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SESSÃO DE 19 DE MAIO DE 1879

Presidencia do ex.ª sr. Francisco Joaquim da Costa e Silva

Secretarios — os srs.

Antonio Maria Pereira Carrilho

Augusto Cesar Ferreira de Mesquita

SUMMARIO

Apresenta "o sr. ministro da fazenda um proposta approvando o contrato feito com o banco ultramarino. — Na 1.º parte da ordem do dia foram approvados sem discussão os projectos n.º 102, 110 e 303. — Na 2.º parte continua a discussão do orçamento do ministerio da marinha, sendo approvados, depois de discutidos, os capitulos. 4.°, 5.°, 6.° e 7.°; entra em discussão o capitulo 1.° do orçamento do ministerio dos negocios estrangeiros.

Abertura — Ás duas horas e um quarto da tarde.

Presentes á abertura da sessão 50 deputados — Os srs.: Adriano Machado, Osorio de Vasconcellos, Alfredo Peixoto, Alipio Leitão, Avila, Carrilho, Mendes Duarte, Pereira Leite, Barão de Ferreira dos Santos, Sanches de Castro, Cazimiro Ribeiro, Diogo de Macedo, Costa Moraes, Mesquita e Castro, Pinheiro Osorio, Francisco Costa, Guilherme de Abreu, Palma, Freitas Oliveira, Jeronymo Osorio, Anastacio de Carvalho, Brandão e Albuquerque, Scarnichia, Barros e Cunha, Sousa Machado, Almeida e Costa, J. J. Alves, Ornellas de Matos, Pires de Sousa Gomes, Frederico Costa, Figueiredo de Faria, Namorado, Rodrigues de Freitas, Borges, Pereira Rodrigues, Sá Carneiro, Taveira de Carvalho, Barbosa du Bocage, Luiz de Lencastre, Luiz de Bivar, Faria o Mello, Rocha Peixoto, M. J. Vieira, Aralla e Costa, Mariano de Carvalho, Miranda Montenegro, Miguel Dantas, Pedro Jacome, Visconde de Balsemão, Visconde do Sieuve de Menezes.

... Entraram durante a sessão — Os srs.: Adolpho Pimentel, Fonseca Pinto, Braamcamp, Torres Carneiro, Pereira de Miranda, Gonçalves Crespo, A. J. Teixeira, Arrobas, Barros e SA, Ferreira de Mesquita, Fuschini, Saraiva de Carvalho, Victor dos Santos, Zeferino Rodrigues, Caetano de Carvalho, Emygdio Navarro, Hintze Ribeiro, Francisco de Albuquerque, Mouta e Vasconcellos, Gomes Teixeira, Sousa Pavão, Van-Zeller, Frederico Arouca, Paula Medeiros, Costa Pinto, Jeronymo Pimentel, Melicio, João Ferrão, J. A. Neves, Dias Ferreira, Tavares de Pontes, Frederico Laranjo, José Luciano,. Ferreira Freire, J. M. dos Santos, Sousa Monteiro, Lopo Vaz, Lourenço de Carvalho, Almeida Macedo, Freitas Branco, Manuel d'Assumpção, Pires de Lima, Correia de Oliveira, Alves Passos, Macedo Souto Maior, Pinheiro Chagas, Nobre de Carvalho, Pedro Correia, Pedro Roberto, Rodrigo do Menezes, Visconde da Aguieira, Visconde de Alemquer, Visconde do Andaluz, Visconde da Arriaga, Visconde da Azarujinha, Visconde de Moreira de Rey, Visconde do Rio Sado.

Não compareceram á sessão — Os srs.: Carvalho e Mello, Agostinho Fevereiro, Tavares Lobo, Alfredo de Oliveira, Emilio Brandão, Lopes Mendes, Pedroso dos Santos, Pinto de Magalhães, Telles de Vasconcellos, Neves Carneiro, Avelino de Sousa, Bernardo de Serpa, Carlos do Mendonça, Conde da Foz, Moreira Freire, Goes Pinto, Filippe de Carvalho, Firmino Lopes, Fortunato das Neves, Pereira Caldas, Silveira da Mota, José Guilherme, Teixeira de Queiroz, Mello Gouveia, Julio de Vilhena, Luiz Garrido, M. J. de Almeida, M. J. Gomes,.Marçal Pacheco, Miguel Tudella, Pedro Carvalho," Pedro Barroso, Ricardo Ferraz, Thomás Ribeiro, Visconde de Villa Nova da Rainha.

"Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

Representação

Da Camara municipal de Villa Real, pedindo a approvação dó projecto apresentado pelo sr. José Paulino do Sá

Carneiro e outros deputados na parte que se refere á directriz do caminho de ferro que partindo da linha do Douro deve passar por aquella villa em direcção a Chaves.

Apresentada pelo sr. deputado Sá Carneiro e enviada ã commissão de obras publicas.

SEGUNDA LEITURA

Projecto de lei,

Renovo a iniciativa do projecto do lei n.º 70, do 1872, concedendo á camara municipal de Nossa Senhora da Victoria da Batalha o salão grande que dá entrada para os dormitórios do extincto convento de S. Domingos, sito no mesmo concelho, para as repartições municipaes, administrativas e judiciaes.

Sala das sessões, 17 de maio de 1879 — O deputado pelo circulo do Leiria, João Chrysostomo Melicio..

Enviado á commissão de fazenda.

Projecto de lei •

Senhores. — Os empregados da administração militar, classe inteiramente sujeita ao foro e regulamentos militares, não obstante a determinação de lhes ser conferido o direito á reforma e outras recompensas, assim como ás vantagens estabelecidas em favor dos officiaes não combatentes, como é expresso no § unico do artigo 23.° do decreto com forca de lei de 18 de novembro de 1869, não gosam ainda a distincção da ordem militar de S. Bento do Aviz, de ha muito extensiva a algumas outras classes de officiaes não combatentes.

A excepção não se justifica, o seria prolixo demonstrar que 03 officiaes da administração militar estão intimamente ligados ao exercito em todas as relações de serviço quer em tempo de paz, quer em tempo de guerra; por isso tenho a honra do submetter á vossa approvação o seguinte:

PROJECTO DE LEI

Artigo. 1.° A distincção do grau de cavalleiro da ordem militar de S. Bento de Aviz é declarada extensiva aos officiaes da administração militar, que, tendo a graduação de capitão, contem vinte annos de bom serviço, nos termos do alvará de 16 de dezembro de 1790.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 17 de maio de 1879. = Adolpho Pimentel, deputado pelo circulo de Barcellos.

Enviado á commissão de guerra.

O sr. Mariano de Carvalho: — Pedi a palavra para chamar a attenção do parlamento e do governo para umas cartas de lei que saíram ha poucos dias publicadas no Diario do governo a que faltam, segundo me parece, as condições necessarias para que possam ser lei.

A primeira, auctorisa a commissão de recenseamento do concelho de Almeirim a crear uma assembléa eleitoral em Alpiaça.

Esta carta de lei é sanccionada em 8 de maio.de 1878.

(Leu.)

Por conseguinte é do anno passado e tem apenas o inconveniente do ser inutil, porque a assembléa eleitoral já está creada pela lei de 8 de maio de 1878.

A outra, legalisa a despeza do 8:000$000 réis no ministerio do reino, no serviço de saude publica, em 21 de abril do anno proximo findo.

Ha finalmente uma que concede ao asylo D. Pedro V

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da infancia desvalida de Braga o extincto convento da Penha, e diz. (Leu.)

Isto não póde ser por uma rasão muito simples, porque as cartas de lei não podem ir á sancção regia sem umas certas formalidades que a constituição marca e que não podem ser alteradas.

A primeira formalidade é esta:

. «Se qualquer das duas camaras, concluida a discussão, adoptar inteiramente o projecto que a outra camara lhe enviou, o reduzirá a decreto, e depois de lido em sessão o dirigirá ao Rei em dois autographos assignados pelo presidente e dois secretarios pedindo-lho a sua sancção pela fórmula seguinte: «As côrtes geraes dirigem ao Rei o decreto incluso que julgam vantajoso e util ao reino e pedem a Sua Magestade se digne dar a sua sancção.»

Por conseguinte logo que se vota definitivamente uma carta de lei em qualquer das duas casas do parlamento, redigem-se os dois autographos, são lidos na mesa e assignados pelo presidente e secretarios da camara e enviados por uma deputação a El-Rei, e Sua Magestade póde dar ou negar a sancção. Mas para isto ha um praso marcado na constituição.

Diz o artigo 59.°:

«O Rei dará ou negará a sancção em cada decreto dentro de um mez depois que lhe for apresentado.»

Se não de todos, pelo menos de uma ou de duas d'estas cartas de lei, foram feitos os autographos em fevereiro do anno passado; aconteceu-lhes não sei o que, mas o caso é que este anno os autographos não foram lidos na outra casa do parlamento, não foram enviados por uma deputação a Sua Magestade, e El-Rei não podia por conseguinte sanccionar cousa alguma.

Gomo isto succedeu, não o sei. Que a culpa não é do chefe do estado, sei-o eu por informações que tenho, mas como é que houve esta demora de um anno na sancção é que eu não posso perceber.

O caso é que se não todas, pelo menos algumas cartas de lei, não podiam ser lei senão depois de cumpridas as formalidades necessarias marcadas na constituição para que um projecto das côrtes se transforme em lei.

Dou conhecimento d'este facto á camara e ao governo, e dir-lhe-ía, se elle estivesse presente, que me parece que é necessario proceder de algum modo, em relação a uma, duas ou todas estas tres cartas de lei, porque creio que a constituição tem de ser cumprida, afim d'ellas serem transformadas em lei.

Uma, que é a que se refere á creação de uma assembléa eleitoral em Alpiaça, não tem importancia alguma, porque essa assembléa já está creada pela lei de 8 de maio do anno passado.

Em quanto á que legalisa uma despeza com o serviço de saude, não póde haver duvida; mas a que se refere ao asylo de D. Pedro V, em Braga, é mais grave porque diz: de 12 de fevereiro do anno proximo findo.

E um edificio que o estado cede á camara municipal de Braga', e, por conseguinte, não sendo esta concessão feita perfeitamente, por uma lei regular, póde dar origem a contestações que é necessario prever.

¦ Por consequencia, em relação a esta é necessario acautelar.

Seja como for, eu dei d'este facto conhecimento á camara, e v. ex.ª informará o governo, se elle quizer tomar conhecimento do que acabo de dizer, a fim de se remediar este caso de qualquer modo..

O sr. Miguel Dantas: — Mando para a mesa um requerimento de João Antonio Maximo, conductor auxiliar no ministerio das obras publicas e servindo no caminho de ferro do Minho, em que pede á camara que sanccione uma medida legislativa, que a elle e aos seus collegas dê o accesso e futuro no serviço do estado, provendo assim de remedio á injustiça de que estão sendo victimas, segundo' allega.

Peço que este requerimento tenha o conveniente destino e espero que a commissão lhe prestará a attenção que ella merece, melhorando d'este modo a precaria situação em que estes empregados, até ao presente, se -têem encontrado.

O sr. A. J. Teixeira: — Mando para a mesa um parecer da commissão do fazenda sobre o projecto de lei que concede o pequeno pinhal de S. João á camara municipal de Cantanhede.

O sr. J. M. dos Santos: — Envio para a mesa um projecto de lei em que é o governo auctorisado a conceder á junta geral do districto de Evora, para o estabelecimento de uma escola normal de 2.ª classe ou outro estabelecimento de instrucção, a igreja de S. Pedro, situada na freguezia da Sé d'aquella cidade.

PRIMEIRA PARTE DA ORDEM DO DIA

Entrou em discussão o projecto n.º 102. E o seguinte:

Projecto de lei n. 102 Senhores. — As vossas commissões reunidas de fazenda e de obras publicas foi presente a proposta de lei do governo n.º 94-L, tendente a sujeitar á lei commum a concessão das minas de Aljustrel, feita á companhia de mineração transtagana, e sobre esta proposta vao emittir o seu parecer.

Por aviso do 2"7 de abril de 1866 foi aberto concurso por espaço do seis mezes para a concessão das minas de pyrites de cobre de S. João do Deserto e de Algares no concelho de Aljustrel. O concurso annunciado em Lisboa, Londres, París e Madrid terminou ás quatro horas da tarde de 21 de setembro do mesmo anno. Não houve oppositor á concessão das minas.

Recebendo-se, porém, depois de findo o praso do concurso, no ministerio das obras publicas, requerimentos pedindo a concessão das alludidas minas, determinou-se, por portaria de 21 de novembro do dito anno de 1866, que fosse aberto novo concurso por espaço de quarenta dias, nos termos do programma anterior. Cinco dias mais tarde, isto' é, a 26 de novembro de 1866, e com o fim de habilitar com tempo sufficiente os individuos nacionaes e estrangeiros que quizessem ser oppositores á adjudicação, o praso do concurso foi prorogado até 31 de janeiro de 1867, verificando-se a abertura das propostas no dia immediato.

