas de uma questão secundaria, a de adiar a execução da lei, n'esta parte, para uma epocha proxima e definida; e parece-me que com estas condições a camara póde votar dignamente, resolvendo uma cousa que é de utilidade publica (apoiados).
Tenho concluido.
O sr. Pedro Franco: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se quer que se prorogue a sessão até se votar este parecer (apoiados).
Muitas vozes: — Votos, votos.
Foi approvado este requerimento.
O sr. Mardel: — Em vista da manifestação da camara,
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peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se julga a materia sufficientemente discutida (muitos apoiados). Foi approvado este requerimento.
O sr. Presidente: — Peço a camara que attenda bem qual o modo por que eu julgo que se deve votar o parecer da maioria da commissão: se as minhas idéas não forem approvadas, então, darei a palavra sobre o modo de propor a quem a pedir.
O artigo 1.° do parecer da maioria da commissão, parece-me que é a mesma cousa que o artigo 1.° do parecer da minoria (apoiados).
O sr. Santos e Silva: — Peço a palavra por parte da commissão.
O sr. Presidente: — Deixe-me a camara acabar a minha exposição.
Primeiramente deve pôr-se á votação o artigo do parecer da maioria da commissão; portanto póde entrar em duvida, se, rejeitado elle, importa esta rejeição a rejeição do § 2.° Entretanto eu creio que a desamortisação todos a querem (apoiados — não apoiados).
(Alguns srs. deputados pedem a palavra sobre o modo de propor.)
O sr. Santos e Silva: — Se v. ex.ª me dá licença, direi por parte da commissão duas palavras que talvez esclareçam a votação.
O sr. Presidente: — Tem a palavra.
O sr. Santos e Silva: — Por parte da maioria da commissão não ha duvida alguma em adoptar o artigo da minoria, áparte os dois §§.
Já V. ex.ª vê que por esta simples exposição temos talvez metade das difficuldades resolvidas.
Por consequencia eu proponho que o artigo da minoria da commissão seja substituido ao da maioria, áparte os §§, e que depois, pelo que diz respeito a esses §§, haja votação em separado sobre cada um d'elles (apoiados).
O sr. Freitas e Oliveira: — E eu requeiro que em relação ao segundo haja votação nominal.
O sr. Mathias de Carvalho (sobre o modo de propor): - Parece-me que se não póde pôr á votação senão o parecer da maioria da commissão, porque o parecer da minoria não passa de ser um voto em separado (apoiados). Deve votar-se primeiro o parecer da maioria da commissão, e depois d'elle rejeitado é que se póde submetter á votação o da minoria.
(Susurro).
Vozes: — A maioria retirou-o.
O Orador: — Decida a camara como entender em sua alta sabedoria, mas parece-me muito mais regular que se submetta á votação o parecer da maioria da commissão, e, se a camara o não approvar, então se tratará do voto em separado da minoria.
O sr. Cortez (sobre o modo de propor): — Pedi a palavra para fazer uma proposta analoga á que acaba de fazer o meu collega o sr. Mathias de Carvalho.
Eu creio que v. ex.ª não póde pôr á votação senão o parecer da maioria da commissão, e, no caso d'elle não ser approvado, então é que póde ser votado o outro parecer.
De outra maneira podem dar-se confusões, que não devem existir sobre esta materia, que é muitissimo importante.
O sr. Arrobas (sobre o modo de propor): — O que os srs. deputados estão a dizer é muito bom em principio e em geral, mas descendo-se á especialidade, não se póde fazer o que ss. ex.ªs propõem, porque a commissão declarou por intermedio do seu relator...
Uma voz: — Mas não declarou a camara.
O Orador: — A camara não tem nada que declarar. Se a camara tem prazer em querer rejeitar o que esta retirado por quem o apresentou, é outra cousa; mas, se quer votar utilmente, não póde votar como dizem os illustres deputados.
Quer dizer: retiramos o artigo 1.° do nosso parecer e substituimo-lo pelo do parecer da minoria, e é preciso que a camara saiba que não ha aqui contradicção, porque o que adoptamos é apenas, em logar da redacção do artigo 1.° do parecer da maioria da commissão, a redacção do artigo 1.° do parecer da minoria, que é em que consiste a differença.
