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N.º 7.

SESSÃO DE 15 DE MAIO.

1853.

PRESIDENCIA DO Sr. SILVA SANCHES.

Chamada: — Presentes 79 srs. deputados.

Abertura: — Ao meio dia e um quarto.

Acta: — Approvada.

O sr. Vellez Caldeira: — Sr. presidente, depois da sessão do dia 6 e hoje a primeira a que assisto; e é certamente esta a occasião propria que lenho para declarar o meu voto sobre as propostas do sr. Cezar de Vasconcellos, e do sr. Pinto d'Almeida, para o pagamento dos empregados desta casa, e dos deputados que pertenceram á camara dissolvida em 1801. Sendo aquellas propostas contrarias a uma decisão da commissão administrativa, e tendo-a a camara votado, sem ouvir uma commissão (o que me não pareceu regular) e depois da declaração de v. ex.ª que não havia dinheiro algum no fim da sessão, e o que se achava agora em cofre tinha vindo posteriormente, não havia duvida que não podiam ser pagos senão como os demais credores do estado; e a camara, approvando a proposta do sr. Pinto d'Almeida, fez uma excepção, e toda a excepção é odiosa: eu votei contra as propostas, e nesse sentido mando para a mesa a seguinte

Declaração de voto: — Declaro que na sessão de 6 do corrente votei contra as propostas dos srs. deputados Cezar de Vasconcellos, e Pinto d'Almeida, quanto no pagamento do que se estava devendo aos empregados desta casa, e aos deputados que então eram, quando em maio de 1851 foi dissolvida a camara dos deputados -Vellez Caldeira.

O sr. Bordallo: — Mando tambem para a mesa a seguinte

Declaração de voto: — Declaro que na sessão do dia 9 do corrente votei, que os vencimentos dos empregados desta casa, e o subsidio dos srs. deputados, não pagos antes do decreto de 3 de dezembro de 1851, estão comprehendidos nas disposições deste. — Bordallo.

O sr. Santos Monteiro: — As declarações de voto que acabo de ouvir lêr, tractam de uma votação que houve nesta camara: um dos illustres deputados diz que foi no dia 6; e outro que foi no dia 9: effectivamente a votação teve logar no dia 6; e de certo não houve votação sobre o mesmo objecto em dois dias; mas, não é do erro de data que eu quero tratar. O sr. deputado Bordallo veiu á sessão do dia 7 e ás sessões subsequentes, e se tinha declaração de voto a fazer, devia ser na sessão immediata á da votação, e não passados uns poucos de dias; porque, estabelecido este precedente, posso eu d'aqui a um mez vir declarar o voto que dei hoje sobre qualquer objecto. Por tanto, em primeiro logar, não é possivel apparecer na acta uma referencia a um facto passado em um dia, e que se menciona nas declarações de voto, como passado em dias differentes; e em segundo logar, a practica é — no primeiro dia em que o deputado vem á camara, depois que teve logar qualquer votação, declarar o seu voto; e o illustre deputado o sr. Bordallo já veiu á camara depois disso.

O sr. Bordallo: — Já tive occasião de declarar nesta camara, e aproveito esta para o fazer segunda vez, que eu, ainda que respeito muito a opinião de qualquer sr. deputado, em relação aos actos praticados por qualquer outro, não posso de maneira nenhuma acceitar essa opinião como uma regra, porque não admitto que haja outras regras para os deputados, que não sejam as estabelecidas na carta, no regimento, e nas leis; e eu não acho nem na carta, nem no regimento, nem nas leis estabelecida esta restricção — que se mandem as declarações de voto para a mesa só no dia immediato áquelle em que leve logar n votação. Por tanto, intendi que estava no meu direito mandando essa declaração de voto para a mesa, para ser lançada na nela. Em quanto á differença que parece haver entre o dia da votação que nota o sr. Vellez Caldeira na sua declaração, e o dia que eu notei na minha, será muito facil averiguar o dia em que leve logar a votação, e emendar o erro na declaração em que elle se der.

O sr. Vellez Caldeira — Eu já declarei que é este o primeiro dia de sessão em que venho á camara, depois que teve logar a votação a que me refiro na minha declaração; e que eu votei contra as propostas dos srs. Cezar, e Pinto d'Almeida, basta para isso invocar o testimunho dos srs. deputados, que se sentam junto de mim.

O sr. Santos Monteiro: — Não tenho duvida em admittir a doutrina nova que se quer estabelecer; mas creio que ale agora ainda não foi admittida; e a practica é que — as declarações de voto tem logar no dia immediato ao da votação; passados uns pou-

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cos de dias não tem logar; e a primeira vez que lai acontece. Se não está determinado positivamente no regimento da casa, pelo menos, é a practica constante desde que ha corporações de similhante natureza; não se vem fazer declarações cinco ou seis dias depois de se votar. (Apoiados)

O sr. Presidente: — Não havendo duvida a respeito da declaração de voto do sr. Vellez Caldeira, lança-se na acta. Quanto á do sr. Bordallo, sobre que se suscitaram algumas duvidas, vou consultar a camara.

Resolveu-se que tambem fosse lançada na acta.

O sr. Presidente: — A grande deputação que, em conformidade da resolução da camara havia, logo que Sua Magestade Imperial chegasse ao Tejo, apresentar-lhe a renovação do sentimento expressado na mensagem de 16 de fevereiro, e assistir ao enterro de Sua Alteza Imperial a Princeza D. Maria Amelia, cumpriu o que pela camara lhe foi determinado.

A mensagem que apresentou a Sua Magestade Imperial a bordo do vapor que a conduziu ao Tejo, é a que passo a lêr.

«Senhora! — A camara dos deputados vem ante Vossa Magestade Imperial ratificar os sentimentos de profunda magoa, que a Vossa Magestade Imperial manifestou na sua mensagem de 16 de fevereiro.

Sua dôr, pelo funestissimo acontecimento, que motivou aquella mensagem, é tão viva hoje, como então o era, e será ião duravel como a causa que a desperta.

Lenitivo só a presença de Vossa Magestade Imperial poderia causar-lh'o, porque Vossa Magestade Imperial, distinctissima pelo complexo das mais sublimes virtudes, e, de mais a mais, a augusta Viuva do excelso hei o sr. D. Pedro IV, do Libertador Duque de Bragança de muito saudosa memoria, e carinhosa Mãe da nunca assás chorada Princeza D. Maria Amelia.

Vossa Magestade Imperial é pois suspirada pelos Portuguezes, quando está ausente, e muito bem vinda quando regressa, como é sempre desejada a sua permanencia entre elles.

Queira o Ceo que, pela constante, muito espontanea, e a mais pura homenagem de seus respeitos e amor, elles possam concorrer para que Vossa Magestade Imperial sinta menos pesado o desgosto que a opprime.

Tal é, Senhora, o mais ardente desejo da camara dos deputados, que a Vossa Magestade Imperial respeitosamente pede haja de tambem acceitar sua cordoa! saudação pela chegada de Vossa Magestade Imperial.»

Sua Magestade Imperial dignou-se responder por escripto da maneira seguinte:

.4 Senhores: — O novo testimunho de saudade e respeito que a camara dos deputados da nação portugueza acaba de tributar aos restos mortaes de minha adorada Filha, empenha cada vez mais a minha viva e eterna gratidão.»

Quererá a camara, acêrca desta resposta, resolver o que resolveu acêrca da primeira? (Muitos apoiados) Então consigna-se na acta que foi ouvida com profundo reconhecimento; o transcrever-se-ha por extenso tanto a resposta como a mensagem; guardando-se no archivo junto á outra, com data de 2 de março; e publica-se no Diario do Governo. (Muitos apoiados.)

CORRESPONDENCIA

Declarações: — Do sr. Mello Soares, participando que o sr. Passos (Manoel) não comparece á sessão de hoje, por motivo de molestia. — Inteirada.

2. Do sr. Frederico Guilherme, participando que o sr. Torquato Maximo não comparece á sessão de hoje, por molestia. — Inteirada.

3. Do sr. Palma, participando que o sr. Garcia Peres, por justo impedimento não comparece á sessão de hoje, e talvez a mais algumas. — Inteirada.

Officios: — 1. Do sr. Guerreiro, participando que achando-se doente, não póde fazer parte da grande deputação, que ha-de ir cumprimentar Sua Magestade Imperatriz, e pedindo que o sr. presidente nomeie outro deputado para o substituir. — Inteirada.

O sr. Presidente: — Tendo recebido este officio no dia 11; e lendo recebido tambem uma communicação do sr. José Xavier de Moraes Pinto, participando igualmente que por incommodo de saude, não podia fazer parte da grande deputação, nomeei, em logar destes senhores, os srs. Antonio de Mello Breyner, e Pinheiro Ozorio para fazerem parte da deputação.

2.º Do sr. Fonseca Coutinho, participando que em consequencia do seu máo estado de saude, que exige tractamento um pouco demorado; e tendo de tractar negocios domesticos urgentes, pede por isso licença para se ausentar da camara, pelo resto da actual sessão. — Concedeu-se a licença pedida.

3. Do sr. Calheiros, participando que lhe não é possivel comparecer hoje, nem ás seguintes sessões até á proxima terça feira, por ter de saír fóra da capital a negocio urgente. — Inteirada.

4.º Do ministerio do reino, dando as informações que lhe foram pedidas pela commissão de fazenda, sobre a pertenção dos empregados das repartições extinctas, com exercicio na secretaria do conselho gera] de beneficencia. — Á commissão de fazenda.

5.º Do-mesmo ministerio, dando as informações que foram pedidas pelo sr. Silvestre Ribeiro, sobre divisão territorial dos concelhos de Santa Cruz e Machico, na ilha da Madeira. — Para a secretaria.

6.º Do ministerio da marinha e do ultramar, dando as informações que lhe foram pedidas, sobre se os barcos de vapôr pertencentes á armada lêem a força e capacidade necessarias para fazerem a carreira de Angola, satisfazendo a um requerimento do sr. Arrobas. — Para a secretaria.

7. Do mesmo ministerio, dando os esclarecimentos que lhe foram pedidos, sobre a representação dos empregados de Loanda, acêrca do pagamento de seus vencimentos em moeda forte. — Á commissão do ultramar.

REPRESENTAÇÕES: — 1.ª Da camara municipal de Pinhel, pedindo que se mande construir uma estrada desde a Barca de Alva, passando por Pinhel e Celorico, até Foz-Dão, fazendo tambem um ramal de estrada do Pinhel até á Meda, e uma ponte no Maçoeime. A commissão das obras publicas.

2.ª Da camara municipal de Villa Real de Santo Antonio, pedindo novamente, que em uma ou mais alfandegas do Algarve, particularmente na de Villa Real de Santo Antonio, sejam admittidos os tecidos de algodão estrangeiros. — As commissões de fazenda e de commercio e artes.

3.ª Do conselho escolar da escola medico-cirurgica do Porto, offerecendo alguns dados e noções

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que julga absolutamente indispensaveis á manutenção e progressivo melhoramento das escólas. — Á commissão de instrucção publica.

SEGUNDAS LEITURAS.

Requerimento: — Requeiro se peça, com urgencia, ao governo, pelos ministerios respectivos, os seguintes esclarecimentos:

1: Quantos barcos provenientes dos portos do Algarve têem tido despacho na alfandega grande de Lisboa, nos 3 annos de 1850 a 1852, com destino para aquella provincia.

2. Um mappa estatistico das cargas despachadas na alfandega grande de Lisboa, com destino para os portos do Algarve, referido aos mesmos 3 annos.

3. Lima synopse dos manifestos feitos no consulado geral de Gibraltar para barcos com destino aos mesmos portos, e especificando as cargas despachadas para estes destinos, e referida aos mesmos 3 annos.

4. Uma relação dos barcos que saíram dos mesmos portos com destino para Gibraltar, que cargas levaram, e que cargas despacharam nas alfandegas desses portos, quando voltaram a elles. — Palma.

Foi remettido ao governo.

Requerimento: — Requeiro que pelo ministerio da fazenda se remetta a esta camara, com urgencia, um mappa do vinho e agoa-ardente, expoliados do porto de Lisboa para as nossas possessões de Africa, nos annos comprehendidos entre maio de 1847 ale maio de 1851, distinguindo separadamente cada anno.

— Visconde da Junqueira. Foi remettido ao governo.

Requerimento: — Requeiro que seja enviado á commissão de fazenda um requerimento dos capitães de infanteria, servindo na guarda municipal de Lisboa, sobre deducções de decimas, e que eu apresentei na sessão passada, para que a commissão considero a justa pertenção dos supplicantes, por occasião de examinar a parte do orçamento, que tracta dos vencimentos dos officiaes daquelle corpo. — Cezar de Vasconcellos.

Foi admittido e approvado sem discussão.

Requerimento: — Requeiro que os papeis e mais documentos sobre a canalisação do rio das Enguias, entre Tejo e Sado, mandados a esta casa da secretaria das obras publicas, sejam remettidos á commissão de obras publicas, para serem devidamente apreciados. — Garcia Peres.

Foi admittido e approvado sem discussão.

Proposta: — Renovo a iniciativa da projecto de lei n.º 38 «la sessão de 1851, afim de que seja novamente elevada a 6 contos de réis a prestação concedida ao visconde de Santarem, para o costeamento dos trabalhos litteratos de que se acha encarregado.

— Pessanha (João).

(O projecto a que se refere esta proposta é o seguinte.)

Parecer (n.* 38 de 1851.) — Senhores: A commissão do orçamento examinou mui attentamente a proposta n.º 9 — l), apresentada pelo governo, para se elevar a 6 contos de réis a prestação de 4 contos de réis, que actualmente percebe o visconde de Santarem, para continuar a publicação dos trabalhos de que está encarregado; e attendendo aos justos fundamentos da proposta, bem como ás razões que mui desenvolvidamente foram enumeradas no parecer da illustre commissão diplomatica, que acompanhou a

dicta proposta, é de parecer que ella seja approvada, e convertida no projecto de lei que a mesma illustre commissão diplomatica confeccionou.

Sala da commissão, 3 de abril de 1,851. — Joaquim José Falcão = Lourenço José Moniz — Jeronymo José de Mello (com declaração) = Francisco José da Costa Lobo — Antonio Vicente Peixoto = J'. de D. Antunes Pinto — Bernardo Miguel de Oliveira Borges = João da Costa Carvalho — Eugenio de Almeida = Augusto Xavier da Silva.