Apresentaram-se duas propostas e a mais vantajosa foi a da companhia de mineração transtagana, que offereceu pagar ao estado 800 réis por tonelada de minerio posto á boca da mina.

Era esse o ponto a licitar: a base proposta pelo governo tinha sido de 500 réis por tonelada, e o concessionario seria obrigado a extrahir, pelo menos, 20:000 toneladas de minerio, sendo a clausula obrigatoria a datar de cinco annos depois da concessão.

Os engenheiros officiaes nomeados pelo governo em 1865, que determinaram as condições e base do concurso, suppozeram ao mineral o teor medio de 3 por cento de cobre, tendo este um valor de £90.

Começou a companhia os seus trabalhos de lavra em 1867, tendo-lhe sido feita a concessão definitiva por decreto de 14 de novembro do mesmo anno.

Por esse decreto, a área superficial da mina dos Algares foi fixada em 1.794:862 metros quadrados, contidos n'um hexágono irregular, e a area da mina de S. João do Deserto em 990:680 metros quadrados, contidos em um quadrilátero.

Tom a empreza despendido até hoje nos trabalhos das minas cerca de 900:000$000 réis, sem que este valioso capital tenha dado o mais pequeno lucro aos accionistas.

A concorrencia de outros minerios estrangeiros com maior

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mais especial pujança, fizeram com que o das minas de Aljustrel não tivesse toda a acceitação nos mercados especiaes do producto, sendo necessario que a empreza adoptasse systema, para dar valor ao minerio, diverso do anteriormente seguido. Acresce que as presumpções, de que o minorai conteria pelo menos, em media, 3 por cento de cobre, não foram confirmadas pelos factos. A realidade mostra que o teor d'esse minerio a custo chegará á media de 2 por cento, isto é, tem apenas dois terços do que se calculara nas bases sobre que se redigiu o programma do concurso.

Acresce que o preço do cobre fixado nos orçamentos anteriores á adjudicação era £ 90 por tonelada, desceu a £ 60 em fevereiro d'este anno, mais como resultado de excesso de producção do que em virtude de crise eventual dos mercados.

Foi por isso que em 9 de novembro de 1878 a companhia, representada pelos seus directores, fez subir ao governo um requerimento em que, expondo as precarias circumstancias em que se encontra a empreza, pediu a modificação do contrato.

O governo, attendendo aos principios de equidade, propõe essa modificação, que aliás não faz mais do que sujeitar a concessão a todas as disposições vigentes da lei de minas.

O que tudo visto e ponderado:

As vossas commissões, considerando que forçar a companhia ao exacto cumprimento do seu contrato, seria coagi-la a abandonar a lavra d'aquellas minas, perdendo assim todo o capital n'ellas empregado, o que seria verdadeira iniquidade;

Considerando que, alem d'isso, o abandono de tão importante empreza acarretaria o descredito das demais emprezas mineiras no nosso paiz, e um grande numero de operarios ficaria de repente privado do pão quotidiano;

Considerando que o imposto de 800 réis por tonelada de minerio bruto posto á boca da mina não está em relação com o rendimento da exploração, que varia, segundo os mercados e segundo o teor do minerio extraindo; e por isso a lei de minas previdentemente estabelecera que os concessionarios d'estas emprezas pagassem ao estado duas classes de imposto; uma de 80$000 réis por cada 10:000 braças quadradas de terreno demarcado, e outra proporcional ao producto liquido das minas, não podendo exceder a 5 por cento d'esse producto, o que torna o imposto proporcional aos lucros, e não independente d'esses lucros;

Considerando que será necessario liquidar os impostos que a companhia porventura deva ao estado e que essa liquidação não póde deixar de ser feita nos termos da lei commum;

Considerando outrosim que, tornado o imposto proporcional ao rendimento liquido, os encargos da companhia ficam profundamente modificados, e como não fóra ella o unico oppositor no concurso encerrado em 31 de janeiro de 1867, é justo que esse imposto proporcional não possa descer de 5 por cento, maxima rasão d'elle fixada na lei;

Considerando finalmente que tanto o governo como a empreza ao celebrarem o contrato laboraram evidentemente n'um erro involuntario, baseado sobre apreciações inexactas, e que portanto a equidade reclama que o poder legislativo' faça justiça recta e inteira, exigindo-se o imposto nas condições em que, legal e geralmente, póde ser exigido.

Considerando que a modificação proposta, longe de desfalcar as receitas publicas, assegura a d'esta proveniencia, que ha tempos se não arrecada, e que tambem não seria arrecadada, se a empreza fosse coagida a suspender os trabalhos da lavra, abandonando assim as minas:

Por todas estas rasões e pelas demais que a vossa sabedoria supprirá, as commissões reunidas de fazenda e de obras publicas julgam, de accordo com o governo, que a proposta de lei n.º 94-L deve ser convertida no seguinte

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° As minas de cobre do S. João do Deserto e Algares, no concelho de Aljustrel, concedidas provisoriamente em 9 de fevereiro, e definitivamente por. decreto de 14 de dezembro de 1867 á companhia de mineração transtagana, ficam em tudo sujeitas aos preceitos consignados no decreto com força de lei de 31 de dezembro de 1852 e regulamento de 9 de dezembro de 1853.

Art. 2.° O imposto fixo de 800 réis por tonelada de minerio que a companhia concessionaria das referidas minas era obrigada a pagar ao estado, não podendo a totalidade d'esse imposto em cada anno ser inferior a 16:000$000 réis, nos termos do seu contrato, fica substituido pelos impostos de que trata o artigo 40.° do decreto com força de lei de 31 de dezembro de 1852.

§ unico. O imposto proporcional a que a companhia ê obrigada será o maximo fixado no referido artigo 40.° da. lei de minas.

Art. 3.° Os impostos de que a companhia seja devedora ao estado, na data da publicação d'esta lei, serão liquidados nos termos do artigo antecedente e seu § e pagos dentro do praso de dois annos, em prestações semestraes.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das commissões, 17 de abril de 1879. = José de Mello Gouveia = Visconde da Azarujinha = João Anastacio de Carvalho = Joaquim Pires de Sousa Gomes = Augusto Fuschini = Caetano Pereira Sanches de Castro = José Joaquim Namorado — José Maria dos Santos = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Antonio José d’ Avila = Antonio Telles de Vasconcellos = H. Gomes da Palma = A. C. Ferreira de Mesquita = Julio de Vilhena = A. Osorio de Vasconcellos = Francisco Gomes Teixeira = Antonio Maria Barreiros Arrolas = Filippe de Carvalho = Antonio Maria Pereira Carrilho, relator.

Proposta de lei n.º 94-L

Senhores. — Em 23 de novembro de 1866 foi aberto concurso para a concessão das minas de pyrite cuprica, situadas no concelho de Aljustrel, districto administrativo de Beja, legalmente abandonadas por alvará de 14 de dezembro de 1857, sendo adjudicadas em 9 de fevereiro da 1867 á companhia de mineração transtagana, que offerecêra, d'entre todos os concorrentes, o maior lanço de um imposto fixo para o estado de 800 réis por cada tonelada de minerio sobre a base de 500 réis.

No relatorio dos engenheiros officiaes, que por ordem do governo procederam aos estudos previos para a determinação das condições e base do concurso, foi supposto ao minerio o teor de 3 por cento em cobre, e ao preço d'este metal o valor de £ 90, resultando da applicação d'estes elementos ao calculo, da valorisação commercial d'aquelles jazigos a probabilidade de lucros remuneradores para a empreza, deduzida ainda a importante verba a pagar ao estado.

Começou a empreza os seus trabalhos de lavra em 1867, e despendeu até hoje a quantia de 900:000$000 réis sem haver realisado lucros.

Em 9 de novembro de 1878 fez a direcção da companhia de mineração transtagana subir á presença de Sua Magestade uma representação, expondo as precarias circumstancias em que se acha a empreza das minas de Aljustrel, o pedindo a modificação do seu contrato.

O governo, desejando obter todas as informações sobre tão importante assumpto, nomeou uma commissão official de engenheiros para que desse conta do estado dos trabalhos e das condições economicas d'aquelles jazigos; e ouviu sobre o objecto da representação a repartição de minas.

No decurso dos trabalhos de lavra pretendeu a companhia exportar os seus minerios para venda de cobre e enxofre, como praticavam outras minas, á a mesma natureza, e, n'este intuito, fez exportação de pyrites para diversos portos de Inglaterra, França e Allemanha.

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A concorrencia das outras minas e a qualidade especial que tornava os minerios de Aljustrel pouco convenientes ao seu aproveitamento para enxofre, obrigaram a empreza, depois de muitas tentativas, a abandonar aquelle systema de valorisação, adoptando definitivamente o processo geral de tratamento por via húmida na localidade para extracção do cobre. Por outro lado ainda se reconheceu, no decurso dos trabalhos de lavra, que o minerio tem uma percentagem do cobre, que não póde reputar-se pelo exame de muitas analyses e ensaios até hoje feitos, em mais de 2 por cento, talvez menos ainda, e em todo o caso bastante inferior á que fóra calculada pelos engenheiros officiaes.

O preço do cobre, que fóra reputado em £ 90, desceu no ultimo mercado de 29 de fevereiro d'esta anno a £ 60, e parece esta baixa de preço devida mais particularmente a um excesso de producção, do que a uma crise eventual do mercado, sendo por isso pouco provavel o restabelecimento do seu antigo preço.

Estas circumstancias affectam tão consideravelmente as condições economicas da companhia, que lhe é impossivel actualmente satisfazer aos encargos que sobre si tomou no acto da adjudicação, e apresentam-se as causas d'este estado de cousas com um caracter tão pouco susceptivel de variação ou mudança, que nenhuma probabilidade se antevê mesmo de que possa vir a satisfazel-os no futuro.

Forçar esta empreza ao rigoroso cumprimento do contrato seria o mesmo que obrigal-a a abandonar a lavra d'aquellas minas com todo o capital ali despendido, porque em taes condições não encontraria por certo os recursos monetarios de que ainda necessita para o prosseguimento dos trabalhos de mineração, e, posto que as minas voltassem á posso do estado, este nada lucraria com essa resolução, porque o descredito produzido por tal facto tornaria muito difficil e demorada a adjudicação das minas, os trabalhos executados cairiam em ruina pela suspensão, e uma grande massa de operarios ver-se-ía rapidamente privada de salarios.

O governo considera ainda que o abandono das minas de Aljustrel poderia affectar profundamente os interesses de toda a industria mineira, pelo descredito e desanimo que tão infeliz exemplo poderia produzir no paiz.

Attendendo, portanto, á reclamação feita pela direcção da companhia de mineração transtagana, e achando justo o equitativo, pelas rasões expostas, que se preste a esta empreza todo o auxilio compativel com os legitimos interesses do estado, tenho a honra de submetter á vossa approvação a seguinte.

PROPOSTA DE LEI

Artigo 1.° As minas de Aljustrel, concedidas á companhia de mineração transtagana, por decreto de 14 de novembro de 1867, ficam em tudo sujeitas aos preceitos consignados no decreto com torça de lei de 31 de dezembro de 1852 e regulamento de 9 de dezembro de 1853.

Art. 2.° O imposto fixo. de 800 réis por tonelada de minerio que a companhia concessionaria era obrigada, pelas condições do concurso, a pagar ao estado, fica substituido pelos impostos de que trata o artigo 40.° do citado decreto com força de lei de 31 de dezembro de 1852.

Art. 3.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Ministerio das obras publicas, commercio e industria, 28 de março de 1879. = Antonio de Serpa Pimentel = Lourenço Antonio de Carvalho.

Foi logo approvado.

Leu se o projecto n.º 119.

E o seguinte:

Projecto de lei n.º 119 Senhores. — Pela lei de 16 de maio de 1878 foi concedido A camara municipal de Faro o pagar em prestações annuaes de 500$000 réis ao cofre da viação de 3.ª ordem do seu concelho, a quantia de 10:833787 réis, que vereações anteriores haviam desviado do referido cofre, para fazer face ás despezas geraes do municipio e melhoramentos publicos do mesmo.

Estando porém muito adiantada a construcção das estradas municipaes do concelho de Faro, e tanto, que todas as freguezias do concelho se acham ligadas por estradas a macadan entre si, e com a capital do districto, bastará a dotação annual destinada á viação municipal segundo a lei de 6 do junho de 1864, para que, em periodo breve, se concluam todos os caminhos classificados no respectivo plano como estradas de 3.ª ordem.

A verba, pois, de 500$000 réis annuaes pede com muita mais vantagem, e como pede a camara de Faro, em representação apresentada ás côrtes, na sessão da camara dos senhores deputados de 8 de abril ultimo, ser applicada á construcção de um edificio, destinado a paços do concelho, tribunal de justiça e escola de instrucção primaria.