Se fazemos esta adopção, não hão de aceita-la? Do contrario é querer ter o prazer de estar a rejeitar o que não existe.
O sr. Pereira Dias (para um requerimento): — O que isto é sabe-o muito bem o sr. Arrobas, e eu sei-o tambem; e por isso creio que é escusado haver uma discussão sobre este assumpto. Póde dizer-se a um ou a outro individuo, que não tem o habito das cousas e o conhecimento d'esta casa, que não sabe como ás vezes os negocios se dirigem no parlamento...
O sr. Presidente: — O sr. deputado não póde fundamentar o seu requerimento.
O Orador: — Isto é uma questão prévia. Póde dizer-se, repito, que isto é uma simples cousa, que é innocente apparecer o relator da commissão por parte da maioria e dizer: «Peço á camara que substitua o parecer da maioria pelo parecer da minoria, ou pelo voto em separado da minoria.» Entretanto, como eu sei o alcance d'isto, e como sei ao mesmo tempo que devo contar como adversarios n'esta questão os illustres signatarios do parecer da maioria da commissão, peço por isso á camara exactamente o contrario (apoiados) daquillo que os illustres deputados querem.
E necessario que se saiba que não se póde fallar aqui em parecer da minoria; aqui não ha parecer senão da maioria (apoiados); o que apparece aqui é um voto em separado assignado por quatro membros da commissão de fazenda, voto que é justificado, e nada mais.
Por consequencia a camara o que deve votar primeiro é o parecer da maioria (apoiados); se elle for approvado, esta a questão resolvida; se elle for rejeitado, iremos então submetter á votação o voto em separado da minoria. Isto é o que se tem feito sempre.
Entretanto, para resolver a questão, eu requeiro que v. ex.ª consulte a camara sobre se quer ou não votar primeiro o parecer da maioria da commissão (apoiados).
O sr. José de Moraes (para um requerimento): — O meu requerimento é o seguinte:
«Requeiro a v. ex.ª que consulte" a camara sobre se quer votar o parecer da maioria da commissão, porque a commissão não póde retirar o parecer sem consentimento da camara.»
Não se retira um parecer pelo bello arbitrio de um deputado. V. ex.ª não tem mais nada a fazer do que pôr á votação da camara o parecer da maioria da commissão.
O sr. Santos e Silva: — Eu retiro o meu pedido em nome da commissão.
O sr. Presidente: — Os senhores que são de voto que se vote primeiro o parecer da maioria tenham a bondade de se levantar.
Decidiu-se affirmativamente.
O sr. Faria Pego: — Requeiro votação nominal sobre este parecer.
Foi approvado este requerimento. Feita a chamada
Disseram approvo os srs.: Alvaro Seabra, Ferreira Pontes, A. J. Pinto de Magalhães, A. L. Seabra Junior, Barreiros Arrobas, Lopes Branco, B. F. Abranches, E. Tavares, F. M. da Rocha Peixoto, Van-Zeller, Freitas e Oliveira, Jeronymo Pimentel, J. A. Judice, Santos e Silva, José Maria de Magalhães, Joaquim Pinto de Magalhães, Dias Ferreira, Achioli de Barros, Sá Carneiro, Coelho do Amaral, Manuel Bento da Rocha Peixoto, Motta Veiga, Lavado de Brito, Franco; P. M. Gonçalves de Freitas, Sebastião do Canto, Costa e Silva, Faria Pinho, Tiberio.
Disseram rejeito os srs.: Annibal, Braamcamp, Alves Carneiro, Costa Simões, Ferreira de Mello, Villaça, Sá Nogueira, Falcão de Mendonça, Azevedo Lima, A. J. da Rocha, A. J. de Seixas, Magalhães Aguiar, Faria Barbosa, Torres e Silva, Montenegro, Barão da Trovisqueira, Belchior José Garcez, Cunha Vianna, B. Francisco da Costa, Custodio Joaquim Freire, Pereira Brandão, F. da Gama, Fernando de Mello, F. F. de Mello, Albuquerque Couto, Silva Mendes, Gavicho, Bicudo Correia, Silveira Vianna, Gaspar Pereira, Rolla, G. de Barros, Noronha e Menezes, Faria Blanc, Silveira da Motta, Innocencio de Sousa, Almeida Araujo, Matos Camara, Assis Pereira de Mello, Gaivão, Cortez, J. Manuel da Cunha, Calça e Pina, Fradesso, Thomás Lobo d'Avila, Gusmão, Xavier Pinto, Bandeira de Mello, Costa e Lemos, Mardel, Sette, Correia de Oliveira, Carvalho Falcão, Teixeira Marques, Vieira de Sá, Toste, Mesquita da Rosa, José de Moraes, Prazeres Batalhoz, Lourenço de Carvalho, Ferreira Junior, Penha Fortuna, Aralla e Costa, Pereira Dias, Quaresma, Mathias de Carvalho, Botelho de Sousa, Raymundo Rodrigues, Ricardo de Mello, Deslandes, Vicente Pinto, Visconde dos Olivaes.
