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SESSÃO DE 30 DE MAIO DE 1888

Presidência do exmo. sr. José Maria Rodrigues de Carvalho

Secretarios os exmos. srs.

Francisco José de Medeiros.
José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral

SUMMARIO

Não houve expediente. - Representações mandadas para a mesa pelos srs. Mendes da Silva, Franco Castello Branco, Alpoim e Alfredo Pereira. - Requerimento de interesse publico apresentado pelo sr. Teixeira de Vasconcellos. - Requerimentos de interesse particular mandados para a mesa pelos srs. Alpoim e Villaça. - Justificação das faltas do sr. Figueiredo Mascarenhas. - Declaração de voto do sr. Franco Castello Branco. - Consultada a camara sobre os pedidos do sr. Alfredo Mendes, resolveu-se que fosse publicada a representação e ouvida a commissão de commercio e artes sobre a proposta de lei relativa á companhia do gaz.- O sr. Dantas Baracho pergunta á commissão de agricultura se tenciona dar parecer sobre os projectos da lei que attendem ás aspirações do congresso agrícola. Responde o sr. D. José de Saldanha, e novamente usa da palavra sobre o mesmo assumpto o sr. Baracho. - O sr. Franco Castello Branco entende que o governo deve instar com as commissões para que dêem parecer sobre os alludidos projectou. Pergunta em seguida qual é a opinião do sr. ministro das obras publicas sobre o assumpto, e termina justificando a representação que mandou para a mesa. Responde o sr. ministro das obras publicas, replicando-lhe em seguida, por concessão especial da camara, o sr. Franco Castello Branco.- Usa novamente da palavra o ar. ministro das obras publicas. - O sr. Villaça manda para a mesa um parecer da commissão de guerra, dois projectos de lei, uma proposta para renovação de iniciativa e um requerimento de interesse particular. - O sr. Consiglieri Pedroso julga necessario acautelar desde já os interesses do thesouro com respeito aos novos direitos do alcool, providenciando-se, como se tem feito em casos analogos, para que elles sejam pagos desde já. Refere-se em seguida á noticia de terem sido prohibidos os estudantes do lyceu do Porto de tomarem parte nos comícios de propaganda anti-jesuitica. Respondem-lhe os srs. ministros da fazenda e do reino. - Trata da questão relativa á companhia das aguas o sr. Fuschini. - O sr. ministro da fazenda manda para a mesa uma proposta de lei, que tem por fim evitar despachos antecipados de alcool. Pede dispensa do regimento para que desde já se reuna a commissão de fazenda e dê, o seu parecer. Assim se resolveu.

Na ordem do dia procede-se á eleição dos vogaes effectivos e substitutos dos conselhos de administração e fiscal da administração dos tabacos. - O sr. Carrilho manda para a mesa o parecer da commissão de fazenda acerou da proposta de lei apresentada na sessão anterior pelo sr. ministro da fazenda. Dispensado o regimento entra em discussão, tomando n'ella parte os srs. Consiglieri Pedroso, ministro da fazenda por tres vezes. Moraes Carvalho, Arouca e Franco Castello Branco. E approvado o parecer. - O sr. ministro da fazenda manda para a mesa uma proposta para accumulação, que é logo approvada.

Abertura da sessão - Ás duas horas e meia da tarde.

Presentes á chamada 50 srs. deputados. São os seguintes: - Mendes da Silva, Alfredo Pereira, Antonio Castello Branco, Tavares Crespo, Mazziotti, Simões dos Reis, Hintze Ribeiro, Augusto Pimentel, Augusto Fuschini, Miranda Montenegro, Barão de Combarjua, Bernardo Machado, Lobo d'Avila, Eduardo Abreu, Eduardo José Coelho, Emygdio Julio Navarro, Feliciano Teixeira, Almeida e Brito, Francisco de Barres, Francisco Machado, Francisco de Medeiros, Francisco Ravasco, Guilherme de Abreu, Sá Nogueira, Pires Villar, João Pina, Franco de Castello Branco, Santiago Gouveia, João Arroyo, Menezes Parreira, Vieira de Castro, Teixeira de Vasconcellos, Correia Leal, Joaquim da Veiga, Simões Ferreira, Amorim Novaes, Ferreira de Almeida, Eça de Azevedo, Abreu Castello Branco, Figueiredo Mascarenhas, Alpoim, Julio Graça, Manuel Espregueira, Manuel José Correia, Matheus de Azevedo, Miguel da Silveira, Miguel Dantas, Dantas Baracho, Estrella Braga e Visconde de Silves.

Entraram durante a sessão os srs.: - Moraes Carvalho, Serpa Pinto, Alfredo Brandão, Anselmo de Andrade, Alves da Fonseca, Sousa e Silva, Baptista de Sousa, Antonio Centeno, Antonio Villaça, Ribeiro Ferreira, Gomes Neto, Moraes Sarmento, Antonio Maria de Carvalho, Pereira Carrilho, Santos Crespo, Augusto Ribeiro, Conde da Castello de Paiva, Conde de Villa Real, Elizeu Serpa, Góes Pinto, Madeira Pinto, Estevão de Oliveira, Fernando Coutinho (D.), Freitas Branco, Firmino Lopes, Castro Monteiro, Severino de Avellar, Frederico Arouca, Candido da Silva, Baima de Bastos, Izidro dos Reis, Souto Rodrigues, Rodrigues dos Santos, Sousa Machado, Alves Matheus, Oliveira Valle, Jorge de Mello (D.), Jorge O'Neill, Alves de Moura, Avellar Machado, Ferreira Galvão, Barbosa Colen, José Castello Branco, Dias Ferreira, Elias Garcia, Ferreira Freire, José Maria de Andrade, Oliveira Matos, José Maria dos Santos, José de Saldanha (D.), Pinto Mascarenhas, Santos Moreira, Abreu e Sousa, Julio Pires, Julio de Vilhena, Lopo Vaz, Mancellos Ferraz, Vieira Lisboa, Poças Falcão, Luiz José Dias, Manuel d'Assumpção, Manuel José Vieira, Brito Fernandes, Pinheiro Chagas, Marçal Pacheco, Marianno de Carvalho, Martinho Tenreiro, Pedro Monteiro, Pedro de Lencastre (D.), Pedro Victor e Consiglieri Pedroso.

