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definitiva das linhas telegraphicas submarinas, e não impugno o artigo 3.° do projecto, porque esse artigo encobre a revogação da legislação anterior, e a camara póde, quando entender conveniente, substituir essa legislação por outra nova.

Não rejeito todo o projecto, e concordo em que seja conveniente, e até necessario, que n'estes contratos a que se refere o artigo 3.°, o poder executivo não possa de hoje em diante fazer mais do que nos contratos de caminhos de ferro. Mas annullar contratos legalmente feitos, negar ao poder executivo attribuições que as leis lhe concediam, e concedem ainda n'este momento, querer dar a uma lei que tratâmos de formular poder retroactivo, não posso eu admittir, porque o não admittem os nossos principios constitucionaes. O que esta feito legalmente é facto consumado; tratemos do futuro. (O sr. Garcez: — Peço a palavra.)

Já V. ex.ª vê que não impugno todo o projecto, e aceito o artigo 3.° para o futuro.

Mas em relação aos contratos legalmente feitos, parece-me que o poder legislativo não deve tomar conhecimento nenhum d'elles.

Foi feito o primeiro contrato, a que se refere o artigo 1.° do projecto, em 13 de agosto de 1867. Eram concessionarios os srs. Frederick Darley Rose, Charles Copper e Stephenson Clarke, que se tinham compromettido a estabelecer uma linha telegraphica que, partindo de Falmouth, na Inglaterra, viesse tocar em Peniche. Tinham-se-lhe feito varias concessões, que o governo achou poder conceder-lhes, em virtude das auctorisações que as camaras lhe tinham dado, e que os concessionarios julgaram que lhes satisfaziam os incommodos e despezas a que os levava esta empreza. Este contrato legal não podia ser substituido sem rescisão por outro, feito por qualquer governo, com concessões que o prejudicasse.

No artigo 13.° do contrato diz-se (leu).

N'um segundo contrato, celebrado em 21 de janeiro de 1868, fez um outro governo concessões que prejudicavam o primeiro, e foi por isso que os primeiros concessionarios reclamaram.

Entre os documentos que mandei para a mesa, havia um requerimento que illucidava completamente a questão, mas a commissão attendeu-o, annullando ambos os contratos (apoiados). Ora, sr. presidente, contra este despacho, com o qual me não posso conformar, é que venho pedir a attenção da camara. Quando os concessionarios vinham pedir justiça, quando elles diziam, apontando para a letra do contrato, que não podem ser concedidas aos segundos concessionarios as mesmas garantias que lhes tinham sido concedidas, porque se prejudicam entre si, dar-se-lhes uma resposta que ambos os contratos ficam nullos! A attenção pelo requerimento não me parece bem provada, porque o despacho não é justo nem legal.

Os contratos, qualquer d'elles, no campo da legalidade, porque as questões que se podem levantar entre uns e outros concessionarios, não são para aqui; os contratos, digo, foram feitos pelo poder executivo, segundo as auctorisações dadas pelo poder legislativo.

No decreto de 20 de junho de 1857, diz o artigo 2.° que = só o governo póde estabelecer linhas electro-telegraphicas, ou conceder auctorisação para esse fim, debaixo das condições que julgar convenientes =.

Este decreto, que se funda na auctorisação conferida pela carta de lei de 30 de junho de 1856, diz bem claramente que = o poder executivo tem pleno poder para contratar linhas telegraphicas debaixo das condições que julgar convenientes =. Os contratos feitos por consequencia em 13 de agosto de 1867, e 21 de janeiro de 1868, na parte em que se não prejudicam, estão perfeitamente legaes, e legaes porque aquelle decreto de 20 de junho de 1857 funda-se em doutrina clara da carta de lei de 30 de junho de 1856.

E eu vou ler á camara esta carta de lei no artigo que diz respeito a este ponto. Diz o artigo 1.°: «E o governo auctorisado a organisar e regular o serviço das linhas electro-telegraphicas, e a fixar para este effeito o numero, habilitações e vencimentos dos empregados indispensaveis para o mesmo serviço».

O sr. Belchior Garcez: — Isso é só para as linhas electro-telegraphicas terrestres, e não para as submarinas. Peço a palavra.