Foi portanto rejeitado o parecer por 73 votos contra 29.
O sr. Freitas e Oliveira (sobre o modo de propor): — Creio que a votação a que v. ex.ª vae proceder agora esta completamente prejudicada. O artigo da minoria da commissão ficou completamente prejudicado pela votação que a camara acaba de fazer (apoiados).
Vozes: — Nada, nada.
(Grande susurro.)
O Orador: — Se os cavalheiros que votaram contra o parecer da commissão tinham em vista que ficava decretada a desamortisação obrigatoria dos passaes, não deviam ter votado contra este artigo) da maioria da commissão (apoiados). O artigo da maioria da commissão diz que fica desde já obrigatoria a desamortisação dos passaes, e o artigo da minoria da commissão diz o mesmo, dando mais amplitude á medida.
Vozes: — Mas não diz desde já.
O Orador: — Se não diz «desde já» para que é o §? (apoiados). O § diz que fica suspensa. Se lá não esta a clausula «desde já» entende-se que a desamortisação fica para mais tarde. Logo o § é inutil (apoiados). O artigo da maioria da commissão é exactamente o mesmo, com a differença que o da minoria queria mais; queria que a desamortisação fosse mais adiante do que quer a maioria. Portanto uma votação prejudica a outra; e se uma votação não prejudicava a outra, era preciso que os cavalheiros que, querem a desamortisação votassem por uma, e fossem depois votar pela outra. Aquelles que não votaram pelo menos, e querem votar pelo mais, votem o parecer da minoria da commissão (apoiados). Se a camara porém entende que esta votação não prejudica a outra, então requeiro a v. ex.ª que sobre os artigos do parecer da minoria da commissão, assim como sobre o seu ultimo §, a votação seja tambem nominal (apoiados).
O sr. Presidente: — Vou pôr a votação o artigo, separado dos seus §§ (apoiados).
Vozes: — Nada, nada, juntos.
(Grande susurro.)
O sr. Santos e Silva (sobre o modo de propor): — Eu, sem aceitar as rasões na sua totalidade, apresentadas pelo sr. Freitas e Oliveira, e para não gastar tempo á camara, declaro que aceito as suas conclusões, ou o seu pedido final, para que haja duas votações sobre este artigo. A primeira deve versar sobre o artigo 2.° propriamente dito, e a segunda votação sobre o § 2.°, por virtude do qual fica suspensa a execução do mesmo artigo. E isso que eu proponho, e peço a v. ex.ª que o submetta á deliberação da camara; e desde já dou a este meu pedido o caracter de requerimento para ser preferido na votação.
O sr. Freitas e Oliveira: — Eu requeiro que artigo seja separado do §, por isso que rejeito o §.
O sr. Pereira Dias: — Peço de novo á camara que preste toda. a sua attenção a este negocio.
É necessario que se saiba que tanto o parecer da maioria da commissão, como o voto em separado dos quatro membros da mesma commissão, constituem duas entidades unicas, e a camara o que resolveu foi que cada uma dellas fosse votada separadamente (apoiados).
E não esta assim prejudicado o parecer da minoria da commissão, por ter a camara rejeitado o parecer da maioria. (Vozes: — E verdade.)
Do mesmo modo que não se votou em separado o § unico do artigo que nos apresentou a maioria da commissão, tambem não podemos de maneira nenhuma votar separadamente o artigo 2.° e os seus §§ do parecer da minoria. Se nós agora votassemos separadamente o artigo 2.°, o que queria isso dizer? Que rejeitávamos a votação que ha pouco fizemos.