Não compareceram á sessão os srs.: - Guerra Junqueiro, Albano de Mello, Campos Valdez, Antonio Candido, Oliveira Pacheco, Antonio Ennes, Pereira Borges, Guimarães Pedrosa, Fontes Ganhado, Jalles, Barros e Sá, Victor dos Santos, Condo de Fonte Bella, Elvino de Brito, Mattoso Santos, Francisco Beiivlo, Francisco Mattoso, Fernandes Vaz, Lucona e Faro, Soares de Moura, Gabriel Ramires, Guilhermino de Barros, Sant'Anna e Vasconcellos, Casal Ribeiro, Cardoso Valente, Dias Gallas, Alfredo Ribeiro, Silva Cordeiro, Joaquim Maria Leite, Oliveira Martins, Pereira de Matos, Ruivo Godinho, Laranjo, Pereira dos Santos, Guilherme Pacheco, Vasconcellos Gusmão, José de Nápoles, Barbosa de Magalhães, Rodrigues de Carvalho, Simões Dias, Santos Rela, Bandeira Coelho, Marianno Presado, Sebastião Nobrega, Vicente Monteiro, Visconde de Monsaraz, Visconde da Torre e Wenceslau de Lima.

Acta - Approvada.

Não houve, expediente.

REPRESENTAÇÕES

Da associação industrial portugueza, pedindo que se recuse a approvação á proposta de lei que auctorisa o governo a conceder á companhia do gaz de Lisboa, que o material de canalisação e os apparelhos destinados ao fabrico do gaz pague durante um anno, a contar da publicação da referida proposta convertida em lei, os direitos de importação estabelecidos para taes artefactos na edição official de 1885 da pauta geral das alfandegas.

Apresentada pelo sr. deputado Alfredo Mendes da Silva, enviada ás commissões de fazenda, commercio e artes e, mandada publicar no Diario do governo.

De caixeiros e empregados commerciaes da cidade de Guimarães, pedindo a revogação da lei vigente do recrutamento na parte em que não se lhes concede os adiamentos, que são permittidos aos mancebos que frequentam estudos superiores.

Apresentada pelo sr. deputado Franco Castello Branco e enviada á commissões de recrutamento.

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1790 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Dos professores da escola normal de Lisboa, pedindo sejam equiparados cm vencimentos aos professores dos lyceu de Lisboa, Coimbra e Porto.

Apresentada pelo sr. deputado Alpoim e enviada á com missão de instrucção secundaria, ouvida a de fazenda.

De escrivães do juizo de direito da comarca de Penafiel pedindo que não seja eliminado o § 2.° do artigo 19.° do projecto da reforma judicial, que dá aos escrivães do civel nas comarcas fora de Lisboa e Porto competencia para funccionar nas causas commerciaes, cujos feitos, distribuidos com igualdade entre elles, formam para esse effeito uma classe especial.

Apresentada pelo sr. deputado Alfredo Pereira, enviada á commissão de legislação civil e mandada publicar no Diario do governo.

REQUERIMENTO DE INTERESSE PUBLICO

Requeiro, com urgencia, que, pelo ministerio da fazenda (administração geral das alfandegas), seja enviada a esta camara nota indicativa da quantidade, e valor do alcool originario do archipelago dos Açores, despachado nas alfandegas de Lisboa e Porto em cada um dos annos do periodo decorrido de 1 de janeiro de 1877 a 31 do dezembro de 1887. = Teixeira de Vasconcellos.

Mandou-se expedir.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR

Do Jayme Lobo de Brito Godins, secretario geral do governo da provincia de S. Thomé e Principe, solicitando que lhe seja coutado o tempo durante o qual serviu no exercito do reino para os effeitos da aposentação.

Apresentado pelo sr. disputado Alpoim, e enviado á commissão do ultramar, ouvida a de fazenda.

De Francisco de Albuquerque de Mello Pereira e Caceres, aspirante de 1.ª classe a engenheiro naval, com a graduação do guarda marinha, pedindo que lhe seja concedido o soldo correspondente á patente e gratificação.

Apresentado pelo sr. deputado Villaça e enviado á commissão de marinha, ouvida a de fazenda.

Dos serventes do ministerio das obras publicas, commercio e industria, pedindo que os seus vencimentos sejam equiparados aos dos serventes do ministerio da fazenda.

Apresentado pelo sr. deputada Villaça e enviado á commissão de obras publicas, ouvida a de fazenda.

JUSTIFICAÇÃO DE FALTAS

Declaro que não compareci á sessão de hontem por motivo justificado. = José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas.

Para a secretaria.

DECLARAÇÃO DE VOTO

Declaro que, se estivesse presente na sessão do hontem, teria approvado a moção do sr. Franco Castello Branco. = José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas.

Para a acta.

O sr. Mendes da Silva: - Sr. presidente, na sessão de 28 do corrente mez foi apresentado á camara, pelo governo, uma proposta de lei auctorisando o governo a conceder á nova companhia gaz de Lisboa a faculdade de pagar pela pauta de 1883 os direitos do material que carecesse importar para estabelecer a sua industria em Lisboa.

Esta proposta, a despeito do § 2.° do artigo 1.° dizer que o governo só poderá usar da auutorisação quando se prove que as fabricas nacionaes não podem produzir o material no praso de um anno, esta proposta, digo, não agradou á industria metallurgica de Lisboa e Porto e fez com que as industrias de lima e outra cidade, convocassem uma reunião, onde resolveram representar contra a sua approvação.

Não contentes com a representação que dirigiram a esta camara e aos proprietarios das officinas mais importantes de Lisboa e Porto, recorreram tambem á associação industrial portugueza, que é a protectora nata dos interesses industriaes, e pediram-lhe para que auxiliasse os seus esforços, a fim de que o projecto não fosse convertido em lei.