A casa em que actualmente funciona a camara municipal de Faro é um casebre que tanto na apparencia exterior, como nas accommodações, é vergonhoso para paços do municipio capital do districto, e o tribunal o a escola andam por casas de renda, sem a necessaria capacidade, e nas peiores condições.

E portanto da maior urgencia attender ao indispensavel melhoramento d'estes estabelecimentos publicos, que não poderia ser levado a effeito sem meios, que violento seria pedir aos contribuintes.

N'estes termos é a vossa commissão de administração publica de parecer, de accordo com o governo, que deve ser approvado o seguinte

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° É relevada a camara municipal do concelho de Faro de pagar em prestações annuaes de 500$000 réis, como lhe foi concedido pela lei de 16 de maio de 1878, a importancia de 10:833$787 réis, em que se achou alcançada para com o cofre de viação.

Art. 2.º É auctorisada a mesma camara a applicar a referida verba na construcção de um edificio destinado aos paços do concelho, tribunal judicial, escolas de ensino primario e outros serviços a seu cargo.

Art. 3.° Fica revogada, toda a legislação em contrario.

Safe das sessões, em 6 de maio de 1879. = Antonio Telles de Vasconcellos — H. F. de Paula Medeiros = Adriano José de Carvalho e Mello = Jeronymo Pimentel — V. de Moreira de Rey (vencido) = Adolpho Pimentel — Manuel Aralla — Julio de Vilhena — Francisco de Albuquerque Mes quito e Castro, relator.

A commissão de obras publicas concorda com o parecer da illustre commissão de administração publica. = Caetano Pereira Sanches de Castro — II. Gomes da Palma — Joaquim Pires de Sousa Gomes = A. Osorio de Vasconcellos Antonio Telles de Vasconcellos — Augusto Fuschini — José Taveira de Carvalho Pinto de Menezes = José Joaquim Namorado.

Projecto de lei n.º 101-E

Senhores. — Considerando que a viação municipal do concelho de Faro está quasi concluida;

Considerando que a construcção n'aquella cidade de um edificio destinado aos paços do concelho, tribunal judicial, escolas de ensino primario o outros serviços, é da mais urgente necessidade;

E attendendo aos ponderosos fundamentos expostos pela illustre camara municipal na sua adjunta representação de 13 de março do corrente anno, tenho a honra de submetter ao vosso exame e esclarecida apreciação o seguinte

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.º E relevada a camara municipal de concelho de Faro de pagar em prestações annuaes de 500$000 réis, como lhe foi concedido pela lei de 16 de maio de 1878, a importancia de 10:833$788 réis, em que se achou alcançada para com o cofre da viação.

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Art. 2.º É auctorisada a mesma camara a applicar a referida verba na construcção de um edificio, destinado aos paços do concelho, tribunal judicial, escolas de ensino primario e outros serviços a seu cargo.

Art. 3.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala das sessões, 8 de abril de 1879. = O deputado por Faro, Luiz de Uivar.

Foi approvado.

Leu-se o projecto n.º 103.

E o seguinte:

Projecto de lei n.º 103

Senhores. — Á vossa commissão de instrucção publica foi presente o projecto de lei n.º 84-E, com o parecer da commissão de fazenda em sessão de 1876.

A vossa commissão, considerando que os logares de naturalistas adjuntos das secções mineralógica e zoológica do museu nacional exigem para seu digno desempenho, a par de um trabalho impertinente e aturado, habilitações scientificas de grande alcance, affirmadas em concurso por provas publicas;

Considerando mais que ninguem com aquellas habilitações, que não são vulgares, se sujeitará a este trabalho, que é grande, nem acceitará a relativa responsabilidade, que é importante, sem a esperança do uma remuneração condigna;

Considerando ainda que a boa rasão manda que esta remuneração seja determinada sobre aquellas bases — habilitações scientificas, trabalho e responsabilidade;

Considerando, finalmente, que o augmento de despeza é insignificante, e que dá em resultado a grande vantagem da acquisição de individuos á altura do bom desempenho de tão importantes funcções:

A vossa commissão é de parecer que, depois de ouvida a commissão de fazenda, deve ser approvado o seguinte

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° O vencimento dos naturalistas adjuntos ao museu nacional encorporado na escola polytechnica de Lisboa, é fixado em 600$000 réis annuaes.

Art. 2.° Fica revogada a legislação, em contrario.

Sala da commissão, aos 26 de março de 1879. = José Vicente Barbosa du Bocage = Luiz Garrido = Antonio José Teixeira — Francisco Gomes Teixeira = Manuel Joaquim Alves Passos — Domingos de Sousa Moreira Freire, relator.

A commissão de fazenda concorda com o parecer da illustre commissão de instrucção publica.

Sala das sessões da commissão de fazenda, em 18 de abril de 1819. = Julio de Vilhena — Francisco Gomes Teixeira = Lopo Vaz de Sampaio e Mello = Filippe de Carvalho — M. d'Assumpção — A. C. Ferreira de Mesquita = Antonio M. P. Carrilho = Antonio José Teixeira.

N.° 84-E

Renovo a iniciativa do projecto n.º 96 da sessão de 1876, com o respectivo parecer da commissão de fazenda.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, em 12 de março de 1879. = J. V. Barbosa du Bocage.

N.° 90

Senhores. - A vossa commissão de fazenda foi presente a pretensão de Felix de Brito Capello e Francisco Xavier de Almeida, que, como naturalistas adjuntos das secções mineralógica e zoológica do museu nacional, pedem que os seus vencimentos sejam equiparados aos dos primeiros observadores do observatorio meteorologico, estabelecimento, como o primeiro, dependente da - escola polytechnica.

E a vossa ' commissão, considerando que é justo o pedido dos supplicantes porque o serviço que lhes está incumbido é importante e de não menos trabalho e responsabilidade que o das funcções a cuja retribuição pede que seja igualada a que elles têem;

Considerando que o augmento da despeza não chega a 400$000 réis annuaes:

É de parecer que deveis approvar o seguinte

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° O vencimento dos naturalistas adjuntos ao museu nacional encorporado na escola polytechnica de Lisboa, é fixado em 600$000 réis annuaes.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, aos 29 de março de 1876. = Placido Antonio da Cunha e Abreu = Visconde da Azarujinha = José Maria dos Santos = Manuel Maria de Mello a Simas == Joaquim José Gonçalves de Matos Correia = Antonio José Teixeira. = Antonio José de Seixas = Antonio Maria Pereira Carrilho.

Foi approvado.

Continuou a discussão do capitulo 4.º do orçamento do ministerio da marinha.

O sr. Mariano de Carvalho: — ____(O sr. deputado

não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este, logar.)

Leram-se na mesa as seguintes Propostas

1.ª Proponho que no capitulo 5.° se consignem descriminadas as despezas com o museu colonial. = Mariano de Carvalho.

2.ª Proponho que seja supprimido o serviço de creados (taifeiros) como hoje existe a bordo dos navios de guerra, e que em substituição se applique o regulamento formulado pelo primeiro tenente da armada Ferreira do Amaral e publicado nos n.ºs 7 e 11 dos Annaes do club militar naval.

Que a economia resultante d'esta modificação se applique a ter addidos ao corpo de marinheiros todos quantos officiaes seja possivel dos que na lista da armada são designados com a qualificação de promptos Mariano de Carvalho.

3.ª Proponho que no artigo 19.° (3.° deposito) se separe a verba de azeite para machinas da verba viveres. — Mariano de Carvalho.

4.ª Proponho:

1.° Que n'uma das ordens da armada do primeiro semestre -de cada anno economico se declare:

Quaes os navios que estiveram armados e por que tempo no anno economico findo.

O numero de dias completos de navegação a vapor.

2.° Que se estabeleça qual o consumo medio do carvão em vinte e quatro horas para cada navio em marcha regular.

3.° Que se fixe o abono de azeite para machinas para cada navio em vinte e quatro horas de trabalho e por mez para limpeza e conservação.

4.° Que se supprima nas tabellas das rações o abono de azeite para luzes por praça e se formule um regulamento distribuindo as luzes por categorias conforme são destinadas para pharoes de navegação, de bitaculas, de cobertas ou de camaras; e se faça o abono de luzes para cada navio conforme as suas dimensões, lotações, etc. — Mariano de Carvalho.

6.1 Proponho que seja desapparelhada á fragata D. Fernando e sirva unicamente para escola de artilheria.

Que o serviço de instrucção de officiaes e marinhagem seja feito na Bartholomeu Dias e na Estephania, alternadamente em cruzeiro nas ilhas adjacentes para este fim e para serviço de guarda costas, de fiscalisação aduaneira, de policia de pesca, de matricula maritima o de emigração.

Que o Vasco da Gama esteja em meio armamento metade do anno, e que na outra metade se empregue em todos os exercidos para que é proprio.

Que os navios propostos na força naval, quando estejam em Lisboa, se conservem em meio armamento com o pessoal indispensavel para a sua boa, conservação, devendo es

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tar completamente armada no Tejo só uma canhoneira ou corveta. = Mariano de Carvalho.

Foram admittidas.

Foi tambem apresentado o seguinte

Requerimento

Requeiro que sejam enviados com urgencia a esta camara, pelo ministerio da marinha:

O parecer do conselho de trabalhos ácerca da compra de duas canhoneiras e um vapor de menor lotação ajustados em Inglaterra pelo sr. Carlos Testa.

Os contratos definitivamente celebrados para a acquisição d'estes navios. = Mariano de Carvalho.

Mandou-se expedir.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros e interino da Marinha: — A camara e o illustre deputado mesmo, creio que não esperam que eu acompanhe as minuciosas observações que fez a respeito do variados assumptos de administração de marinha, visto que uma grande parte d'elles é regulamentar e da responsabilidade immediata de corporações especiaes. Quanto a estes posso apenas dizer ao illustre deputado que as suas observações hão de contribuir" para melhorar os serviços publicos, hão de naturalmente ser consignadas se o merecerem na reforma de regulamentos, que são sempre feitos por commissões de officiaes da armada, e o ministro não póde senão sanccionar; porque taes commissões são as que estão ao facto das necessidades do serviço, conhecem-nas melhor, e hão de propor o que julgarem mais opportuno, com o zêlo e probidade com que sempre o fazem.

Um dos melhoramentos que o illustre deputado deseja é que se supprima a classificação de promptos na lista da armada, o que é, segundo elle, reforma de grande valia.

Essa denominação, censurada pelo sr. Mariano de Carvalho, não póde elle deixar do applicar a mim, por isso que estou prompto para dar-lhe informações á respeito dos assumptos sobre os quaes o illustre deputado chamou a attenção da camara e do governo. Entre esses merece particular attenção a historia dos contratos para a construcção de duas canhoneiras e de um pequeno transporte a vapor.

Quanto á primeira parte, a historia, tal como s. ex.ª a contou, é exacta.

O sr. Carlos Testa, que merece, nem podia deixar de merecer, toda a confiança, não digo só do governo, mas de todas as pessoas que conhecem a gravidade e a seriedade do seu caracter, (Apoiados.) foi encarregado de fazer uma negociação para a compra de canhoneira: s, em virtude da auctorisação concedida ao governo pelo parlamento.

Quando 'eslava em Inglaterra, contratando com casas conhecidas e bem reputadas, appareceu a proposta de uma casa belga, constructora, não especialmente de navios, mas de obras de ferro de grandes proporções, a qual affirmava poder construir os navios em condições economicas. ' Tambem é verdade que o illustre deputado disse a respeito da maneira como o sr. Testa mui judiciosamente andou por essa occasião. Não se contentou com a proposta que recebera da Inglaterra, quiz tambem avaliar e conhecer as propostas d'essa outra casa; dirigiu-se a ella e pediu-lhe projectos das construcções, os quaes a casa não lhe mandou, mandando-lhe apenas indicações incompletas, se bem me recorde.

De maneira que, quando o sr. Testa chegou a Lisboa, a sua opinião era esta. Construam-se as duas canhoneiras em casas conhecidas e respeitaveis, segundo planos perfeitamente estudados em Inglaterra; e como a somma votada pelo parlamento para a construcção d'essas canhoneiras não fica esgotada, e se torna necessario ter um pequeno vapor para o serviço da armada, aqui ou nas colonias, faça-se tambem construir o pequeno vapor, o que traz apenas um pequeno augmento de despeza. Propunha o sr. Testa que o governo ajustasse não só as duas canhoneiras indicadas, mas tambem o vapor. Ha um pequeno excesso de despeza, mas

isso não póde ser rasão para que o governo, sendo conveniente a proposta, deixe de fazer essa despeza; mesmo porque na verba do arsenal da marinha ha sommas para construcções das quaes se poderá tirar uma pequena quantia, que junta á que resta da compra das canhoneiras, chegará para aquellas construcções sem que se exceda o orçamento e a auctorisação concedida pelo parlamento.