O sr. Freitas e Oliveira: — Por consequencia é inutil o artigo.
O Orador: — Mas não separe V. ex.ª o artigo 2.° dos §§, do voto da minoria da commissão. O artigo 2.° e os §§ formam o parecer da minoria, e esse parecer é que nós votâmos agora (apoiados).
É necessario que a camara saiba que n'esta votação póde haver tres pensamentos distinctos. (Uma voz: — E ha.)
Póde haver deputados que queiram a desamortisação obrigatoria desde já (apoiados). Esses são aquelles que votaram a favor do parecer da maioria.
Póde haver deputados que queiram a desamortisação obrigatoria, não desde já, mas como a formula a minoria da commissão (apoiados).
E póde haver outros, e ao numero d'esses pertenço eu, que não querem nem o parecer da maioria, nem o da minoria (apoiados).
Logo é escusado repetir a votação que já teve logar. Votando-se todo o parecer da minoria, aquelles que queriam a desamortisação obrigatoria desde já, e que já se declararam, votam contra o parecer. Aquelles que rejeitaram a desamortisação obrigatoria desde já, e que tambem a rejeitam para janeiro, votam contra o parecer. E aquelles que querem a desamortisação obrigada, mas adiando-se para janeiro, votam a favor do parecer (apoiados).
O sr. Presidente: — Vou pôr á votação o requerimento do sr. Santos e Silva.
Uma voz: — Já o retirou.
Vozes: — Votos, votos.
O sr. Presidente: — O sr. Santos e. Silva retira o seu requerimento?
O sr. Santos e Silva: — V. ex.ª pede isso com algum empenho?
O sr. Presidente: — Não, senhor; ouvi dizer que o tinha retirado...
O sr. Santos e Silva: — Eu tenho quasi por habito obedecer a v. ex.ª, por consequencia retiro o meu requerimento.
O sr. Arrobas: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se quer votar como propõe o sr. Pereira Dias (apoiados).
(Agitação na assembléa.) Vozes: — Ordem, ordem.
O sr. Barão da Trovisqueira: — Requeiro que se consulte a camara sobre se quer que se proponha o artigo á votação separado dos §§.
(Susurro.)
O sr. Faria Rego: — Peço a palavra.
O sr. Presidente: — Eu vou consultar primeiro a camara a respeito do requerimento do sr. Pereira Dias, em que s. ex.ª propõe que a votação se faça em globo, isto é, comprehendendo o artigo e seus §§ (muitos apoiados).
Consultada a camara, decidiu que a votação se fizesse em globo.
O sr. Cortez: — Requeiro que se consulte a camara sobre se é de opinião que a votação sobre o artigo e seus §§ seja nominal.
A camara decidiu affirmativamente. Feita a chamada
Disseram approvo— os srs. Annibal, Braamcamp, A. J. da Rocha, Torres e Silva, Montenegro, Cunha Vianna, C. J. Freire, Pereira Brandão, F. da Gama, F. F. de Mello, Albuquerque Couto, Silva Mendes, Gavicho, Bicudo Correia, Gaspar Pereira, Guilhermino de Barros, Blanc, Silveira da Motta, I. J. de Sousa, Gaivão, Cortez, Calça e Pina, J. T. Lobo d'Avila, Gusmão, Xavier Pinto, Carvalho Falcão, Teixeira Marques, Vieira do Sá Junior, Rodrigues de Carvalho, Toste, Rosa, José de Moraes, Batalhoz, L. de Carvalho, R. V. Rodrigues, Visconde dos Olivaes.
Disseram rejeito — os srs. A. E. de Seabra, Alves Carneiro, Ferreira de Mello, Villaça, Azevedo Lima, A. L. de Seabra Junior, Arrobas, A. Pinto de Magalhães, Aguiar, Faria Barbosa, Lopes Branco, Barão da Trovisqueira, Garcez, Abranches, E. Tavares, Fernando de Mello, F. M. da Rocha Peixoto, Silveira Vianna, Van-Zeller, Rolla, Noronha e Menezes, Freitas e Oliveira, Homem e Vasconcellos, Almeida Araujo, Santos e Silva, Matos e Camara, Assis Pereira de Mello, J. M. da Cunha, Fradesso da Silveira, J. Pinto de Magalhães, Bandeira de Mello, Costa Lemos, Mardel, Sette, Carneiro de Oliveira, Dias Ferreira, Sá Carneiro, Alves Ferreira Junior, M. B. da Rocha Peixoto, Motta Veiga, Penha Fortuna, Aralla e Costa, Pereira Dias, Lavado de Brito, Pereira de Lacerda, Mathias de Carvalho, Paulino e Sousa, P. A. Franco, P. M. Gonçalves de Freitas, Ricardo de Mello, Deslandes, Vicente Carlos, Costa e Silva, Pinho, Tiberio.