Ora, sr. presidente, as considerações em que se funda a proposta, um primeiro logar, não são verdadeiras; Diz-se n'ella:

"A nova companhia "gaz do Lisboa" assignou o seu contrato com a camará municipal, quando nào estava ainda definitivamente approvada a pauta actual. A companhia formulou os seus cálculos baseando-se nos direitos aduaneiros então existentes e fundada n'elles se sujeitou nos determinados encargos.

"Agora, a mesma companha allega que as fabricas nacionaes não podem nos prasos do contrato, fornecer-lhe todo o material que ellas podem produzir, etc."

É n'esta allegação, sr. presidente, que se funda a apresentação d'este projecto do lei; mas segundo informações que possuo, esta allegação carece absolutamente de verdade.

O contrato entre a companhia e a camara foi assignado em 14 de outubro do anno passado; a pauta geral das alfandegas foi approvada na camara electiva no dia 28 de janeiro, e em 10 de agosto obteve a approvação da camara dos pares, sendo publicada no Diario do governo de 14 do mesmo mez.

Quer isto dizer que entre a approvaçào da pauta em vigor e a assinatura do contrato mediaram quasi dois mezes, além do que esta pauta, salvas as pequenas modificações que soffreu na discussão n'esta e na outra casa do parlamento, achava-se em execução desde a data em que o respectivo projecto foi apresentado á camara, pelo actual sr. ministro da fazenda.

Pouco vale portanto a affirmação de que a companhia gaz de Lisboa, desconhecia o augmento de direitos que tinha a soffrer a tubagem de ferro fundido, quando concorreu á adjudicação da illuminação municipal.

Affirma-se que a industria nacional não está em circumstancias de fornecer no praso preciso para o estabelecimento de canalisação na cidade todo o material necessario á companhia para se desempenhar das obrigações que contrahiu para com a camará municipal de Lisboa.

É muitissimo difficil saber se esta affirmação tem ou não fundamento, mas ainda quando algum tenha, não é difiicil provar que a approvação do projecto constituo um verdadeiro prémio á falta de actividade e francamente nos somos quasi todos bastante mandriões, para que seja preciso ainda animar a preguiça, concedendo-lhe premio.

A companhia desde 14 de outubro até agora esteve a dormir, e para que possa ganhar o tempo que perdeu dá-se-lhe como prémio uma concessão que já ouvi avaliar em mais de 100:000$000 réis.

É possivel que a industria nacional não possa, desde a data de hoje até áquella em que a companhia deve definitivamente ter montado o seu estabelecimento em Lisboa, produzir todo o material preciso, mas é mais do que possivel provavel, que, se a companhia, desde 14 de outubro e não tivesse descuidado de fazer as suas encommendas, que só para agora guardou, podesse ser fornecida nas oficinas do paiz de todo o material de que carece.

Parece-me mais do que justo que, ainda mesmo na, hypothese de que a industria nacional não podesse fornecer

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toda a canalisação, a nova companhia soffresse as consequencias da sua incuria. (Apoiados.)

Sr. presidente, as pautas das alfandegas não são, a meu ver, simplesmente um elemento de protecção á industria nacional; são tambem um factor e o mais importante de receita para o thesouro; e não vejo que o estado tenha necessidade de ser prejudicado em quantia tão avultada, como me dizem que é a importancia dos direitos que deixarão de cobrar-se, se o projecto a que me estou referindo chegar a ser convertido em lei. (Apoiados.)

N'esta camara pende um projecto de lei apresentado no principio da sessão pelo sr. deputado Oliveira Martins, concedendo preferencia á industria nacional nos fornecimentos do estado, e estabelecendo outras disposições favoraveis á mesma industria, que me parece poderiam sem inconveniente ser traduzidas em lei; uma d'estas disposições é a que tende a fazer cessar por uma vez os favores especiaes que a cada passo e sob todos os pretextos, se concedem, em materia de dispensa de pagamento de direitos.

Eu não quero fatigar mais a attenção da camara, nem vale a pena por agora, visto que, só o projecto chegar a ser discutido, me reservo para ser mais extenso nas minhas considerações; alem de que, estou persuadido de que a minha voz encontrará echo n'esta casa e ha de ser secundada por outras mais eloquentes e auctorisadas que me auxiliarão na opposição que tenciono mover-lhe.

Por agora limito-me a mandar para a mesa a representação da associação industrial portugueza contra a approvação d'esta proposta de lei e a pedir a v. exa. que consulte a camará sobre se permitte que ella seja publicada na folha, official.

Antes de terminar devo dizer que a proposta de lei está affecta á commissão de fazenda para sobre ella dar parecer, e é muito rasoavel que vá áquella commissão, desde que a sua approvação affecta os interesses do thesouro; mas como me parece incontestavel, que da resolução que sobre o assumpto se tomar pôde sobrevir offensa aos interesses legitimos da industria nacional, creio que deveria ser ouvida a commissão de commercio e artes, que o a quem principalmente incumbe defender n'esta casa esses interesses.

Peço por consequencia a v. exa. que consulte tambem a camara sobre se permitte que a proposta, depois de obter parecer da commissão de fazenda, seja, enviada á commissão de commercio e artes, para sobre ella emittir tambem o seu parecer.

O sr. Presidente: - Consulto a camara sobre os requerimentos do sr. Alfredo Mendes da Silva.

Resolveu-se que a representação fosse publicada no Diario do governo, e que, fosse ouvida a commissão de commercio e artes sobre a proposta de lei.

O sr. Dantas Baracho: - V. exa. tem a bondade de me dizer se já consultou a camara, ou se reserva para mais tarde consultal-a sobre o requerimento que o sr. Alfredo Mendes da Silva fez para ser ouvida a commissão de commercio e artes sobre a proposta de lei a que s. exa. se referiu?

O sr. Presidente: - Já consultei a camara, e a camara approvou.