O Orador: — Eu não vejo que em presença d'esta disposição generica da lei se possa dizer, que ella se refere só ás linhas electro-telegraphicas terrestres, e não aos cabos submarinos. Para mim estão todos comprehendidos na designação de linhas electro-telegraphicas.

O sr. Belchior Garcez: — Não estão.

O Orador: — Peço perdão. O que são cabos submarinos senão linhas electro-telegraphicas.

O sr. Belchior Garcez: — Mas as nacionaes, e não internacionaes.

O Orador: — A carta de lei de 30 de junho de 1856 não diz isso.

O sr. Belchior Garcez: — Essa carta de lei não legislou com respeito ás linhas electro-telegraphicas internacionaes. Legislou com respeito ás linhas electro-telegraphicas nacionaes.

O Orador: — A lei não restringe a auctorisação n'ella contida ás linhas electro-telegraphicas nacionaes, ou ás linhas terrestres sómente. A lei abrange as linhas electro-telegraphicas por terra e mar; nacionaes e internacionaes.

O sr. Belchior Garcez: — E só ás nacionaes.

O Orador: — A lei não o diz em nenhum dos seus artigos. Os contratos foram feitos debaixo do espirito d'esta lei. A letra da lei é clara.

O sr. Belchior Garcez: — Tenha a bondade de ler novamente a lei.

O Orador: — Com muito gosto.

Diz a lei: «É o governo auctorisado a organisar e regular o serviço...

O sr. Belchior Garcez: — Qual serviço?

O Orador: — O serviço das linhas electro-telegraphicas...

O sr. Belchior Garcez: — Aonde?

O Orador: — No paiz.

O sr. Belchior Garcez: — Ah! No paiz.

O Orador: — E verdade. No paiz, porque a lei não póde legislar se não para o paiz. Mas não faz restricções, diz respeito a todas as linhas electro-telegraphicas que interessem directamente o paiz. Continuemos a ler a lei, visto que o sr. deputado assim o deseja.

«Na proxima sessão legislativa dará o governo conta ás côrtes do uso que tiver feito da auctorisação conferida por esta lei.»

O sr. Belchior Garcez: — Sim senhor. Do uso que tiver feito d'essa auctorisação com respeito ás linhas electro-telegraphicas em Portugal.

O Orador: — Mas a lei não diz «esta auctorisação diz respeito só ás linhas que não saírem do territorio portuguez».

O sr. Belchior Garcez: — Subentende-se.

O Orador: — Subentende-se? Com uma interpretação assim das leis não podemos ter confiança nenhuma n'ellas. Deus nos livre que assim fosse. As leis entendem-se e interpretam-se pelas regras da hermeneutica...

O sr. Belchior Garcez: — Mas para Portugal.

O Orador: — Para Portugal! Peço perdão ao illustre deputado. Se a carta de lei de 30 de junho de 1856 dissesse em algum dos seus artigos que «a auctorisação d'ella concedida era só para as linhas electro-telegraphicas nacionaes», de certo não viria eu hoje, em nome d'essa mesma carta de lei, dizer á camara que aceite o que esta feito e legalmente feito, e que legisle para o futuro de outra fórma, se o julgar conveniente. A lei não fez restricções, disse e diz bem claramente: «Que o governo ficava auctorisado a contratar com as condições que julgasse convenientes as linhas electro-telegraphicas».

Se os cabos submarinos são linhas electro-telegraphicas, o governo estava no seu direito plenissimo de os contratar.

Eu não quero demorar-me muito n'esta questão, e declaro com franqueza que me assustam os muitos apontamentos que vejo tirar ao illustre relator da commissão.

De certo não saio bem do combate apesar da justiça que julgo assistir á minha opinião. Cumpri um dever.

Fui encarregado de apresentar aqui uns documentos em que se pedia justiça, e portanto tinha obrigação de pugnar por essa justiça.

O governo contratou segundo a lei que existia, a camara póde hoje estabelecer nova lei, e tirar aos governos presente e futuros a auctorisação que até aqui tinham os governos passados; mas o que esta feito, esta feito, a camara, entendo eu, que não o póde hoje alterar.