Foi portanto rejeitado o artigo 2° e os §§ do parecer da minoria da commissão por 54 votos contra 37.
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O sr. Teixeira Marques: — Uma vez que a sessão esta prorogada parece-me que poderia agora usar da palavra para dar algumas explicações...
Uma voz: — A sessão estava prorogada, mas era para a votação.
O Orador: — N'esse caso peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se me permitte dizer agora duas palavras.
Vozes: — Falle, falle.
O sr. Teixeira Marques: — Depois da declaração do illustre relator da commissão, em virtude da qual queria s. ex.ª retirar o artigo por que termina o parecer da maioria, e substitui-lo pelo da minoria, podia eu forrar-me ao dever de dar estas explicações; s. ex.ª hontem acoimou-me de incoherente dizendo que — a commissão, á excepção da minha pessoa, tinha cumprido a sua palavra! — Mas desde o momento em que s. ex.ª declarou que o artigo do parecer da minoria era o mesmo, era igual ao da maioria, e por isso o adoptava como substituição, claro esta que não existe a contradicção que até aqui se tem querido indicar. Isto é, maioria e minoria, na questão fundamental, estão perfeitamente de accordo.
S. ex.ª dizia hontem que —não entrava no debate, porque se achava opprimido pela bills, assim como tambem se sentia um pouco perturbado na sua rasão. Effectivamente parece que s. ex.ª, de ha um mez a esta parte, tem dado provas de que anda repleto de bills, e então precisava atacar um individuo que nunca lhe fez mal (apoiados). Póde ser que alguma vez o meu voto se não prestasse a qualquer plano secreto que s. ex.ª tivesse em vista; mas o illustre deputado póde tambem ter a certeza de que nunca hei de sacrificar o meu voto e a minha consciencia á realisação dos seus planos. Offendi-o por isso?
Por mais que medite, não me recordo de um unico facto, pelo qual possa suppor que o sr. Santos e Silva tenha motivos para me aggredir! E não obstante fê-lo!
Disse s. ex.ª, repito, — toda a commissão cumpriu a sua palavra, á excepção de um membro—. É preciso que eu diga quem foi versátil nas suas opiniões, e que o diga bem alto, trazendo para aqui factos que se passaram na commissão de fazenda. Auctoriso-me para isso com os precedentes de s. ex.ª e de outros illustres oradores, que têem vindo á tribuna revelar factos passados no gabinete da commissão de fazenda, e mesmo porque me parece que as sessões da commissão não são secretas. A commissão de fazenda ou outra qualquer representa uma delegação da camara e representando uma delegação da camara os seus actos necessariamente devem ser patentes á mesma camara.
Que se fez? Eu digo. O ministerio passado apresentou aqui uma proposta sobre desamortisação. Votei essa proposta sem a menor declaração, e talvez fosse esse o unico projecto da situação passada que votasse com enthusiasmo, porque achava n'elle um grande alcance financeiro; talvez que outras pessoas não tivessem a mesma opinião.
Depois o governo transacto reconheceu os attritos e as difficuldades que tinha a vencer, não só pela cotação das inscripções a 50 por cento, mas, e muito especialmente, por causa da desamortisação obrigatoria dos passaes dos parochos. E o que fez? Pediu o adiamento da sessão, e este adiamento importava o da questão (apoiados). Até quando? Até á proxima reunião do parlamento (apoiados). O adiamento da camara importava necessariamente o adiamento da questão (apoiados). Era uma cousa clara.