Vieram essas propostas para Lisboa. O costume, a regra, o principio, é mandal-as com os planos de que são acompanhadas ao conselho do trabalhos do arsenal de marinha; e n'este ponto devo dizer que não me posso fazer echo das censuras do illustre deputado.

(Interrupção do sr. Mariano de Carvalho, que não se percebeu)

As reflexões do sr. Testa são como costumam ser as que fazem as pessoas entendidas sobre estas questões, e que têem uma competencia reconhecida. (Apoiados.)

Mas porque o conselho de trabalhos se engane n'um ou n'outro ponto, sendo aliás uma corporação que correspondo a corporações identicas n'outros paizes, a qual ha muitos annos auxilia a administração publica, e que em todas as epochas tem sido muito considerada; porque a sua opinião não esteja de accordo agora com a do sr. Testa, porque a formula de que ella se serviu para a determinação da tonelagem não é a do sr. Testa, mas outra que, affirma o conselho, se adopta na Inglaterra; não vejo eu n'isso rasão para condemnar uma corporação que é composta de pessoas que lêem prestado bons serviços, que conhece de certo a maneira por que ha de aconselhar o governo n'estes assumptos, e cuja competencia tem sido reconhecida em todas as epochas e por todos os ministros. (Apoiados.)

Não tenho, por consequencia, que discutir a competencia do conselho de trabalhos. Ha lá dissentimentos, como em todos os conselhos.

Mas o facto é que o conselho de trabalhos fez as suas indicações a respeito das canhoneiras e do vapor, mostrando-se inclinado a que fosse feita a encommenda á casa Cockrill; e, depois de se ouvir, alem do conselho, ainda outra corporação superior da armada, cujas' opiniões se dividiram, o governo julgou que o mais conveniente, e que devia naturalmente dar em resultado a acquisição de navios mais bem construidos, de accordo com as construcções anteriormente feitas e que tinham provado bem, era acceitar as propostas inglezas.

As duas canhoneiras e o pequeno vapor estão-se construindo em Inglaterra nas casas designadas pelo sr. Testa.

(Interrupção do sr. Mariano de Carvalho.)

O que eu posso affirmar é que o pequeno vapor foi ultimamente assumpto de estudos especiaes, a fim de se ver se devia ser construido, por conveniencia publica, de preferencia na casa Cockrill.

Actualmente, porém, os tres navios estão sendo construidos em Inglaterra, como já disse, em harmonia com os projectos e estudos muito graves e muito serios do sr. Testa.

Eis-aqui o que posso dizer ao illustre deputado sobre o principal assumpto em que parecia necessario dar-lho esclarecimentos.

Posso ainda dizer ao sr. deputado que não ha inconveniente em enviar a consulta do conselho de trabalhos, que nada tem de confidencial. São opiniões que podem ser justas, ou não, mas que a camara poderá apreciar.

Se o illustre deputado me dispensasse de responder a todos os pontos, obsequiava-me muito indicando-me áquelles a respeito dos quaes carecia de que o governo desse explicações.

(Interrupção do sr. Mariano de Carvalho) S. ex.ª notou, por exemplo, que, se usassem cabos de cânhamo o de arame nos navios. É um ponto a que não posso responder.

A armada tem corporações especiaes e technicas que aconselham o que se deve usar. Essas corporações podem, ou não, ter rasão mas o ministro, qualquer que elle seja,

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em vista de uma consulta das pessoas competentes, technicas, entendidas n'estes assumptos, não póde dizer que não acceita as suas indicações senão em casos excepcionaes.

O ministro não pede fazer isso, e se o fizer commette um erro.

Pois uma commissão de officiaes de marinha diz que são mais convenientes para os navios da lotação dos que nós temos os cabos de cânhamo do que os cabos de arame, e o ministro ha de dizer — essa opinião não é boa, porque ha navios inglezes em que os cabos não são de cânhamo, e por consequencia não acceito a opinião d'essa commissão?

Se o fizer toma uma grave responsabilidade. O facto de ser ministro não torna ninguem infallivel.

No tempo em que tive a honra de ser ministro da marinha, quando a minha maneira de ver dissentia da de uma consulta que me era apresentada, mandava ouvir outra commissão de officiaes de marinha de conhecimentos abalisados; e muitas vezes reconheci que eu não tinha rasão, e que quem a tinha era a commissão, cuja opinião me parecera não ser exacta.

Quando se trata de fazer a analyse minuciosa de todos os pequenos defeitos que póde ter uma administração tão complexa como a da marinha, necessariamente se hão de achar motivos de critica, mais ou menos justa.

Ainda não ha muito tempo li um discurso pronunciado no parlamento inglez, do qual se podia concluir que a Inglaterra quasi não tinha marinha; e que se um dia houvesse uma guerra maritima entre outra nação e a Inglaterra, esta não teria navios de guerra em circumstancias de entrar vantajosamente em combate!

Apesar das criticas de espiritos mal dispostos, a marinha do guerra ingleza é a mais poderosa do mundo, e se houvesse guerra maritima, a Inglaterra teria grande probabilidade de ficar victoriosa. (Apoiados.)

Entretanto diziam áquelles criticos que não havia administração, que os navios não andavam, que as couraças não eram fortes, que a artilheria era inferior á de todas as outras marinhas; emfim, attribuiam gravissimos defeitos á marinha ingleza.

E certo que houve officiaes do marinha que a defenderam; que houve da parte do almirantado inglez, que tem as suas tradições e as suas opiniões, quem se pronunciasse em sentido opposto. Mas quem lesse os discursos feitos por individuos que occupavam alta posição na marinha, e que tinham navegado muitos annos, concluia que a marinha de guerra ingleza não era tão forte como se suppunha.

Ora, eu espero que não sejamos nunca levados á triste situação de dizermos que a nossa modesta marinha não vale nada. Façamos tambem justiça ás nossas cousas. (Apoiados.)

(&,. ex.ª, não reviu as notas tachygraphicas.) O sr. Mariano de Carvalho: — Acho-me collocado em face do sr. ministro dos negocios estrangeiros n'uma posição excepcional, não pela muita amisade, respeito e acatamento que tenho por s. ex.ª ha muitos annos, que isso não me inhibiria nunca de discutir os negocios publicos com s. ex.ª

Quando discuto deixo salvas as relações de amisade. Respeito, mas combato; e nenhumas considerações de amisade e de respeito seriam capazes de me desviar do meu caminho. Mas colloca-me em uma situação difficil a circumstancia de s. ex.ª não estar encarregado da pasta da marinha e de eu não poder dirigir-me propriamente ao sr. ministro da marinha.

Por muito que seja o talento de s. ex.ª e os seus estudos, e por muito robusta que seja a sua memoria, ha mais de um ou de dois annos que s. ex.ª deixou o ministerio da marinha, o que é uma circumstancia que prejudica muito tudo quanto sobre este assumpto eu teria a dizer.

O que realmente não posso admittir é a theoria do sr.

ministro a respeito do acatamento que deve haver pelas resoluções dos conselhos technicos.

Um ministro póde, deve, e tem obrigação de dissentir do parecer d'essas corporações, quando elle não lhe pareça o mais conveniente.

O ministro aconselha-se, lê, estuda, mas de modo nenhum se cinge supersticiosamente ao que as taes corporações indicam.

Se o sr. ministro da marinha me dissesse, por exemplo: eu consultei as corporações technicas a respeito dá substituição dos cabos de cânhamo pelos cabos de fios de arame, não em navios de differente lotação d'aquelles em que n'outros paizes se emprega esse systema, mas em navios da mesma lotação, e deram-me opinião contraria a essa substituição; mas depois examinei, pensei, aconselhei-me, ouvi pessoas competentes, e a final resolvi-me a seguir a opinião d'essas corporações, eu podia dissentir da opinião do illustre 'ministro mas não podia deixar de dizer tambem que s. ex.ª tinha procedido do modo mais orthodoxo possivel.

Agora, não se occupar de nada, não tratar de nada, não querer saber de nada, e cingir-se com superstição, por assim dizer, á opinião de um conselho technico, que diz que é melhor conservar os cabos que outros paizes já não empregam em certas condições, não me parece que esteja á altura dos talentos de s. ex.ª, nem do dever de um ministro constitucional. (Apoiados.) ¦

Com as theorias que s. ex.ª apresentou até os ministros eram desnecessarios.

Para referendar decretos e assignar portarias, bastava realmente uma machina de escrever, não era preciso mais nada. (Apoiados.)

E a prova de que esse respeito, de que esse acatamento supersticioso pelas corporações technicas não existe nem póde existir na pratica, é que o sr. ministro interino da marinha acaba de dizer — o conselho de trabalhos condemnou, como se vê pela analyse do sr. Carlos Testa, que as canhoneiras se construíssem em Inglaterra, inclinando-se a que se construíssem na Belgica, mas o governo não fez caso d'essa opinião e optou porque os navios se fizessem em Inglaterra. Isto é que é o regular.

Agora, querer desculpar-se de um acto de má administração, ou querer eximir-se a responder, simplesmente porque o conselho de trabalhos disse ou aconselhou outra cousa, isso é que não póde ser. (Apoiados.)

Um ministro tem obrigação de ver tudo, de examinar, de comparar, e só depois é que decide. (Apoiados.)

Quanto ao conselho de trabalhos, o nobre ministro não foi perfeitamente exacto n'aquillo que me attribuiu.

Eu não condemnei o conselho de trabalhos, eu o que» fiz foi pedir os elementos necessarios para apreciar o mesmo conselho de trabalhos.

Quem condemna o conselho de trabalhos é o sr. Carlos Testa, e quem até certo ponto o condemna tambem é o procedimento do governo.

Pois então o conselho de trabalhos analysa tão mal 03 projectos mandados de, Inglaterra, que merece uma replica, tão severa do, sr. Carlos Testa; pois o proprio governo rei conhece que o. conselho de trabalhos, fez uma má analyse ej que a opinião do sr. Carlos Testa é que é a boa, e vem, dizer que p conselho de trabalhos andou bem? (Apoiados.) Não póde ser. (Apoiados.)

Erraram os vogaes d'este conselho; seria de boa fé, e de» certo que o foi, mas erraram n'um assumpto essencial commetteram um erro de que podia resultar a perda da muitas vidas, e que, alem d'essa perda irreparavel, podia trazer comsigo a perda de dezenas e dezenas de contos da réis. (Apoiados.)

Eu não condemno o conselho de trabalhos, nem condemno o arsenal, nem condemno ninguem.

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Eu estou como o homem que entrou n'uma sociedade e que achou de menos um annel de brilhantes. ' Procurou-se por toda a parte, mas o annel não se viu mais; e o homem dizia no fim de tudo isto — são todos muito honrados, mas o meu annel desappareceu.

O conselho de trabalhos é excellente, o arsenal é excellente, os ministros são excellentissimos, mas o que acontece é que se desmancha o. Vouga porque o plano não é apropriado á machina que se lho destina, é que estão os navios a estragar-se no Tejo pela demora que ha era se lhes fazerem concertos; é que depois tornam-se a deixar estragar para se lhes tornarem a fazer novo3 concertos; é que se gastam quatro e cinco annos para se fazer uma canhoneira, étc, étc.

São todos muito bons, e até sou amigo particular de muitos d'elles; tenho o maior respeito pelo seu caracter, estimo-os pela sua intelligencia, mas em geral' as obras que fazem são deploraveis! Todos são excellentes, todos são sabios; até me canso em fazer-lhes elogios, mas não fazem obra que presto, e o nosso dinheiro gasta-se!

Se estivesse no logar do sr". ministro da marinha, mandava chamar um engenheiro inglez para dirigir o arsenal, e um guarda livros para metter a escripturação em ordem....

No nosso arsenal trabalha-se d'esta maneira. Por exemplo: fez-se uma simples lancha a vapor; foram officiaes muito habeis que lhe metteram a machina, mas a lancha fez-lhes a desfeita de não andar! (Riso.) Os engenheiros eram muito bons, mas a lancha é que não andava. E note-se que foram estes mesmos bons engenheiros que dirigiram a construcçâo da canhoneira Vouga, que precisa ser desmanchada, e que ha annos approvaram a compra da celebre Hawk!

Os engenheiros são excellentes, mas as cousas são como são e não como deviam ser.

Queria que o sr. ministro, em logar de ter tanto acatamento por estes officiaes, aliás distinctissimos, resolvesse por si mesmo esta questão, porque é capaz de o fazer com a sua intelligencia, e que procedesse como era justo, vendo que não podemos. continuar a despender 1.600:000$000 réis, fera o orçamento extraordinario, para termos maus navios e mau serviço!

¦ Isto é que queria responder ao sr. ministro, não insistindo mais com s. ex.ª pelos motivos de delicadeza que de principio apresentei.

Propuz o que achei conveniente, e se o governo e a camara não quizerem acceitar' o que proponho, peior para elles.

