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ou de 1857; o que eu preciso saber é se as leis anteriores e não revogadas, que dizem respeito a contratos d'esta natureza, auctorisavam o governo para os celebrar ou não.
Esta questão de legalidade ou illegalidade d'estes contratos é uma questão muito séria e importante, disse eu ha pouco, e a camara deve-a pesar com certo cuidado, porque diz respeito a direitos adquiridos.
Se os contratos foram legaes, e por ventura houver prejuizo para os concessionarios, pela annullação posterior, elles têem direito a indemnisações, e podem vir pedi-las, e eu não sei como o governo e o parlamento lh'as hão de negar.
No artigo 13.° do contrato do sr. Rose ha um privilegio evidente, porque se determina que todos os despachos entre Portugal e Inglaterra sejam feitos por aquelle cabo submarino, salva a declaração do expedidor.
Disse-se que o governo não teve intenção de conceder privilegios. Eu não posso discutir as intenções com que o governo contratou. O artigo 13.° concedeu este privilegio e não sei de outro artigo do contrato que altere, revogue ou destrua o que naquelle se concede.
Diz-se que na proposta original do contrato de 13 de agosto, que é o do sr. Rose, vinha um artigo, que ouvi chamar 2.°, no qual se pediam mais privilegios, ou mais claramente do que os concede o artigo 13.° do contrato difinitivo, e que o governo não tendo aceitado o artigo 2.° da proposta, de certo não tinha a intenção de conceder os privilegios do artigo 13.° A questão de numero para mim é indifferente. Houve differença na collocação, assim como tambem a haveria entre os privilegios pedidos e concedidos.
Mas é claro que o artigo 13.° do contrato feito entre o governo e o sr. Rose, diz que = todas as participações telegraphicas entre Portugal e Inglaterra, hão de ser feitas exclusivamente por aquella linha logo que o expedidor não indique o contrario =. Isto é um privilegio bem explicito que o governo não concederia se não tivesse a intenção de o conceder, e podia faze-lo se não pelo decreto de 1864, pelo decreto de 1857, que tem força de lei, como confessa o proprio sr. relator da commissão. E nem podia deixar de ser assim. O decreto de 1857 tem a assignatura do actual sr. ministro da fazenda, que então era ministro das obras publicas, e s. ex.ª não lavrava um decreto que não estivesse dentro das attribuições concedidas nas leis anteriores. Este decreto refere-se á carta de lei de 1856, e ninguem hoje duvidou de que estivesse dentro dos limites da lei a que se refere. Póde duvidar-se da força do decreto de 1864, n'um ou n'outro artigo, segundo disse o sr. relator da commissão; mas esse decreto mesmo, que hoje se põe em duvida, já se refutou como tendo força de lei nos artigos referidos; e n'esta camara passou isso em julgado. Seja porém como for, eu respeitarei o que a camara resolver na sua alta sabedoria, porque ha de ser justa e legal na sua resolução. (O sr. José de Moraes: — Apoiado.)
D'esta discussão vê-se claramente que os contratos podem não ser convenientes, mas foram legaes (apoiados. — Vozes: — Não apoiado).
Os contratos podem não ser convenientes hoje, podem nascer d'elles complicações entre os concessionarios actuaes; isto é, entre os de 1867 e os de 1868, póde mesmo a complicação ir mais longe, como receiou o sr. Belchior José Garcez; mas taes complicações nascidas entre os diversos contratos, não tiram a legalidade com que elles foram feitos. E uma discussão áparte, pertence aos concessionarios liquidar entre si quaes são os direitos que se chocam, qual é o contrato que deve ser garantido, se ha antinomia entre elles. Mas para nós, desde o momento em que os contratos foram celebrados em virtude das leis estabelecidas, são legaes. De hoje em diante podemos estabelecer uma outra lei; mas para o que esta feito temos a lei vigente, e por ella se deve resolver este negocio. Podemos fazer uma lei que diga d'aqui em diante não se podem fazer mais contratos d'esta natureza, especialmente concedendo privilegios sem auctorisação expressa do poder legislativo. Faça o governo contratos provisorios, mas para se tornarem definitivos é necessaria a confirmação das camaras legislativas. Mas até hoje, até este momento, o governo que contratou linhas telegraphicas, embora lhes concedesse privilegio, contratou-as muito legalmente, e dentro das attribuições que lhe estavam concedidas.