E n'essa occasião não se levantaram os escrupulos dos homens dos principios, dos homens que pugnam pelos santos principios da liberdade, não se levantaram para condemnarem o procedimento do governo, e agora, quando se trata de adiar a mesma questão, talvez pelos mesmos motivos por que se adiava então, é que elles lhes vieram! E por que se dão esses escrupulos? Vou contar á camara o que aconteceu, não commento, e se acaso proferir alguma expressão menos conveniente, desculpem-m'a, porque não esta no meu proposito, não quero, nem desejo faltar ao respeito que tenho a esta camara em geral, e a qualquer dos seus membros em particular.
O governo actual, vendo que não podia fazer passar a lei da desamortisação tal como estava, diante das difficuldades que se levantaram, apresentou outra proposta em que subtrahia á acção da desamortisação os passaes, e não incluia as inscripções cotadas a 50 por cento.
Foi esta proposta presente á commissão de fazenda, e a commissão declarou que a approvava porque não queria levantar obstaculos nem difficuldades ao governo; mas declarou tambem que, se acaso na camara se apresentasse algum additamento tornando extensiva a desamortisação aos passaes, a commissão o aceitaria.
Effectivamente assim se fez. Veiu o parecer da commissão sobre esta proposta do governo; na discussão porém o sr. Rodrigues de Azevedo apresentou um additamento para serem comprehendidos os passaes. Esse additamento foi votado pela camara, e no dia. seguinte apresentou-se o illustre deputado, auctor do additamento, explicando o que queria dizer aquella votação. O sr. relator da commissão declarou o seu voto no mesmo sentido. Eu votei sempre em principio a desamortisação dos passaes.
Houve outra reunião na commissão de fazenda em que se pediu a interpretação que commissão dava á proposta do sr. Rodrigues de Azevedo. A esta sessão assisti eu conjunctamente com os meus collegas, e a commissão disse que não podia dar-se outra interpretação senão aquella que se tinha dado, e unica aceitavel, de que a desamortisação dos passaes era obrigatoria.
No dia immediato houve outra reunião da commissão de fazenda, a ultima. Apresentaram-se então as emendas feitas por alguns srs. deputados ao projecto da commissão, e entre ellas a do sr. Freitas e Oliveira. Foram rejeitadas todas, á excepção da do sr. Freitas e Oliveira.
N'essa occasião o illustre relator da commissão, que me accusa de incoherente, apresentou-se perante a commissão com dois pareceres, sendo um aquelle que o illustre relator assignou e apresentou á camara, e outro para a hypothese contraria, isto é, para o adiamento puro e simples, não obstante ter-se votado na camara outra cousa...
O sr. Santos e Silva: — É menos exacto.
O Orador: — E exacto, e este parecer esta em meu poder; eu vou lê-lo á camara, e peço aos srs. tachygraphos que o transcrevam. O parecer do sr. Santos e Silva diz o seguinte:
«São pois attendiveis as rasões produzidas pelo sr. ministro da fazenda, mas a commissão não póde nem deve prescindir de um principio por ella claramente professado, como é a desamortisação obrigatoria dos passaes. Entretanto de um principio á sua applicação vae a distancia que a opportunidade e as circumstancias politicas, em certos casos, podem crear.
«A commissão, attendendo a que o governo, perante ella, se comprometteu solemnemente a apresentar, na proxima sessão legislativa, uma proposta de lei que torne obrigatoria a desamortisação dos passaes dos parochos, regulando a applicação d'este principio, e estendendo-o a outros bens e direitos prediaes, é de parecer que tão importante materia seja adiada para a proxima sessão legislativa.»
A conclusão d'este parecer foi pelo sr. presidente da com, missão posta igualmente á votação...
O sr. Santos e Silva: — Eu já vou explicar-me.
O Orador: — Pediu-se o voto do sr. Faria Guimarães, rejeitou; seguiu-se depois o sr. Faria Blanc, votou a favor do adiamento; depois seguiu-se o sr. Santos e Silva, e este senhor disse que se reservava para votar a final, porque seguiria a opinião da maioria. Por ultimo cumpriu a sua palavra, rejeitando o adiamento, e dando o seu voto em favor da proposta do sr. Freitas e Oliveira!!!
Eis-aqui esta o voto consciencioso do sr. Santos e Silva. Se s. ex.ª não tivesse atacado o meu procedimento, não ouviria isto.