O Orador: - Muito bem. Estimo muito que a camará tomasse essa resolução, e não estimo menos que o sr. Alfredo Mendes viesse aqui denunciar ura facto tão importante como aquelle que s. exa. denunciou na representação que mandou para a mesa, e em que figuram tambem os nomes de mais tres srs. deputados da maioria e de dois dignos pares progressistas. (Apoiados.)

As rasões d'isto são obvias. Ainda ha dois dias o sr. presidente do conselho, tratando a opposição do impugnar a necessidade das sessões nocturnas, e dizendo que ellas serviriam apenas paca dar paragem a projectos que traziam sobrescriptos, s. exa. indignou-se por isso, e a opposioão prometteu-lhe que havia de ler os sobrescriptos á medida que esses projectos fossem apparecendo.

O projecto a que acaba de referir-se o illustre deputado e meu amigo o sr. Alfredo Mendes da Silva, tem um sobscripto bem caracteristico, porque tem por fim conceder um favor á nova companhia do gaz, em prejuizo da industria nacional e do thesouro publico. (Apoiados.)

Creio que o sobrescripto não pôde ser mais claro e mais explicito, como claro e explicito foi o acto de um deputado da maioria condemnar, como condemnou desde já, que se permittisse similhante attentado, reformando-se a pauta para, pouco depois, a emendarem em proveito de companhias poderosas e com prejuizo da industria nacional. (Apoiados.)

E um deputado da maioria que vem denunciar este facto e fazer um sobrescripto tão significativo, traçado em tão excellente cursivo, ao projecto apresentado antes de hontem pelo sr. presidente do conselho, projecto que, se fosse approvado, prejudicaria a fazenda publica em mais de 200:000$000 réis. É simplesmente inaudito. (Apoiados.) E deixando registados estes factos, que não podiam deixar de ficar registados, vou occupar-me de outro assumpto, para tratar do qual principalmente pedi a palavra.

Desejo perguntar á commissão de agricultura se tenciona com brevidade formular parecer relativamente aos projectos apresentados pelos srs. Estevão de Oliveira, Alfredo Brandão e D. José de Saldanha, e que satisfazem os louvaveis desejos da real associação de agricultura portugueza.

A opposição regeneradora já hontem accentuou bem a sua situação n'esta casa com respeito ás questões agricolas, em uma moção tendente a que essas questões tivessem a preferencia, visto que se vae fazer a violencia de haver sessões nocturnas. Mas isso não é sufficiente.

Tendo a maioria votado contra essa moção, é indispensavel que a commissão de agricultura, em cujo seio ha membros que votaram com a opposição regeneradora, é indispensavel, repito, que ella torne conhecida a sua norma de proceder, a fim de que a população agricola, que constituo a grande massa da população do paiz, saiba quem a protege nas suas legitimas aspirações e quem lhe faz guerra. (Apoiados.)

Não sei se está presente algum dos membros d'essa commissão; mas, se está, eu pedia-lhe respondesse á pergunta que acabo de formular, e rogo a v. exa. a fineza de me conceder novamente a palavra para depois fazer as considerações que entender convenientes.

Vozes: - Muito bem.

O sr. D José de Saldanha: - Sr. presidente, acabando o sr. deputado, o sr. Sebastião de Sousa Dantas Baracho, de se referir á commissão de agricultura d'esta camara, e dada a circumstancia de não estar presente o respectivo presidente, o sr. conselheiro Elvino José de Sousa e Brito, e de se achar na sala o secretario da mesma commissão, que sou eu, fui, pela força das circumstancias, levado a pedir ao illustre orador licença para o interromper, a fim de lhe explicar o que succede com os trabalhos d'essa commissão.

Na sessão do dia 22 do corrente mez insisti eu em descrever o modo por que correm os trabalhos das commissões, e pedi ao governo que, pelos meios ao seu alcance, fizesse dar andamento a certos e determinados projectos, que estão pendentes de algumas d'essas commissões.

Em relação aos que foram enviados á commissão de agricultura direi que ainda horitem verifiquei que se conservam na respectiva pasta, e acrescento que eu, na qualidade de secretario, o que posso fazer é conseguir que os papeia a meu cargo estejam em ordem e nada mais.

A convocação da commissão para trabalhar não está na minha alçada, e todos sabem que é ao seu presidente que, pela pratica seguida pelo regimento em vigor, compete re-

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guiar, de accordo com o governo, o procedimento da commissão.

O sr. Dantas Baracho: - Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que eu diga algumas palavras em resposta ao sr. D. José de Saldanha.

A camara resolveu que lhe fosse concedida a palavra.

O sr. Dantas Baracho: - Que factos tão extraordinarios!

Em seguida á declaração preciosa que fez o illustre deputado da maioria o sr. Alfredo Mendes da Silva, não são menos preciosas as declarações feitas pelo illustre deputado o sr. D. José de Saldanha, que eu respeito muito, e a cujo caracter honrado todos n'esta casa prestam homenagem. (Apoiados.)

O sr. D. José de Saldanha acaba de nos dizer com a sua voz auctorisada, e de mais a mais sendo como é deputado da maioria, que as commissões não trabalham porque o governo não quer, (Apoiados.) e que os projectos de caracter agricola, a que me referi quando usei a primeira vez da palavra, ficaram cuidadosamente guardados n'uma pasta, na secretaria da camara, em logar de terem sido enviados á respectiva commissão! (Apoiados.)

Eu desejo que estos factos fiquem registados. (Apoiados.)

O governo fez-se representar no congresso agricola, onde se espraiou em promessas as mais lisonjeiras, e embaraça agora no limite da sua acção, depois de não ter tido iniciativa de projectos d'esta natureza, os projectos que os representantes do congresso agricola apresentam ao parlamento! (Apoiados.)

Isto realmente é admiravel e extraordinario! (Apoiados.)

E não é menos extraordinario o facto que s. exa. citou de que, sendo secretario da commissão de agricultura, instando pela reunião d'ella, o presidente d'essa commissão.

(Interrupção do sr. D. José de Saldanha.)