A commissão diplomatica foi enviada a proposta de lei n.º 9 — D, apresentada a esta camara pelo sr. ministro dos negocios estrangeiros, a qual tem por fim restabelecer, no seu original quantitativo de fi contos de réis. a subvenção concedida ao visconde de Santarem para a publicação de differentes obras, da qual fôra encarregado pelo governo de Sua Magestade; e bem assim um relatorio mui circumstanciado do mesmo visconde, um officio do nosso ministro em Paris, e outros documentos officiaes concernentes ao mesmo objecto. A commissão entrou na consideração do negocio, que a proposta involve, com aquella attenção, que a natureza delle desde logo lhe inspirou; e pelo cuidadoso exame dos referidos documentos, achou que as varias obras de cuja publicação fôra incumbido o visconde de Santarem, são de mui transcendente importancia; mui numerosas, e de raro valor os documentos que dellas fazem parte, para a enumeração de todas as quaes obras e documentos, a commissão se refere ás ciladas peças officiaes. Estas peças, mostram, em ioda a evidencia, que não só as auctoridades das quaes ellas dimanam, mas as opiniões da parte mais grave da imprensa periodica litteraria e scientifica, têem caracterisado a publicação das dictas obras como de summa utilidade para o inundo litterario em geral, e de grande gloria para o seu auctor, e para o governo e nação portugueza. A commissão viu que taes obras custaram longos annos de improbos trabalhos da parte do visconde de Santarem; e que á força do mais perseverante zelo e infatigavel assiduidade, e até de sacrificios de não pequenas sommas de seu proprio patrimonio, é que aquelle illustre portuguez conseguiu pôr a sua publicação em progressivo andamento, até o anno de 1840; tempo em que a prestação original de 6 foi reduzida a 4 contos de réis. Observou mais a commissão, que desde a época daquella reducção, a marcha da publicação tem sido extremamente morosa; e que a causa essencial deste atrazo tem sido a insufficiencia de meios pecuniarios em que ficou collocado o illustre funccionario encarregado daquelles trabalhos. Notou ainda a commissão que os mencionados documentos asseguram que, uma vez que a antiga prestação seja regularmente paga, nem um só momento parará mais o andamento da publicação. A commissão deprehende finalmente das mesmas fontes de informação, que não está na marcha das cousas humanas encontrar segunda vez um concurso de circumstancias tão favoraveis para levar ao cabo Ião ardua, importante e honrosa empreza, como aquelle que tem offerecido a estada por tantos annos em Paris, centro do mundo litterario, de um sabio dos elevados talentos, grandes conhecimentos, incançavel zelo, e amplas e variadas relações do visconde de Santarem; e tem por mais que provavel a commissão, que se a publicação das obras de que se tracta, não fôr prompta, e sem interrupção, grande risco se seguira de que a empreza venha de todo a

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Malograr-se, visto que, como fim declarado, a opportunidade que offerecem os serviços do visconde de Santarem, e com toda a rasão considerada como unica.

Em presença pois de todos os factos e considerações que ficam expendidas e de outros que, sendo necessario, serão apresentados, intende a commissão, que nem o governo, nem esta camara, sem grande desdouro seu, podem expor a perecer á mingua de meios, por causa de uma differença de despeza, comparativamente limitada, uma empreza de tão reconhecida e vasta utilidade, e ião subido lustre para a nação portugueza; e que portanto a proposta do governo deve ser approvada; e na conformidade desta sua opinião, tem a honra de a converter no seguinte projecto de lei.

Artigo 1.º É elevada a 6 contos de réis a prestação annual, concedida ao visconde de Santarem para continuar as importantes publicações de que esta encarregado.

Art. 2.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da commissão, em 28 de março de 1851. — Lourenço José Moniz = Custodio Manoel Gomes = Antonio Vicente Peixoto = Luiz Vicente de Affonseca = Tem voto dos srs. Dom Prior de Guimarães e Conde de Linhares.

Sendo admittido, foi enviado á commissão ele fazenda.

Projecto de lei: — Os decretos de 5 de novembro de 1851, e 2 de dezembro de 1852 lêem excitado fortes e clamorosos queixumes. Os defensores da liberdade da terra, as pessoas obrigadas ao cumprimento dos legados pios, e os estabelecimentos interessados na applicação dos não cumpridos, todos alli hão, encontrado motivo para se queixar.

A parte as intenções, tanto dos que os suggeriram, como dos que os sustentam e combatem, é força confessar que fizeram innovações que nunca foram toleradas, desde o berço da monarchia até hoje; estabeleceram disposições anti-politicas e anti-economicas, cuja execução foi suspensa, mesmo em épocas de menos illustração que a actual; e deram, finalmente, nos estabelecimentos acima indicados, privilegios que a fazenda nacional não tem.

A legislação anterior é, sem duvida, tão defeituosa como acanhada; limita-se a regular mais que confusa e contradictoriamente a applicação dos legados pios, que não são devidamente cumpridos, e a sua arrecadação e commutação. A beneficencia e caridade publica são o seu unico intuito; e todas as vezes que era preciso soccorrer alguma classe ou estabelecimento, recorria-se ao expediente de lhe dar partilha nos legados pios.

Similhante legislação não satisfazia já a este fim, nem ás necessidades do paiz, e menos ás indicações da sciencia. A reforma era, e é indispensavel; mas é preciso fazer uma reforma que liberte, e não escravise a propriedade; desassombre, e não affecte a riqueza nacional; e aproveite não só aos estabelecimentos de caridade e beneficencia, mas a toda a nação. Não basta regular a applicação, a arrecadação, ou a commutação dos legados pios, é necessario tambem providenciar á sua extincção, repressão, reducção, conversão, e remissão.

Por estes motivos tenho a honra de vos propôr o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º O hospital de S. José, santa cisa da misericordia de Lisboa, ou outros quaesquer estabelecimentos de caridade e beneficencia, não podem possuir bens de raiz por mais de anno e dia, sem licença regia.

§ unico. Os bens que possuirem sem esta licença, ou não a obtendo dentro de igual praso, contado desde a publicação da presente lei, deverão ser alienados.

Art. 2.º Tanto aos estabelecimentos declarados no artigo anterior, como a outros quaesquer corpos de mão morta, só se concedera dispensa para possuirem bens de raiz, além do tempo legal, provando-se urgente necessidade.

Art. 3.º Poderão ser denunciados, conforme a legislação em vigor, os bens de raiz, que os estabelecimentos, de que tractam os precedentes artigos, possuirem por mais do praso legal, sem licença regia.

§ 1.º O ministerio publico proporá a acção de denuncia todas as vezes que ella tiver logar, dentro de trinta dias depois de receber os documentos necessarios.

§ 2.º As auctoridades administrativas, apenas tiverem noticia de alguns bens possuidos contra a disposição desta lei, o participarão ao ministerio publico, fornecendo-lhe Jogo os respectivos documentos e esclarecimentos.

Art. 4.º Não serão admittidos a propôr acção alguma em juizo os corpos de mão morta sobre os bens que possuirem contra as disposições desta lei, nem sobre a sua renda, fôro, censo, ou outra qualquer pensão.

Art. 5.º E inteiramente revogado, o alvará de 31 de janeiro de 1775, que declarou e ampliou os §§ 6.º e 7.º da lei de 9 de setembro de 1769, os quaes ficam em vigor.

Art. 6.º São nullos os legados pios instituidos depois da publicação da lei de 9 de setembro de 1769, e os que se instituirem para o futuro, ainda mesmo não sendo impostos em bens de raiz, quando a sua instituição não tenha sido precedida de licença regia.

Art. 7.º As contas do cumprimento dos legados pios, serão tomadas pelo administrador do concelho nos termos do artigo 248.º n.º 2, do codigo administrativo, cuja disposição é restabelecida.

Art. 8.º A execução das contas, conhecimento e julgamento de todas as questões sobre legados pios, são da exclusiva competencia do juiz de direito da comarca, ou vara respectiva.

§ 1.º Em todas estas cousas será sempre ouvido o ministerio publico.

§ 2.º Este interporá o recurso competente, quando a decisão lhe não fôr favoravel.

§ 3.º A fórma do processo será a ordinaria.

Art. 9.º As causas de abolição de morgados ou capellas, e de subrogação de bens vinculados ou encapellados processar-se-hão conforme o decreto de 4 de abril de 1832, e a reforma judicial, intervindo só as pessoas que são mandadas ouvir por esta legislação.

Art. 10.º Extincto por qualquer modo um vinculo ou capella, cessam todos os encargos e legados pios inherentes ao mesmo.

§ 1.º São considerados extinctos, desde a abolição das ordans religiosas, os legados pios, que a estas se pagavam.

§ 2.º Não poderão, porém, repetir-se os já pagos. Art. 11.º Todos os legados pios não extinctos ficam sujeitos, requerendo os devedores:

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1.º A commutação feita pelo ordinario, cm applicação immediata para a misericordia mais proxima, não pertencendo já por lei a outro estabelecimento; devendo os encargos respectivos ser commutados em missas resadas pro benefactoribus in genere

2.º A conversão, pela fórma do artigo 9.º da lei de 22 de junho de 1816, no que fôr applicavel, em dinheiro, se foram instituidos em genero;

3.º A reducção a tres quartas partes, a qual fica desde já lendo logar por immediata disposição, desta lei, além da já feita pelo de 9 de setembro de 1769, §19.

4. A remissão por vinte prestações annuaes depois de reduzidas.

Art. 12.º As disposições desta lei são applicaveis a todos os legados pios, ou sejam impostos em bens de vinculos ou capella vinculada, ou não vinculada, ou em bens livres de qualquer natureza e especie, não lendo outro fim senão a piedade do instituidor, quaesquer que sejam as suas denominações e as clausulas das instituições.

Art. 13.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala das sessões, 4 de maio de 1853. — O deputado por Trancoso, Francisco Maria da Guerra Bordai lo.

Sendo admittido, foi enviado d commissão de legislação, devendo ter tambem publicado no Diario do Governo.

Projecto de lei. — Senhores: A provincia da Beira, a maior e uma das mais povoadas e indutriosas do reino, pagando ha perto de 10 annos uma contribuição especial para estradas, queixa-se com razão que alli não se tenha aberto ou melhorado alguma das muitas que precisa, não obstante a disposição do artigo 2.º da lei de 26 de julho de 1843, que as mandara começar quanto fosse possivel, simultaneamente em todos os districtos do continente.

Pelo systema de estradas, approvado pela cilada lei, pertenciam ás duas Beiras, a cada uma sua estrada principal directa, e outras indirectas, que ligavam entre si as terras principaes.

Não se fez um só palmo destas estradas; e ainda que os povos se reputariam muito felizes, se as vissem concluidas, é evidente que aquelle systema é muito deficiente: falla nelle uma estrada desde a Foz-Dão, passando por Mangualde, Celorico e Pinhel, ale á Barca de Alva; e duas partindo deste ponto, uma ale á Pesqueira, e outra até ao Sabugal; assim como mais uma que communique as duas Beiras pela Serra «In listrei la, e outra de Trancoso até ao Pocinho.

Por este modo ficariam os povos da Beira em contacto com as grandes vias fluviaes do Téjo, Douro e Mondego; e ver-se-hia desinvolver a agricultura, florecer a industria, e multiplicar o commercio.

Revogada a caria de lei de 26 de julho de 1843 pela de 19 de abril de 1815, ficou a certeza de que se pagaria o imposto estabelecido por aquella; mas falla a certeza de que será applicado ao fim a que foi destinado. Os povos reclamam esta certeza: não se recusam a pagar para as estrada'; porém querem gosar dos que se lhes prometteram. Havendo cumprido pela sua parte, exigem que os seus representantes promovam o cumprimento da obrigação correlativa: o têem direito a ser satisfeitos.

Por este motivo tenho a honra de vos propôr o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Proceder-se-ha, sem perda de tempo, a abertura e melhoramento das estradas das duas Beiras, que constam dos mappas n.º 1 e 2, annexos II caria de lei de 26 de julho de 1843.

Art., 2.º Far-se hão, tambem, as obras necessarias para a abertura ou melhoramento de uma estrada desde a Foz-Dão ato á Barca de Alva, passando por Mangualde, Celorico e Pinhel.

Art. 3.º Abrir-se-ha uma estrada, pela margem esquerda do Douro, desde a Barca de Alva até á Pesqueira; e melhorar-se-ha a que parte daquelle ponto até ao Sabugal.

Art. 4.º Proceder-se-ha ao melhoramento da estrada de Trancoso até ao Pocinho.

Art. 5.º Abrir-se-ha, finalmente, uma eirada que communique as duas Beiras pela Serra da Estrella, pelo ponto mais conveniente.

Art. 6.º O imposto para as estradas será impreterivelmente applicado nestas, e nos districtos administrativos onde se cobra.

Art. 7.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala das sessões da Camara do deputados, 4 de maio de 1853. =: O deputado por Trancoso, Francisco Alaria da Guerra Bordallo: O deputado, Arystides Ribeiro Alvares — O deputado, Antonio Saraiva Carvalho.

Sendo admittido, foi enviado á commissão das obras publicas, devendo ser tambem publicado no Diario do Governo.

Projecto de lei (n.º 31 M). — Senhores: Gôa n'outra era emporio e deposito de todas as mercadorias da Asia, foi uma das cidades mais populosas, commerciantes e ricas dessa parte do mundo; mas hoje seccando-lhe esta parte da riqueza publica, se acha infelizmente reduzida ao exulamento e á summa pobreza; e até de vez em quando se apparece ahi algum estrangeiro, é para visitar as ruinas da antiga Gôa, o admirar nellas a sua preterita grandeza e esplendor.

Destituida deste ramo de industria commercial, o tambem da manufactureira, não lhe resta hoje outro, que possa ser cultivado fructuosa e lucrativamente, mais que a agricultura, fomentando-o pois, é que se póde melhorar a sorte dos portuguezes dessa parte da monarchia o promover o seu bem estar.

Julgo desnecessario tractar de demonstrar aqui, que de entre os meios que poderosamente concorrem para fomentar e augmentar a industria agricola, o mais principal é a liberdade do sólo, porque é este um principio incontestavel da sciencia, corroborado pela experiencia contemporanea, tanto estrangeira, como domestica, depois da salutar legislação da dictadura, do nunca assaz chorado Imperador Duque de Bragança, que libertou o sólo do continente do reino da maior parte das alcavalas, octrois, direitos banaes, e outras servitudes que a escravisavam nos reinados antecedentes.

É pois esta a liberdade que o sólo dos estados de Gôa demanda, para que a sua cultura seja fomentada, melhorada, e augmentada.

