O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

1926 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

as duas nações, aos eternos princípios de direito e ás solemnes declarações feitas perante o parlamento britannico por lord Granville, ás quaes já tive occasião de referir-me na minha nota de 9 de julho.
«É singular na historia este facto de uma nação poderosa haver durante perto de quarenta annos impedido o exercício dos direitos de soberania de uma nação amiga, sua antiga e sempre fiel alliada, e isto em territorios a respeito dos quaes não invocara nem podia invocar direitos alguns de domínio; resultando daqui manter só por tão longo período n'aquellas regiões um completo estado de anarchia, contrario ao livro desenvolvimento do commercio das nações civilizadas, mas altamente proveitoso aos interesses egoístas e ao monopolio exclusivo de alguns opulentos traficantes.
«Tamanha injustiça a que pozera termo o governo de Sua Magestade Britannica pelo tratado de 26 de fevereiro, não é de esperar que possa jamais praticar-se, qualquer que seja a sorte d'aquelle tratado».
Repito, é esta uma linguagem singelamente digna e propria de uma nação que para fazer valer o seu direito não dispõe, nem de poderosas esquadras nem de exercitos numerosos, mas que ainda assim sabe prezar a sua dignidade, e manter os seus brios tradicioaaes. (Apoiados.)
A nota que acabo de ler dá-me motivo para felicitar o sr. ministro dos negocios estrangeiros por a haver redigido. (Apoiados.)
Com os documentos que citei á camara creio, pois, ter demonstrado claramente a que abandono nos tinha votado a Inglaterra.
Mas ha ainda um documento mais duro e triste do que todos estes para o evidenciar.
Parecerá esta asserção impossível de provar, mas o Livro branco allemão veiu infelizmente dar-nos elemento para tambem a demonstrarmos á camara.
A pag. 30 d'este livro, lê-se um despacho do conde de Munster para Berlim, relatando uma conferencia que tivera com lord Granville, em Londres, n'elle se dizia o seguinte:
«Celebrando o tratado a Inglaterra só tivera em vista tornar accessivel a todas as nações o commercio do Congo, e livral-o dos vexames dos portugueses.»
Acrescentava ainda lord Granville, «que elle por si pouco valor dava ao tratado, mas que não via ainda muito claramente o que se poderia pôr em seu logar. Portugal não prescindiria de fazer valer os seus direitos áquellas regiões, e usar da força contra Portugal nenhuma potência o quereria fazer.»
Aqui está, portanto, a maneira porque a Inglaterra se exprimia na occasião em que nós tão angustiosamente appellavamos para ella.
Affirmava-se que o único motivo que levara o governo inglez a assignar o tratado do Congo era o pretender livrar o commercio dos vexames que lhe trazia o domínio colonial portuguez!
Ainda mais.
Lord Granville declarava não ligar por si nenhum grande apreço ao tratado, havendo apenas uma cousa que não estava ainda bem esclarecida no seu espirito, e era o não saber o que se lhe havia de substituir!
Era assim que a Inglaterra nos defendia perante as chancellarias européas.
Passava-se isto em 20 de junho, quer dizer, em seguida á nota de 7 de junho, tão notável e tão celebre, por mim já lida a esta camará, e dirigida pelo príncipe de Bismark ao conde de Munster.
Creio, sr. presidente, que na historia se manifesta de modo incontestavel, a existencia de uma lei providencial. Pois bem, o que ultimamente está succedendo á Inglaterra talvez seja mais uma das muitas provas da existência de uma tal lei.
Essa nação que dispôs da primeira esquadra do mundo, que é a mais rica de quantas ostentam o seu poderio por esse universo; esse paiz, do qual se póde dizer como outrora se dizia do imperio portuguez, que para elle não começa nem acaba o dia, visto abranger vastíssimos territorios em todos os continentes; esse paiz viu ha poucos dias succumbir Kartutn e morrer ali, vergonhosamente abandonado, o general Gordon-Pachá. Esse paiz sujeitou-se nas regiões montanhosas do Afghanistan, já nas proximidades do Herat, que no dizer da imprensa ingleza sempre foi considerado como chave das Indias, a ouvir troar os canhões do general Komaroff, affirmando mais uma vez o famoso momento que diz ás nações, como aos indivíduos, que também, para ellas ha períodos de decadencia e humilhação. (Apoiados.)
E é notável, sr. presidente que, seja precisamente a chave dessas Indias que nós fomos dar á Inglaterra pela cessão de Bombaim, que seja ahi que a proverbial altivez da Gran-Bretanha mais se offusque e se tenha abatido.
Não se sacrificam de balde, mercê de Deus, os principios de direito; a justiça dos fracos não póde ser menosprezada nem calcada aos pés; não se procede assim para com alliados como nós, que tínhamos, como ha pouco disse, sido a origem do poder colonial da Inglaterra, que mais tarde havíamos cooperado com ella nos campos da batalha, e do modo mais valente e levantado contribuído para salvaguardar a Europa da tyrania napoleonica, para comnosco, emfim, a que ultimamente estávamos cooperando tambem com a Gran-Bretanha na causa da civilisação do continente africano!
Referi-me ha pouco á sugestão para convocação da conferencia, referi-me ao nosso despacho para Londres de 12 de maio e á circular de 13, e perguntei ao sr. ministro dos negocios estrangeiros, se a este documento tinha havido alguma resposta, e s. exa. do seu logar affirmou-me que elle não fôra communicado aos diversos governos.
No entretanto é certo que todos esses governos mostraram ter conhecimento da suggestão do governo portuguez; o proprio despacho de 7 de junho, do príncipe de Bismarck, lá se refere á tentativa do sr. Bocage; e ainda ha documento mais claro a esse respeito, é o que se lê neste Livro branco, a pag. 32, e sob igual numero:
«O governo portuguez, assim diz o conde de Hatzfeldt, em 26 de julho, para o conde de Munster, de ha tempos a esta parte reconhecera por seu lado, como eu cabalmente referi na mencionada nota de 7 de junho, que era indispensavel resolver a questão de um modo internacional. Para esse fim se dirigiu não só a nós e á Inglaterra, mas ainda a outras potencias, com a proposta de uma conferencia. Respondemos que consideravamos a proposta conveniente, e que por nosso lado facilitariamos a solução que servisse melhor os interesses geraes.»
Ora, eu não levo a mal que o governo portuguez suggerisse a idéa de uma conferencia internacional, mas do que elle devia ter tratado primeiro, era de entender-se com os governos respectivos, para definir os termos, dentro dos quaes se devia realisar essa conferencia; e tanto isto é assim, que quando o sr. Andrade Corvo, numa audiência do sr. Tules Ferry, suscitou a idéa de se resolver a questão do Zaire, pela reunião de um congresso internacional, logo o sr. Ferry lhe disse: que já lhe havia sido suggerida essa idéa por parte da Allemanha. Fez isto immediatamente com que o sr. Andrade Corvo, cavalheiro com larga pratica dos negocios, e que é um homem, a cuja intelligencia perspicaz todos prestámos inteira homenagem, (Apoiados.) logo visse o alcance d'aquelle facto, e declarasse ao sr. Ferry, mudando de linguagem, que realmente uma conferencia poderia ser muito proveitosa, mas que ainda assim ella tinha perigos possíveis, referindo-se a negocios coloniaes.
E viu bem s. exa., porque realmente a maneira unica de desviar taes perigos consistia em definir primeiro os termos em que a conferencia ia trabalhar, circumscrever-lhe