¦ A minha responsabilidade fica salva, e deixo de' cansar a camara com estas observações.

(S, ex.ª não reviu as notas tachygraphicas.) Posto á votação o capitulo 4.°, foi approvado. As propostas foram enviadas á commissão.

Capitulo 5.° — Encargos diversos......... 82:880$000

O sr. Mariano de Carvalho: — Passa-se á discussão do capitulo 5.°, que é relativo aos encargos diversos. Sobre elle tenho de apresentar uma proposta e de pedir ao Sr. ministro da marinha as explicações que me poder dar.

Vou dar a rasão da minha proposta.

Percorrendo rapidamente o orçamento da marinha, achei que variam as despezas das provincias ultramarinas para O museu colonial; algumas dão 500$000, outras 1:000$000 réis, étc, de maneira que me parece que na totalidade as provincias ultramarinas contribuem com 4:500$000 réis.

Não vi no orçamento ultramarino nenhuma despeza com O museu colonial, assim como a não vi no orçamento da metropole, onde devia estar, por isso que este estabelecimento funcciona em Lisboa.

Não quero que se acabe com o museu, porque é uma

instituição util, mas desejo que se mencione no orçamento da metropole a verba sufficiente para o seu custeio.

Este capitulo tem para despezas extraordinarias a verba de 8:720$000 réis, para gratificações a oito officiaes emprega - • dos em terra e outras commissões 3:000$000 réis; para commissões, agencias, differenças de cambio, passagens do navios mercantes, aluguer de embarcações para o serviço de navios de guerra, passagem do canal do Suez, recrutamento maritimo, fretes, ele 12:000;$000 réis; para conservação e reparos de edificios de marinha 4:000$000 réis; para gratificações aos empregados das galeotas 360#000 réis; despezas de expediente da commissão central de geographia, 300$000 réis.

A despeza com o expediente da sociedade de geographia não offerece objecção alguma, emquanto que a gratificação aos empregados das galeotas podia dar logar a algumas considerações, que não desejo comtudo fazer agora.

A verba destinada para conservação e reparos dos edificios de marinha, acho-a diminuta, e a este respeito desejava que me explicassem, se explicação póde ter, como são dirigidas as obras de um paredão que se construiu no edificio do arsenal, á entrada no aterro da Boa Vista.

Havia antigamente uma entrada para o arsenal da marinha ao canto do atterro, pois agora está ali construida uma parede muito feia, com muitas ameias, muitas ancoras, grades, e eu desejava que me dissessem por que ministerio corre aquella despeza.

Uma voz: — O arsenal não sabe cousa alguma, mas paga.

O Orador: — Ouço dizer que o arsenal paga aquellas obra, sem que tenha conhecimento d'ella.

O illustre deputado tambem me parece que é conhecedor d'este assumpto, e espero que s. ex.ª diga alguma cousa para nosso socego, porque tenho medo que se faça outro paredão como o que está á entrada do aterro!

Desejo que se explique como esse paredão se fez, por ordem de quem e quem fez o desenho!;

Parece que o ministerio da marinha nada sabe a este respeito senão para pagar!

¦ Alem d'esta verba, temos ainda a de • 3:000$000 réis' applicados a gratificações de residencia a oito officiaes empregados em terra e outras commissões. ¦

Desejava saber quaes são as commissões em que 'estão estes officiaes.

Por exemplo, os officiaes que estão no corpo de marinheiros, têem lá as suas comedorias, gratificações, étc; os que estão fazendo serviço no arsenal da marinha, tambem por ali recebem as suas gratificações; os que estão no ministerio da marinha, são pagos pela verba da secretaria da marinha, portanto, não sei quaes as commissões em que se despendem estes 3:000$000 réis, e sem saber quaes sejam não tenho vontade de votar esta parte do orçamento.

N'esta verba das despezas extraordinarias vem tambem indicadas outras despezas feitas com as differenças de cambios, passagens de praças, construcçâo e reparo de edificios, etc.; e temos ainda despezas de expediente nas diversas repartições da secretaria do arsenal, do corpo de marinheiros, da cordoaria, e até despezas de expediente da commissão central do geographia!

Portanto, se me poderem ou quizerem dar algumas explicações sobre estes pontos, muito folgaria com ellas, porque me habilitariam a votar com conhecimento de causa.

Eram estas as observações que tinha a fazer com relação a este capitulo, e termino mandando para a mesa a minha proposta relativamente ao museu colonial.

E a seguinte

' Proposta

Proponho que no artigo 20.° se eliminem a verba de réis 8:790$000 para despezas extraordinarias, e de 3:000)5000 réis para gratificações de residencia. — Mariano de Carvalho.

Foi admittida.

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O sr. Carrilho: — Volt responderem breves palavras, para não demorar este debate, precisamente ás perguntas que o meu illustre amigo o sr. Mariano de Carvalho acaba de fazer sobre o 4.° capitulo do orçamento do ministerio da marinha, de que se trata.

Disse s. ex.ª que não sabia que despezas extraordinarias eram estas o em que se applicava a verba. Perderiam immediatamente o caracter de eventuaes o extraordinarias essas despezas se antecipadamente podessem ser descriptas com precisão! passavam a ser ordinarias.

Ora, verba identica está descripta em todos os orçamentos, e se não posso dizer a sua exacta applicação nos exercicios anteriores é porque não tenho aqui essas contas. Entretanto, se o illustre deputado consultar o orçamento de 1870-1871, feito no tempo em que era ministro da marinha o illustre talento o sr. Rebello da Silva, que não era capaz de pedir ao parlamento verba alguma que não fosse absolutamente indispensavel para o serviço, já pela occasião politica em que o orçamento era feito, já pelo estado verdadeiramente angustioso o deploravel das nossas finanças n'esse momento, o illustre deputado verá que lá estão indicadas para estas despezas extraordinarias 8:000$000 réis.

Actualmente nós pedimos 8:720$000 réis, isto é, só 720$000 réis mais do que então se pedia. Mas só a portagem dos navios do guerra no canal de Suez justifica de sobra este pequeno excesso.

Quanto ás gratificações de residencia a oito officiaes em pregados em terra e outras commissões, tambem não é cousa nova que a commissão de fazenda do 1879 inventasse.

Comparado o orçamento actual com o que foi apresentado pelo governo do sr. duque d'Avila para 1878-1879, não ha discrepancia n'esta verba. Alem de que a legislação da marinha não tem sido alterada em pontos fundamentaes, de maneira tal que possa fazer desapparecer essa despeza. E tambem no orçamento de 1870-1871 se encontra a verba do 7:200$000 réis para gratificações de residencia. Portanto, se existiam então, no tempo das economias, não creio que o serviço tenha sido simplificado de modo que possam hoje dispensar-se.

Quanto ao orçamento do museu colonial, a proposta do illustre deputado ha de ir á commissão, mas julgo que não ha duvida nenhuma em que se descrevam no orçamento as respectivas verbas de receita o despeza d'esse estabelecimento; mas de fórma que o thesouro da metropole não seja aggravado nem em um ceitil.

A respeito da verba do réis 17:000$000 e tanto consignada no orçamento do material da armada, para azeite, disse o illustre deputado que lho parecia azeite de mais. E não era do mais, se os calculos que apresentou fossem exactos. Não são.

S. ex.ª encontrou a pag. 476 do orçamento a verba de 255:469$800 réis para viveres, comprehendendo azeite para as machinas. Leu o mappa da força naval, applicou-lhe a tabella legal, suppoz que cada ração valia 200 réis e achou que em azeito se gastava mais de 17:000$000 réis. Repito, era azeite de mais e vou provar.

Força effectiva naval no mappa......... 3:195 homens

Patrão mór do Douro e enfermeiros desembarcados era serviço no hospital....... 4 »

Pessoal dos navios desarmados e de registo do porto...... 95 »

Patrão do salva-vidas Joaquim Lopes..... 1 »

3:295

Ora, multiplicando por trezentos e sessenta e seis dias que tem o anno futuro, achar-se-hão 1.205:970 rações, que a 205 réis cada uma, e não 200 réis como s. ex.ª calculou, lemos 247:223$850 réis. Acrescentando mais 246$000 réis de 1:200 rações para vinte aspirantes de marinha em sessenta dia, emquanto estiverem durante o tempo de ferias na escola de artilheria, teremos 247:469$850 réis, custo das rações. Para completar os 255:469$850 réis faltam apenas 8;000$000 réis.

De sorte que para azeite para machinas ficam apenas 8:000000 réis! E será porventura exagerada esta verba? No orçamento de 1870-1871 vinha a verba de réis 11:600$000. E havia então menos navios de vapor e menos machinas no arsenal; por consequencia, já se vê que n'essa occasião se pedia para azeite, absoluta e relativamente, muito mais do que se pede hoje.

O outro ponto tambem tocado pelo sr. Mariano diz" respeito ao numero, nomes e qualidades dos navios.

Diz s. ex.ª que não tinhamos todos os navios que estão descriptos no mappa que vem junto ao orçamento, o que devem ser eliminados d'esse mappa dois navios que estão ainda em construcção no arsenal, a Vouga e a Rio Ave.

Mas s. ex.ª não se lembrou de que temos exactamente duas canhoneiras a Mandovi e a Bengo, alem de um transporto, que hão de vir de Inglaterra dentro do anno economico futuro, e que substituem as que se encontram no mappa.

(Interrupção do sr. Mariano de Carvalho, que se não percebeu.)

A lei de fixação da força de mar, para o futuro anno economico, diz o seguinte:

«A força de mar para o anno economico de 1879-1880 é fixada em 3:195 praças, distribuidas por 1 navio couraçado, 6 corvetas e 8 canhoneiras de vapor, 3 vapores, 1 fragata de vela e 3 transportes de vapor.

«O numero o qualidade dos navios armados podem variar segundo o exigir a conveniencia do serviço, comtanto que a despeza total não exceda a que estiver votada para a força que se auctorisa.»

Esta lei tem a data de 8 de maio corrente.

Já vêem v. ex.ª e a camara que a lei torna inutil a proposta do sr. Mariano de Carvalho. Se não tivermos as canhoneiras Vouga e Rio Ave teremos a Mandovi e a. Bengo, ou outras quaesquer, porque a lei permitte isso, nem podia deixar de permittil-o.

Mas os nomes dos navios é que não estão exactos no mappa annexo ao orçamento. Que tem isso? E se alguns, dos já existentes e a navegar deixarem de existir?

Ora, não haviamos de estar a descrever os navios pelos seus nomos; seria então uma questão insignificante, abaixo do parlamento.

O que é preciso é que a força naval não exceda aquella que está auctorisada por lei e não está excedida no orçamento, como acabo de mostrar. E quando se fez o mesmo orçamento calculou-se logo com o armamento dos navios que hão de vir de Inglaterra.

Não tenho mais nada a dizer. Creio que respondi aos pontos principaes a que o illustre deputado se referiu. Quanto á questão de administração, o sr. ministro interino da marinha respondeu, como de costume, tão satisfactoriamente, que seria audacia incrivel da minha parte emittir opinião sobre assumpto em que tinha dito tudo o competente.

O sr. Adolpho Pimentel: — Pedi a palavra para mandar para a mesa uma proposta. Não faço longas considerações para a justificar, o se as fizesse de certo offenderia a illustração d'esta camara.

A proposta é a seguinte.

(Leu.)

Ha dias levantaram se n'esta casa vozes eloquentissimas dizendo, e quanto a mim muito bem, que nós tinhamos direito a sermos considerados uma potencia colonial importantissima; mas que para esse fim necessitámos de mandar para as nossas longiquas e valiosissimas possessões, não só missionarios da religião, mas tambem apostolos da sciencia.

Eu concordo perfeitamente com essa idéa apresentada

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aqui por alguns dos mais distinctos membros d'esta casa do parlamento e que igualmente foi perfilhada pelo talentoso e erudito ministro dos negocios estrangeiros e interino da marinha.

Tenho, se não a certeza, a mais bem fundada esperança de que esta proposta será unanimemente approvada, porque n'estas questões não póde haver politica partidaria, pois todos os partidos devem ter a peito o engrandecimento das nossas possessões coloniaes. A opposição de certo se não opporá até porque alguns dos seus mais talentosos membros associaram o seu nome illustre ao meu humilde, assignando esta proposta.

Da maioria nunca poderia esperar impugnação, porque n'esta situação politica formada pelo governo e maioria parlamentar avulta um nome respeitavel que está brilhantemente vinculado á sociedade do geographia. Escusado será dizer que é o do distincto estadista, primoroso escriptor, e eruditissimo professor Andrade Corvo.

