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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

tuação politica em que infelizmente nos encontrâmos, e é por isso que eu espero que ella possa merecer os votos de quasi toda a camara, com a excepção apenas dos srs. ministros e dos seus amigos particulares, sendo mesmo possivel que o nobre presidente do conselho a tenha na conta de patriotica, e n'esse caso merecerá a honra de ser approvada por unanimidade (riso).

V. ex.ª sabe, e notou por certo a camara, que eu só tarde, e muito tarde, pedi a palavra para entrar n'esta discussão. Pedi-a, provocado por algumas phrases que devo suppor menos pensadas e reflectidas que partiram do banco dos srs. ministros, e que me maguariam de qualquer parte que viessem; mas que muito mais me deviam de maguar, partindo de um homem que tenho na conta de meu amigo, o sr. ministro da fazenda. Ainda que estas phrases não tivessem sido proferidas por s. ex.ª, eu teria necessidade de me inscrever, para tomar parte n'este debate, depois de um dos discursos pronunciados n'esta casa pelo sr. presidente do conselho durante esta discussão.

Eu entro, sr. presidente, com grande difficuldade e não menor repugnancia n'esta discussão; repugnancia e difficuldade que plenamente se justificam na natural propensão do meu animo mais inclinado sempre para a benevolencia do que para a censura. E se esta é sempre para mim cousa desagradavel, muito mais desagradavel se torna quando tem de recaír em actos praticados por homens que eu muito respeito, de todos os quaes tenho recebido provas de muita benevolencia e de alguns testemunhos de verdadeira amisade. Entendo, porém, que é obrigação do homem, que tem a honra de occupar um logar n'esta casa o não prestar ouvidos á voz da amisade, mas escutar unicamente a voz do dever, que manda apreciar os actos dos homens que se acham sentados n'aquellas cadeiras (as dos ministros) com o inteiro desassombro, e com a completa imparcialidade, que é sempre devida tanto a amigos como a adversarios (apoiados).

Se eu não estivesse profundamente convencido de que estamos atravessando um periodo de grande decadencia, decadencia que é para as nações o que o somno é para os individuos, eu ficava para logo certo d'isso ao ter este documento e ao ouvir os discursos do nobre presidente do conselho de ministros, que sinto não ver n'este momento presente, tanto mais que tenho de me referir quasi exclusivamente a s. ex.ª

Eu não me proponho analysar detidamente este documento (indicando o projecto de resposta ao discurso da corôa). Foi essa analyse feita já por um dos mais distinctos caracteres d'esta casa, por um dos mais notaveis talentos da geração nova, pelo meu excellente amigo o sr. Rodrigues de Freitas (apoiados).

Dizem uns que a resposta ao discurso da corôa deve ser apenas considerada como mero cumprimento dirigido á corôa; entendem outros que é a occasião mais propria para abrir um largo debate, em que se apreciem todos os actos politicos e administrativos dos governos.

Eu entendo que ha excellentes rasões para justificar qualquer d'estas opiniões; mas entendo tambem que nenhuma d'ellas é verdadeira absolutamente (apoiados).

Ha occasiões, e isto tem succedido n'estes ultimos annos em Portugal, em que a resposta ao discurso da corôa deve ser considerada como um mero cumprimento. Entendeu, porém, a opposiçâo d'esta casa que, nas actuaes circumstancias, não se podia fazer isso, e, na minha opinião, entendeu muito bem (apoiados).

Quando nós estamos em face de um gabinete que nos promette condições de duração, é licito e conveniente adiar a apreciação dos actos do governo, já na esphera politica, já na economica e financeira, para occasião mais propicia e opportuna; quando, porém, nos encontramos em face de um governo que só é governo no nome (apoiados), que é contrario a todas as indicações constitucionaes, devemos apressar-nos a apreciar os seus actos, a sua politica, a sua

marcha governativa, para que ao menos fique registado para o futuro o modo por que foi apreciada a gerencia d'esse governo (apoiados).

