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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
Discurso do sr. deputado Mariano de Carvalho proferido na sessão de 5 de setembro que devia ter sido publicado a pag. 528 d'este Diario
O sr. Mariano de Carvalho: — Não fazia tenção de tomar de novo a palavra n'este debate, porque as rasões que eu tinha apresentado contra a validade da eleição de Macedo de Cavalleiros não me parece que de modo algum fossem destruidas pelo illustre relator da commissão, como em breve espero mostrar. Porém um accesso d'aquella febre colerica que de vez em quando ataca o sr. presidente do conselho de ministros, accesso que o levou a collocar o sr. visconde de Moreira de Rey na triste situação de metter os pés pelas mãos e até não me permittir que ao menos, me risse, obrigou-me a entrar no debate mais uma vez, e obrigou-me, porque o sr. presidente do conselho de ministros, dirigindo-se a mim, disse: «Nunca me fiz illusão sobre o papel que o illustre deputado vinha representar n'esta camara».
A isto é que principalmente desejo responder, para que estas palavras do sr. presidente do conselho de ministros não possam ser interpretadas de um modo desfavoravel para mim. Effectivamente s. ex.ª nunca teve o minimo motivo para se illudir a meu respeito; pelo contrario, teve sempre todos os motivos para saber que eu lhe faria constantemente opposição emquanto o meu partido lh'a fizesse tambem (apoiados). Peço-lhe que responda, se póde.
D'este modo julgo dever repellir a insinuação do sr. presidente do conselho de ministros, porque s. ex.ª dirige insinuações contra todos. Um dia é contra o sogro do sr. visconde de Moreira de Rey, outro dia contra mim, outro dia emfim contra todos aquelles que incorrem na colera de s. ex.ª
Até aquelles que o sr. presidente do conselho de ministros declara seus particularissimos amigos, até aquelles a quem s. ex.ª confessa dever obrigações, esses mesmos não escapam á sua colera.
Assim succedeu ao sr. bispo de Vizeu, do qual s. ex.ª se declarou particular amigo, e de quem recommendou como modelo a illustração e a intelligencia. Esse mesmo foi aqui injuriado pelo sr. marquez d'Avila e de Bolama; que lhe attribuiu actos improprios de qualquer homem honrado, e que o nobre prelado não praticou.
Não prosigo n'esta ordem de idéas. Tinha obrigação de dar á camara esta explicação; v. ex.ª comprehende bem que era este o meu dever.
Não quero entrar tambem na discussão que se levantou a respeito da responsabilidade que têem os ministros pela nomeação dos seus funccionarios, mas declaro que me inclino muito para a doutrina sustentada pelo sr. visconde de Moreira de Rey, e aceita n'outra epocha pelo sr. marquez d'Avila e de Bolama.
S. ex.ª, quando ainda era simplesmente o sr. Antonio José d'Avila, disse n'esta casa o seguinte (leu).
Vê a camara que o sr. presidente do conselho allegava a impunidade da auctoridade administrativa que praticava excessos eleitoraes para accusar de cumplices os superiores d'essa auctoridade.
Sei que o sr. presidente do conselho ha de vir sustentar agora, que os auctores dos actos de violencia nas passadas eleições foram punidos e que, portanto, o governo não merece a accusação de seu cumplice.
Mas a camara e o paiz sabem que a impunidade existe para muitos d'elles, porque a alguns o sr. presidente do conselho apenas lhes deu a demissão, o que em muitos casos não póde considerar-se como castigo; outros nem demittidos foram e vingam-se agora dos eleitores que resistiram ás suas violencias. Portanto o governo é seu cumplice, segundo as proprias doutrinas do sr. presidente do conselho.
Mas ha mais. Admira-me como s. ex.ª na sessão anterior condemnasse com phrases severissimas aquelles que accusam o governo sobre inducções e probabilidades, e em 1853 s. ex.ª, que então não era marquez, dissesse o seguinte (leu).
De maneira, que então s. ex.ª não tinha duvida em decidir por simples inducções e probabilidades para condemnar o governo. E tanto não tinha duvida, que repetiu, este argumento em outra parte do seu discurso, a pag. 17 do Diario da camara de 1853.
S. ex.ª notou o facto singular e acrescentou logo (leu).
Aqui está o illustre presidente do conselho a julgar e a condemnar por inducções e probabilidades. S. ex.ª achava excellente esta doutrina; não era presidente do conselho, nem marquez d'Avila e de Bolama, nem par. Hoje, que é tudo isso, acha detestavel a sua propria doutrina. Mudam os tempos, mudam os homens para quem a propria conveniencia é a regra suprema.
Esquecia-me ainda referir outra phrase do sr. presidente do conselho na ultima sessão, que não quero deixar sem replica.
Dizia s. ex.ª: «porque não vem a esta camara as provas das accusações que fazem ao governo?» Porque s. ex.ª as recusa. Eu queria fazer accusações ao governo por actos praticados pelo sr. marquez d'Avila e de Bolama, e queria servir-me de documentos officiaes; pedi que me fossem remettidos esses documentos que provam a criminalidade de s. ex.ª e não me foram remettidos (apoiados), sem que o governo allegasse que havia inconveniencia em os mandar á camara! Aqui está porque as accusações não são documentadas; porque o réu esconde as provas do seu crime.
Muito bem disse no outro dia o sr. Barjona de Freitas, que é bom que haja publicidade em regra; e que, só quando os ministros declaram que ha inconveniente serio, é que não deve fazer-se a publicação de determinados documentos.
O governo, repito, até hoje não declarou que houvesse inconveniencia na publicação dos que pedi; Mas esses documentos eram a base da accusação criminal contra s. ex.ª por ter faltado á verdade em papeis officiaes com prejuizo do thesouro, e por isso não são mandados á camara. O paiz que julgue.
Passo agora á eleição de Macedo de Cavalleiros, e tenho depois que replicar a algumas considerações feitas pelo sr. Sampaio: devo antes dizer que não tenho por systema defender-me accusando os adversarios.
O illustre relator da commissão entendeu que devia contestar factos e desfazer accusações levantadas n'esta casa pelo sr. visconde de Moreira de Rey, accusando os amigos de s. ex.ª por actos similhantes aquelles, que se manifestam na eleição de Macedo.
Não sei se esses factos se deram; mas suppondo mesmo que se deram, admitindo que os amigos do sr. visconde de Moreira de Rey os praticaram, fica provado que são innocentes o sr. marquez d'Avila e as auctoridades administrativas de Macedo de Cavalleiros? De certo que não, e por isso não comprehendo este modo de argumentar, que póde enganar gente boçal, mas que não serve n'uma assembléa. illustrada.
Pela minha parte hei de servir-me dos factos, e só dos factos que constam do processo eleitoral e do parecer da commissão. Não tenho outros documentos, mas a propria commissão falla por mim.
Ainda ha pouco a camara ouviu dizer ao illustre relator da commissão: «mas o que ha n'esta eleição? Ha apenas protestos infundados, protestos desacompanhados de pro-