Seguia-me eu a votar em quarto logar, e declarei que no estado em que a questão se apresentava era muito difficil dar desde já o meu voto. Effectivamente não votei nem o parecer da maioria, nem o da minoria, e pedi um praso para pensar, como têem feito muitos srs. deputados.
Depois de ter meditado votei com a minoria.
Lembra-me bem que, quando se tratou da questão do caminho de ferro de sueste, o sr. Santos e Silva, na primeira sessão da commissão de fazenda não votou, e em outra sessão disse: «preciso esclarecer-me sobre o verdadeiro merito do contrato, porque não sei se será melhor votar um contrato mau, ou fazer caír o ministerio». Depois veiu e votou a favor do contrato! Eu votei contra, e votando eu assim, diz s. ex.ª que caí em grande contradicção! Está enganado, não fui contradictorio então, nem agora, como foi s. ex.ª A prova é que s. ex.ª veiu hoje pedir á camara a substituição do artigo, por que acabava o parecer da maioria, pelo artigo por que termina o parecer da minoria!
Agora com respeito a uma expressão que hontem o sr. Santos e Silva soltou, relativamente ao que eu tinha dito, fazendo-se como que zelador da minha palavra, declaro aqui e em toda a parte que a rejeito.
(O orador não reviu este discurso).
O sr. Santos e Silva (para explicações): — Querer o illustre deputado attribuir-me coleras que eu não tenho, é fazer-me uma graça que eu não aceito. S. ex.ª é que acaba de dar uma prova á camara, que as está exhalando por toda a parte. Felizmente eu e a camara temos esperanças de que passadas vinte e quatro horas s. ex.ª esteja restabelecido do seu grave incommodo, porque estes desabafos trazem taes resultados que são sempre muito uteis (apoiados).
O illustre deputado, emquanto não desabafasse, estaria sempre alterado, mas ámanhã é provavel que esteja melhor, e até bem commigo.
Tenho a declarar a s. ex.ª que esta equivocado. É o que costuma produzir a tal cólera. Eu não disse que o illustre deputado tinha faltado ao seu dever e á sua palavra; disse que a maioria da commissão tinha cumprido o seu dever e a sua palavra.
O sr. Teixeira Marques: — Referiu-se pessoalmente a mim.
O Orador: — Referi-me para contar os factos como se passaram, o sem dizer que o illustre deputado tinha deixado de cumprir o seu dever; e até me parece que no meu discurso haverá alguma expressão d'onde se collija que eu não quiz emittir opinião alguma a esse respeito. Deixei essa apreciação á camara, e omitti o meu juizo.
Não tive pretensões a exercer tutelas, e portanto não tem nada a rejeitar, como o pretendeu fazer com tão grande indignação.
Emquanto a um papel, que deitei para baixo da mesa na commissão de fazenda, e foi apanhado não sei por quem...
O sr. Teixeira Marques: — Não deitou para baixo da mesa, foi votado.
O Orador: — Foi votado? Votado o que? Eu explico á camara como este negocio se passou.
Ventilara-se na comissão de fazenda, se se devia ou não aceitar uma emenda, para consignar no projecto n.° 1 a desamortisação obrigatoria dos passaes. Dividiram-se as opiniões; uns pugnavam pelo principio, outros inclinavam-se para as rasões de opportunidade produzidas pelo sr. ministro da fazenda. O que lá se não discutiu foi a idéa que a minoria consignou no seu parecer. Ou a desamortisação effectiva e obrigatoria desde já, ou um adiamento definido e limitado até á proxima sessão legislativa; foi sobre isto que versou a discussão.
Quando a discussão ía em certa altura, pedi eu licença para ler o meu parecer, acrescentando que, se a maioria não o aceitasse, teria de aceitar o adiamento, fundamentado em taes e taes rasões, que então expuz, e que acabava de apontar a lapis n'um bocado de papel. Tudo isto devia ter sido presenciado pelo illustre deputado, que se sentava junto de mim. E pois menos exacta a affirmativa do illustre deputado, quando disse, que eu trazia dois pareceres feitos de casa. Até creio, que mostrei ao illustre deputado o meu borrão na occasião em que o fiz, antes de o ler á commissão. Declarei tambem que estava disposto a seguir a opinião da maioria, e a relatar um parecer em conformidade com as suas decisões. Foi por isso que me reservei para votar no fim. Eram estes os meus compromissos; eram estes os compromissos, creio eu, do nobre deputado. A camara apreciará quem fallou á sua palavra, quem faltou ao seu dever e quem reconsiderou. Não fiz, nem faço, observações n'este sentido.