Em duas partes se podem naturalmente dividir as considerações sobre o projecto de resposta ao discurso da corôa — uma parte politica e a outra parte financeira.

Mas antes de proseguir preciso fazer uma declaração.

Os meus collegas que me conhecem já sabem que eu procuro sempre entrar na discussão com a maxima imparcialidade, e ser sempre, como devo, benevolo e attencioso para com todos. Hoje pretendo seguir o mesmo caminho; se, porém, proferir alguma palavra menos conveniente, peço a v. ex.ª a fineza de logo m'o indicar, e á camara que a considere desde já como retirada.

Sr. presidente, eu sou d'aquelles que entendem que os actos do poder moderador podem e devem ser apreciados pela opinião e pelo parlamento. E n'esta occasião folgo de ter de meu lado a auctoridade de um dos vultos mais respeitaveis, de um dos talentos mais profundos, de um dos caracteres mais serios d'este paiz; fallo do illustre deputado o sr. Mártens Ferrão. É por isso que me julgo obrigado a declarar, que tenho a ultima dissolução como um gravo erro politico, o um attentado constitucional (apoiados).

Eu sei que se pretendou lançar a responsabilidade d'esse acto sobre o partido a que tenho a honra de pertencer. Ora esse partido (e eu creio que posso fallar em nome dos meus amigos politicos) toma com toda a coragem a parte da responsabilidade que lhe possa pertencer, mas exige em nome do seu dever e do seu direito, que o governo e os diversos partidos que o tem amparado n'esta casa, com mais ou menos benevolencia, tomem tambem a parte de responsabilidade que a cada um devo caber.

A camara sabe que depois que saíram do ministerio os srs. bispo do Vizeu e Saraiva de Carvalho, o partido reformista não se julgava já representado nas cadeiras dos ministros, e comtudo continuou ao lado do governo prestando-lhe todo o seu auxilio e todo o seu apoio; e eu não quero exaltar o valor da coadjuvação que o governo recebeu d'esse partido. Basta recordar, e todos se lembram de certo, as expressões pronunciadas por muitas vezes n'esta casa pelo meu illustre amigo o sr. ministro da fazenda e pelo illustre presidente do conselho. O que é certo é que o governo nos encontrava sempre na commissão de fazenda promptos a relatar os seus projectos e na camara a sustenta-los. Olhava-mos para o paiz e mais nada. Cumpriamos o nosso dever.

Quando porém nós tinhamos votado medidas de impostos que íam ferir não só cidadãos collocados em posição mais alta, mas ainda os mais humildes, levando as exigencias do fisco até aquelles que com o suor de seu rosto ganham de dia o pão com que á noite alimentam seus filhos; quando nós acabavamos de levar o peso do imposto a toda a parte, entendemos que não deviamos curvar a cabeça ás exigencias menos rasoaveis da camara dos dignos pares quando esta pretendia que, á sombra de um projecto destinado a acabar com isenções que não se justificavam, não só se mantivessem excepções que a justiça condemnava, mas que se concedessem outras que nenhuma rasão séria poderia admittir.

Era contrariar as nossas promessas, e rasgar o nosso programma, porque nós entendemos que a resolução da questão de fazenda depende da elevação do imposto equitativamente distribuido, e da diminuição da despeza, sem prejudicar os serviços uteis indispensaveis.

Não podiamos pois continuar sem grave injustiça a isentar de imposto certos estabelecimentos, e desde este momento nós não podiamos, com grande pezar nosso, acompanhar o governo no caminho que elle pretendia seguir.

Não era só isto; começára-se a discutir na commissão de fazenda o orçamento do estado, e nós ouviamos a todos os srs. ministros declarações explicitas de quanto eram sinceros os seus desejos de caminhar resolutamente pela estrada que nós seguiamos, de cortar por todas as despezas injus-