Tambem a camara me dispensará de fazer o elogio d’esta sociedade que, apesar da sua curta existencia, tem já um nome brilhante, e um nome que mais brilhante se tornará quando ella tiver os precisos meios para occorrer:ás suas despezas o poder realisar o altissimo rim a que se destinou.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Propomos que da verba de diversas despezas consignada no artigo 20.° do orçamento do ministerio da marinha seja destinada a quantia de 1:500$000 réis á sociedade de geographia de Lisboa, como subsidio de estudos e explorações scientificas = Mariano de Carvalho — Pereira de Miranda = Emygdio Navarro = Ferreira de Mesquita = M. d'Assumpção = Caetano de Carvalho = Adolpho Pimentel.

Foi admittida.

O sr. Pereira Leite: — Mando para a mesa um parecer da commissão de legislação. Mandou-se imprimir.

O sr. Mariano de Carvalho: — Perguntei ha pouco á commissão e ao governo em que se gastavam estes 3:000$000 réis que vem no orçamento a titulo de commissões de residencia, porque taes commissões não existem, e senti-me alegre quando o sr. relator da commissão me disso: «Eu lhe vou responder». Como sei que elle tem sempre resposta prompta para tudo fiquei satisfeito.

Mas confesso sinceramente que depois de o ouvir maior foi a desillusão que tive do que o jubilo que ao principio experimentara.

«Quer o sr. deputado saber em que se gasta 3:000$000 réis para gratificações de residencia? Não sabe em que se gasta? Pois olhe que já em 1880 esta verba estava no orçamento, e quem fez esse orçamento foi o sr. Rebello da Silva.»

Aqui está em que consistiu a resposta do sr. relator da commissão!

De maneira que eu pedi explicações sobre o modo como se despendia uma verba que vem no orçamento para gratificações de. residencia o depois das explicações da commissão fiquei sabendo o mesmo que até ali sabia, que não era cousa alguma.

O illustre deputado entendeu que tinha explicado tudo dizendo que a verba vinha no orçamento apresentado pelo sr. Rebello da Silva, que pertenceu ao partido historico, e que, constituindo hoje esse partido e o reformista o partido progressista, ao qual pertenço, eu ficava em muito má posição, fazendo a pergunta que fiz.

Pois nem eu fiquei em má posição, nem o sr. relator explicou cousa alguma; em primeiro logar porque eu fazia opposição ao sr. Rebello da Silva, e em segundo logar porque o sr. Rebello da Silva podia ter errado como errou o actual sr. ministro da marinha.

Pergunta se o que é esta despeza extraordinaria que vem mencionada n'este capitulo do orçamento, e responde-se: « Já estava no orçamento antecedente! »

O sr. Carrilho: — -Não é tão extraordinaria como isso.

O Orador: — Mas eu quero saber em que se gastamos 3:000$000 réis, quero saber quaes as cousas em que é necessario fazer despezas extraordinarias.

E a resposta a respeito das rações e do azeite é do igual força.

Juntando isto para aqui, diminuindo para acolá; mais praça para aqui, mais praça para acolá, dá a verba do 10:000$000 réis para azeite.

Faltou apenas dizer que muitas praças não estão fazendo serviço.

Agora pergunto tambem:

Porque é que em vez de descreverem as canhoneiras Ave e Vouga, que não estão acabadas do construir, e uma d'ellas tem do ser desmanchada, não se descreve o vapor Guiné, que já está armado?

Como não ha meio de explicar estas duas verbas, eu proponho.a sua eliminação, porque é possivel que assim se consiga poder saber alguma cousa, se não vier a lei do meios acabar com todas as explicações.

Leu se a proposta na mesa.

E a seguinte

Proposta

Proponho que do armamento naval se eliminem as canhoneiras Vouga e Ave, o inclua n'elle o vapor Guiné, fazendo-se as convenientes modificações nas verbas para carvão, azeite, estopa, rações, tia. = Mariano de Carvalho.

Foi admittida.

Foi approvado o capitulo 5.°

As propostas foram enviadas á commissão.

O sr. Ministro da Fazenda: — Mando para a mesa uma proposta do lei approvando os contratos feitos com o banco ultramarino, pedindo á camara desculpa de não ler o relatorio.

Leu-se na mesa.

Proposta de lei nº 127-A

Senhores. — A creação do banco nacional ultramarino trouxe importantes e reconhecidas vantagens ao desenvolvimento do commercio das nossas provincias africanas, o por mais de uma vez este estabelecimento tem prestado valiosos serviços á gerencia financeira dos governos d'aquellas provincias. Não sómente as transferencias do fundos da metropole se têem feito de ordinario por intermedio do mesmo banco, mas é elle que continuadamente presta ás juntas de fazenda e até ás camaras municipaes do ultramar o auxilio dos adiantamentos necessarios para a regular administração da fazenda n'aquellas afastadas provincias, sendo quasi sempre credor do estado o das juntas por quantias do alguma importancia.

Nas transferencias de fundos para o ultramar, umas vozes o banco desembolsava primeiro os fundos que entregava ás juntas de fazenda, e mais tarda era aqui embolsado dos seus creditos, outras vezes recebia aqui primeiro as sommas a transferir, que mais tarde entregava no ultramar, conforme as conveniencias do governo na occasião de se effectuarem estas operações de thesouraria.

Chegou, porém, um momento em que as difficuldades do banco na sua sede em Lisboa, provenientes das irregularidades e subtracções que foram descobertas, pela infidelidade de alguns de seus empregados, impossibilitaram o banco de prestar nas provincias ultramarinas os serviços que eram necessarios, se não se lhe adiantassem aqui as sommas que conviria transferir para o ultramar, e que em parto correspondiam a adiantamentos que elle tinha feito ás juntas de fazenda.

Ao mesmo tempo que os abusos commettidos pelos empregados do banco eram sujeitos á acção competente do poder judicial, e a gerencia superior do estabelecimento

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durante a epocha em que os abusos se haviam praticado era submettida ao exame dos accionistas, entendeu o governo, no interesse que tinha o estado em não pôr em risco eventual a solidez e credito do banco, que podia auxilial-o sem prejuizo dos interesses da fazenda. Este auxilio, sufficiente para livrar o banco de embaraços no momento em que a desconfiança causada pela revelação dos abusos e desvio de fundos podia esgotar momentaneamente os seus recursos, consistiria nas operações, cujos contratos foram effectuados, e que o governo hoje submette ao vosso exame e legalisação.

Representara estes contratos, como vereis, duas operações para transferencia de fundos, como outras anteriormente tinham sido feitas em diversas epochas. Como, porém, se tratava de quantias mais avultadas e de um praso mais longo, como o fim era não sómente o interesse directo do estado, mas o do proprio banco, embora som onus para a fazenda publica, e como pareceu conveniente exigir do banco, no interesse' do mesmo estado, garantias excepcionaes e que não era costume exigir quando se tratava de operações de thesouraria d'esta natureza por quantias menos importantes, entende o governo que deve submetter estes contratos ao exame e approvação do poder legislativo.

Do adiantamento de 200:000$000 réis em virtude do primeiro contrato, já o governo está embolsado, e não foi este adiantamento superior a outros que haviam sido feitos em diversas epochas por meras operações de transferencia de fundos sem contrato especial.

No momento em que se effectuava o segundo contrato pela importancia de 500:000$000 réis, era o banco credor no ultramar das juntas de fazenda o das camaras municipaes, da somma de 367:000$000 réis, e tinha alem d'isso o mesmo banco aberto creditos em favor das juntas de fazenda e governadores geraes do ultramar, para o caso de guerra, sedição, e para precauções de segurança publica, na importancia de 230:000$000 réis.

Por esta rapida exposição vereis que dos contratos feitos com o banco nacional ultramarino, com as condições e garantias ali estabelecidas, nunca poderia resultar prejuizo á fazenda, mesmo no caso em que o banco não estivesse nas condições de solidez em que está effectivamente, pois que os desfalques e subtracções de que foi victima, apenas terão em resultado o prejuizo dos accionistas nos seus dividendos durante alguns semestres, mas não abalaram profundamente a solidez do banco, e muito menos a sua solvabilidade para com o governo ou para com terceiros.

Com este relatorio vão alguns esclarecimentos que vos habilitarão a examinar o assumpto de que se trata, e irão todos áquelles que julgardes conveniente requisitar das estações officiaes.

Tenho, pois, a honra de submetter á vossa approvação a seguinte proposta de lei.

Ministerio dos negocios da fazenda, gabinete do ministro, em 19 de maio de 1879. = Antonio de Serpa Pimentel.

Proposta de lei

Artigo 1.° São approvados os contratos de 12 de junho e de 3 de dezembro de 1878 com o banco nacional ultramarino, ficando relevado o governo da responsabilidade em que tiver incorrido por haver effectuado os mesmos contratos.

Art. 2.° Emquanto durarem os mencionados contratos, mandará o governo, se o julgar conveniente, proceder a quaesquer investigações ou inqueritos sobre a gerencia e contas do banco, tanto na sua sede em Lisboa, como nas suas succursaes ou agencias no ultramar.

Art. 3.° O governo dará conta ás côrtes do andamento e liquidação das operações realisadas em virtude dos contratos de que trata esta lei.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario

Ministerio dos negocios da fazenda, gabinete do ministro, em 19 de maio de 1879. = Antonio de Serpa Pimentel. Foi enviada á commissão de fazenda.

Entrou em discussão o capitulo 6.º

Capitulo 6.° — Empregados em serviço no ultramar, supranumerarios, fóra dos quadros, reformados, aposentados e veteranos............................... 328:665$754

O sr. Mariano de Carvalho: — E bom sempre dizer o que os capitulos comprehendem, porque os srs. deputados, pelos muitos affazares que têem, não chegara a ler o orçamento. (Riso)

Este capitulo comprehende empregados em serviço no ultramar, supranumerarios, reformados, aposentados, jubilados e veteranos.

Ora, isto é uma enorme cohorte do empregados, salvo 03 que estão no ultramar, que apenas dão noticia da sua presença, por uma despeza de algumas dezenas de contos de réis.

N'este capitulo nota-se uma circumstancia muito singular, e sobre a qual desejava que se me desse uma explicação, para poder ficar tranquillo a este respeito. ~"

O facto é a notavel desproporção entre os reformados da classe civil e. os reformados da classe de marinha. É uma cousa muito fóra de tudo quanto podia esperar-se.

O caso é este. Sommando todos os empregados civis do todas as classes de serviço do ministerio da marinha, com direito á reforma, encontramos 858, e sommando todos os empregados militares, de todas as categorias, que têem direito á reforma, encontrámos 2:856. Reformados civis 278, e reformados militares 266. Quer dizer que, a par de 858 empregados civis em serviço activo, temos 278 reformados, e a par de 2:856 empregados militares em serviço activo, temos 266 reformados. De modo que a proporção dos reformados' civis, em relação aos reformados da classe militar da armada, é de 9,2, emquanto que a dos empregados civis, com respeito aos da classe militar, é de 32,8.

Os militares são em maior numero do que os empregados civis, o por isso era natural que a sua passagem para a classe dos reformados fosse mais rapida. Pois não é assim.

Vamos a descer a promenores.

Na direcção de marinha ha 28 empregados civis e 4 militares; na direcção do ultramar ha 35 empregados civis e 4 militares, e, alem d'isto, mais 18 empregados. Somma tudo 81. Da mesma classe, aposentados, 44. Ha 44 reformados para 81 em serviço activo, mais do que na classe militar.

Vamos a outra classe que se possa comparar com esta. Vamos procurar o pessoal superior de marinha militar. Encontro: officiaes de graduação militar 319, reformados 54.

Portanto, officiaes da marinha militar em serviço activo 319, e reformados 51; e empregados civis da secretaria em serviço activo 81, e aposentados 44. A proporção dos que fazem serviço, para os empregados civis, é de 54 por cento, emquanto que para os empregados militares é de 17 por cento do serviço activo.

Vamos a um ministerio qualquer; por exemplo, ao da justiça.

Acho que a proporção, por exemplo, dos reformados para os effectivos, é de 17 por cento, igual á proporção que existe na marinha militar, mas muito abaixo da proporção do empregados civis do ministerio da marinha.

Eu tenho dito muitas vezes que é necessario olhar seriamente para esta questão dos reformados, porque tendo nós agora quarenta annos de existencia de systema constitucional, é claro que vae apparecendo o numero de reformas e aposentações mais avultado, e, por consequencia, as despezas hão de augmentar de um modo notavel, se não tivermos o cuidado de propor ao parlamento alguma medida,

Sessão de 19 de maio de 1879

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similhante ao que se tem feito em outros paizes, a fim de remediar esse inconveniente.

Lembro que em tempo o sr. Braamcamp apresentou uma proposta n'esse sentido, e eu tambem já apresentei um projecto, chamando por essa occasião a attenção do sr. ministro da fazenda, que me prometteu, no anno seguinte, trazer uma proposta de lei sobre o assumpto.

Ora isto foi ha quatro ou cinco annos, e ainda s. ex.ª não teve tempo de cumprir a sua promessa, aggravando-se o mal todos os dias.