Em Gôa (são palavras da junta geral de districto da mesma, na sua consulta de 1841) ha alguns bens, que n'outro tempo lendo pertencido por differentes titulos á fazenda publica, andam ao presente afforados a particulares sob diversas denominações de praso da corôa no maximo nelles, etc. Sujeitos uns ao

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reconhecimento do governo dilecto por simples termo em cada vida, outros a carias de successão vitalicia, e outros finalmente a carias vitalicias com o direito de renovação de apurameneo no fim de tres vidas. Estes bens emfiteuticos não podendo segundo as regras do direito, ser divididos, nem alheados sem licença do direito senhor, sujeitos a grave incommodos, se acham em geral muito mal cultivados; e muitos delles estão de tal maneira encravados em outros allodiaes dos possuidores, que é agora difficil, e mesmo impossivel, distingui-los entre si; resultando daqui o inconveniente de se não poderem dividir, e alheiar os ditos bens allodiaes, que cercam os emfiteuticos.

Alguns destes bens emfiteuticos são absolutamente indivisiveis, mas outros indivisiveis sómente quoad glebam, e divisiveis quoad valorem, ao qual tem direito muitos individuos, sendo a maior parte dos mesmos bens de tão insignificante renda, que mal chega para costear as despezas de vistorias, avaliações, e mais diligencias necessarias para se haver certa de successor, e renovação, accrescendo muitas vezes a difficuldade do accôrdo dos interessados nos prasos quoad valorem, no individuo, em que o praso deva ser encabeçado. Donde resulta não haver a respectiva caria, e por falla della ficam os prasos na administração da fazenda nacional, a qual os arrenda triennalmente em hasta publica, mas é notorio que o preço que obtem nestes arrendamentos, é sempre lesivo, ao mesmo tempo que os bens ficam muito mal cultivados, e por conseguinte deteriorados, não obstante quaesquer condições de arrendamento, que a experiencia mostra que nunca Se cumprem.

Logo é de manifesta Utilidade da agricultura daquella parte da monarchia a remissibilidade desses fóros pertencentes á fazenda publica, pagando-lhe o foreiro um justo e rasoavel preço; mas para que este pagamento não seja nem oneroso no emfiteuta, quando a quantia fôr avultada, nem prejudicial á fazenda publica, cessando-lhe de Um jacto a renda dos fóros, que entra na sua receita ordinaria, é conveniente que possa ser realisado em prestações rasoaveis.

Existem igualmenee nos mesmos estados de Gôa, principalmente nos estabelecimentos de Damão e Dio, alguns direitos banaes, de natureza e analogia dos que louvavelmente foram abolidos e extinctos pela sobredita legislação da providente dictadura do Immortal Duque do Bragança, os quaes além de produzirem vexames e violencias, causam tambem estorvos para augmento da agricultura, que naquelles estabelecimentos se acha em espantoso atraso, os quaes, assim como já não existem cá, não devem continuar a existir lá.

Por estes motivos que serão opportunamente desinvolvidos, tomo a liberdade de apresentar á vossa approvação o seguinte projecto de lei

Artigo 1.º Todos Os censos e fóros de qualquer natureza que sejam existentes nos estados de Gôa, e de que a fazenda nacional é credora, ou senhoria directa, podem ser remidos na conformidade desta lei, ou foreiros possuidores legitimos dos predios onerados.

§ unico, Não gosa do beneficio da remissão o emfiteuta, quando o sub-emfiteuta quizer remir.

Art. 2.º O preço da remissão será igual a vinte pensões das que oneraram o predio, que se pertende remir; porém na remissão dos foros accrescerá mais um laudemio, que será quarenta e um.

Art. 3.º Quando Os censos ou foros não consistirem em dinheiro, haverá para regular o preço das remissões a competente liquidação feita no juizo contencioso a requerimento do remittente, com estação do delegado do procurador regio por parte da fazenda nacional; e tambem com a citação do emfiteuta, quando o remittente fôr sub-emfiteuta. Esle processo é summario e nenhum recurso será recebido, senão no effeito devolutivo.

Art. 4.º Quando o preço da remissão exceder a 500 xarafins, poderá ser pago em prestações eguaes, ficando a vencer juros de 5 por cento, as prestações que se deverem.

Art. 5.º Ficam considerando-se allodiaes para todos os effeitos os bens remidos desde o momento que se effectuar o pagamento da primeira prestação, e ficam hypothecados legalmente ao pagamento das prestações e seus juros em divida.

Art. 6.º O governo geral em conselho com audiencia da junta de fazenda publica, fica auctorisada a fixar o prazo do pagamento das prestações e seus juros, a qualidade da moeda, tudo quanto fôr possivel, conforme ás regras em vigor para a venda dos bens nacionaes naquelles estados.

Art. 7.º Todos e quaesquer direitos banaes que ainda existem nos mesmos estados da India, ficam extinctos e abolidos, assim como foram no continente do reino, por decreto de 13 de agosto de 1832.

Art. 8.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara, 10 de maio de 1853. — Estevão Jeremias Mascarenhas, deputado por Gôa.

Sendo admittido, foi enviado á commissão do ultramar.

Proposta: — Renovamos a iniciativa do projecto 11.º 23, de 1852 — Jeremias Mascarenhas — Ferreira de. Castro.

(O projecto a que se refere esta proposta, é o seguinte):

Projecto de lei (n.º 23, de 1852). — Quando o decreto de 23 de maio de 1834 extinguiu as ordens religiosas, declarou que se dariam, e logo foram. designadas por outro decreto de 20 de junho, pensões ou prestações aos membros dellas para a sua decente e devida sustentação. Esle passo não foi dictado por maximas de elevada politica, ou por doces sentimentos de humanidade, foi um acto indispensavel de rigorosa justiça. Incorporando na fazenda nacional todos 05 bens de qualquer especies que as corporações regulares estavam possuindo, reconheceu o legislador o sagrado direito dos membros das dietas corporações a uma justa indemnisação, nem podia deixar de o reconhecer, porque elle muito bem sabia, e ninguem de bom senso ignora, que ás corporações regulares competia o direito de propriedade sobre os seus bens legitimamente adquiridos, da mesura sorte que a quaesquer outras corporações ecclesiasticas, ou seculares, ou individuos particulares.

Não deve, pois, considerar-se a prestação concedida aos egressos como uma concessão espontanea, ou como uma obra de beneficencia do governo ou da unção, mas sim como satisfação de um rigoroso dever; e como o pagamento de uma divida sagrada, sem que comtudo deixe de ser tambem um acto de humanidade. E sobre todos esses titulos, que é reconhecida no relatorio ao decreto de 2 de novembro de 1836, e é por isso mesmo que neste ultimo decreto

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foram separados varios rendimentos publicos, e applicados para o pagamento das dicsas prestações.

Forçoso, comtudo, é confessar que esse sagrado e rigoroso dever, respeitavel por sua origem, por seu objecto, e não menos pelo desvalimento, caracter e profissão dos individuos a quem. respeita, não tem merecido em differentes tempos ajusta e devida consideração; podendo talvez affirmar-se que entre os (redores do estado, sendo os egressos os que tinham melhor direito a serem preferidos no pagamento de suas prestações, são estes mesmos os que têem sido mais esquecidos, mais desfavorecidos (e permitta-se me que diga) mais injustamente tractados.

Nenhuma novidade, senhores, vos poderia dar nesta materia, porque vós todos tendes presenciado o abandono a que parece foi votada esta classe de cidadãos, depois de terem sido expulsos de suas casas, e privados dos bens que haviam adquirido por titulos legitimos, e pelo seu trabalho e industria. Condemnados por muitos annos a receberem em logar das suas prestações em dinheiro, uns chamados recibos notados, que eram obrigados a rebater por menos a terça, quarta, quinta ou sexta parte do valor nominal, foram reduzidos a um estado lastimoso, para me servir das proprias expressões do decreto de 22 de agosto de 1843, porque se viram, vós o sabeis, no meio da sociedade sem meio algum de subsistencia, e alguns delles, por sua idade ou molestias, sem aptidão e agilidade para poder mendigar.

Aquelle estado lastimoso, propoz-se o governo a prover de remedio pelo citado decreto de 22 de agosto; e posto que nunca a ninguem tivesse occorrido a idéa de que as prestações dos egressos eram excessivas, a providencia adoptada pelo governo, foi reduzir á metade as dietas prestações, ordenando que o pagamento se fizesse em dia; isto é, que até ao dia 15 de cada mez se satisfizessem os vencimentos do mez antecedente. Ainda que a providencia daquelle decreto não passasse de uma medida interina, como nelle mesmo se expressa, a reducção por ella feita foi logo, sem proceder approvação do corpo legislativo, considerada como obra perfeita, justa e sanccionada por lei (quando em verdade não foi senão uma injustiça manifesta, uma violação dos direito, e das respectivas leis) e para se lhe dar plena execução de futuro, se mandou, pelo decreto de 30 de maio de 1844, que se passassem aos prestacionados titulos de renda vitalicia, pela metade da quinta de que tivessem o assentamento legal no thesouro.

É assim que se tem respeitado uma obrigação sagrada. E desta sorte que são nadados os membros das extinctas corporações regulares, depois de perderem a favor da fazenda nacional toda a sua propriedade.

O pagamento dessa mesma reduzida metade, tem sido sofismado, e a solemne promessa do decreto de 22 de agosto ficou sem execução, como as antecedentes; porque não ha lei, não ha providencia a favor desta classe de cidadãos, que merecesse ser cumprida. O atrasamento das prestações em algues districtos do reino é excessivo, é escandaloso: ha pomos dias se lerem nesta casa requerimentos de eggressos, que se queixam da falla de pagamento de 22 mezes, e se n'outros é menor o atrasamento, em todos e grande, e mui grandemente lastimoso o estado a que se acham reduzidos pela falla de seus devidos alimentos. E é nesta triste conjunctura que o governo,

rompendo por todas as considerações em que as citadas leis e decretos tomaram a sorte dos egressos, lhes inutilisa os titulos de tenda vitalicia, lhes supprime a providencia benefica do artigo 4º do decreto de 30 de maio de 1844, e os quer novamente reduzir a notar recibos, para levarem ás mãos dos agiotas a importancia de suas prestações, de que tanto carecem pera sustentar a vida.

Convem, senhores, que vos lembreis que esta infeliz classe de cidadãos, digna sem duvida de melhor sorte, está hoje reduzida a numero muito inferior ao que fôra em 1834; que todos esperavam que chegaria um momento em que fossem tractados com justiça, e que cessasse o despreso e abandono com que eram tractados, porém, muitos não chegaram a vêr esse dia, e talvez a pobreza e miseria apressou os dias de sua vida. Não é justo, não é possivel, que assim sejam tractados até ao fim; uma lai injustiça mereceria os titulos de cruel e tyrannica; e tanto mais ella se prolonga, quanto mais augmenta a sua gravidade, por quanto mais augmenta a sua gravidade, por quanto os egressos que hoje recebem prestações, são, na maxima parte, individuos, que, por sua idade, molestias, e outras causas, nem podem servir empregos ecclesiasticos ou civis, nem adquirir por outros meios a sua necessaria sustentação; pelo que não duvido que convireis, em que nenhum credor ou servidor do estado tem melhor direito a ser attendido e pago do que os egressos.

Persuadido de que deve ler chegado o tempo de reconhecer, fazer cessar, e reparar o injusto procedimento seguido conda a referida classe, não proporei medidas novas, nem favores extraordinarios em seu beneficio; Irei buscar as providencias contidas nas leis e decretos, que se deveriam ter observado, e fundado nellas, tenho a honra de vos propôr o seguinte projecto de lei

Artigo 1.º Desde a publicação desta lei continuar-se-ha a pagar aos egressos das extinctas ordens regulares a pi estação designada nos artigos 1.º e 2. do decreto de 20 de junho de 1834.

Art. 2.º O pagamento, de que tracta o artigo antecedente, será feito pontualmente, e como prescreve o artigo 2.º do decreto de 22 de agosto de 181-3.

Art. 3.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala das sessão da camara dos deputados, 4 de fevereiro de 1852 — Joaquim Rodrigues Ferreira Pontes, deputado por Traz-os Montes.

Sendo admittido, foi enviado á commissão de fazenda.

O sr. Secretario (Rebello de (Carvalho). — Na sessão passada foi mandado para a mesa um parecer da commissão do ultramar, concluindo por um projecto de lei, o qual se mandou imprimir.

A mesa acaba de receber

Um officio do sr. Barão d'Almeirim participando que negocios urgentes de sua casa reclamam a sua presença em Santarem por alguns dias, e pede para esse fim dez ou doze dias de licença.

Foi concedida.

O sr Justino de Freitas: — Mando para a mesa o seguinte parecer da commissão de poderes.

Foi lido na mesa o parecer da commissão de poderes, que acha legal o diploma do sr. Antonio da Luz Pitta, deputado eleito pelo circulo do Funchal

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Foi approvado sem discussão, e depois de proclamado deputado foi logo introduzido na sala o sr. Luz Pitta, que prestou juramento e tomou assento.

O sr. Santos Monteiro: — Acaba de ser distribuido nesta camara um parecer da commissão de commercio e artes, em que nega a approvação a um projecto que aqui apresentei; mas, entre Os membros da commissão lia dois que assignaram com declaração; e além disso, ha um parecer da commissão de fazenda que approva o meu projecto, o qual parecer não esta impresso; é verdade que está no Diario do Governo, mas não me parece bastante para a discussão

Não era para este fim porém que eu tinha pedido a palavra a v. ex., era sobre a mesma materia para apresentar um requerimento; e peço á meza que, a ser possivel, seja hoje mesmo expedido para o governo, a fim de vêr se é possivel responder á pergunta que eu aqui faço: eu talvez estivesse habilitado para responder; mas queria que a resposta fosse official. Esle objecto, o qual senão tem querido encarar, senão em vista d.is regras restrictas da sciencia, encarado pela practica tem produzido uma bulha, e

uma bulha muito grande..... não quero entrar na

questão, não a quero antecipar.