É extraordinario, repito, que depois da indicação do s. exa., o presidente da commissão, que é um funccionario de confiança do governo, o director geral da agricultura, não empregasse os esforços ao seu alcance para que essa commissão se reunisse, esforços perfeitamente desnecessarios, por isso que, a commissão só esperava para se reunir o ser convocada pelo seu presidente, o que nunca se fez.

O sr. D. José de Saldanha: - Peço licença para novamente interromper a v. exa., porque o que eu disse foi que, em virtude do regimento em vigor n'esta camara e das praticas seguidas, aos presidentes das commissões compete regular, de accordo com o governo os trabalhos da mesmas commissões, e que n'esse caso está o presidente da commissão de agricultura, da qual sou secretario. Direi mais que uno os meus votos aos do illustre deputado, e meu amigo o sr. Sebastião de Sousa Dantas Baracho, para que o governo se empenhe em promover a remessa a esta camara dos pareceres sobre todos os projectos relativos á questão agricola.

O Orador: - Sr. presidente, creio ter caracterisado os factos extraordinarios que o illustre deputado o sr. D. José de Saldanha veiu revelar ao parlamento; e esses factos, que s. exa. tão generosamente e tão baldadamente procura agora desculpar, mostram o desinteresse com que o governo tem olhado para as questões agricolas. (Apoiados.)

Eu devo dizer a v. exa. e a camara que este desinteresse não tem echo no paiz, como vou proval-o. (Apoiados.)

Se eu hoje procurei obter as informações que solicitei, foi porque recebi um officio de uma camara municipal, apoiado pelos quarenta maiores contribuintes e pela commissão executiva da associação agricola local, e que pedia a minha intervenção n'este assumpto. Refiro-me a Torres Novas, que eu tive a honra de representar aqui durante duas legislaturas, e que é minha terra natal, não admirando por isto que eu advogue os interesses d'essa localidade, que são os da grande maioria da nação; (Apoiados.) alem de que, prendem-me a essa terra estreitos laços de estima e do reconhecimento, que eu não podia esquecer quando ella atravessa uma crise tão cruel e esmagadora como a que está atravessando, e de caracter exclusivamente agricola.

N'esse officio pediam-me para que eu instasse por todos os modos para que os projectos de lei apresentados pelos representantes da real associação de agricultura tivessem seguimento e fossem convertidos em leis do estado. (Apoiados.)

Dirigi-me, pois, á commissão e instei com ella n'esse sentido, como acaba de se ver; mas devo dizer que não estou satisfeito, como os meus constituintes o não podem tambem estar com as explicações que o illustre deputado o sr. D. José de Saldanha me deu. A despeito dos bons desejos de s. exa., o governo não tem attendido até hoje ás justas reclamações dos povos e esqueceu as suas mais solemnes promessas formuladas no congresso agricola. (Apoiados.)

Oxalá que este tão insolito quanto condemnavel procedimento não venha a produzir violentas represalias, que o governo parece empenhado era preparar, como preparou as do começo d'este anno, com as geenas de sangue que todos os homens de coração lastimaram. (Apoiados.)

Vozes: - Muito bem.

O sr. Franco Castello Branco: - Sr. presidente, antes de mandar para a mesa e fazer algumas considerações ácerca de uma representação que me é enviada de Guimarães, não posso deixar de referir-me ao incidente que acaba de renovar-se perante a camara, provocado por algumas palavras do meu amigo e collega o sr. Dantas Baracho, e pela resposta que lhe foi dada pelo tambem meu illustre amigo o sr. D. José de Saldanha.

Sr. presidente, v. exa. viu que eu tratei aqui hontem, conjunctamente com os distinctos deputados e meus prezados amigos, os srs. João Arrojo e Teixeira de Vasconcellos, da necessidade que ha para a camara e para o governo de se aproveitarem as poucas sessões que, porventura, ainda nos restam, para se discutirem de preferencia os assumptos agricolas. Até foi esse o objecto principal da minha moção, e nas considerações com que a acompanhei, frizei bem claramente que a solução da larga crise agricola, que está pesando sobre o paiz, não depende unicamente da resolução do problema dos cereaes, unico que o governo parece querer tratar na presente sessão. Outras questões existem, igualmente importantes e urgentes, que demandam o nosso cuidado e desvelo, tendo sido já apresentado por alguns deputados, membros da real associação de agricultura portugueza, diversos projectos de lei, que mais ou menos compendiam as conclusões votadas pelo congresso agricola. (Apoiados.)

Como muito bem disse o sr. Dantas Baracho, o governo pareceu ver com bons olhos o congresso agricola, e pelas vozes dos srs. ministros das obras publicas e da fazenda, e de alguns amigos politicos, apparentou o mais vivo interesse pelas queixas e reclamações dos lavradores.

O que succede, porém, agora? Como mostra o governo querer honrar essas promessas, feitas, não perante uma maioria de amigos politicos, sempre condescendentes e resignados, mas em face dos principaes representantes das diversas classes e regiões agricolas, no seio de um congresso, que marca um ponto notavel, por mais de um motivo, na nossa vida politica e social?

O sr. D. José de Saldanha acaba do nol-o dizer! (Apoiados.)

Pôde admittir-se, havemos de consentir que os projectos apresentados n'esta camara, por assim dizer em nome do congresso agricola, projectos firmados por nomes tão distinctos e honrados como são os dos srs. D. José de Saldanha, Alfredo Brandão e Estevão de Oliveira, dois de-

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putados da maioria e outro que não é hostil ao governo; havemos de consentir, repito, que esses projectos enviados á commissão de agricultura, ha mais de um mez, continuem dormindo na pasta em que os encerraram logo depois da sua apresentação? (Apoiados).

O governo não concorda com elles? Pois apresento outros; mas o que não pôde é mandar fechar as propostas apresentadas pelos deputados na pasta de uma commissão, que para maior aggravante é presidida por um delegado de confiança do governo, pelo director geral da repartição de agricultura, um dos burocratas de mais elevada categoria no ministerio das obras publicas.