N'este sentido parece-me que nós podemos reduzir o projecto que se discute ao artigo 3.° Este artigo não o impugno; a camara póde ter rasões muito ponderosas para o adoptar, e eu mesmo o voto e o aceito da melhor vontade; mas em relação aos outros dois artigos, deixe a camara o governo a discutir com os concessionarios dos dois contratos sobre qual d'elles é válido o qual deve vigorar, porque ambos foram feitos dentro das auctorisações concedidas pelo poder legislativo.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho a eliminação dos artigos 1.° e 2.° do projecto de lei que se discute. = O deputado, Fernando de Mello.

Foi admittida e entrou em discussão com a materia.

O sr. Secretario (José Tiberio): — A commissão de redacção não fez alteração alguma ao projecto n.° 18—A, e portanto vae ser remettido para a outra camara.

O sr. Fradesso da Silveira: — O meu amigo, o sr. Fernando de Mello, acabou de apresentar algumas considerações ácerca do parecer da commissão de obras publicas, relativo ao projecto sobre a construcção de linhas telegraphicas.

Começo por pedir a v. ex.ª e á camara que não vejam nas minhas observações nenhuma idéa de dirigir censura a quem quer que seja, e que acreditem que vou expor francamente a historia d'este negocio tão francamente quanto é possivel para que possam todos aprecia-lo com justiça.

Diz o meu amigo, o sr. Fernando de Mello, que não lhe repugna que a camara reclame para si o direito de resolver que se adopte o artigo 3.° do projecto, pelo qual a concessão definitiva de qualquer linha electro-telegraphica submarina fica dependente da approvação da camara; que lhe parece isto muito justo, porém não entende que esta resolução vá prejudicar contratos anteriormente celebrados, os quaes, segundo lhe parece, devem ter sido feitos legalmente.

Diz s. ex.ª que a commissão, dizendo que foram attendidos os concessionarios da linha de Falmouth a Peniche, não teve com elles a devida attenção.

Mas, sr. presidente, quando uma commissão examina um documento qualquer, e depois do exame toma uma resolução, é evidente que foi o documento attendido. E quando a commissão diz que = ficaram attendidos os concessionarios =, isto quer dizer que a sua representação foi devidamente considerada, que a, commissão tomou na devida conta os argumentos que se apresentaram, e se não resolveu favoravelmente foi por que entendeu que não havia fundamento para uma resolução favoravel; mas de nenhum modo os desconsiderou, de nenhum modo os desattendeu, nem a commissão de obras publicas era capaz de desattender ninguem.

Vejamos qual é o estado do negocio, e como este negocio veiu aqui. Tratamos de rejeitar contratos; é preciso ver como esses contratos aqui vieram.

Não temos diante de nós senão uma unica proposta de lei apresentada pelo meu illustre amigo, o sr. Canto, quando ministro das obras publicas, para a approvação de um unico artigo de um contrato.

É claro que o governo, trazendo á camara uma proposta de lei para a approvação de um unico artigo de um contrato, entendeu que do poder legislativo não dependia outra cousa senão aquelle artigo; entendeu que os outros artigos do contrato não dependiam do poder legislativo, e que estava na alçada do poder executivo fazer o contrato como o fizera, excepto na parte relativa áquelle artigo.

Não estamos porém de accordo n'este ponto; não me parece que isto seja completamente regular, mas posso explicar á camara o motivo por que este artigo isolado veiu aqui á camara separado do resto do contrato.

Em 1864 deu a camara um voto de confiança a um governo. Os votos de confiança têem suas vantagens e seus inconvenientes.

Nem sempre se póde conceder votos de confiança, nem sempre elles podem aproveitar do modo mais conveniente, do modo que mais corresponda aos intuitos de quem os concede.

Foi o que aconteceu n'este caso. A camara concedeu um voto de confiança para o governo decretar o que dependesse de auctorisação legislativa ácerca da policia e conservação das linhas telegraphicas, etc.. e o ministro respectivo de então julgou-se auctorisado a decretar, e decretou uma auctorisação para negociar contratos de construcção e estabelecimento de linhas telegraphicas!