Declaro muito positivamente — que quando apresento um projecto de lei qualquer, é porque intendo ser de interesse publico; não estou ligado por nenhuma consideração a votar deste, ou daquelle modo, mas sim como eu intendo. Se eu votei approvando os actos da dictadura em globo, considerei mais a questão politica, do que alguns tios projectos contidos nos volumes que aqui vieram; e tanto isto é assim, que o projecto que eu apresentei para a elevação do direito da praia, tende a alterar um dos decretos da dictadura: e desde já faço uma declararão, que hei-de usar da iniciativa para alterar mais alguns decretos, especialmente aquelle que diz respeito ás alterações nas pautas. Sinto que não esteja presente o sr. ministro do reino, — porque elle poderia dar um testimunho de que eu fui um dos primeiros que, ha muitos annos, reconheci a alta conveniencia de reformar as pautas; conheço tambem que a commissão que tractou deste objecto, fez muito bons serviços, mas a materia é de tal natureza que não se podia concluir com a brevidade com que ella foi concluida; talvez fosse devido a essa brevidade de trabalho o apparecerem algumas inconveniencias, não só para a industria do paiz, mas ainda para os rendimentos publicos.

Portanto digo que não posso deixar de agradecer á illustre commissão de commercio e artes a occasião que me proporcionou de chegar mais cedo a onde eu esperava chegar mais tarde. Eu não quero agora fugir da ordem; direi apenas que me reservo para tratar desta questão, quando ella vier á discussão.

Esta questão a respeito de moeda agitou-se em 1851, sendo ministro da fazenda o sr. Antonio José d'Avila. S. ex. então nomeou uma commissão da qual fizeram parte alguns membros, que actualmente se acham nesta camara, sendo um delles o sr. Julio Pimentel. E é em consequencia disto que eu faço o seguinte

Requerimento: — Requeiro que se peça ao governo, pelo ministerio da fazenda, a remessa com toda a urgencia a esta camara do relatorio, e quaesquer outros trabalhos ou pareceres da commissão creada por decreto de 15 de janeiro de 1851, para propôr as providencias que já nessa época reclamava o nosso systema monetario, e a desharmonia entre os valores officiaes do ouro e da praia. — Santos Monteiro.

(Continuando) Sinto que não esteja presente o sr. ministro da fazenda, porque desejava perguntar a s. ex. se o director da casa da moeda lhe tinha feito a este respeito alguma reflexão, ou ao director geral das contribuições indirectas; e se a tinha feito verbalmente, ou se a tinha feito por escripto; e não a lendo feito, desejava, em todo o caso, que s. ex.ª ouvisse a opinião deste funccionario probo e muito intelligente, a respeito da questão sujeita. Como, porém, o sr. ministro da fazenda não está presente, em particular lhe farei esta pergunta.

A camara resolveu que o projecto do sr. Santos Monteiro fosse tambem impresso.

Foi admittido o requerimento do sr. Santos Monteiro, e ficou em discussão.

O sr. Julio Pimentel: — Não me opponho ao requerimento, mas cumpre-me dizer alguma cousa a respeito da commissão a que alludiu o illustre deputado. Eu era secretario dessa commissão, e não me recordo de se ter apresentado nem relatorio nem parecer algum. A commissão reuniu-se algumas vezes, é verdade, mas depois que o sr. Avila, então ministro da fazenda, veio apresentar no parlamento, em 1851, um projecto que foi approvado, e cujo fim era retirar da circulação cellas moedas de ouro estrangeiras, conservando unicamente as libras no valor legal que actualmente tem, não me recordo que a commissão se tivesse tornado a reunir; nem apresentou parecer, nem relatorio algum. A razão porque se não tornou a reunir, não sei eu; o que sei é que não tomei a ser convocado para esta commissão; e na qualidade de secretario não me pertencia fazer a convocação para a reunião da commissão; e estou convencido que não ha relatorio nem documento algum assignado pelos membros que fizeram parte dessa commissão.

O sr. Cunha Sotto-Maior. — Pedi a palavra para chamar a attenção do sr. ministro da fazenda e da camara, sobre um facto que esta acontecendo ha dias nesta capital: nós estamos aqui a fazer discursos, e o paiz está soffrendo o prejuizo que resulta do agio que existe entre a prata e ouro. Os principio de sciencia que os illustres deputados invocam, não destroem o flagello, que actualmente existe, sensivelmente pesado não só para aquelles que tem de trocar um soberano, mas mais ainda para o negociante que tem de trocar 300 ou 400 soberanos para as suas transacções commerciaes. Em logar de se fazerem discursos, seria melhor tomar uma medida decisiva, rapida, e prompta para acabar com o desequilibrio que ha entre o ouro e a prata: porque v. ex.ª, a camara e a todos os deputados com os principios de sciencia e economia que invocam, não são capazes de mostrar que não é bastante sensivel para quem tem de trocar um soberano, perder um tostão. Por consequencia é necessario evitar este mal quanto antes. Qual é a medida que convem propôr, não sei eu, porque não sou o homem da sciencia; mas apesar disso sempre direi, que a medida que se deve adoptar é prohibir a exportação da prata. Qual o meio de prohibir a exportação da prata? E elevar o direito que facilita a sua exportação. Parece impossivel que esteja o parlamento aberto, que haja um governo e um ministro da fazenda, que se mostrem insensiveis a este flagello que existe, que deixem com-

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VOL. V — MAIO — 1853.

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tinuar o mal e que não tractem de apresentar uma medida para o remediar; sobre tudo parece-me impossivel que a camara esteja entretendo-se em fazer discursos; e a tractar de caminhos de feno, quando ha um flagello que está opprimindo os habitantes desta capital.

Portanto o que eu peço, é que o sr. ministro da fazenda e a camara, adoptem uma providencia para acabar com este mal.

O sr. Ministro da fazenda (Fontes Pereira de Mello) — Sr. presidente, o governo não é indifferente, nem o póde sei, a um panico que se estabeleceu ultimamente nesta capital quanto ao preço do ouro relativamente á prata; panico que, como já disse a ultima vez que fallei sobre este objecto, não tem motivo algum plausivel, porque não existem hoje inconvenientes que não existissem ha 2 ou 4 mezes. V. ex. e a camara sabem perfeitamente que este é um dos objectos mais graves que podem ser tractados pelo governo e pelo parlamento; e não se póde exigir que se proponha para elle uma. solução rapida. (Apoiados) É muito mais facil crear um panico, do que destruil-o. (Apoiados) E declaro a v. ex.ª e á camara que já me tenho occupado deste objecto, tenho mesmo conferenciado com alguns amigos meus, membros da commissão de fazenda e de commercio e artes, sobre o modo de remediar este mal que existe, que é serio, e que é grave: entre tanto o que desejava e muito, pelo interesse de todos e para evitar estas especulações, que todos os dias se estão fazendo neste desgraçado negocio, era que se sobre-esteja quanto possivel nesta discussão sobre a questão do valor da moeda, em quanto se não discute definitivamente o parecer que foi apresentado na camara, e sobre o qual o governo ha-de emittir a sua opinião, o melhor que puder, e como julgar conveniente aos interesses publicos.

Pedia por tanto aos illustres deputados que têem a fallar, se lhes parecesse que estas minhas observações são procedentes, que evitem quanto possivel a discussão sobre este objecto, em quanto v. ex. não julga opportuno dar esse parecer para a ordem do dia. Então a camara e o governo verão a questão como mais conveniente fôr, porque isto não é questão de opposição, nem de governo, é questão de interesse geral que affecta as transacções que se fazem todos os dias no mercado, e sobre a qual deve haver a mais escrupulosa reserva. (Apoiados.)

Eu quiz fazer estas observações para mostrar aos nobres deputados que me não esquece o negocio, mas que me parece inconveniente, para remediar este mal, que se falle agora nesta questão. (Apoiados.)

O sr. Presidente: — Ha um requerimento na mesa, de que v. ex.ª talvez não tenha conhecimento, e é por isso que vai novamente ler-se. (Leu-se.)

O sr. Avila — Sr. presidente, eu pedi a palavra porque queria dar algumas explicações relativamente á commissão, cujo relatorio se pede no requerimento do sr. Santos Monteiro. Estas explicações foram começadas pelo sr. Julio Pimentel, mas peço perdão ao illustre deputado para lhe observar que me parece que houve alguma inexactidão da sua parte quanto ás reuniões da commissão.

Em 1851 tive a honra de propôr a Sua Magestade a nomeação de uma commissão que devia occupar-se da grave questão mondaria que então agitava toda a Europa, e que a agita ainda hoje, e entre os cavalheiros nomeados para essa commissão propuz o actual sr. ministro do reino, que me fez a honra de acceitar a nomeação que delle fiz, e foi o presidente dessa commissão, e o illustre deputado o sr. Julio Pimentel foi tambem desde logo nomeado membro della, e seu secretario. Esta commissão foi convocada poucos dias depois da sua nomeação por mim para me dar a sua opinião relativamente a um projecto que eu apresentei á camara, e que linha por fim a retirada de todas as moedas estrangeiras da circulação, menos os soberanos, e de elevar os direitos da exportação da prata de 100 réis por marco, a 1$000 réis. Houve uma larga discussão sobre o assumpto, no qual todos os illustres cavalheiros que compunham aquella commissão, deram o seu contingente de observações, e esclarecimentos, e a final a commissão conveiu no projecto, que eu vim depois submetter á ca mãi a.

Poucos dias depois tive necessidade de consultar de novo a commissão para lhe pedir a sua opinião sobre o cunho, que eu pertendia effectuar de algumas moedas de ouro para substituir aquellas que se retiravam da circulação. Na occasião em que se tractou da retirada da circulação de todas as moedas estrangeiras de ouro menos os soberanos, o governo não tinha ainda formado a sua opinião sobre o que devia fazer, porque o governo queria decidir-se em vista da quantidade de moeda que se apresentasse para trocar: se fosse pequena porção o governo se descartaria della pelo commercio sem fazer proceder ao cunho de novas moedas de ouro, o que o governo não julgava conveniente naquellas circumstancias. Mas o banco de Portugal que linha emprestado algum ouro para essa troca, exigia o seu embolso: era necessario tambem trocar as moedas estrangeiras que tinha em seus cofies a junta do credito publico, e pagar os emprestimos levantados para a troca. Podas estas circumstancias obrigaram o governo avir pedir uma auctorisação ao corpo legislativo para cunhar corôas de ouro não com o pezo das corôas antigas, mas com o que lhes competia, tomando o valor de 128$000 réis para o marco de ouro. Sobre esta grave questão eu quiz ouvir a commissão, a qual se reuniu, discutiu comigo esse assumpto, e eu tive a fortuna de que a commissão conveiu no projecto que vim trazer á camara, e que foi approvado pelo corpo legislativo e convertido em lei.

O illustre deputado citou a primeira reunião da commissão, e esqueceu-se das outras; porque além das que tiveram logar a convite meu, outras houve a convite do seu presidente, que era, como já disse, o sr. ministro do reino actual para as quaes eu tambem fui convidado, e em que a commissão se occupou muito seriamente do gravissimo assumpto, que lhe fóra commettido.

Mas vieram os acontecimentos de abril, e dahi por diante não sei mais nada do que se passou a este respeito. O que posso dizer á camara, e que repito com satisfação, é que a commissão nas occasiões em que se reuniu a convite meu, e naquellas a que tive a honra de assistir por convite do seu presidente, a commissão occupou-se muito seriamente do assumpto para que tinha sido creada. Se depois se fez relatorio ou não, não sei, mas effectivamente da parte da commissão havia os melhores desejos de desempenhar a sua missão: posso dar disso testimunho á camara.

Convenho no que disse o sr. ministro da fazenda.

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que não é conveniente que se façam observações que aggravem as difficuldades, em que nos achamos. Pelo que respeita ao pedido do illustre deputado o sr. Santos Monteiro não julgo que este seja motivo bastante para demorar a discussão do seu projecto, que eu pediria a v. ex. que visto que este negocio se julgou urgente, que tivesse a bondade de o dar para ordem do dia de ámanhã.

Quanto á questão da exportação da prata, peço licença para notar ainda uma circumstancia. O sr. ministro da fazenda disse que não ha novidade alguma mais do que o que havia ha 4 mezes. Peço perdão para dizer, que ha demais agora uma enorme exportação de prata, que anda já por í) mil marcos nestes 4 mezes. É um negocio muito serio, e eu não quero entrar agora no exame das razões que teve a illustre commissão de commercio e artes para examinar o seu parecer: os principios, que invocou, são sem duvida os principios da sciencia, mas parece-me, que não tem applicação aqui; porque a verdade é que depois da elevação do direito a exportação diminuiu; e eu não acredito muito no contrabando deste genero, porque o não reputo muito contrabandeavel. Ha ainda uma outra circumstancia para a qual eu chamo a attenção dos meus illustres collegas, e é que os despachos para a exportação da prata, e essa mesma exportação não podendo pela natureza das cousas ficar em segredo sabe-se logo, que a prata está a sair pela barra fóra, espera-se por consequencia uma grande alia no preço deste metal, a imaginação trabalha, o panico não póde deixar de crescer. E os homens, que fazem o commercio dos metaes, que vendem cruzados novos contra soberanos tomam tambem as suas precauções para não perderem, isto é, estabelecem um grande desconto para os soberanos, e eu não comprehendo como isso lhes possa ser levado a mal. O negocio é como o indicou a commissão de fazenda com bastante bom senso, peço licença para o dizer, e eu intendo que é absolutamente indispensavel que o projecto do sr. Santos Monteiro se discuta, e se discuta quanto antes, e se v. ex.ª o der para ordem do dia de ámanhã, estou certo que essa discussão ha de ser util.

O sr. Casal Ribeiro: — Sr. presidente, quasi nada tenho a dizer, depois das ultimas palavras com que acaba de concluir o sr. Avila, e era para fazer uma moção igual á que s. ex. acaba de apresentar, que eu tinha pedido a palavra. Intendo que convem trazer este projecto á discussão, e trazel-o de uma vez, (Apoiados) porque é altamente inconveniente estar a discutir esta questão por incidente, por isso que é questão gravissima que não se tracta incidentemente, nem exaggerando ou apreciando com exactidão a intensidade do mal. O que é preciso é dar-lhe remedio; o que é verdade é que o agio, que augmentou depois da apresentação do projecto do sr. Lourenço Cabral, que propunha a elevação do valor dos cruzados novos, apesar desse projecto ter sido retirado, em conformidade com a conclusão do parecer da commissão de fazenda, que propunha a sua rejeição, ainda o agio não desceu. Não me proponho a entrar na averiguação das causas, se nisto ha especulação ou se e um effeito natural das condições em que se acha o nosso mercado; entretanto sem entrar agora na discussão do projecto, direi tambem, que apesar de não vêr de modo algum a solução da questão monetaria no augmento do direito da exportação da praia, apesar disso parecia-me conveniente, nas circumstancias em que actualmente nos achamos, que fossemos um pouco menos rigorosos, scientificamente fallando, (Apoiados) que cedessemos um pouco das exigencias e dos principios absolutos da sciencia, e que não tivessemos duvida em approvar uma medida que, se não traz a solução da questão da moeda, entretanto póde satisfazer á opinião, e nisso acho eu grande vantagem. (Apoiados) Póde haver um panico excitado de boa ou má fé; póde haver um erro de opinião, e a maneira de combater os effeitos desse erro é satisfazendo a uma certa exigencia da opinião que ella intende que póde destruir o mal. (Apoiados) Portanto concluo votando pelo requerimento do sr. Avila, para que o projecto venha immediatamente á discussão.