O governo pôde responder a esta accusação, que ás commissões é que cumpre trabalhar; mas, depois das suas declarações no congresso, devia, por honra sua, instar com ellas a fim de se apressarem a dar parecer sobre esses projectos, como faz para os da sua iniciativa.

Repito, senão concorda com elles, apresente outros; mas o que não pôde ser de modo algum, é que se pretenda forçar a camara a discutir de dia e de noite, e que se queira fazer recair a sua attenção sobre assumptos que não merecem igual ponderação, e alguns dos quaes, veja v. exa. como isto vae caminhando os proprios deputados da maioria accusam de trazer sobrescripto! (Apoiados.)

Eu desejo que o sr. ministro das obras publicas, que vejo presente, nos diga por parte do governo, o que tenciona fazer; e s. exa. não se pôde negar a isso porque tomou compromissos ante o congresso agricola. O silencio não é resposta, e era questões d'esta natureza é necessario que cada um de nos assuma desassombradamente as suas responsabilidades.

E agora, sr. presidente, mando para a mesa uma representação de alguns caixeiros e empregados do commercio, da cidade de Guimarães, que vem perante a camara reclamar algumas alterações a lei do recrutamento, que o anno passado esta camara approvou, e hoje o lei do paiz.

Pretendem os peticionarios, que lhes sejam applicadas exactamente as mesmas beneficas disposições, que por aquella lei foram concedidas aos estudantes de qualquer curso superior, isto é, que lhes seja applicavel o adiamento durante o tempo da sua aprendizagem; e quando por acaso, findos os tres annos por que esse adiamento é permittido por lei, elles já estejam estabelecidos como commerciantes, se lhes conceda ainda o mesmo que se preceitua para os estudantes das escolas superiores depois de terminado o concurso; isto é, o nato irem fazer o serviço nas fileiras, mas unicamente ficarem sujeitos á taxa militar. (Apoiados.)

Acho de toda a justiça e perfeitamente justificada esta reclamação.

Eu sou dos que pensam, que o serviço militar obrigatorio, tal como foi creado no anno passado, para nada serve senão para incommodo de muitas classes sociaes, e principalmente para esta a que me estou referindo.

Nem teremos exercito mais bem organisado, nem mais numeroso, nem mais bem armado, garantindo melhor a defeza do paiz. Por outro lado vão ser prejudicados numerosos individuos, exactamente no periodo em que elles mais precisam da sua liberdade e de tempo, para se habilitarem aos diversos modos de vida e profissões a que se destinam.

O beneficio então concedido aos estudos superiores, é de todo o ponto iniquo.

Tão preciso é para a vida e economia do paiz haver bachareis e doutores, como negociantes, commerciantes e industriaes.

Estamos até fartos de ouvir que este paiz é um paiz de bachareis, como n'outro tempo se dizia que era um paiz de frades. (Apoiados.) E necessario que ao lado do consumidor, haja o productor, e para haver productor é necessario não impedir ou empecer a aprendizagem e desenvolvimento das classes commerciaes. É necessario não chamar para as fileiras os que áquellas se destinam, cortando-lhes a carreira exactamente na occasião do seu tirocinio e aprendizagem.

Não sei se o governo tenciona apresentar qualquer modificação á lei do recrutamento do anno passado, mas estou convencido que estas reclamações, umas que vem á camara, outras que apparecem dia a dia na imprensa, hão de leval-o, a este ou a outro governo, a modifical-a radicalmente.

Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que se publique a representação no Diario do governo.

Vozes: - Muito bem.

Consultada a camara permittiu-se a publicação.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - O illustre deputado que acabou de fallar, assim como o sr. Dantas Baracho, queixavam-se de que o governo não tenha ainda apresentado propostas de lei, relativamente á questão agricola.

Para responder a s. exas., basta-me lembrar-lhes que honteru á noite se reuniram as commissões de fazenda e de agricultura, a fim de discutirem uma proposta que principalmente interessa á questão agricola, a proposta relativa a cereaes.

D'isto se conclue que o governo, longe de descurar este assumpto, pelo contrario, trata de activar quanto posbivel, a resolução das commissões a respeito d'aquella providencia para que o parlamento possa tomar d'ella conhecimento e discutil-a ainda este anno.

É evidente que não possam ser discutidas n'uma só sessão legislativa todas as questões agricolas, como não podemos tambem considerar a discussão d'estes assumptos dependente unicamente da camara.

É necessario que as commissões dêem o seu parecer.

É menos exacto que se ponham de parte os projectos da iniciativa dos illustres deputados e que só se considerem as propostas do governo. O que succede é discutirem-se os projectos simultaneamente com as propostas de lei, como é praxe antiga n'esta casa.

Com respeito aos outros assumptos de que se occupou o congresso agricola, se a camara os não discutir, a culpa não será do governo, que já apresentou as suas propostas como tambem ,não tem sido da maioria. Estamos em fins de maio e não é de certo por falta de projectos que não tem havido mais sessões e que não se teem adiantado os trabalhos parlamentares.

Repito, o governo ha de empregar todos os esforços para que se discutam todas as questões agricolas n'esta sessão, não obstante estarmos já no fim de maio.

No entretanto, folgo de ver que o lado esquerdo da camara se empenha na resolução do problema que ao governo não merece menos consideração,

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Franco Castello Branco: - Peço a v. exa. consulte a camara sobre se permitte que eu faça algumas considerações em resposta ao illustre ministro das obras publicas.

Consultada a camara resolveu affirmativamente.

O sr. Franco Castello Branco: - Eu não tenho senão a admirar a habilidade com que o sr. ministro das obras publicas deixou de responder ás perguntas, que lhe fizemos, limitando-se a umas observações geraes que não podem satisfazer a ninguem.

Não sei a quem cabe a culpa do não termos discutido até agora mais projectos de lei; mas, se s. exa. quizesse recorrer á opinião dos cavalheiros que têem presidido a esta camara, veria que elles se queixam mais da maioria, que não comparece aqui á hora regimental, do que da opposição.