O decreto, que tem a data de 31 de dezembro de 1864, foi para quem o referendou, um decreto com força de lei, -e para mim é um decreto sem força de lei, é um acto do executivo, que não póde obrigar como lei.

Entretanto este decreto, em uma especial circumstancia, foi já considerado como lei. Houve talvez uma resolução da camara, dando auctoridade legal a algum dos seus artigos, e por este motivo provavelmente os srs. Corvo e Canto fundaram no artigo 4.° as concessões de que se trata.

Note a camara que eu não pretendo fazer censura a ninguem, e considere que me estou referindo a differentes ministerios. Não quero censurar ninguem, pretendo apenas expor as cousas como ellas se passaram.

Portanto já vê a camara que dois ministros successivos consideraram aquelle decreto como tendo força de lei, mas realmente não a tinha. E não creio que fosse por irreflexão; mas havendo a camara feito algumas referencias áquelle decreto ou a outro da mesma data, talvez esta circumstancia levasse ss. ex.ªs a esta errada supposição.

Entretanto, a concessão feita ao sr. Rose teve origem na auctorisação concedida pelo decreto de 31 de dezembro de 1864, e a concessão feita aos srs. Medlicot e Rumball foi fundada na mesma auctorisação.

O que se segue d'aqui é que o governo partiu do decreto de 1864, mas este decreto estabelecêra as condições que deviam depender do poder legislativo, e o sr. Canto, por escrupulo talvez excessivo, entendeu que devia trazer á camara aquelle artigo, porque, sendo o praso marcado de noventa e nove annos, s. ex.ª entendeu que este praso não era determinado.

Entendeu talvez que era demasiadamente longo, por isso não quiz tomar sobre si a responsabilidade de resolver, e trouxe o negocio á camara.

Tanto o sr. Canto como o sr. Corvo negociaram os dois contratos, suppondo que podiam realmente negocia-los; tendo eu a opinião contraria, respeito as suas intenções, e acredito que foi com a melhor vontade de acertar que fizeram estas negociações.

Comtudo é preciso verificar agora se o governo, não tendo n'aquelle decreto de 1864 a força precisa e a auctorisação necessaria para fazer a negociação, teria em alguma* lei anterior essa força e auctorisação.

Apparece em 1856 uma Li, de 30 de julho, que o meu amigo, o sr. Fernando de Mello, acaba de citar, para o regimento do serviço telegraphico, e n'essa lei diz-se = que o governo póde estabelecer linhas telegraphicas e conceder auctorisações para esse fim, debaixo das condições que julgar convenientes =.

Ora, concedida a auctorisação n'estes termos, parece que o governo estava plenamente habilitado. Mas naturalmente occorre a todos uma duvida. Porque é que os diversos ministros, quando trataram de fazer estes contratos, se referiram ao decreto de 1864, que não tem força de lei, e esqueceram a carta de lei de 1856, que era lei?

Para que foram procurar o abrigo de um decreto, cuja força legal era muito duvidosa, quando tinham uma lei de que se podiam aproveitar?

D'esta lei derivou o sr. Carlos Bento uni decreto que tem realmente força de lei. Esse decreto refere-se a construcções; foi ha pouco lido e escuso de repetir a sua leitura, que tomaria tempo á camara. Os contratos pois podiam ser bem fundados, pelo menos apparentemente, n'esse decreto que foi referendado pelo sr. Carlos Bento, em 1857.

A commissão teve de apreciar este negocio em condições que não eram perfeitamente normaes.

Não havia porventura uma clara e manifesta illegalidade. Não se realisou talvez um caso em que fosse preciso conceder ao governo um bill de indemnidade; mas os governos tinham contratado fundados n'um decreto que não tem força de lei. D'aqui as difficuldades.

A commissão achou-se realmente embaraçada. Viu que o governo se tinha fundado n'um decreto que lhe dava auctorisação para contratar; foi verificar o alcance da lei de onde esse decreto derivava, e achou que a lei ficava muito áquem, que era muito mais restricta, porque auctorisava o governo a decretar sobre policia e conservação, e não a contratar construcções de linhas telegraphicas, nenhuma referencia fazendo ás linhas internacionaes submarinas.

E tanto assim era que o proprio ministro, que referen-