O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

( 205 )

dar logar a outros abusos, será preciso accrescentar mais algumas providencias, que em certos casos sirvam de restricção á regra geral, e em outros regulem os termos em que deve observar-se.

Bastará substanciar os fundamentos em que assentam similhantes providencias para se conhecer, com evidencia, a justa razão que as aconselha.

O reconhecimento paterno, como prova de um facto, que dá ao filho natural novo estado, e direito á successão, torna-se de tal importancia, que não é possivel deixar de exigir-se que seja revestido de toda a authenticidade, para excluir até a mais leve sombra de surpreza e seducção.

Chegar-se-ha talvez a este resultado se se determinar que o reconhecimento só possa fazer-se no assento de baptismo, em escriptura publica, ou em disposição de ultima vontade.

A irrevogabilidade do reconhecimento, ainda mesmo feito em testamento, é uma condição exigida pela propria natureza do objecto. Desde que o pai mostrou explicitamente não ter duvida ácerca do facto da filiação, deixar-lhe a faculdade de revogar o reconhecimento, seria permittir que prevalecesse o arbitrio aonde não ha liberalidade que exercer, mas deveres que cumprir. Nem a revogação do testamento póde envolver a revogação do reconhecimento, porque o principio do reconhecimento está no facto da filiação, e não no testamento.

A dignidade do matrimonio, e a fé reciproca que uniu entre si os conjuges, não permittem que um delles possa depois do casamento mudar a sorte da familia legitima. E assim, para o filho natural concorrer á successão do pai com os filhos do legitimo matrimonio, é indispensavel que a filiação tenha sido reconhecida por escriptura publica, antes da celebração do mesmo matrimonio.

Os direitos de terceiro não podem nunca ser prejudicados por facto alheio. Este principio inaltaravel de justiça exige que seja admittida a impugnar não só o reconhecimento, mas a acção de filiação quando tiver logar, qualquer pessoa que se julgue por qualquer modo prejudicada com a declaração ou reconhecimento da filiação.

Finalmente, não só é maxima incontestavel que as Leis não podem ter effeito retroactivo, mas é não menos certo, que seria iniqua e intoleravel qualquer disposição que violasse direitos adquiridos por virtude de Legislação anterior.

É facil reconhecer a que ponto chegaria a violação de direitos adquiridos legitimamente na materia de que se tracta.

1.° Se o filho natural do peão, que pela Ordenação do Reino concorre á successão com os filhos legitimos, independente de reconhecimento paterno, fosse excluido, dessa mesma successão, por ser já casado o pai ao tempo da publicação da nova Lei, e não poder em consequencia apresentar o reconhecimento anterior.

2.° Se o filho natural do peão, não podendo igualmente apresentar o reconhecimento do pai, por este ser fallecido ao tempo da publicação da Lei, fosse privado da successão, quando esta lhe estava já deferida desde a morte do pai pelo direito da Ordenação do Reino.

Ainda que á primeira vista parecia desnecessario prevenir similhantes hypotheses, na intelligencia de que deixadas ao abrigo dos principios de justiça universal, acima expendidos, tudo ficaria acautelado; e não obstante poder-se affirmar com maior segurança, que em hypotheses iguaes nenhum prejuizo viria aos filhos legitimos e herdeiros do nobre, porque não podendo em taes casos habilitar-se o filho natural com o requisito indispensavel do reconhecimento, tambem não poderia entrar na successão; não são desconhecidos os desastrosos resultados que muitas veses nascem de interpretações cerebrinas, mas engenhosas; nem póde duvidar-se de que toda a claresa nas Leis nunca é demasiada para obstar aos males da sua errada applicação; e estas considerações bastam para persuadir senão a necessidade, ao menos a grande utilidade de estabelecer expressamente, que em taes hypotheses se observe sem alteração alguma a Legislação da Ordenação do Reino, Liv. 4.º Tit. 92.

Taes são, Senhores, os fundamentos pelos quaes tenho a honra de submetter á vossa illustrada consideração o seguinte Projecto de Lei, intimamente convencido de que da sua adopção deve resultar vantagens á Sociedade.

PROJECTO DE LEI. - Artigo 1.º As disposições da Ordenação Liv. 4.º Tit. 92.º, que regulam a successão legitima do filho natural do peão, são ampliadas ao filho natural do nobre, para succeder ao pai em quaesquer bens não vinculados, abolida assim a distincção que em contrario se estabelece na referida Ordenação.

Art. 2.° A prova da filiação natural sómente poderá effectuar-se pelo reconhecimento feito pelo pai, de qualquer condição que este seja.

§ unico. Não se requer o reconhecimento da filiação feito pelo pai:

1.° Quando este em tempo correspondente á procreação do filho natural tiver commettido o crime de rapto por seducção ou violencia, da mulher da quem houver o mesmo filho.

2.º Quando no mesmo tempo da procreação até ao do nascimento do filho natural tiver havido cohabilação entre o pai e a mãi.

3.° Para obter a prestação de alimentos, sem direito algum á successão.

Sómente nas tres hypotheses deste paragrafo fica sendo permittida a acção de filiação natural contra o pai ou seus legitimos representantes.

Art. 4.° O reconhecimento da filiação de que tracta o artigo antecedente, não poderá fazer-se senão no assento de baptismo, assinado pelo pai, em escriptura publica, ou em disposição de ultima vontade.

§ unico. O reconhecimento uma vez feito, ainda mesmo em disposição de ultima vontade, é irrevogavel.

Art. 4.° Para o filho natural concorrer á successão do pai, de qualquer condição, com filhos havidos de legitimo matrimonio, é preciso que o reconhecimento da filiação seja feito em escriptura publica, antes da celebração do mesmo matrimonio.

Art. 5.° Tanto o reconhecimento como a acção de filiação nos casos em que por esta Lei tem logar, poderão ser contestados por quaesquer interessados.

Art. 6.º O direito do filho natural á successão do pai, guardada a distincção entre o filho do peão e o do nobre, regular-se-ha pela Ordenarão Liv. 4.º Til. 92.°, e não pelas disposições da presente Lei.

1.º Se o filho natural concorrer á successão com

VOL. 5.º - MAIO - 1850.