Mas deixemos isso; não quero fazer retaliações nem estar constantemente a repetir o que ainda hontem disse n'esta casa; o que ou pergunto ao sr. ministro das obras publicas c o que desejo saber é o seguinte:

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1794 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O governo apresentou unicamente uma proposta com relação á questão dos cereaes; mas muitos illustres deputados, que, em rasão da sua politica, não podem ser suspeitos ao governo, apresentaram seis ou sete projectos que não respeitam exclusivamente á questão dos cereaes, mas a diversos assumptos agricolas, e representam a summullados pedidos e das reclamações das differentes commissões em que se dividiu o congresso agricola.

Esses projetos estão ha mais de um mez nas commissões, e, segundo o que acabámos de ouvir ao sr. D. José de Saldanha, não só ainda não os discutiram, mas nem sequer os tiraram das pastas onde foram collocados.

Isto demonstra unicamente que o governo o que pretende é atravessar a sessão com o menor numero de difficuldades possivel, e, por isso, não quer saber de projectos que, não sendo de sua iniciativa, não representam uma conveniencia politica do gabinete.

Este ponto é que é necessario ferir, para que a responsabilidade vá a quem pertença, no que respeita a esses projectos que nem sequer foram ainda examinados pelas commissões, mostrando assim que nada se importam com elles.

Isto não pôde admittir-se. Não ha rasão para que já tenha parecer a proposta de Leixões e não haja a mais pequena, discussão nas commissões a respeito de outros projectos que, segundo penso, não estão incluidos na proposta apresentada pelo governo relativamente aos cereaes. O governo, nunca me cansarei de o dizer, não podia responder senão uma cousa, e é, se concordava ou não com as conclusões apresentadas n'esses projectos, os quaes continham as aspirações e desejos do congresso agricola mas ha um mez que elles foram apresentados e ainda até agora a commissao não se reuniu para os discutir, porque o governo não quer.

Se o governo não está perfeitamente de accordo com as conclusões d'esses projectos, podia mandar modificai os na sua commissão, ou então apresentar outros que representassem o seu pensamento a similhante respeito; mas esperar que a sessão se approxime do seu fim, não tomar em consideração esses projectos, que, alem da importancia que teem pelos nomes que os subscrevem, teem a importancia de representarem os votos do congresso agricola, e isto quando o governo ali se comprometteu mais ou menos a satisfazer os desejos do congresso, é procedimento que não se comprehende. (Apoiados.)

O sr. presidente do conselho está dando a entender n'este momento que é menos exacto ter o governo apresentado opinião definitiva no congresso; mas é certo que o governo affirmou ali que havia de occupar-se do assumpto e que tomaria uma resolução. (Apoiados.) E a verdade é que a não tomou ainda.

Não concorda o governo com as resoluções do congresso? Pôde apresentar outras, mas não fazer cousa alguma é que se não entende. (Apoiados.)

Convençam-se, porém, governo e maioria, que nos não largiimos mão do assumpto, emquanto o governo não adoptar uma attitude correcta.

E a este respeito direi, que me parece até que ha uma proposta do sr. ministro da fazenda que está proxima a naufragar.

V. exa., sr. presidente, lembra-se por certo do enthusiasmo com que o sr. ministro apresentou aqui a sua proposta de lei; recorda-se sem duvida da absoluta satisfação e do ar triumphante com que fez a sua leitura, e a da correspondencia trocada entre s. exa. e a associação real de agricultura portugueza, para esta assistir á experiencia da moagem de trigos nacionaes, a que se ia proceder. Pois já quasi se não falla n'essa experiencia, e até me consta que já não bastam as experiencias feitas em uma fabrica organisada á hungara, mas que c preciso fazer as experiencias sacerdotal ou sacristamente n'uma fabrica organisada á portugueza no Barreiro. (Riso.)

Ora, pelo que respeita á questão das moagens, eu não quero referir-me agora a esse ponto. Esperemos o resultado das experiencias. E quanto aos outros assumptos de que tratam os projectos apresentados pelo sr. D. José de Saldanha, é preciso saber se o governo os acceita ou repudia. Se os repudia, se os não julga convenientes, traga outros, e não faça só discutir medidas que o paiz não quer; não venha com propostas que hão de trazer como consequencia mais umas corretagens para alguns individuos.

Eu formulo a minha pergunta. Ha na commissão do agricultura propostas, e não me refiro ás propostas do governo, que interessam á agricultura; porque é que o governo não tem instado com o presidente d'essa commissão para que se reuna e resolva o assumpto?

Esta é que é a questão, e isto é que carece de resposta.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - As declarações que eu fiz ha pouco já aqui foram feitas pelo sr. ministro da fazenda em resposta do sr. D. José de Saldanha.

Folgo muito de ver o enthusiasino manifestado ultimamente pelos illustres deputados nas questões agricolas; mas, á boa paz e sem querer melindral-os, permittam-mo dizer-lhes que lastimo muito que não tivessem mostrado o mesmo enthusiasmo logo no principio da sessão.

O sr. Franco Castello Branco: - Pelo que me respeita, peço licença ao sr. ministro para lhe dizer, em primeiro logar, que eu discuti este assumpto quando no anno passado se tratou do projecto das pautas; e em segundo logar, que logo no começo d'esta sessão, e por mais de uma vez, me referi á questão dos cereaes, que na sessão anterior tivera apenas na pauta uma solução provisoria. E fallei sempre no sentido de desejar que o governo tomasse uma resolução definitiva sobre o assumpto.

Não foi, pois, hoje a primeira vez, como insinua o sr. ministro, que eu me referi a essa necessidade.

O Orador: - Folgo muito com essa declaração do illustre deputado, mas lastimo ao mesmo tempo que tivessem gasto dois mezes a discutir a importantissima questão das licenças, que já não existia, (Apoiados.) e que tenham tambem consumido sessões sobre sessões com a importantissima questão do modo de propor.