Escuso de repetir á camara o artigo 2.° do decreto de 1857, que já tive occasião de ler, assignado pelo sr. Carlos Bento, e que o sr. Fradesso da Silveira não impugnou. Ao sr. Fradesso pareceu-lhe que teria sido melhor, nos contratos de que se trata, não haver a referencia ao decreto de 1864, mas sim ao de 1857. Pelo que disse s. ex.ª, se porventura o poder executivo se tivesse referido ao decreto com força de lei de 1857, de cuja authenticidade e legalidade ninguem duvida, os contratos estavam validos; mas como houve um lapso talvez, quem sabe, da imprensa, e em logar de se fazer menção do decreto de 1857 se referem ao de 1864, tudo esta nullo.
D'este modo principio a ter medo da legalidade de quasi todas as nossas leis, porque todos nós temos tido occasião de encontrar esses lapsos nas referencias. Creio que até mesmo no parecer d'este projecto, apesar do cuidado com que o sr. relator trata todas as cousas, apparece uma referencia que não é exacta. Devia ler-se 30 de julho de 1856, e lê-se 30 de junho.
A camara comprehende bem os grandes inconvenientes que podem trazer estes lapsos e enganos, se porventura se decidir que, quando n'um contrato qualquer, embora haja uma lei que o auctorise, houver engano na referencia da lei, ha logar para annullação.
Concluo, porque não desejo tomar mais tempo á camara. Supponho que foi infructifero todo este trabalho, porque a camara esta sempre disposta a rejeitar tudo o que são contratos, e se vota algum é com difficuldade. Eu tambem não morro pelos contratos; não tenho saudades de nenhum delles, nem d'estes dois, nem de um terceiro a que se referiu o sr. Belchior Garcez; mas julgo que nós não podemos, nem devemos tomar come illegal o que é legal, não podemos destruir hoje por uma lei o que anteriormente foi feito segundo as leis do paiz. Podemos legislar para o presente e futuro; o passado não nos pertence. Disse.
O sr. Fradesso da Silveira: — Vou dizer poucas palavras. Bem dizia eu d'este logar ainda ha pouco que talvez não tivesse sido bem clara a minha exposição, e agora vejo que o não foi, porque se tivesse sido bem clara, o orador que me precedeu talvez me tivesse feito completa justiça.
O sr. Fernando do Mello: — A minha intenção não foi fazer-lhe injustiça.
O Orador: — Ha dois pontos distinctos a considerar. Um é o que se refere á auctorisação que o governo póde ter para negociar; o outro refere-se ao contrato em sr.
Não nos demoremos a considerar o primeiro ponto, e vamos a considerar o segundo. O que fez a commissão? Como os contratos todos não estavam presentes chamou-os a si, pediu-os. Vieram os contratos e a commissão considerou-os como provisorios; apreciou-os, e disse qual era a sua opinião sobre elles. Agora a resolução da camara importa muito para cortar as reclamações e difficuldades que se podem levantar sobre este assumpto. Estou simplesmente considerando uma das faces da questão. O ponto essencial era este: saber qual era a posição que a commissão e a camara deviam tomar em relação aos contratos. Vieram, como disse, esses contratos de que a camara esta de posse. A commissão examinou-os, encontrou-lhes condições que não eram as mais convenientes, e julgou acertado vir propor á camara a rejeição de ambos. Se a camara rejeitar ambos estão cortadas as difficuldades, e não ha direito a reclamação alguma.
Mas se se perguntar á camara as rasões que teve para rejeitar estes contratos, a camara tem uma resposta facil e prompta. Não ouviram ainda ha pouco o illustre deputado, o sr. Vieira de Sá, dizer que havia alguma cousa muito attendivel a propor, e que não estava considerada nos contratos? Esse é um dos motivos por que a commissão não approvou os contratos. A commissão tinha conhecimento de que havia propostas dos srs. deputados pelos Açores e correspondencias de alguns dos concessionarios, sobre pontos em que não havia nada resolvido nas condições. Não appareciam incluidas nos contratos certas clausulas de que a commissão tinha noticia, e portanto pareceu-lhe que o melhor era annullar o que estava feito para depois contratar de novo, e eu desejo fazer bem sentir á camara que, por este modo, não fica nenhum direito a reclamações (apoiados).