O sr. Santos Monteiro: — Como o sr. Julio Pimentel acaba de assegurar que não ha nenhum relatorio da commissão, nem trabalho escripto, é escusado o meu requerimento. O que eu queria saber, já está dicto pelo sr. Avila, e não foi contestado pelo sr. Julio Pimentel; e desejando eu muito que o projecto venha á discussão, e vindo amanhã, ainda que fosse approvado o requerimento, não estava cá a resposta a tempo, por consequencia retiro o requerimento. E a respeito das informações que desejava do director da casa da moeda, eu sei a opinião delle, e então na discussão me farei cargo delle.

A camara consentiu que o sr. Santos Monteiro retirasse o seu requerimento.

O sr. Themudo. — Mando para a mesa uma representação dos povos de Guimarães, pedindo providencias sobre a lei dos foraes, e pedindo á camara que se occupe destes trabalhos, primeiro que de todos, para evitar o flagello que estão soffrendo, por virtude de duvidas que se suscitam a respeito da lei de foraes. Aproveito a occasião para pedir á commissão de legislação que veja se se occupa deste objecto com preferencia a outros trabalhos, visto que affecta uma grande parte da nação, e pediria tambem que a representação fosse impressa no Diario do Governo.

O sr. Presidente. — Amanhã proporei isso á camara, quando se tractar de dar destino á representação.

O sr. Carlos Bento: — Pedi a palavra para mandar para a mesa duas representações: uma da camara municipal de Villa Nova da Cerveira, pedindo um edificio para exercicio das suas funcções municipaes; e outra de uma confraria da mesma villa, pedindo um edificio para o estabelecimento de um hospital.

O sr. Affonso Botelho: — Eu propunha-me fazer uma interpellação ao sr. ministro da fazenda, sobre um objecto, mas s. ex. dispensou-me de a fazer, porque teve a bondade de me dar agora os esclarecimentos de que eu carecia, e por tanto desisto da palavra que tinha pedido para esse fim.

ORDEM DO DIA.

Continuação da discussão do projecto n. 27, na sua especialidade.

O sr. Presidente: — Continua a discussão do artigo 3.º

O sr. Cardozo Castello Branco (Sobre a ordem) — As commissões reunidas de obras publicas, e de

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legislação tractaram de dar unia nova redacção ao artigo 3.º do projecto que está em discussão. A commissão conserva a primeira parte do artigo lai como estava no projecto, por isso que a respeito desta parte não houve duvida nem objecção alguma. A segunda parte, sobre que houve duvidas, apresenta-a, formando um artigo 5.º, nos lei mos seguintes:

Emenda — Artigo 3.º do projecto n.º 27.

As expropriações que forem necessarias para a construcção deste caminho de ferro e suas dependencias são declaradas de utilidade publica.

(N. B. A segunda parte do artigo 3.º deve passar para depois do artigo 4.º, na fórma seguinte).

Art. 4 O do parecer.

Art. 5.º O governo poderá não só começar desde já os processos necessarios para a verificação de utilidade publica, na conformidade do artigo antecedente; e para a liquidação das expropriações; mas tambem continual-os depois, com tanto que a prévia indemnisação, e a adjudicação das propriedades que devam sei expropriadas, só possam fazer-se depois da auctorisação exigida no artigo 2.º

Art. 6.º O 5. do projecto

Art. 7.º O 6.º do projecto.

Parece-me que v. ex.ª deve por ã votação a primeira parte do artigo 3., visto que a ella não houve objecção nenhuma; depois segue-se o artigo 4.º, e depois o artigo 5., que é a materia da segunda parte do artigo 3.º

O sr. Presidente — Visto que sobre a primei ia parte do artigo 3.º nenhuma contestação houve, e a commissão agora muda a segunda parte para outro artigo, se não houver reclamação, pi oponho á votação a primeira parte do artigo

Fui approvada.

O sr. Presidente — Agora entra em discussão o artigo 4º do projecto.

O sr. Mello Suares: — Em logar de caminho de ferro deve lêr-se deste caminho de ferro, para evitar duvidas deve-se fazer esta rectificação.

O sr. Presidente: — Cá está no artigo original.

O sr. Casal Ribeiro —.No impresso não esta.

O sr. Presidende: — Faz-se a rectificação devida.

O sr. Bordallo: — Sr. presidente, não e minha intenção impugnar o artigo 4.º que está em discussão, mas sómente observar que a mesma confusão que linha havido no artigo 3.º, se nota tambem no artigo 4.º, entre a verificação da utilidade pública e a urgencia das expropriações. Não quero explicar o que são est.is duas cousas, porque estou certo que todos sabem o que é a declaração da utilidade pública, e a urgencia da expropriação.

E certo que a lei de 23 de julho de 1850 tambem faz esta differença da utilidade pública, e urgencia da expropriação, mas por esta lei não ha nada mais facil do que fazer a declaração da urgencia, porque isso apenas depende de um decreto do governo; e se agora pelo artigo 4 0 do projecto se facilita um pouco a declaração da utilidade pública, torna-se tambem mais difficil a declaração da urgencia, porque a faz depender de consulta do conselho de obras publicas, o que pela legislação de 1850 não acontecia. Bem sei que nesse tempo não existia o conselho de obras publicas, mas existia o conselho de estado, e entretanto a lei de 23 de julho de 1850 não exigia a consulta deste tribunal.

Se acaso se tem por fim facilitar as expropriações, já estabelecendo um novo methodo de se fazer a declaração de utilidade pública, já deixando isto dependente só do governo ouvindo o conselho de obras publicas, parece-me que não devemos tornar mais difficil a declaração da urgencia; alteremos embora a legislação a respeito da declaração de utilidade pública, mas parece-me que não ha motivo nenhum para a aliciar a respeito da urgencia.

Na lei de 23 de julho de 1850 diz-se que é necessario fazer primeiro intimação ao proprietario, de que a expropriação da sua propriedade foi declarada de utilidade pública para depois se fazer o processo da liquidação, e no projecto em discussão nada se diz a este respeito, e como -e pão diz nada a respeito da intimação, póde o poder judicial ter duvidas sobre se deve haver ou não essa intimação, e longe do se facilitar o processo das expropriações tornar-se ainda mais moroso e mãi difficil, porque quando o poder judicial intende que não se observaram todas as formalidades legaes, suspende o processo, manda que seja devolvido á auctoridade administrativa, e não dá mais um passo; por tanto difficultam-se por este modo as expropriações.

Para evitar todos os inconvenientes que notei mando para a mesa uma substituição a fim de facilitar o processo das expropriações, e que tem a vantagem de não dizer respeito só ás expropriações necessarias ao caminho de ferro de leste, mas de todos quantos caminhos de ferro se quizerem fazer, e para quantas expropriações se considerarem de utilidade publica.

A substituição e a seguinte:

Substituição. — Artigo 4.º A verificação da utilidade publica das expropriações necessarias para as vias da communicação do estado, quando não fôr feita expressamente pela lei, sel-o-ha por simples decreto do governo, só com attenção aos estudos technicos.

§ 1.º Tanto a lei como o decreto que declarar a utilidade publica destas expropriações serão exequiveis desde o dia da sua publicação no periodico official do governo.

§ 2.º Depois da publicação da lei ou decreto, serão intimados todos os interessados na propriedade que se mandar expropriar nos lermos dos artigos 3.º, 4.º, 5., 7.º e 8. da lei de 23 de julho de 1850.

§ 3.º Os interessados poderão reclamar; e a interposição da reclamação, sua decisão e intimação desta, serão feilas pela fórma estabelecida na mesma lei, sem suspensão da execução, ou processo da expropriação. = Bordallo.

(Continuando)

De maneira que a minha substituição tem por fim facilitar o processo das expropriações de modo que não tique dependente das solemnidades ou formalidades que estabelecia a lei de 2.3 de julho de 1850; e leiu tambem por fim dar aos proprietarios todas as garantias e meios de saberem se a expropriação se faz ou não, sem difficultar o processo das expropriações.

Eu bem sei que se póde dizer, e já disse o sr. ministro das obras publicas na anterior sessão, que desde que se publicou a lei de 23 de julho de 1850 ainda não houve um só recurso de declaração de utilidade publica; é uma verdade, e talvez não venha a haver recursos similhantes; mas quando se estabelecem os recursos é para usar delles quem quizer; quem deve sei o juiz da conveniencia de usar do recurso ou deixar de Usar é sómente o interessado, elle verá se lhe con-

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Vem ou não; é necessario que se lhe dêem todos os recursos, assim como que saiba se se faz ou não a expropriação para allegar o seu direito se quizer, por que não desejo que fique ignorando se se faz ou não a expropriação, e que esta se faça inquisitorialmente, e elle para saber alguma cousa tenha de andar caminho das secretarias, onde todos sabem quanto é difficil averiguar qualquer cousa.

Depois de lida 711 mesa, foi admittida a substituição, e ficou conjunctamente em discussão.

O sr. Carlos Bento — Sr. presidente, voto por todas as garantias que se dão á propriedade desde que essas garantias não contrariam o pensamento de utilidade publica em uma obra importante. E por isso, sr. presidente, não julgo inutil nenhuma das disposições que as duas commissões inseriram neste projecto, em addicionamento ao projecto inicial apresentado pelo governo. Todos sabem que o principio das expropriações e o principio da limitação da propriedade; todos consideram como caso grave a verificação da limitação desta propriedade; todos intendem que as garantias que se dão á propriedade, neste caso, são garantias que se devem ai tender o mais possivel; por isso intendo eu, que as duas commissões fizeram muito bem — era ale indispensavel que o fizessem — em marcar solemnidades que julgaram indispensaveis para a verificação da declaração de utilidade publica e de urgencia.

Pela proposta originaria do governo, a declaração de utilidade publica e urgencia era simplesmente decretada pelo governo; mas pelo artigo 4.º, em discussão exige-se mais alguma cousa; exige-se a verificação da apresentação do plano, e assim mostra-se effectivamente ao dono da propriedade, cuja expropriação se requer, que em verdade ha a consideração da utilidade da obra, que é a determinação da verificação dessa expropriação; ha mais, ha além disso, a circumstancia de ser preciso, para a declaração da necessidade, ser ouvido um tribunal superior; e esta inspecção dum tribunal superior, em materias desta gravidade, é uma garantia summamente attendivel. Vê-se, pois, que no caso de que se tracta se dão todas as garantias.

Approvo tambem este artigo da limitação da propriedade, e não o approvarei genericamente, como se pretende, por uma proposta que está sobre a mesa; approvo, digo, esta limitação que tracta d'uma preferencia de caminhos de ferro; preferencia que adopto, por isso mesmo que ella versa sobre uma obra, cuja utilidade está completamente reconhecida. Porém o illustre deputado, auctor da proposta a que ha pouco me referi, não adopta esta preferencia, quer que a disposição seja generica, e para sustentar a sua proposição tractou s. s. de mostrar as vantagens que á agricultura e ao commercio viriam da construcção das vias ferreas, por isso mesmo que seria mais facil o consumo da producção. Permitta-me o illustre deputado que lhe diga, que eu não ignoro essas grandes vantagens que residiam á agricultura, á industria e ao commercio dura perfeito e completo systema de vias de communicações; mas entre as communicações geme, que convem que existam, ha algumas que, pelas vantagens que offerecem logo que existam, merecem preferencia, e é por este motivo que eu dou preferencia á construcção d um caminho com relação á de outro, logo que seja ampla e claramente reconhecida n sua necessidade e vantagem. É este o motivo por que dou preferencia a este caminho de ferro de leste, por exemplo, ao do norte. E por esta occasião direi, que quando se tractou do decretamento do caminho de ferro do norte, parece-me que havia um contracto para a construcção da estrada de Lisboa ao Porto, contracto que dava todas as garantias de se poder realisar; porque effectivamente capitaes se tinham posto á disposição desse pensamento; e quando appareceu aquella disposição para se fazer o caminho de ferro do norte, mandou-se parar com tudo quanto havia ácerca desta estrada, com a idéa de que, lendo de se formar a directriz dessa estrada, ella podia d'alguma maneira prejudicar o pensamento da directriz do caminho de ferro. Eu peço licença para dizer, que intendo que este argumento não procede; todos sabem que a directriz dum caminho de ferro não offerece inconveniente ao estabelecimento d'estradas. Eu intendo que por se ler o pensamento de estabelecer no paiz um certo numero de caminhos de ferro, não devemos renunciar ao de fazer estradas, devemos, pelo contrario, aproveitar todos 05 meios e circumstancias que possam concorrer para a facilidade, de lermos estradas. Eu vejo que em toda a parte onde se estabelecem caminhos de ferro, se não renuncia á idéa de construir estradas e outros meios de communicação; eu vejo que em França e em Hespanha se segue este systema: em França, apezar de haver já uma grande rede de caminhos de ferro, estão-se votando despezas para estradas, e outros meios de communicação, com as communicações aquáticas; — na Hespanha, apezar d'existir alli o pensamento de cobrir o paiz d'uma grande rede de caminhos de ferro, isso não prejudicou as questões d'e-.1 radas, alli ainda se tracta tambem de fazer estradas: portanto intendo que uma cousa não deve prejudicar a outra

Alas o illustre deputado, a que me refiro, quer tornar a disposição do artigo generica; quer que ella lenha relação com todos os caminhos de ferro que haja a fazer; isto é o que, no meu modo d'intender, não póde de fórma alguma ser adoptavel; eu preciso em primeiro logar demonstrar agora a utilidade e a vantagem de todas as obras que haja a fazer, e isto é o que o illustre deputado não póde fazer; e já não acontece o mesmo pelo que respeita á obra de que se tracta, cuja necessidade, utilidade e vantagens estão demonstradas. E nessa generalidade, que o illustre deputado quer, digo que, por mais garantias que quizesse dar com relação á propriedade, essas garantias nunca seriam sufficientes em todas as suas differentes relações, e é a essas garantias da propriedade que se deve attender tanto quanto fôr necessario; e por isso é que esta camara, para adoptar o projecto que está em discussão, relativo ás expropriações de que elle tracta, intendeu que era necessario achar um fundamento extraordinario e especial para uma obra como aquella de que se tracta, a fim de decretar as expropriações.