O que é facto é que assim não se póde continuar. (Apoiados.)

Mas quer a camara saber como é que se faz crescer o numero dos reformados? Eu explico uma parte.

A carta de lei de 8 de maio de 1878 diz o seguinte. (Leu.)

Ora esta lei entrou aqui com pés de lã, e deixou-nos completamente tranquillos a respeito de qualquer augmento de despeza que d'ella podesse resultar.

No artigo 1.º auctorisava-se o governo a reformar a secretaria da marinha; no artigo 2.° dizia, e isto é que nos tranquillisou, a ponto que até os proprios anjos nos invejavam; dizia o artigo 2.°

(Leu.)

Sem augmento algum de despeza.

Havia na secretaria da marinha um pessoal effectivo e um quadro de addidos, mas alem d'isso havia alguns serventes do arsenal, que ali prestavam serviço, sommou se o pessoal da secretaria com os addidos o serventes e disse se á camara, esta verba é tanto, este serviço não está bem feito, e póde-se, sem de modo algum augmentar a despeza publica, fazer melhor serviço comtanto que por isso nos dêem auctorisação.

A camara deu a auctorisação que lhe pediram, e ficou perfeitamente tranquilla e certa de que ía ter melhor serviço sem augmento de despeza, o que não é impossivel nenhum, porque se póde fazer isso em todos os serviços publicos. (Apoiados.)

Mas o que aconteceu depois!?

Repito, não conheço d'estes phenomenos, não sei entrar na apreciação da maneira como isto se faz; mas vendo a lista da armada achei a paginas 9 e 10 o seguinte:

«Empregados da secretaria d'estado aposentados, um era 12 de dezembro de 1878, outro em 3 de setembro u)q 1878, outro em 26 de junho de 1878, outro em 4 de junho de 1878, outro em 21 de junho de 1878, outro em 21 de agosto de 1878, outro em 21 de março do 1878, outro em 25 de junho de 1878, outro em 17 de outubro de 1878, outro em, 30 de março do 1878, e outro em 27 de fevereiro de 1878, ao todo 16.

O sr. Carrilho: — Estavam impossibilitados.

O Orador: — Eu não sei se estavam impossibilitados para p serviço, o que sei é que faziam serviço. Pois não se reconheceu a necessidade de os aposentar senão depois que se publicou; a lei? Como é que se fez isto tudo? Como é que nós fomos burlados? E esta a unica phrase que se póde applicar ao que se fez.

Foi-se aos empregados do quadro effectivo e aposentaram-se; foi-se aos empregados do quadro addido, passaram-se para o quadro effectivo e aposentaram se; e augmentou-se a despeza; mas como os empregados aposentados não figuram UP quadro dos empregados effectivos nem no dos addidos da secretaria, nem no dos serviços do arsenal, o governo póde dizer ás côrtes que cumpriu a lei! Apenas se esqueceu de dizer que tinha apontado 16 empregados.

Aqui está como se propõem leis ao parlamento e como se cumprem! Aqui está como o systema parlamentar não passa de uma mascarada!

Em qualquer paiz onde houvesse respeito pelo systema parlamentar, reconhecida a necessidade de aposentar era pregados, aposentavam-se, reconhecida a necessidade de reformar secretarias, reformavam-se, mas. pediam-se clara, mente ao parlamente os meios necessarios para o fazer.

N'este capitulo ha uma secção unica que tem os empregados aposentados da secretaria, incluidos todos em um grupo. Dizia a tal secção unica no orçamento para 1878— 1879: «empregados do secretaria aposentados 4:999$600 réis»; diz no orçamento para 1879-1880: «empregados de secretaria aposentados 13:919$840 réis»; quer dizer, treplicou a despeza com os aposentados. A consolação que tomos é que não é paga nem pelo quadro effectivo nem pelo quadro dos addidos, nem pelo dos serventes do arsenal, é paga pelos reformados. Não se violou o artigo da lei; apenas se não disso a verdade á, camara.

Se se dissesse a verdade, não havia parlamento nenhum que não votasse, mas a questão é que, em logar de se apresentar a questão com franqueza e verdade, se recorro a estes artificios, que tem tristes consequencias para p systema que nos rege.

A grandissima desproporção que ha entre 50 por cento de reformados em relação ao serviço civil e só 17 por cento em relação ao serviço militar, explica se por isto. E por aqui póde a camara, fazer idéa de como as cousas, se passam.

(O orador não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros e interino da Marinha: — Pedi a palavra quando o illustre deputado, o sr. Mariano de Carvalho, pronunciou uma phrase contra a qual eu, homem liberal, n'um parlamento liberal, não podia deixar de protestar.

E uma burla o systema parlamentar em Portugal!

O systema parlamentar entre nós é puro e genuino; e se alguem acceita a denominação de burla para esse systema, eu, como homem liberal, rejeito-a. (Apoiados.)

E uma mascarada o systema parlamentar. Porque? Nós não estamos a fazer uma burla, estamos a honrar aquillo que a todos nos honra, a resolver os negocios publicos coma um povo livre.

Porque é uma burla o systema parlamentar? Porque se, propoz uma reforma n'uma secretaria e havia n'essa secretaria grande numero de empregados addidos que serviram, antigamente no conselho ultramarino, que estavam impossibilitados e que foram separados do serviço activo, aposentando-os em virtude das leis era vigor, porque tinham direito a isso?

Se o illustre deputado duvida do que affirmo, peça os processos o verá então como estes empregados foram aposentados em conformidade com a lei.

Eu não estou aqui a defender nem o governo, nem o ministro; estou a defender o systema parlamentar e a dizer que elle não é burla, nem ninguem o ousará dizer, sendo sinceramente liberal.

O illustre deputado leu uma longa lista de individuos} aposentados, alguns antes da lei, porque quando foram aposentados ainda a lei da reforma não existia. Que prova isso? Nada.

Quando se tratou de reorganisar a secretaria da marinha foi perfeitamente de accordo com q projecto apresentado á camara;, e nós não podemos, em vista d'esta reforma, dizer que houve excesso, nem abuso......

Se o illustre deputado não sabe as particularidades d'esta reforma, vae sabel-as, porque eu vou mandar á camara os documentos, « depois se reconhecerá, se algum individuo foi reformado, sem o ministro estar auctorisado pela lei a reformal-o; depois se verá se as prescripções da lei; foram exactamente cumpridas. Faça depois 9 sr. Mariano de Carvalho as suas censuras; eu tratarei de as receber humildemente, se forem justas; de as repellir, se o não forem, com a dignidade e respeite que devo. a mim mesmo, á camara e ao illustre deputado que me fizer a accusação. (Apoiados.)

O sr. Mariano de Carvalho: — Pôde o nobre minis-

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tro protestar á sua vontade; os factos são o que são, e ninguem é capaz de lhes tirar o caracter.

Somos liberaes, porque os costumes do paiz são superiores á vontade dos homens.

Os costumes do povo são tanto pela liberdade, que nem o governo, nem ninguem, póde attentar contra ella, porque está a salvo de qualquer tentativa. (Apoiados.)

Mas isso não tem nada com o systema parlamentar.

O systema parlamentar é a lastima que esta lei prova. (Apoiados.)

Eu provoco o nobre ministro a que percorra os annaes parlamentares de todos os paizes, sem excepção, para que me mostre um governo que procedesse do modo como se procedeu entro nós a respeito da secretaria de marinha, e que depois se conservasse uma hora, um minuto, era face do parlamento. (Apoiados.)

Cuida o nobre ministro que illude alguem com o sophisma de que as leis já existiam? Cuida que engana alguem com isso?

• Pois o governo quando trouxe aquella proposta do lei hão sabiá já que havia empregados impossibilitados, e que existiam as leis que foram citadas pelo illustre ministro?

Era melhor dizer á camara: a despeza augmenta, porquê o serviço assim o exige.

Não o fez, e isso era melhor do que propor a lei só e Unicamente com o intuito de fazer reformas; e deixar vagas, pára prover n'ellas áquelles a quem' se apadrinhava. (Apoiados.)

O illustre ministro pode protestar á sua vontade; e até é a sua obrigação, porque á sombra d'este systema parlamentar é que o governo tem vivido, mas não póde negar a evidência dos factos, e factos como estes não se praticam em

paiz nenhum do mundo, não digo n'um paiz sinceramente livre, porque sinceramente livre é o nosso, mas n'um paiz sinceramente parlamentar. (Apoiados.)

Isto é o que está acontecendo todos os dias, e a todas as horas. (Apoiados.)

Todos os dias se vão descobrindo factos que mostram que o procedimento do governo é o constante proposito de, por pretextos mais ou menos futeis, não dizer a verdade ao parlamento, e arrancar-lhe assim concessões que elle porventura não daria se estivesse bem informado. (Apoiados.)

E a penitenciaria? Porque não vieram pedir auctorisação para continuarem as obras da penitenciaria? Porque é que gastaram 900:000,5000 réis em vez de 300:000$000 réis para que tinham auctorisação, sem darem contas a ninguem?

Porque o não fizeram?.

Porque sabiam que no dia em que pedissem essa auctorisação haviam de encontrar quem lhes perguntasse então como se fizeram essas despezas? Como se gastou esse dinheiro?

Por que não vieram tambem pedir ao parlamento que auctorisasse antes, ou legalisasse depois as despezas extraordinarias feitas com estradas no Algarve?

Porque o não fizeram?

porquê sabiam que no dia em que o fizessem havia de haver quem dissesse — sr. ministro das obras publicas, o que v. ex.ª disse na camara dos dignos pares não é exacto, porque, como eu mesmo hei do provar, a estrada de Tavira a Marfim Longo, em construcção não lera 28 kilometros, mas 8 unicamente, dos quaes estão construidos dois terços, tendo se gasto já 92:000$000 réis!... (Vozes:--Ouçam, ouçam.)

Quando o governo pedisse ao parlamento que auctorisasse antes, ou legalisasse depois ostas despezas, havia de haver quem lho tomasse contas e acabava a mascarada; mas como é necessario que ella continue, procuram-se mil

pretextos futeis, mil argucias bysantinas para occultar estes actos ao parlamento. (Apoiados)

E este caso do ministerio da marinha é insignificante, á vista do que se tem feito; o mal lavra muito mais fundo e vão muito mais longe, e tambem as consequencias hão do ser mais funestas do que muita gente imagina. (Apoiados)

Eu não queria irritar este debato, que tem corrido pacificamente até este momento, e durante o qual eu não pronunciei alguma phrase que não tenha pronunciado em outras occasiões n'esta casa, sem que ninguem se lembrasse de protestar, tanto isto está na convicção de todos.

O nobre ministro dos negocios estrangeiros é o unico que não tem a convicção de que não ha systema parlamentar serio desde o momento em que ainda não houve um governo que não tivesse maioria ha camara dos deputados, é a camara dos pares, constituida pelo modo por que todos sabem que está constituida.

Podem fazer o que quizer, o facto é este, com a differença que se tem aggravado todos os dias.

Tenho concluido.

O sr. Arrotas: — Posto que a commissão de fazenda tenha o seu órgão official, que sabe cumprir com o seu dever, posto que o nobre ministro da marinha acabe do dar explicações satisfactorias a respeito do assumpto de que se trata, eu como membro d'essa commissão não posso deixar de tomar a palavra para muito resumidamente esclarecer a camara a respeito das duvidas que apresentou o nobre deputado.

A lei do 8 de maio do 1878, que reformou a secretaria de marinha, não alterou as condições da aposentação dos empregados da mesma secretária; a lei não alterou o que existia.

Na secretaria da marinha encontraram dois individuos no caso de serem reformados, um d'elles era o sr. Tavares de Macedo, e do outro não me lembro agora o nome; estes dois individuos foram reformados antes da reforma da secretaria.

Os outros eram officiaes de fazenda que serviram no ultramar, cheios de serviços e nas circumstancias de se reformarem;

No uso do seu direito requereram a sua aposentação, foram á junta, foram inspeccionados e foram reformados. Onde ha aqui o abuso?

Disse o illustre deputado que certos individuos "foram aposentados para darem os logares a outros.

O sr. Tavares de Macedo occupava um logar superior na secretaria da marinha, mas não era preciso a reforma da secretaria para elle deixar a vaga, porque independentemente d'ella podia reformar-se, como de facto acontecer e o mesmo se dava com os outros individuos que tinham direito á reforma.

Não era preciso que a reforma da secretaria se fizesse para estes individuos se reformarem.

Nunca pensei que teria de entrar n'esta discussão, se tivesse prevenido tinha muito mais que dizer, mas não me pude conter, porque via alterar a verdade.