A commissão fez o que devia fazer. Chamou os contratos a si, apreciou-os todos, e apresentou o seu parecer.
A outra questão é a da legalidade dos contratos. Auctorisações mais ou menos amplas e deducções mais ou menos extraordinarias poderiam dar logar a um bill de indemnidade, e nós chegámos até a apresentar uma proposta de bill de indemnidade. Entretanto, como tivemos de considerar estes documentos todos, apreciaram-se devidamente as duas opiniões oppostas que se manifestaram, porque se por um lado a redacção da lei de 1856 induzia a crer que o governo estava auctorisado a fazer taes concessões, por outro lado recorrendo ao espirito da lei podiamos julgar que o não estava. A legislação actual não dava ao governo auctorisação para nenhuma especie de contrato relativo a linhas submarinas. No decreto de 1864 vem as condições para as concessões, e n'estas condições tudo se refere a linhas aereas ou subterrâneas, e não se faz referencia a essas linhas, que não são de certo linhas submarinas (apoiados). E, alem disso, quando uma outra das condições é que o fio deva passar pelos postes da empreza, segue-se tambem que se não póde referir a uma linha submarina, que nunca e de fórma alguma póde ter postes. Todas as condições do contrato em fim estão indicando que, na occasião em que aquelle decreto foi referendado, nem sequer se pensou nas linhas submarinas (apoiados).
Mas como nem sempre as leis se interpretam segundo o seu espirito, mas sim muitas vezes segundo a sua letra, a commissão achou que talvez se podesse deduzir tudo da ampla faculdade concedida pela lei de 1856.
A outra parte da questão era porém mais grave, e era necessario resolve-la.
Já disse que o governo esta habilitado a fazer negociações quanto antes, e não me parece que haja grande prejuizo em uma pequena demora. De mais sabem todos perfeitamente que estas negociações de cabos submarinos são longas, e por isso parece-me que, com o intervallo d'aqui até á sessão proxima, é provavel que se não vá prejudicar muito o estabelecimento do cabo; talvez que nós até com essa demora possamos obter alguma condição similhante á que foi proposta pelo illustre deputado pela Horta, o sr. Vieira de Sá, ou alguma outra igualmente attendivel (apoiados).
Pedi a palavra unicamente para fazer estas reflexões á camara, e parece-me que d'esta vez tenho dado todas as necessarias explicações; entretanto se a camara quizer mais algumas da-las-hei com toda a satisfação.
Vozes: — Muito bem, muito bem.
O sr. Sá Nogueira: — O illustre deputado que advogou a legalidade d'estes contratos partiu do principio de que o governo estava auctorisado para os fazer, que estavam legaes, e que por consequencia a camara não podia tomar conhecimento d'elles. Aqui esta a que se reduziu a substancia do que o illustre deputado disse.
O governo não esta, não esteve, nem póde mesmo estar auctorisado a conceder privilegios sem a approvação das côrtes; e seria um absurdo constitucional suppor-se que se tinha dado a um governo auctorisação ampla para conceder privilegios, que podiam ser menores ou maiores a ponto de se converterem n'um imposto! E o direito de lançar impostos não ha de certo querer a camara largar de sua mão (muitos apoiados).
Já se vê que é um absurdo constitucional suppor a existencia de similhante auctorisação, quando o sr. relator da commissão provou manifestamente que ella não existia (apoiados).
Não quero cansar a camara, e conseguintemente direi apenas mais algumas palavras; tomei unicamente a palavra para motivar o meu voto.
O governo estava no seu direito contratando, fazendo o contrato provisorio; mas poderia elle contratar fazendo concessão de um privilegio, por pequeno que fosse, sem esse contrato depender da approvação das côrtes?! Eu entendo que não; e se no paiz houvesse alguma lei que podesse ter essa interpretação, ninguem certamente lhe podia nem devia dar similhante intelligencia em consequencia dos principios que nos regem (muitos apoiados).