Parece-me, pois, que a substituição não se deve adoptar, e que o artigo 4.º deve passar lai como está.

Agora quanto ás difficuldades que o illustre deputado referiu que poderiam vir da falta da declaração d'intimação, que suppoz não existir pela adopção do artigo 4.º deste projecto de lei, devo dizer-lhe, que o artigo 4.º do projecto é a substituição do processo administrativo marcado na lei de 23 de julho de 1850, e desde que elle é a substituição da lei vigente, está claro, que o poder judicial, cujas atribuições neste

VOL. V. — MAIO — 1853.

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ponto, ficam limitadas ás disposições deste projecto, não póde deixar de-obrar segundo esta lei, que é a substituição clara, terminante e positiva da lei de 23 de julho de 1850. Portanto as difficuldades que o illustre deputado apresentou, não tem logar. Em conclusão direi, que approvo o artigo 4.º lai qual como elle está redigi do j nem outra cousa ha, me parece, que deva votar-se.

O sr. Cardoso Castello Branco: — Sr. presidente o illustre deputado que primeiro fallou hoje nesta discussão, principiou por impugnar a doutrina do artigo 4.º, e mandou uma substituição mais generica que comprehende todas quantas obras se façam ou possam fazer sobre caminhos de ferro. A commissão intendeu que não podia, em virtude deste projecto, estabelecer disposições genericas para todos os caminhos de ferro que se fizerem, porque não estava habilitada para isso, nem esta era a occasião para se estabelecerem taes provisões. Se houver necessidade de se proceder a expropriações para caminhos de ferro e outras obras de utilidade publica, lá está a lei de 23 de julho de 1850, que regula este negocio, pelo qual se determina o modo de as fazer; e, se as obras forem de tal natureza que precisem uma disposição especial, Deos queira que o governo tenha muitas occasiões de vir a esta camara pedir auctorisação para estas obras! Mas quando o governo então vier á camara, estou certo que hão de apresentar-se as mesmas modificações que a commissão offerece a respeito deste certo e determinado caminho.

Ora eu devo declarar ainda outra cousa. No artigo 4.º, como disse o illustre deputado que acabou de fallar, estabelece-se um meio mais facil, do que aquelle que estabelece a lei actual, sobre a verificação da utilidade publica; mas estabelecendo um-meio mais facil para verificar a utilidade publica, a commissão devia dar tambem algumas garantias aos donos dos terrenos expropriados a respeito do modo de liquidar estas expropriações. Segundo a lei actual, para se declarar a urgencia bastava um simples decreto do governo; mas a commissão intendeu que o negocio não devia ficar nesse estado, que deviam dar-se ao dono e proprietario do terreno que devia expropriar-se, algumas garantias; accrescentou portanto ás disposições da lei actual as seguintes: — que o governo não declarasse a urgencia das expropriações, sem que primeiro houvesse o traçado do caminho devidamente approvado, e precedesse uma consulta do conselho das obras publicas; e que, alem disso, o governo procedesse a todas as informações que julgasse necessarias para poder conhecer, se as expropriações eram precisas. — Intendo que esta camara não póde recusar-se a approvar estas garantias que a commissão offereceu em beneficio ou em favor dos proprietarios dos terrenos expropriados.

Portanto parece-me que a camara não póde deixar de approvar o artigo com a declaração que se fez de que em logar de ser este artigo uma idea generica, que comprehendesse todos os caminhos de ferro, se restrinja áquelle sobre que versa a auctorisação pedida pelo governo.

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Sr. presidente, principio por agradecer ao sr. ministro das obras publicas e ao illustre relator da commissão a approvação que deram á minha proposta, mandada para a mesa antes de hontem. S. ex.ª não quizeram ter a bondade de confessar que tinham acceito a minha proposta;

mas o facto foi que apesar de declararem que não a queriam, conformaram se com ella, foi approvada tal qual; o orgulho, o amor proprio e certos sentimentos vaidosos do sr. ministro e da commissão não deixaram que elles declarassem que a approvavam, mas o facto é que foi approvada nemine discrepante; não confessam que a approvaram, mas o facto existe, e quer confessem quer não, não destroem a existencia da cousa.

Este art. 4.º que está em discussão é a cousa mais-innocente, mais inutil, mais innoffensiva que a camara póde fazer quer o approve quer o rejeite, por que por este artigo a camara não decide cousa nenhuma, o governo não póde levar avante qualquer expropriação, senão depois de haver um Traçado de caminho de ferro, e ser este traçado approvado pelo corpo legislativo; ora como não existe o Traçado, não póde existir a approvação delle, e não existindo o traçado e a approvação delle, a camara approva uma cousa que não existe. Toda esta discussão que tem havido, ha de ser renovada em globo e detalhe, quando vier á camara o contracto; por consequencia o sr. ministro das obras publicas e o governo podiam muito bem ler poupado á camara a inutilidade e esterilidade desta discussão, dando á camara trabalhos mais proficuos e que dessem um resultado qualquer, e não entretendo a camara com esta discussão, que não dá resultado nenhum, porque ha de ser renovada quando vier o contracto á discussão.

No fim de contas pergunto eu, approvado este projecto tal qual, o que approvamos nós? O caminho de ferro não, porque não ha contracto. Approvamos o Traçado? Qual é? Não o vimos. Que condições serão contractadas? Ignoramos. O sr. ministro da fazenda pouco a pouco tem revelado algumas, mas ainda não revelou o conjuncto e complexo das circumstancias do contracto que nos ha de trazer.

Sr. presidente, até agora tenho combatido o caminho de ferro, por que o achava excessivamente caro; daqui em diante principio a ler talvez de o combater porque o vou achando excessivamente barato. Em Hespanha ha duas vias, tambem cá lereis duas vias; em Hespanha o material circulante, o fixo, e o movel pertencem á companhia; tambem cá serão da companhia; de sorte que é boca que pedes, coração que desejas! E principio a ter meu receio, tenho medo que pelo andar dos tempos a Inglaterra reclame do governo portuguez alguma indemnisação a favor do sr. Hislop, porque a Inglaterra não costuma deixar expropriar impunemente os seus subditos, e vejo que o sr. Hislop quer-se arruinar, e principio a ler serios cuidados sobre isto; mas como não está em discussão o contracto definitivo, guardo-me para quando o esteja.

Na sessão passada o sr. Justino de Freitas principiou por se admirar tio nosso zelo a favor do caminho de ferro. Não sei porque se admirou, nem posso perceber qual é a consequencia que tanto o illustre deputado como os seus collegas querem tirar das continuas e incessantes recriminações que fazem sobre o nosso passado; nosso, digo eu, em relação ao partido com que estou ligado, mas não em relação á minha pessoa, porque o meu passado não merece discussão nenhuma, é claro, é conhecido, e se foi bom, é bom o meu presente, porque hoje occupo o mesmo campo que então. Por consequencia o illustre deputado não consegue cousa alguma com essas

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recriminações, porque é muito máo modo de argumentar, é pessima essa pertenção a invectivas e a querer censurar os outros pelo que fizeram, quando quer fazer o mesmo, A experiencia que é a mestra da vida, deve ser aproveitada pela intelligencia do illustre deputado e dos seus collegas; se nós procedemos mal, o illustre deputado não nos imite, faça o contrario; mas censurar e cair nos erros que commettemos, será tudo quanto quizerem, mas não maneira de argumentar; nem é cousa que dê consideração nenhuma nem a quem a faz, nem áquelles contra quem se argumenta.

Sr. presidente, é moda dizer-se, não sei porque (ainda não pude attingir qual é o alcance que ha nesta asserção, que me parece absurda e até perniciosa) — não querem caminhos de ferro. Nós queremos caminhos de ferro, e eu lenho-me estafado a enunciar este desejo e a fortificar-me cada vez mais nelle, porque não quero pôr na menor duvida o alio conceito que me merece um melhoramento ião util; mas acho muito máo systema este de querer que tenhamos caminhos de ferro á força, porque leio todos os dias — não quereis caminhos de ferro, pois haveis de le-los á força. O que eu acho máo systema é esta injuncção, pela qual se nos quer dar caminhos de ferro á força; acho que é um mal, e ronda esta injuncção é que voto, e por causa desta injuncção é que desconfio, porque as minhas apprehensões cada vez se reforçam de dia para dia quanto ao caminho de ferro de que se tracta.

Não quero tomar tempo á camara; mas permitta-me V: ex. que muito de passagem eu faça algumas pequenas observações sobre a falla de legalidade que acham os illustres deputados da maioria na manifestação das nossas opiniões e principios, porque tenho ouvido perguntar — em virtude de que direito vos arrogais a opinião publica? Eu não me arrogo a opinião publica em virtude de um direito; mas sou daquelles que conhecem que em Portugal tambem ha opinião publica; ainda hontem eu assisti por occasião dos tristes funeraes da Princeza Dona Amelia a uma manifestação da opinião publica; eu vi hontem que a afluencia foi immensa, que todas as lojas se fecharam, e todos trajaram de lucto em consequencia de haver opinião; e esta opinião consegue-se, quando a pessoa a quem é applicada, é credora della pela sua muita virtude, pela sua muita modestia, e pela probidade e dignidade do seu comportamento, então ha opinião publica; mas o que a opinião publica não favorece, é os hypocritas, é as pessoas que não são credoras della; mas quando ha a justificação de uma virtude qualquer, a opinião publica manifesta-se, como se manifesou hontem.

Este artigo como eu disse ao principio, é a cousa mais innocente e inoffensiva, que um parlamento qualquer póde discutir e approvar; e por isso declaro, que não tenho duvida nenhuma em votar pelo artigo como está.

O sr. Cazal Ribeiro: — Sr. presidente, o illustre deputado que acaba de fallar, disse que votava pelo artigo, nem podia deixar de ser assim, depois que s. ex. o declarou obra sua, e que a commissão adoptou as suas idéas. Eu folgo, de que s, ex. tenha esse motivo de satisfação, e amor proprio bem intendido pela commissão ter adoptado as suas idéas, podendo por consequencia conhecer «que ella é bastante docil para acceitar todas as emendas toda as Indicações rasoaveis que se façam, e que a camara não deixará tambem de a acceitar; mas a verdade é, que aquillo que propoz a commissão, não é nem mais nem menos do que o que estava no projecto já apresentado, mas dando-lhe uma redação differente do que aquella que estava, afim de tornar o artigo mais claro. Portanto fique a gloria do artigo, áquem disso fizer questão; mas em todo o caso s. ex. não podia deixar de concluir senão approvando o artigo: teremos occasiões, ainda que poucas sejam, em nos acharmos no mesmo campo.

Parece-me, sr. presidente, que a commissão devia esperar do illustre deputado alguma condescendencia em relação a outros pontos, como, por exemplo, em quanto ao preço do caminho de forro, que ao principio achou extremamente caro, e as condições do contracto de uma lesão enorme, e não é por certo corresponder bem ao pensamento e á docilidade que a commissão teve, vir dizer agora, que o caminho de ferro é extremamente barato.

Sr. presidente, eu não intendo que as indicações que se têem feito por parte dos illustres deputados, sejam as que fizeram alterar as condições do contracto, porque acredito que estas alterações já estavam feitas, antes dos illustres deputados apresentarem as suas reflexões; mas fique embora a gloria aos illustres deputados da opposição de serem ouvidas as considerações, que fizeram em beneficio da fazenda publica; mas vir agora censurar essas alterações, dizendo-se, que já se acha o caminho de ferro bastantemente barato, é demasiada injustiça sua, e não corresponder, como disse, á docilidade que a commissão leve.

Quanto á substituição, apresentada pelo sr. Bordallo, intendo, que ella não póde ser votada, e muito principalmente depois de se ter votado o art. 3.º, que declara de utilidade publica as expropriações para este caminho, em virtude de uma lei, e a alteração que se propõe na substituição do illustre deputado, não é senão querer-se que nesta lei, que é uma lei especial para as expropriações relativas ao caminho de ferro de leste, se comprehendam em geral todas as expropriações para todos os caminhos de ferro, e para todas as estradas que forem indispensaveis fazer-se.

A commissão intendeu que a formalidade da declaração de utilidade publica devia restringir-se a este caminho de ferro de leste, por ser uma lei especial para esse caminho, e intendeu que devia de mais a mais conter outras disposições especiaes que dessem todas as garantias aos expropriados em relação a este mesmo caminho, como são as que se comprehendem na segunda parte do art. 3.º Portanto sendo o objecto desta lei as expropriações do caminho de ferro de leste, intendo que é inconveniente admittir qualquer outra doutrina que não se limite a este ponto; e não se póde interpretar o seu motivo, como o interpretou o meu amigo o sr. Carlos Bento, porque aqui não se tracta de dar uma certa preferencia de caminho de ferro; não se tracta de declarar, se e mais util ou mais vantajoso o caminho de ferro do norte, ou o de leste. Intendi, pois, que devia dar alguma resposta sobre este ponto, para que se não inferisse do silencio da commissão que ella acquiesceu, nesta parte, ao que disse o illustre deputado. As disposições do projecto limitam-se unicamente ao caminho de ferro de leste, pois que agora só se tracta de decretar a uti-

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lidade publica das expropriações para esse fim, sem se estabelecer preferencia alguma. E quanto ás considerações que se fizeram a respeito da estrada do Porto, ellas vem completamente demonstrar que estabelecido o principio que devia haver o caminho de ferro do norte, não se devia progredir na estrada.

Quanto ao artigo em discussão ainda apresentou o illustre deputado algumas considerações que podem complicar o processo das expropriações, como em relação á urgencia, para a qual não exige que se ouvisse o conselho das obras publicas, porque isso já estava declarado no regulamento da sua organisação. Se isto assim é, intendo que esta disposição de ouvir o conselho das obras publicas é talvez um excesso de clareza que não vem complicar cousa alguma.