Eu sei que ha leis que alteraram as condições da aposentação que deram em resultado triplicar logo a despeza. Conheço, por exemplo, uma, lei de aposentações relativamente ao arsenal da marinha e que é do anno de 1870. Sei que os operarios d'aquelle estabelecimento tinham umas condições de reformas que -foram alteradas, o logo em seguida a despeza elevou se a mais do dobro em virtude d'essa lei. Disse-o n'um folheto que escrevi; mas quanto á lei a que se referiu o illustre deputado não vejo motivo para censurar o governo. (Apoiados)

Posto a votos o capitulo 6.º foi approvado.

Capitulo 7.°— Despezas de exercicios findos... 950/5000

O sr. Mariano de Carvalho: — Não tratarei de responder ao sr. Arrobas, o que não significa certamente falta de respeito para com s. ex.ª, mas porque realmente não vejo necessidade d'isso.

Notarei simplesmente que depois da votada a lei do 1878,

Sessão de 13 de maio de 1879

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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Se desenvolveu logo uma febre, uma verdadeira epidemia de aposentações, quando até ali os empregados tinham estado tranquillos e socegados, nem pensando talvez na aposentação.

A vista d'este exemplo, quando o governo vier á camara pedir auctorisação para reformar qualquer secretaria em iguaes condições, declaro desde já que não lh'a concedo.

Mas que digo eu! Ninguem foi promovido para depois ser aposentado, e os factos que se deram foram completamente normaes. (Riso.) Havia desde muito apenas dez empregados aposentados, e aposentaram-se durante o anno de 3878 mais dezeseis, mas isso foi uma questão puramente de acaso. (Rizo.) Será porém bom que taes acasos não se repitam. (Apoiados.)

O governo sabia já que havia a lei do aposentações de que se podia lançar mão, mas foi de uma innocencia, comparável á do uma creança recemnascida, quando apresentou a proposta para reformar a secretaria da marinha, comtanto que não gastasse mais do que a despeza já effectiva com o quadro existente, com os addidos e com os serventes do arsenal empregados na secretaria.

Posto á votação o capitulo 7.°, foi approvado.

Entrou em discussão o orçamento do ministerio dos negocios estrangeiros.

Capitulo 1.° — Secretaria d'estado.......... 19:674$000

O sr. Luciano de Castro... (O sr. deputado, não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. ministro dos negocios estrangeiros. Vozes: — Deu a hora.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Ainda não dou a hora, mas se os illustres deputados me querem fazer calar, eu calo-me.

Tenho muito respeito pela camara, o estou disposto a acceder a tudo quanto me for indicado. Não faço questão de cousa de tão pequena importancia.

O illustre deputado fallou em uma questão grave, é a questão que se debateu durante algum tempo entre Portugal e Hespanha, a proposito de um conflicto de pescadores.

V. ex.ª e a camara comprehendem bera que eu não posso discutir aqui 03 documentos relativos a essa questão, que terminou já por uma convenção.

. A convenção ha de ser sujeita ao parlamento, a propria convenção o diz...

O sr. Luciano de Castro: — A questão da indemnisação não entra na convenção.

O Orador: — Ainda lá não cheguei. O illustre deputado não póde exigir que eu falle tão depressa que diga tudo ao mesmo tempo. *

A convenção. ha de ser sujeita ao parlamento, ha de ser tratada em sessão secreta, e então á discutiremos. Entretanto aproveito a occasião para dizer que me associo completamente aos louvores que o illustre deputado fez ao patriotismo, á nobre isenção e ao elevadíssimo caracter do sr. duque d'Avila.

O sr. duque d'Avila emquanto a questão esteve pendente, debateu-a como convinha a um ministro dos negocios estrangeiros.

Quando eu entrei para o governo a questão não estava pendente, estava terminada. Mas havia a exigencia da indemnisação por parte da Hespanha.

Prendem com isto as accusações gravissimas que o sr. deputado quer levantar sobre a minha falta de patriotismo e de zêlo pelos brios da patria.

Essas accusações parece-me que não têem rasão de ser.

A questão da indemnisação pedida pelo governo hespanhol tinha dois capitulos principaes, póde-se assim dizer,

que se distinguem fundamentalmente quando se trata de uma questão internacional.

Primeiro, indemnisação por offensa á bandeira hespanhola, e indemnisação por interrupção no exercicio de um direito reciproco, direito que se dizia resultar do antigo uso, e de documentos em que mostrava que o governo portuguez tinha pedido lhe fosse concedido o exercicio da pesca nas aguas hespanholas, o que lhe fóra concedido.

A suspensão da reciprocidade da pesca, perdida por nós, parecia rasão para indemnisação ao governo da nação hespanhola.

Segundo, compensação ou indemnisação por perdas o damnos por estragos feitos a diversos barcos n'uma desordem que teve logar nas aguas portuguezas.

A primeira parto d'esta indemnisação tinha um caracter verdadeiramente internacional.

A essa oppuz me nas conferencias que tive com o duque de Tetuan, com justo fundamento, em minha opinião, o o governo hespanhol cedeu das suas exigencias.

Restavam, pois, as perdas e damnos causados d'uma desordem em aguas portuguezas, entro pescadores portuguezes e pescadores hespanhoes.

Sem discutir agora se eram os pescadores hespanhoes ou os pescadores portuguezes que tinham rasão, essa questão vem no Livro branco, o facto é que os pescadores de Andaluzia pescavam nas aguas do Algarve, e os pescadores do norte do Minho iam pescar ás aguas hespanholas, sem encontrarem impedimento.

O sr. Luciano de Castro: — É o contrario o que v. ex.ª diz n'uma nota.

O Orador: — Houve uma questão, e é provavelmente aquella a que o illustre deputado se refere. Em 1875, me parece, alguns pescadores portuguezes foram lançar redes nas praias da Andaluzia, e foram mal tratados; segundo hoje se diz.

Mas o facto foi tão pouco grave, que nem os pescadores se queixaram, nem deram parte d'isso ás nossas auctoridades maritimas, nem as auctoridades deram tal noticia ao governo central.

Este facto soube-se em 1877, quando teve logar a recente questão.

Assim, pois, a indemnisação reduzia-se a perdas e damnos soffridos pelos pescadores hespanhoes nas aguas portuguezas em consequencia de uma desordem local.

O nobre duque d'Avila reconheceu a existencia da desordem a que me refiro.

Depois a questão tomou proporções maiores, por motivos que se podem conhecer pelos documentos' do Livro branco:

Essa indemnisação por perdas e damnos aos pescadores hespanhoes é que era preciso fixar..

O governo hespanhol dizia: a indemnisação deve ser de tanto. O governo portuguez respondia a isto que não podia acceitar uma indemnisação imposta, mas uma indemnisação julgada.

Fez, pois, a proposta, que o governo hespanhol acceitou sem a maior reluctancia, do que a Hespanha nomeasse um delegado seu e Portugal outro, a fim do avaliarem as perdas e damnos. A importancia d'essa avaliação devia ser a somma a pagar.

Esta é a questão.

O governo portuguez, em vez de se collocar n'aquelle terreno, devia collocar-se n'outro?

Isso é um ponto a julgar pela camara e pelo paiz.

Eu suppuz que fazia um bom serviço ao paiz, e ainda o supponho, reduzindo uma questão, que estava realmente, por circumstancias que não vera para aqui recordar, no caso de poder tomar maior gravidade, a uma questão apenas de perdas e damnos de uns pescadores. (Apoiados.)

Parecia-me, e parece-me ainda, que avaliar a quantia d'essas perdas e d'esses damnos pelo juizo arbitral do um delegado portuguez e do outro hespanhol — pondo termo

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assim á questão ou levando-a a condições em que não podesse servir de pretexto a novas dissidências entre 03 dois governos — era uma cousa que a prudencia aconselhava ao ministro dos negocios estrangeiros do Portugal, e aconselharia tambem ao ministro dos negocios estrangeiros de Hespanha. (Apoiados.)

Os dois governos comprehenderam-no assim. Não foi Portugal que se sujeitou ás exigencias da Hespanha, nem a Hespanha que se sujeitou ás exigencias de Portugal; foram dois governos que procuraram um meio de conciliação que tivesse em si todas as condições para poder satisfazer a dignidade dos dois paizes; um meio que não tivesse por fórma alguma o caracter de offensa internacional, mas apenas o caracter de ajuste por perdas e damnos causados a uns pescadores n'uma desordem puramente local. (Apoiados)

Quando este negocio vier á camara, porque lhe ha do ser submettido o convénio da pesca, terei então occasião de dizer á camara as rasões por que me pareceu que aquella solução era a mais conveniente para os interesses dos dois paizes; isto é, a solução de continuar a reciprocidade da pesca nas costas de Portugal e Hespanha, de uma maneira regular, tornando impossiveis novos conflictos, e ao mesmo tempo fazendo com que nos aproveitemos da extensa costa hespanhola, que é maior do que a nossa, e com que os hespanhoes aproveitem de certas particularidades da costa de Portugal, onde afflue mais o peixe. O que não quer dizer, note-se bem, que o peixe tenha feito um contrato com a costa de Portugal, para só á ella vir em determinadas epochas.

, Para o anno que vem póde o peixe ir mais para a costa hespanhola do que para a costa portugueza; e, se não existisse a reciprocidade, ficavam os nossos pescadores privados dos lucros proprios da sua industria.

Resta-mo fallar do pagamento da indemnisação.

A indemnisação paguei-a, e acceito a responsabilidade do facto; paguei-a porque era preciso pagal-a n'aquella occasião.

Parecia-me conveniente seguir o exemplo do um homem d'estado, nobilissimo pelo caracter, e cuja perda todos lamentámos, o qual, quando um conflicto internacional se levantou sobre uma questão de dinheiro, mandou pagar logo, sem pedir auctorisação; e quando veiu dizer á camara o que tinha feito, viu que todos os deputados, de todas as cores politicas, approvaram o seu acto.

Quando um governo faz uma despeza para que não está auctorisado, as praticas constitucionaes estabelecem o modo pelo qual essa despeza é legalisada.

Eu não tenho ainda apresentado uma proposta de lei pedindo um bill de indemnidade por este facto, por uma rasão simples, queria trazel-a conjunctamente com a negociação das pescarias. A demora tem sido devida a essa negociação estar ainda pendente; negociação que póde ser de maxima vantagem para nós, por uma circumstancia importante, que é a seguinte:

Os pescadores hespanhoes e os pescadores portuguezes, pescando em commum nas aguas de Hespanha e nas de

Portugal, principalmente ao sul, encontram grande vantagem, em poderem dispor do mercado hespanhol, porque ò para o mercado hespanhol que elles levam a maior parto do peixe.

N'estas circumstancias encontram os pescadores portuguezes um embaraço ao seu commercio, que é a differença entre o direito que paga o peixe em Portugal e o que paga o peixe em Hespanha.

Quando eu fiz uma convenção temporaria, que devia servir do base á convenção que ha do ser sujeita á approvação d'esta camara, estabeleci como principio que os dois governos procurariam o modo de destruir esse embaraço ao commercio o mais e melhor possivel..

Hoje a negociação com o governo hespanhol está bastante adiantada para que na convenção possa vir um artigo addicional declarando que os dois governos, estudando a questão praticamente, garantiriam reciprocamente á importação do peixe fresco ou preparado, quer em Portugal quer em Hespanha um direito igual, fosso qual fosse a sua procedencia.

Desde esse momento os pescadores hespanhoes ganham era vir a Portugal, e os pescadores do Algarve ganham tambem em irem a Hespanha, porque o principal mercado é ali.

Assim está explicado tudo.

Ha outros pontos da questão, que são realmente importantes, e a que o illustre deputado se referiu.

Mas eu confesso sinceramente que não me atrevo discutil-os agora n'esta occasião.

O illustre deputado sabe perfeitamente, e melhor dó que eu, que a questão de se nós tinhamos ou não rasão, se os hespanhoes nos trataram bem ou se nos trataram mal, se mandaram então um navio de guerra para fazer a policia da pesca, e se nós deixámos de mandar outro para o mesmo fim tudo isso cumpria estudar e discutir ao governo de então.

E uma questão conclusa que não posso discutir agora.

O parlamento póde fazei o, eu como ministro é que não posso. (Apoiados)

Sobre este assumpto é o que tenho a dizer por hoje.

Agora tenho de fallar n'outros artigos orçamentaes a que se referiu o illustre deputado...

Vozes: — Deu a hora.

O Orador: — Só a hora deu, como ouço dizer a alguns illustres deputados, não continuo, e peço se me reserve a palavra para a seguinte sessão.

O sr. Presidente: — A hora já deu.

Fica reservada a palavra do sr. ministro para continuar ámanhã o seu discurso.

O sr. Carrilho (primeiro secretario)..: — A commissão de redacção não faz alteração alguma á redacção dos projectos n."8 102, 103 e 119, que vão ser expedidos para a outra casa do parlamento.

O sr. Presidente: — - A ordem do dia para ámanhã é a continuação da que estava dada e mais os projectos n.ºs 122 e 123.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas da tarde.

Sessão de 19 de maio de 1879

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