Disse o illustre deputado que = os concessionarios tinham direito a indemnisações =. Eu pelo que acabo de dizer entendo que não existe similhante direito (apoiados); mas se o houvesse não deviamos recuar diante d'essa circumstancia para deixar de approvar o contrato (apoiados). Se ha que pedir indemnisações vão fazer essas reclamações perante os tribunaes competentes (apoiados), e estes que decidam se os concessionarios têem ou não rasão, e se as leis vigentes podem ser interpretadas no sentido que o illustre deputado lhes deu (apoiados). Á vista do que tenho exposto é muito conscienciosamente que voto contra estes contratos, e approvo o parecer da commissão (apoiados).
Agora aproveito a occasião para recommendar aos srs. ministros que, quando fizerem contratos d'esta natureza, especialmente d'estes a que se chamam de linhas electro-submarinas, não estabeleçam exclusivos (apoiados). Por exemplo, se contratarem o estabelecimento de uma linha telegraphica submarina que passe pelos Açores, não estabeleçam n'esse contrato = que não poderá nenhuma outra linha passar por ahi, ou por alguma das ilhas do archipelago dos Açores =, como se fez a respeito de Cabo Verde.
Concluo, porque não quero tomar mais tempo á camara.
Não havendo mais ninguem inscripto, seguia-se pôr á votação o projecto na generalidade.
O sr. Freitas e Oliveira: — Requeiro que se verifique se ha numero na sala.
O sr. Camara Leme: — Eu requeiro que, votado que seja este projecto, entre em discussão o projecto n.° 14, que trata do generalato por armas.
O sr. Sá Nogueira: — Emquanto se verifica se ha numero permitta-me v. ex.ª que eu peça que seja discutido o projecto n.° 11, que fixa, a força da armada.
O sr. Presidente: — E o que se segue a entrar em discussão.
(Pausa.)
O sr. Secretario (José Tiberio): — Já ha numero na sala.
O sr. Presidente: — Vae votar-se sobre a generalidade do projecto n.° 16, que tem estado em discussão.
O sr. Gaspar Pereira: — Peço que, quando se votarem os artigos d'este projecto, se votem salva a redacção.
O sr. Presidente: — É sempre sob essa condição que se approvam todos os projectos.
Posto a votos o projecto n.º 16 na sua generalidade, foi approvado, e em seguida todos os seus artigos, salva a redacção
Entrou em discussão o projecto n.° 11, que é o seguinte:
Projecto de lei n.° 11
Senhores. — A vossa commissão de marinha, tendo examinado attentamente a proposta do governo, que fixa o contingente de recrutas para a armada no corrente anno, é de parecer que ella seja transformada no seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° O contingente para a armada no anno economico de 1868-1869 é fixado em 692 recrutas.
Art. 2.° O governo fará a distribuição do contingente pelos departamentos e districtos maritimos, na proporção do numero dos maritimos recenseados em cada um dos mesmos departamentos e districtos.
Art. 3.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
Sala da commissão, em 13 de agosto de 1868. =. Antonio Cabral de Sá Nogueira = Antonio Maria Barreiros Arrobas = Jacinto Augusto de Freitas e Oliveira = José Rodrigues Coelho do Amaral.
Foi approvado sem discussão.
Passou-se ao projecto n.º 14, da sessão ordinaria d'este anno, que é o seguinte:
Projecto de lei n.° 14
Senhores. — A vossa commissão de guerra examinou com escrupulosa attenção a proposta do governo n.° 6-D, o a proposta do sr. D. Luiz da Camara Leme n.° 6-F, tendentes á reducção do generalato e á sua promoção por armas até general de divisão exclusive.
Considerando que da reducção dos generaes proposta pelo governa, resulta economia para a fazenda, e nenhum prejuizo ao serviço;
Attendendo a que nos exercitos em tempo de paz se deve tudo regular do modo que seja exequivel em tempo de guerra e que satisfaça as necessidades d'esta;
Attendendo a que os interesses da guerra exigem nos exercitos a divisão das forças nas differentes especialidades de que os mesmos se compõem;
Attendendo a que a promoção dos generaes de brigada actualmente feita d'entre os coroneis mais antigos de todas as armas deixa ao acaso o numero de generaes indispensavel para os commandos das differentes armas;