O sr. Bordallo: — Sr. presidente, nem acho inutil o art. 4., como disse o illustre deputados por Béja, nem tambem digo que deva passar tal qual, como querem os illustres deputados membros da commissão. Eu hei de ser muito breve, mas permitta-me a camara que eu não deixe de responder ao primeiro illustre deputado que combateu a minha substituição. O nobre deputado disse que bastava a minha substituição não dar mais vantagens aos proprietarios que dava a lei de 23 de julho, para não votar por ella. E uma verdade, mas se a minha substituição não dá mais vantagens ao proprietario na maior dos casos em que as expropriações são declaradas de utilidade publica, segundo a lei de 23 de julho, é tambem certo que a mesma lei estabelece um processo muito moroso quando tracta das expropriações para obras consideraveis, e como este processo não serve para estas, e taes são as de que tractamos, intendo que se deve fazer uma alteração na lei das expropriações.

Parece-me que visto nós fazermos uma alteração na nossa legislação sobre expropriações, devemos fazel-a extensiva aos diversos casos que se possam dar, e não sómente a um ponto certo e determinado. Intendo, pois, como digo, que se deve fazer uma alteração permanente na nossa legislação a este respeito, mesmo para que se não dê o caso de se estar a fazer leis aos bocadinhos. Póde acontecer ámanhã fazer-se um novo contracto para um outro caminho de ferro, e aí tem a camara de auctorisar novamente o governo para fazer as expropriações precisas, e de alterar a legislação para estas.

Não ha duvida nenhuma que o processo que a lei de 23 de julho de 1850 estabelece, é muito moroso, e, como já disse, não serve para as expropriações de obras publicas consideraveis. Quando se fez a lei de 23 de julho de 1850 foram-se buscar a maior parte das provisões da lei franceza de 23 de agosto de 1835, mas peço á camara que note que esta lei franceza tractava das expropriações de utilidade communal e nada mais, porque as expropriações de utilidade geral, para obras do estado, essas eram reguladas por leis anteriores, que vinha a ser uma lei de 8 de março de 1810, outra de 7 de julho de 1833, e já depois a — França intendeu que era necessario uma nova lei o fez a de 23 de maio de 1841. Se a lei de 23 de julho tivesse seguido a de 23 de maio de 1841, que se fez em França, não nos teriamos visto nas difficuldades em que nos temos encontrado, quanto á verificação da utilidade publica. E, portanto, certo que o processo que a lei de 23 de julho estabelece, não póde verificar-se: póde ser de muita conveniencia para outras obras, mas não para as expropriações que se houverem de fazer por conta do estado. Os francezes fazem differença entre expropriações que são feitas por conta do estado, e outras que não são de tanta consideração, como são as obras de local propriamente dietas.

Tenho, portanto, respondido ao primeiro argumento apresentado contra a minha substituição.

Disse um illustre deputado que o artigo 4.º do projecto ficava substituindo na parte relativa á utilidade publica e urgencia das expropriações, a lei de 23 de julho de 1850. É verdade que fica substituindo essa lei, no entretanto, como nada diz o artigo 4.º a respeito da intimação, podia dar-se o caso de haverem algumas duvidas, e podia até um juiz decidir de um modo e outro de outro. Acredito, porém, que seja melhor a intelligencia que o illustre deputado quer dar ao artigo. Mas é certo que isto é uma violencia ao proprietario. Pois ha de declarar-se de utilidade publica a expropriação de uma propriedade sem o proprietario, ao menos, ter conhecimento previo e official desta declaração? Eu não vejo providenciado o contrario em artigo nenhum. Pela minha substituição ficam removidos quaesquer obstaculos. O governo-decreta a declaração de utilidade publica para as expropriações; publica-a no periodico official, e immediatamente dá execução ao decreto que declarou a utilidade publica e a urgencia. A minha substituição tem por fim facilitar este processo, e ao mesmo tempo, dar uma garantia aos proprietarios.

O illustre relator da commissão disse que não tractavamos de fazer uma lei de expropriações, mas sómente de fazer algumas alterações na nossa legislação das expropriações para a construcção do caminho de ferro de leste; mas, sr. presidente, parece-me que não se deve confundir de maneira nenhuma, como já se notou n'outra sessão, a auctorisação para se fazer uma obra de utilidade publica, com as expropriações necessarias para essa obra, porque isso são cousas muito distinctas. E portanto ou se tracta de auctorisar alguma obra, ou de regular as expropriações para ella. No primeiro caso devemos só dar a auctorisação especial e determinada; mas no segundo é preciso estabelecer regras geraes e permanentes.

Disse-se que era verdade que a lei de 23 de julho de 1850 fazia depender unicamente de uni decreto do governo as expropriações, e que pelo artigo 2.º deste projecto em discussão ficavam dependentes do decreto do governo e do voto do conselho das obras publicas; mas eu direi que segundo a minha substituição, se facilita o processo das expropriações dando ao mesmo tempo aos proprietarios dos terrenos que se expropriam, todas as garantias necessarias. O illustre deputado que me precedeu, disse que a minha substituição não podia passar por maneira nenhuma depois de ler passado o artigo 3., porque parecia haver certa contradicção entre ella e o artigo, entre tanto eu não acho essa contradicção. O artigo 3.º do parecer declarou, em geral, de utilidade publica as expropriações que se fizerem para o caminho de ferro de leste; e a minha substituição estabelece a fórma de verificar a declaração da utilidade publica de cada expropriação

Disse tambem o nobre relator da commissão, que se não tinha lido em vista no artigo 3.º, senão a declaração da utilidade publica das expropriações para a construcção do caminho de ferro de leste; mas permitta-me s. ex. que lhe note que a lei de 23 de julho

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de 1850 declara de utilidade publica todas as expropriações que se houverem de fazer, e não permitte que se façam expropriações para outro fim, que não seja de utilidade publica. lin já tive occasião de dizer que se tem confundido o fim das expropriações, com o modo de as fazer. A lei de 23 de julho de 1850, estabelece dois modos para se fazerem as expropriações. O primeiro é declarar por lei a utilidade publica de cada expropriação, mas essa lei deve ser expressa — declarando as expropriações em certas e determinadas propriedades; o outro modo de que falla a mesma lei — e decretar o governo, depois de certo processo, a utilidade publica de certas expropriações. Se nós queremos alterar a lei de 23 de julho de 1850, sómente para declarar de utilidade publica as expropriações que se tem de fizer, era uma inutilidade, porque a lei de 23 de julho de 1850 não tracta de outras em conformidade com o artigo 145.º da carta constitucional; portanto, sr. presidente, não quero cançar mais a camara, e concluirei dizendo, que apesar das observações que se fizeram contra a minha substituição, ellas não me convenceram, e ainda estou persuadido que a minha substituição facilita as expropriações. Voto, pois, pela minha substituição.

Não havendo quem mais pedisse a palavra, julgou-se discutido o artigo 4., r foi approvado, ficando prejudicada a substituição do sr. Bordallo.

Entrou em discussão o artigo b. da substituição da commissão.

O sr. Avila: — Sr. presidente, eu vejo neste artigo que a illustre commissão mandou para a mesa, que se evitam precisamente oi inconvenientes que eu desejava que se evitassem: por consequencia não posso combater o seu pensamento essencial: parece-me com tudo que alguma obscuridade póde resultar da sua redacção: não terei porém duvida em o approvar, se fôr posto á votação salva a redacção.

A illustre commissão quer consignar no artigo que o governo póde desde já instaurar os processos de expropriação para o decretamento da utilidade publica, e para a liquidação da indemnisação, mas que o governo não poderá completar este processo, quer dizer, o governo não poderá pagar a indemnisação prévia, nem proceder á expropriação sem que o contracto para o caminho de ferro esteja approvado pelas córtes, ou as côrtes lhe tenham votado os meios necessarios para isso. Sendo este o pensamento da illustre commissão, confesso comtudo que a sua redacção não é tão clara que tire todas as duvidas, e parece-me que póde redigir-se o artigo melhor.

A illustre commissão diz (Leu) Este continua-los depois, parece-me que se podia supprimir; eu vou mandar para a mesa uma emenda de redacção, não para ser submettida á votação da camara, mas para a illustre commissão lhe dar na redacção final, a importancia que intender, que ella merece, lin redigiria o artigo da seguinte maneira. (Leu) E precisamente o pensamento da illustre commissão, mas quanto a mim redigido de maneira que evita alguma obscuridade que poderá encontrar o artigo da commissão.

Agora quero fazer ainda uma declaração, e chamo para ella a attenção da illustre commissão, e sobre tudo os illustres cavalheiros que formam parte da commissão de obras publicas. O artigo 4.º diz o seguinte (Leu) Eu intendo que neste artigo 4.º que a camara já votou, estava consignada a idéa de que a utilidade publica só se podia decretar em attenção ás expropriações necessarias segundo o traçado approvado por este caminho de ferro. E qual é o traçado approvado para este caminho de ferro? E o traçado que ha de formar parte do contracto, que ha de ser submettido ao corpo legislativo, listou convencido que o pensamento que se admittiu no artigo 4.º é este, é que é o contracto que ha-de ser submettido á approvação do corpo legislativo, ha-de ser acompanhado necessariamente do traçado do caminho de ferro, para a construcção do qual esse contracto é submettido ao corpo legislativo; porque eu não concedo que o traçado do caminho de ferro não possa deixar de formar parte do contracto. Chamo para isto a attenção do illustre deputado o sr. Palma. Intendo que o artigo 4 º quando tracta dos planos approvados, tracta do traçado que ha-de ser approvado pelo corpo legislativo; o contracto não póde ser submettido no corpo legislativo sem ser acompanhado do Maçado; a approvação desse contracto importa a approvação rio traçado, ou a modificação delle, se as côrtes o modificarem: por consequencia digo eu, como póde o governo começar desde já o processo das expropriações para um traçado que ainda não está approvado? Eu intendo por consequencia que o artigo que a illustre commissão mandou para a mesa, senão tem nada de nocivo, tem uma idéa inexequivel; não ha inconveniente nenhum em que este artigo seja approvado salva a redacção; porque os inconvenientes que apresentei ao artigo 3.º, esses inconveniente, desappareceram com o artigo 5.º que mandou para a mesa a commissão. Se o contracto carece da approvação do poder legislativo, e se o traçado ha-de formar necessariamente parte do contracto, a approvação do contracto importa a approvação desse traçado; e só se podem conhecer quaes são as expropriações á vista do traçado. Intendo que o governo sem a approvação do contracto não póde fazer nada sobre expropriações. Chamo a attenção das illustres commissões ácerca do que acabo de ponderar. Em quanto ao mais, não tenho duvida em approvar o ai ligo que está na mesa, salva a redacção; mas sei que approvado este artigo nada damos ao governo, porque o artigo l. diz, e não podia deixar de dizer, que as expropriações tem relação ao traçado approvado, e o traçado approvado ha-de ser o que vier no contracto

Concluo mandando para a mesa a seguinte

Emenda: — O governo poderá instaurar desde já os processos necessarios para a verificação de utilidade publica, em conformidade do artigo antecedente, e para a liquidação das expropriações, com tanto que a previa indemnisação e adjudicação das propriedades, que devam ser expropriadas só possam fazer» depois da auctorisação exibida no artigo 2.º — Avila.

Ficou sobre a mesa para. ser tomada em consideração na discussão.

O sr. Cunha Sotto-Maior — Sr. presidente, v. ex.ª até agora tem dado a palavra aos oradores alternadamente pro e contra, e não -ei como é que se tem alterado. Fallou o sr. deputado Avila contra, tem a palavra o relator da commissão o sr. Cardozo Castello Branco a favor, neste caso eu cederia da palavra, se v. ex.ª tivesse a bondade de dar a palavra ao sr. Cardozo Castello Branco, e reservar a minha para depois de s. ex.ª

O sr. Cardozo Castello Branco: — Sr. presidente, o que eu vejo é que o illustre deputado que acaba de fallar, o sr. Avila, está concorde com as opiniões

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da commissão, com tudo no que diverge «'sobre o modo de as enunciar. Sr. presidente, o illustre deputado quer que o governo só fique auctorisado para a instauração dos processos, e a commissão quer não só que elle fique auctorisado para a instauração dos processos, mas para a continuação desses mesmos processos. Alas em geral o que eu vejo, é que o illustre deputado está de accordo com a commissão, portanto quando se der a ultima redacção a este projecto, apresentar-se-ha de maneira que satisfaça ás idéas que se tem apresentado.

Agora em quanto ao traçado, isso é para mim materia de que pouco intendo, mas sem querer metter fouce em seara alheia, sempre direi que o illustre deputado está n'uma equivocação. O Traçado, aquelle que estabelece o logar pelo qual deve. seguir o caminho de ferro, é o terreno por onde deve ser dirigido, com a designação das propriedades que devem ser expropriadas. Ora o traçado sendo assim como supponho que é, deve preceder o contracto; póde estabelecera o traçado e approvar-se sem dependencia da apuração do contracto; portanto sendo assim não sei que para decretar as expropriações, seja necessario o traçado approvado. O que tem este com o contracto? Não tem nada; depois de feito o traçado, e depois de approvado é que tem logar a apuração do contracto para se começar o caminho de ferro; por consequencia parece-me que a duvida que tem o sr. deputado desapparece, por que o art. 4.º está approvado, e ainda mesmo quando o não estivesse, a duvida não podia proceder, por que não tem fundamento.

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Tenho muita difficuldade em approvar o artigo em discussão lai qual está. A substituição que a illustre commissão mandou para a mesa diz — que o governo poderá começar, continuar e ultimar todo o processo relativo a expropriações — Por consequencia já a camara vê que se tracta das expropriações que o governo deve fazer, mas das expropriações que deve fazer a companhia, estas não vejo aqui mencionadas. O sr. ministro da fazenda já leve a bondade de declarar, que todo o custo das expropriações ha de ser feito pela companhia Hislop; se isto é assim, para que quer o governo a auctorisação para fazer expropriações? Eu tenho mais que um motivo para ter estas apprehensões, por que no orçamento, no capitulo 4º das obras publicas, vem a quantia de 570 contos para caminhos de ferro; ora se todas as despezas tem de ser feitas pela companhia, para que pede o governo esta quantia para caminhos de ferro? E necessario que fique claramente definido, se as despezas começadas, continuadas e ultimadas para o caminho de ferro, hão-de ser feitas pelo governo, ou pela companhia: se são fitas pelo governo, então é necessario que fique bem clara esta idéa, e que se diga que é o governo que faz o caminho de ferro, e não uma companhia; e se as despezas são feitas pela companhia, então não póde ir o artigo como está; por que o artigo diz — o governo poderá começar mas não diz a companhia poderá começar — e se o governo póde começar e continuar, não começa nem continua a companhia, e se não começa nem continua a companhia, então estamos a discutir uma fantasmagoria.

