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SESSÃO DE 30 DE MAIO DE 1885 1877

pelos habitantes de Higuerita e que começou a exercer-se pelos fins do seculo passado.
Existia em tempo em Monte Gordo uma povoação importante composta de portuguezes, hespanhoes e individuos de outras nações, que se dedicaram a industria da pesca n'aquella região.
Quando o marquez de Pombal fundou Villa Real de Santo Antonio, na foz do Guadiana, existia já a povoação de Monte Gordo. O marquez determinou que os habitantes d'esta povoação fossem residir para Villa Real de Santo Antonio, ao mesmo tempo que estabelecia varias medidas regulamentares com respeito á pesca.
Os habitantes de Monte Gordo, não querendo sujeitar-se aquella ordem e prescripções, emigraram para a ilha Christina e fundaram ou desenvolveram a povoação da Higuerita, continuando, porém, a explorar a zona piscosa da nossa costa, a coberto das prescripções do marquez de Pombal, pois tinham o cuidado de se conservar de dia afastados da terra e só de noite se approximavam, para dentro da linha de respeito.
As condições em que então a pesca se fazia e aquellas em que se achava então a Europa fizeram com que não se me prestasse maior attenção, nem se tratasse de pôr termo a esta exploração, feita por gente de um paiz na zona piscosa de outro paiz, sem regulamentos nem convenções que a auctorisassem, e por consequencia illegitima.
É baseando se no uso d'esse direito consuctudinario, direito não bem accentuado, porque era apenas o resultado de uma tolerancia, e da maneira cautelosa como essa exploração se exercia, que a Hespanha reclamou e impoz a Portugal uma convenção de pesca, que foi extremamente nociva para nos não só com respeito a nossa industria mas ainda nas diversas consequencias que se suscitaram.
Em principio, quando se explorava a pesca da zona do Monte Gordo unicamente com as artes de chavega comprehendia-se que não se levantassem conflictos sérios, porque todos pescavam da mesma maneira, e portanto com iguaes probabilidades de exito; mas quando a industria de pesca hespanhola se desenvolveu e começou a empregar as artes de galeão, resultou que os pescadores hespanhoes, com este systema, prejudicavam os portuguezes, que continuavam com o antigo systema das artes de chavega.
Não explicarei a camara, porque não teria essa explicação cabimento aqui, em que se differenceiam os apparelhos das artes de chavega dos das artes de galeão.
Bastará dizer que o systema de pescar pelas artes de galeão é o mais adiantado e o mais productivo, por isso que com as artes de galeão se vae ao mar fazer cerco ao peixe, em quanto as artes de chavega são uma especie de redes de arrastar que se lascam apenas a certa distancia da terra e da terra se allam on pucham.
A pesca feita de terra pelas artes de chavega é por isso necessariamente prejudiciada pela pesca das artes de galeão; d'esta differença entre as duas especies de artes, resultaram reclamações dos pescadores da zona leste do Algarve contra a tolerancia que até ali tinha havido com respeito aos hespanhoes.
Em 1876 começaram a apparecer na costa de Monte Gordo os primeiros galeões pescando só de noite para dentro da linha de respeito. Esta concorrencia de pesca com artes aperfeiçoadas irritou os espiritos, a ponto que em ou tubro do anno seguinte teve logar o primeiro conflicto grave, indo os nossos pescadores dar caca aos galeões hespanhoes, cortando-lhes redes e fazendo outras avarias, segundo a queixa do governo hespanhol, e em resultado da qual teve o nosso paiz de pagar uma forte indemnisação de mais de 25:000$000 réis.
O sr. ministro dos negocios estrangeiros creio que era n'essa epocha presidente da commissão de pescarias. Correram-lhe, portanto, esses negocios pelas mãos, e, por consequencia, melhor do que ninguem está no caso de dizer á camara quanto foi triste, e muito para sentir para nós, o conflicto que houve e que teve por epilogo o pagamento da mais injusta das indemnisações, porque não havia direito algum em que a Hespanha se baseasse para poder explorar a pesca nas nossas aguas, por isso que o tratado de limites de 1864, com o seu annexo de 1866, apenas permittia a reciprocidade nos rios limitrophes, convenio este similhante ao que o mesmo paiz tem com a França a respeito do Bidassêa.
Tivemos de ceder ao direito do mais forte, e não só pagámos uma indenmisação, mas, o que e mais, tivemos de acceitar o convenio de reciprocidade de pesca de julho de 1878!
Essa indemnisação serviu para pagar aos armadores hespanhões os capitaes que tinham empregado na armação dos galeões para tentarem aquella pesca com melhor resultado e em concorrencia com a arte de chavega, com que ella se exercia na costa de Monte Gordo!
Para que tão tristes casos se não reproduzam é que chamei a attenção do illustre ministro para as disposições do artigo 23.° do tratado, por desejar que estivesse consignado ali o limite da zona da propriedade maritima; e digo propriedade maritima, accentuando a phrase, porque alguns escriptores sobre direito internacional entendem que apenas deve haver o direito de jurisdicção e não o direito de deminio.
Este limite é variavel entre as diversas nações, principalmente no que diz respeito a zona de pesca, e tem variado para as mesmas nações de tempos a tempos, conforme as condições politicas em que se têem achado; é assim nos diversos tratados entre a França e a Inglaterra, e os Estados Unidos, sobretudo no seculo passado, são tão variaveis as condições de permissão da pesca do arenque nas costas da Escocia e do bacalhau nos bancos da Terra Nova.
É notavel que dessemos á Hespanha, pelo convenio de 1878, a reciprocidade da pesca sem compensação, quando a historia internacional nos aponta factos, e alguns recentes, de nações, que indo explorar as aguas territoriaes de outros paizes, pagaram indemnisações fortes, ao contrario do que succedeu comnosco.
É assim que a Hollanda no seculo XVII pagou durante algum tempo á Inglaterra pela exploração da pesca do arenque nas costas da Escocia 30.000 libras annuaes, concessão que não foi duradoura. Mais recentemente, pelo tratado do Washington, de 1871, entre os Estados Unidos da America e a Inglaterra, manteve-se a reciprocidade de pesca dos subditos dos estados norto-americanos e do Canadá nas respectivas costas, como já se achava consignado no tratado do 1854, mas reconhecendo se que a zona concedida aos Estados Unidos era maior do que a explorada pelo Canadá, pagou a republica, a titulo de compensação, um bonus unico de 5 milhões e meio de dollars. Resultaram d'essa concessão conflictos com os pescadores das regiões inglezas, um dos quaes ficou conhecido nos annaes diplomaticos pela questão da bahia da Fortuna.
Todas estas considerações se referem ao estudo do direito internacional na questão da zona da pesca, e ao quanto convinha fixar bem e precisamente essa zona, e foram suggeridas pela omissão que a meu ver se dava no artigo 23.º e que fica resalvada pela declaração feita pelo illustre ministro com respeito a accordos posteriores á assignatura do tratado que se discute, que resalva a omissão apontada.
Parecia-me conveniente que se accentuasse bem a demarcação d'essa linha, porque poderiam querer que ella seja determinada por todo o contorno da costa, ou apenas pelo contorno dos pontos mais salientes; e permitta-me a camara que exemplifique.
Entre o cabo de Santa Maria, no Algarve, e o cabo de S. Vicente, o contorno e muito variavel; e marcar uma linha subordinada a esse contorno, daria pretexto a conflicto por não ser facil determinar bem o local onde fosse