A sessão terminou, aceitando a maioria o meu parecer e a moção, para se consignar na lei a desamortisação obrigatoria dos passaes. Perguntei aos illustres dissidentes, se queriam que se fizesse menção, no parecer, do seu voto em separado. Tres disseram que sim. O sr. Teixeira Marques ficou suspenso.
O tal papel que ficou debaixo ou em cima da mesa tornou-se uma cousa inutil, e se foi discutido ou votado, foi de certo rejeitado por mim. Aqui tem a camara o tal famoso documento, com que o illustre deputado me quer fulminar. É uma cousa que eu rejeitei, é uma cousa que, se tem dono, não pertence de certo a s. ex.ª, para vir aqui fazer uso d'ella. Entretanto eu não reclamo direitos de propriedade. Aquillo não compromette nem liga ninguem. Nem lá está o meu nome, nem lá estão as minhas opiniões. Era trabalho adiantado para uma hypothese, que se não realisou. Era um borrão, era um rascunho a lapis, sem formalidades e sem assignatura. O illustre, deputado apanhou-o ou alguem lh'o forneceu, para me vir fazer carga com uma cousa que não é sua. A camara avaliará o que valem armas d'esta natureza.
Mas vamos á questão. O que tem o tal papel com o parecer da minoria? Nada. Um adiamento definido, em presença de qualquer rasão de estado, que me podesse convencer, poderia eu aceitar; mas um parecer, cujos considerandos estão a brigar com as conclusões, e cujo artigo esta a brigar com os seus §§, isso é que é inaceitavel, isso é que é contradictorio.
Disse o illustre deputado que a camara não aceitára o parecer da maioria da commissão; mas eu posso tambem responder ao sr. deputado que a camara acaba de demonstrar a consideração em que tem pareceres tão logicos e tão sensatos, como o da minoria.
A camara rejeitou-o apesar de vir escudado com a protecção do governo. Repito, se a maioria dos meus collegas da commissão de fazenda tivesse adoptado um adiamento definido, fundado em rasões serias, aceita-lo-ía. O que ninguem póde aceitar é um artigo contradictorio, que garrota n'um § o principio que estabelece. Isto é novo entre nós.
Pretendeu tambem o illustre deputado achar-me em contradicção, como se as minhas contradicções podessem salvar as suas, quando descobriu, que eu ha pouco aceitava o artigo da minoria. De certo. Aceito, porque é o nosso principio ampliado aos bens e direitos prediaes, que fazem parte da dotação do clero. Onde esta aqui a contradicção? O que eu não aceito, o que eu rejeito in limine, são os seus §§, e principalmente o § 2.°
Não digo mais nada. Peço por ultimo ao illustre deputado, em nome da honrosa profissão que exerce, em nome da humanidade, que esta entregue aos seus cuidados, em nome dos altos interesses politicos do paiz, que tenha o seu espirito mais pacifico e conserve a ma rasão mais fria, como precisa ter para tratar dos seus doentes e entregar-se, nas horas vagas, ao estudo dos negocios publicos. Não continuo n'essa irritação que lhe faz mal, e me esmaga o coração quando o remorso vem aguilhoar-me, recordando-me que fui eu o auctor do estado de exaltação e irascibilidade em que s. ex.ª se encontra. Se eu adivinhasse que havia de accumular-se no seu coração aquella grande porção de cólera que veiu aqui derramar, não tinha proferido a seu respeito uma só palavra, porque os negocios publicos podem perder muito se continua o seu estado de irritação.
Tenho dito.
O sr. Presidente: — A deputação que ha do apresentar a Sua Magestade alguns authographos das côrtes geraes é composta dos srs. Lobo d'Avila, barão da Trovisqueira, Faria Blanc, Almeida e Araujo, e Annibal. Os srs. deputados serão avisados do dia e hora em que Sua Magestade recebe a deputação.
A ordem do dia para ámanhã é a mesma que vinha para hoje e mais os projectos n.ºs 15 e 16.
Está levantada a sessão.
Eram quasi cinco horas da tarde.