O orçamento traz 570 contos para caminhos de ferro, para que quer o governo esta quantia? lista

questão, apezar da minha boa vontade, apezar de não estar em maré de argumentar, apezar de estar ha uma temporada para cá com uma certa demencia para esta discussão, intendo que esta questão cada vez se complica mais; e não posso completamente por de parte certas apprehensões que tenho, por que receio que esta camara discuta um projecto de lei que póde ser completamente inutilisado no momento em que vier o contracto.

Em consequencia de successivas revelações que o sr. ministro da fazenda tem feito, sabe-se que é a companhia que ha de costear-o caminho de ferro; e se isto é verdade, para que vem no orçamento a quantia de 570 contos para caminhos de ferro?... A illustre commissão de commercio e artes, que ha de estar ao facto das circumstancias que occorreram para a construcção do caminho de ferro, não diz nada da companhia, e só falla do governo! Alas é necessario que ella seja mais explicita; é necessario que a camara saiba o que vota, se vota um caminho de ferro feito por uma companhia, ou um caminho de, ferro feito pelo governo; ou se vota um caminho de ferro com o intuito politico de sustentar certas e determinadas pessoas no ministerio. Se vota neste intuito de conservar no poder os cavalheiros que estão sentados naquellas cadeiras, eu não me associo a esta idéa, e rejeito o projecto; mas se quer votar um caminho de ferro pelo qual se ande, então approvo o projecto. (Apoiados do lado direito) Alas o facto é que o governo não póde fazer caminhos de ferro, porque não tem meios; porém diz, que em consequencia desta falla de meios, adjudica os caminhos a uma companhia, e que é a companhia que ha de fazer as expropriações. Se pois é a companhia que ha de fazer as expropriações, para que quer o governo ser auctorisado a expropriar? Para que é que vem no orçamento das obras publicas 570 contos para caminhos de ferro?

Sinto realmente fazer parte de uma opposição ião pequena, que nem a minha voz tem importancia, nem o numero; isto é uma desgraça para mim, mas como sei que a razão não precisa ser numerosa para triunfar, póde sim hoje ser sofismada e esmagada, mas ámanhã ha de vencer; póde tambem acontecer aquillo que aconteceu em Hespanha, de lerem caído 4 ministerios, pouco gloriosamente, por causa dos caminhos de ferro; lá a opinião publica leve eco, e hoje estão mandando rever os contractos dos caminhos de ferro; por isso digo eu, que póde acontecer o mesmo em Portugal, mas em quanto não acontecer, eu, que sou deputado da opposição, tenho o direito de exigir que o governo e a commissão digam — se estas despezas para as expropriações hão de ser feilas pelo governo, ou pela companhia, a quem o governo der o caminho de ferro. Sem esta declaração não posso votar pelo artigo. Se o sr. ministro disser que todas estas despezas são feilas pela companhia do caminho de ferro, eu desde já peço a s. ex.ª que se comprometta a reduzir a um zero os 570 contos, que estão no orçamento das obras publicas.

O sr. Ministro das obras publicas (Fontes Pereira de Mello): — Direi apenas duas palavras em resposta ao illustre deputado, para que não pense, que a sua voz não tem bastante auctoridade, e que eu não tenho bastante desejo de satisfazer aos seus pedidos; e quero mesmo desvanecer um máo juizo que possa resultar das palavras do nobre deputado em relação aos 570 contos, que vem no capitulo 4.º do orçamento do mi-

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nisterio das obras publicas. Aquelles 570 contos que vem no orçamento, a que o nobre deputado se referiu, correspondem ao producto que se espera tirar do fundo especial de amortisação, e que é destinado para o caminho de ferro do norte. (O sr. Avila: — Apoiado) Por consequencia já vê o illustre deputado que é uma cousa muito differente, e que não póde resultar duvida alguma da proposta do governo de accôrdo com a substituição que a illustre commissão mandou para a meza, e que está em discussão neste momento.

Agora em quanto ao modo porque hão de ser pagas as expropriações, eu já declarei que hão de ser pagas pela companhia com quem o governo contractar, e cujo contracto ha de ser submettido á approvação desta camara; porem não lendo a camara ainda conhecimento delle, é claro que não se podia mencionar no artigo do projecto — a companhia poderá — mas sim — o governo poderá — porque ao governo é que se dá esta faculdade, em quanto mais tarde não passar para a companhia a quem o governo der a construcção do caminho de ferro. Por tanto esta explicação dou-a eu simplesmente, para que o illustre veja que as suas palavras me merecem sempre muita consideração.

O sr. Bordallo: — Sr. presidente, o artigo em discussão ou é inutil ou contradictorio. Se se pertende sómente auctorisar o governo a declarar a utilidade publica das expropriações, e a promover os termos -ulteriores, essa auctorisação já foi concedida no artigo ]., que auctorisa a construcção do caminho de ferro. Se pelo contrario se pretende fazer uma limitação ao artigo 4., por se suppôr que é da competencia do poder legislativo a approvação dos traçados, de que alli se falla, é altamente contradictorio e antinómico; porque nesta hypothese nunca o governo poderá começar o processo das expropriações, visto que estas não podem fazer-se antes de se declarar a utilidade publica, e esta fica dependente da approvação dos traçados pelo poder legislativo.

Se é revogada sómente a legislação em contrario, qual a razão porque a illustre commissão falla em indemnisação, e não falla nas outras provisões que não ficam revogadas? Pois ámanhã não póde isto dar logar a duvidas? Nós sabemos, e o nobre deputado sabe-o melhor do que eu, que quando a lei faz referencia a disposições expressas em outras leis, se intende que ficarão em vigor só aquellas disposições de que a lei faz menção. Parece-me pois que a substituição que vou mandar para a mesa, tira todas as duvidas que possa haver, e tendo o mesmo pensamento do artigo do parecer, é comtudo mais claro. Mando tambem um additamento que me é indifferente que fique neste artigo, ou que forme um artigo separado. Mas eu chamo a attenção do illustre relator da commissão para este ponto, porque de certo s. ex. leni muito conhecimento da lei de 1850, e muita perspicacia para comprehender o que vou dizer.

No artigo 150 da lei de 23 de julho de 1850, ha uma referencia ao artigo 46. O artigo 50 manda que quando se declarar a urgencia, se faça o deposito conforme com o artigo 46 da mesma lei. Ora este figura duas hypotheses, que são a do recurso pelo expropriante, e recurso pelo expropriado. Quando o recurso é pelo expropriante, manda-se fazer o deposito pela avaliação, e quando é pelo expropriado então manda depositar mais um terço da avaliação. Mando pois para a mesa a seguinte

Substituição: — Depois das palavras — continua-las — se ponha o seguinte: — e todas as disposições da lei de 23 de julho de 1850, continuem em inteiro vigor, com as modificações, declarações, e ampliações da presente lei. — Bordallo.

Mando igualmente o seguinte

Additamento: — O expropriante depositará mais um terço do valor das expropriações, sempre que esta fôr declarada urgente. — Bordallo.

Tanto a substituição como o additamento foram admittidos á discussão.

O sr. Avila: — Sr. presidente, eu estou inteiramente discorde com as observações do illustre deputado que acabou de fallar, em relação ao artigo 5.º O illustre deputado diz que vota a auctorisação ao governo para começar o processo das expropriações desde já, mas quanto á segunda parte intende que deve votar-se uma substituição que mandou para a mesa. Ora as duvidas que eu apresentei em relação a este artigo, as primeiras não versaram sobre o pensamento que estabelece este artigo, pelo contrario eu declarei que intendia que todas as duvidas que se tinham apresentado em relação ao artigo 3.º, tinham cessado com o correctivo mandado para a mesa pela illustre commissão; porque nós o que não queriamos é que debaixo da frase — fica desde já o governo auctorisado a leval-os a effeito — se intendesse todo o processo da expropriação.

Ora como nós intendemos que o artigo 2.º, que já foi votado, fazia dependente da approvação das côrtes os meios de levar a effeito a continuação do caminho de ferro de Lisboa a Santarem, intendiamos tambem que havia incoherencia entre a segunda parte do artigo 3.º para que o governo tivesse a auctorisação para fazer as expropriações que forem necessarias para a continuação desse caminho de ferro, ficando desde já auctorisado a leva-las a effeito, e o artigo 2.º que fazia dependente do corpo legislativo o contracto e quaesquer meios para levar a effeito essa construcção, e a illustre commissão leve a bondade de concordar, e de declarar que a auctorisação que estabelece o artigo 3.º era unicamente para levar a effeito as expropriações, mas que o processo e a liquidação não podiam continuar sem primeiro estar approvado pelo corpo legislativo o traçado do caminho de ferro, e mandou para a mesa um novo artigo redigido de outra maneira. Eu correspondi á commissão no modo como se houve em acceitar as minhas observações, dizendo que approvava o artigo, mas que parecia susceptivel de uma redacção mais clara, e disse que a mandaria para a mesa sendo necessario, sem comtudo exigir uma votação sobre a minha proposta, e o illustre deputado relator da commissão parece-me que senão oppoz.

Eu espero que a camara intenda que o sentimento que tive fazendo estas observações, não é de opposição. Eu nunca podia intender como objecto para fazer opposição, qualquer que ella seja, o caminho de ferro. Eu posso discrepar quanto aos meios, mas quanto ao pensamento não discrepo, hei-de cooperar quanto puder para que seja levado a effeito. Por consequencia acredite a illustre commissão que a minha idéa é que este projecto sáia o mais perfeito possivel.

Ora eu intendo que este projecto de lei no qual se declara no artigo 1.º, que o governo é auctorisado a contractar uma construcção de um caminho de ferro de Lisboa á fronteia de Hespanha, passando por

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Santarem — no artigo 2.º no qual se declara que o contracto ou outros quaesquer meios porque a construcção houver de ser levada a effeito, ficam dependentes da approvação do corpo legislativo — no artigo 3.º em que se declara, que são de utilidade publica as expropriações necessarias para o caminho de ferro — no artigo k em que se estabelece um processo summario para o decretamento de utilidade publica — e no artigo 5.º finalmente, em que se prescreve a indemnisação previa — parece-me que o projecto esta completo, e que o novo artigo 5.º que se quer introduzir entre os artigos 4. e 5.º do projecto, se póde dispensar. Este é que é o meu pensamento. Intendo que o artigo 5.º se póde dispensar, e porque? Ou o governo ha-de fazer obra por elle e vai provocar uma serie de reacções e difficuldades que nenhum governo que proceda prudentemente deve provocar, ou o governo não o leva a effeito por ser inexequivel, e neste caso é inutil. Eu repito o meu dilemma para ser bem comprehendido. Ou o governo reconhece que o artigo 5.º é inexequivel e não o cumpre, ou o governo pertende leva-lo á execução e vai encontrar logo repugnancias, que nenhum governo deve provocar... (Uma voz: — Deu a hora, vamos a votar isto) Eu hei-de acabar propondo que não se vote, só se querem a prorogação da sessão, porque espero que me farão a honra de responder as observações que eu fiz e que estão ainda sem resposta.

O artigo 4.º diz expressamente. (Leu.)

Ora, quaes são os traçados devidamente approvados? São os traçados, que se hão-de apresentar com o contracto. Pois os nobres deputados julgam que se ha-de apresentar aqui um condado sem ser acompanhado dos traçados? Os traçados devidamente approvados são aquelles que o corpo legislativo approvar com o contracto para se levar á execução o caminho de ferro; logo o governo não póde começar processo nenhum de expropriação sem estar approvado o contracto, e por consequencia os traçados Diz-se “ mas o governo que já approvou o traçado, começa já os trabalhos preparatorios das expropriações» Pois querem dizer á nação inteira que o governo está já fazendo obra por uma auctorisação que não se sabe se lhe será dada!

Dirão que não se perde cousa nenhuma porque se o traçado fôr outro, começam-se novos processos; — mas então é inutil o trabalho que se começou. Se eu fosse senhor de uma propriedade que o governo quizesse expropriar, o governo começava os trabalhos e eu ria-me e diria, está escrevendo na arêa, porque em quanto o traçado não fôr approvado, o governo não tem direito nenhum a pretender cortar a minha propriedade. Eis-aqui ao que eu desejo que a camara adenda, porque n'uma lei não -e devem estabelecer inutilidade» e inutilidades sobre tudo que importam uma violação das prerrogativas do corpo legislativo. O traçado approvado não e o traçado approvado pelo governo, é o que ha-de ser approvado com o contracto, e o contracto só póde ser approvado pelo corpo legislativo. Ora, eu como deu a hora, pediria ás illustres commissões que já deram uma grande prova de docilidade apresentando uma redacção melhor do artigo 3.º, que examinassem novamente este assumpto. Pediria ao nobre ministro das obras publicas, porque não nos illudamos, eu fui governo e sei que muitas vezes os ministros tem repugnancia em contrariar opiniões de amigos seus que os sustentam, mas este negocio é negocio de nós todos, e todos os melindres devem ceder na presença da conveniencia publica; eu não pergunto a s. ex.ª se está ou não conforme com as minhas idéas, mas peço-lhe que combine com as illustres commissões, e que veja se acha que o artigo 3.º effectivamente póde ser necessario. Eu estou convencido que não é, estou convencido que hade trazer difficuldades e vantagem nenhuma, estou convencido que o projecto depois do que se tem votado até ao artigo 4.º não lhe falla nada senão votar-se o artigo 5.º, e votado esse artigo, estou convencido que votamos um pensamento completo que não nos ha-de envergonhar, e que é proprio de uma camara illustrada como tenho o prazer de considerar esta, exceptuando um dos seus membros, que sou eu.

O sr. Presidente: — O sr. Palma veiu dizer-me que tinha pedido a palavra, parece que logo no principio da discussão deste artigo, mas eu não o ouvi, e por consequencia não o inscrevi Está agora inscripto e é o primeiro que se ha-de seguir ámanhã a fallar, e estão inscriptos depois os srs. C. Castello Branco, e José Estevão. A ordem do dia para ámanhã é a continuação desta discussão, em segundo logar o projecto sobre o imposto na exportação da praia a que se refere o parecer n.º 31; em 3.º logar o projecto n.º 29 para serem isentos do pagamento de direitos os donativos que se importarem no Funchal; e em 4. logar o projecto que já estava dado ácerca dos officiaes da guarda municipal. Está levantada a sessão. — Eram quatro horas da tarde.

O REDACTOR

JOSÉ DE CASTRO FREIRE DE MACEDO.

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