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SESSÃO DE 1 DE JUNHO DE 1885 1927

a sua acção, e não consentir que n'ella se levantassem as questões de posse e do direito de occupação.
E o sr. Ferry que por seu lado, visto a França ter interesses tão consideraveis na Africa, avaliava muito bem a gravidade da questão, declarou logo em resposta ao sr. Corvo, que só approvaria a conferencia, limitada que fosse de antemão e cautelosamente a sua competencia.
Houve, pois, em tudo isto, por parte do nosso governo, uma inexplicavel hesitação, (Apoiados.) da qual resultou sujeitarmo-nos a perigos e corrermos riscos, que poderiam ter acarretado as mais graves consequencias para Portugal.
Suggerimos uma conferencia sem nos apoiarmos nem sobre a côrte de Londres, nem sobre qualquer outra, sujeitando nos assim a ver discutidos os nossos direitos de occupação em pontos ainda mesmo muito afastados do Zaire, e a fazer surgir a questão colonial sob todos os teus aspectos.
N'este intervallo, quando tamanhas eram as difficuldades, dera-se, porém, um facto de certa gravidade, ao qual tenho agora de alludir, e a que devia ter-se seguido um resultado qualquer: o de exito ou o de mallogro, resultado que em todo o caso cumpre ver esclarecido perante o parlamento portuguez.
Refiro-me á missão do sr. Antonio de Serpa. (Apoiados.)
No Livro branco não ha uma unica referencia a esta missão, que constou em toda a parte e foi apreciada por toda a imprensa.
É um facto positivo, de todos conhecido, que o sr. Antonio de Serpa se dirigiu em julho a diversas côrtes estrangeiras e particularmente á de Berlim.
Este cavalheiro levava, porventura, instrucções para propor uma conferencia? Procurava allianças? Ia defender officiosamente os nossos direitos, tornar-nos favoravel a opinião das chancellarias?
O sr. Serpa foi ou não recebido pelo príncipe de Bismarck?
Nada nos diz o Livro branco a este respeito; portanto, eu pergunto ao governo qual foi a missão do sr. Antonio de Serpa, de que exito foi coroada ou a que nova decepção nos expoz a viagem d'esse diplomata.
Trata-se de uma diligencia extraordinaria, justificada aliás pela gravidade da situação e das circumstancias.
O que póde, pois, explicar que perante o parlamento se não diga uma só palavra ácerca da natureza d'esta missão nem do exito que podesse ter tido? (Muitos apoiados.)
Sr. presidente, analysei quanto dizia respeito ás negociações que precederam a conferencia de Berlim, agora vou entrar propriamente na apreciação da mesma conferencia, e com essa parte do meu discurso prometto não levar muito tempo á camara.
Direi apenas que a conferencia de Berlim teve umas cousas que se viam, o outras, bem mais importantes para nós, que se não viam.
Por um lado, o que era publico, o que consta dos protocollos e relatorios impressos e distribuído; por esta camara, fui uma discussão, por muitos titulos interessante, de direito internacional, no decurso da qual foram ouvidos homens eminentes, e em que tambem os assumptos africanos foram debatidos com perfeito conhecimento de causa por individuos que tinham estado em Africa, ou que de outro modo tinham em diversas occasiões innegavel competencia n'esses assumptos.
Uma similhante discussão representa incontestavelmente um passo largo para a frente na historia e tradições da diplomacia, permittiu ella que se affirmassem alguns principios, continuando-se assim as tradições honrosas dos congressos de Vienna e de Paris.
Mas é certo, a par disso, que aquella conferencia teve o seu quê de platonico.
Era uma especie de reunião academica; em que todos á porfia procuravam mostrar irem mais adiante uns do que outros no caminho sempre sympathico da liberdade e do progresso, o que podia fazer-se com tanto menos risco quanto se talhava, obra em terreno alheio, e se tinha em vista uma applicação na melhor hypothese muito remota, senão inteiramente problematica.
Mas estas eram as apparencias. O que estava por baixo de tudo ist, o que os factos vieram demonstrar amplamente, é que aquella alta assembléa se reunia em realidade para dar uma existencia official á associação internacional, e para obrigar as potencias que até ali tinham recusado reconhecel-a como soberana, a dobrarem-se perante ella e a tratal-a como tal.
Ali é que estava o perigo para nós. Das exterioridades da conferencia, das suas apparatosas discussões, pouco temos a colher, mal podem excitar em nós outro sentimento que não seja um interesse theorico e de estudo.
E que não é esta uma apreciação isolada, provam-o as seguintes palavras que, segundo creio, foram escriptas por quem tinha no assumpto toda a auctoridade para as dizer. Refiro-me a uma correspondencia de Berlim, inserida no Jornal do commercio, e na qual se relata a sessão final da conferencia.
«Bismark annunciou» assim se lê n'este jornal, «que já tinha na sua mão o acto de adhesão da associação internacional no acto geral da conferencia, que ia ser assignado, e fez o elogio do rei dos belgas. Ficou assim bem marcado qual foi o fim, não ostensivo, mas real, da conferencia. »
«Muita gente agora perguntará: a conferencia de Berlim foi uma comedia, ou uma cousa séria e com resultados praticos? Alguns responderão que teve de uma e outra cousa.
«A primeira resolução que tomou a conferencia foi de todas a menos séria: uma delimitação da bacia do Congo, que fará sorrir os geographos futuros. Na verdade, delimitar a bacia do Congo, ao sul, pelas cristas das bacias do Zambeze e do Loge, equivale a limitar a bacia do Tejo, ao norte, pela serra da Estrella, e pelo Alto da Porcalhota.»
E passado este documentario, que só por si diz tudo, acrescenta-se mais adiante o seguinte:
«A maior vantagem, porém, da conferencia de Berlim, foi estabelecer um precedente, convocando as nações de segunda ordem para deliberar com as de primeira, creando assim a primeira tentativa de um tribunal internacional, para julgar as grandes questões que interessam á civilisação.»
Ora eu não creio, por minha parte, no rigor d'esta conclusão, e na conferencia ácerca do isthmo de Suez, teve ella já, pelo que nos respeita, um primeiro e solemne desmentido.
A assembléa internacional de Berlim é, pois, assim apreciada por alguem, repito, que julgo muito auctorisado para formular similhante apreciação. Deveremos nós, em face d'isto, discutil-a no parlamento portuguez?
E no entanto, não devo deixar de dizer que merecem louvares os nossos plenipotenciarios, cuja missão consistiu em diligenciar directa e indirectamente cortar os vôos a certos philantropos e progressivas incorrigíveis, em manter-se sempre de aralaia e vigilantes contra as pretensões dos que, achando acanhadas as regiões não occupadas de Africa, queriam ainda envolver nas suas combinações o regimen das nossas colonias de Moçambique e região da Zambezia, e até a propria Angola.
A isto, parece-me, tinha de se reduzir o papel dos nossos plenipotenciarios, mas isto era muito, e envolvia os nossos mais importantes interesses coloniaes e brios como nação.

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