O governo está no firme proposito de se occupar da questão agricola, tanto quanto o permitta a estreiteza do tempo, que ainda assim não é excessivamente apertado. Nos não temos receio do calor. Havemos de tratar da questão dos cereaes e de outras questões agricolas, não todas, porque seria impossivel fazel-o n'uma sessão legislativa, ainda que estivéssemos aqui desde o principio de janeiro até ao dia 31 de dezembro, mas as principaes. (Apoiados.)

O illustre deputado já fez um vaticinio funebre sobre a sorte do projecto dos cereaes; mas eu conto que elle não se realisará.

O governo deseja levar a luz a todos os espiritos. Deseja discutir a sua propria proposta, em confronto com os projectos dos illustres deputados que com ellas têem relação, e n'isto dá uma prova bem clara e evidente do seu desejo sincero de acertar e resolver uma questão que tão altamente interessa á agricultura. (Apoiados.)

Já apresentou tambem a proposta de lei dos alcoois, que, a meu ver, ainda interessa mais á agricultura do que a dos cereaes; (Apoiados.) e alem d'estes, ainda ha de apresentar outros, empregando ao mesmo tempo todos os seus esforços para que sejam discutidos. Se não o forem, ha de içar bem claro que a responsabilidade não é d'este lado da camara. (Apoiados.) Sobre este ponto liquidaremos no fim a responsabilidade; fique s. exa. tranquillo a esse respeito.

Repito, o governo ha de apresentar mais projectos, e, se até agora não tem apressado os trabalhos das commissões, é porque não tem havido urgencia, visto que a camara tem estado occupada com outros trabalhos parlamentares. (Vo-

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SESSÃO DE 30 DE MAIO DE 1888 1795

zes: - Muito bem.) Por mais pressa que o illustre deputado tenha, creia que a nào tem maior do que o governo e a commissão de agricultura. (Apoiados.)

Folgo, portanto, muito com os desejos de s. exa., que são tambem os d'este lado da camara e o governo ha de aproveital-os com a máxima boa vontade para se chegar a resultados proveitosos. (Apoiados.)

Vozes: - Muito bem.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Villaça: - Mando para a mesa um parecer da commissão de guerra sobre o projecto de lei que torna extensivas aos empregados da administração militar as disposições do alvará de 16 de dezembro de 1790.

Mando tambem dois projectos de lei, um determinando que os officiaes da bibliotheca da academia real das sciencias de Lisboa, que, na data d'esta lei, tiverem mais de 25 annos de serviço feito na bibliotheca sejam considerados como conservadores d'ella; e outro, regulando a promoção dos engenheiros militares e dos officiaes do exercito, que entrarem na classificação do corpo de engenheiros do ministerio das obras publicas.

Mando juntamente para a mesa uma proposta para renovação de iniciativa do projecto de lei apresentado na sessão de 14 de março de 1880, tornando extensivas aos pharmaceuticos militares as disposições da lei de 28 de maio de 1883, relativas ás honras, privilegios e recompensas honorificas concedidas aos pharmaceuticos navaes.

Mando finalmente um requerimento de Francisco de Albuquerque de Mello Pereira e Caceres, aspirante a engenheiro naval, e uma representação dos serventes do ministerio das obras publicas, pedindo todos augmento de vencimento. Peço a v. exa. que de a estes documentos o conveniente destino.

O parecer foi a imprimir, os projectos de lei e a renovação de iniciativa ficaram para segunda leitura, o requerimento e representação tiveram o destino indicado a pag. 1790.

O sr. Consiglieri Pedroso: - Pedi a palavra para um negocio urgente, que vou expor á camara em breves termos, e ainda para outro assumpto:

O negocio urgente é o seguinte.

Na sessão de hontem foi apresentada pelo sr. ministro fazenda uma proposta de lei com respeito ao novo direito que vem tributar o alcool.

Parece me que, a exemplo do que se tem feito em casos analogos, para salvaguardar os interesses do thesouro, se deve apresentar sem demora uma proposta de lei que mande cobrar, provisoriamente, os direitos correspondentes aos que são estabelecidos pela proposta a que me refiro.

V. exa. vê que a urgencia se impõe pela sua propria natureza, visto como da demora da approvação d'esta proposta podem resultar gravissimos prejuizos para o thesouro.

O segundo assumpto diz respeito ao sr. presidente do conselho.

Acabo de receber do Porto um telegramma em que se me diz que o reitor do lyceu do Porto prohibiu os estudantes de fazerem manifestações no comicio que ha de ter logar contra a propaganda jesuitica.

Desejo ser informado pelo sr. presidente do conselho se é verdadeira esta noticia; se este telegramma tem fundamento.

Aguardo a resposta de s. exa. e se as suas explicações não me satisfizerem, peço desde já que seja consultada a camará sobre se permitte responder a s. exa.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Quero apenas declarar ao illustre deputado que conto poder ainda hoje satisfazer aos desejos de s. exa.

A importancia d'este assumpto não é certamente a mesma que se dava em relação aos cereaes. Hoje quasi qne não ha importação de alcool; entretanto, repito, conto ainda hoje satisfazer aos seus desejos, pondo na proposta de lei a data de hontem.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Luciano de Castro): - Não tenho conhecimento do facto a que s. exa. alludiu. Hoje mesmo vou mandar perguntar ao sr. reitor do lyceu do Porto, que é um cavalheiro honradissimo, se deu a ordem a que v. exa. se referiu, e se havia motivo para a dar só depois de ouvir a resposta de s. exa. é que hei de apreciar o procedimento d'aquelle funccionario, que é, como disse e repito, um dos mais dignos professores do lyceu d'aquella cidade.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Alfredo Pereira: - Mando para a mesa uma representação dos escrivães dos juizes de direito da comarca de Penafiel, pedindo que não seja eliminado o § 2.° do artigo 79.° do projecto da reforma judicial.

Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que esta representação seja publicada no Diario do governo.

Foi auctorisada e teve o destino indicado a pag. 1790.

O sr. Fuschini: - A hora vae muito adiantada, e por isso vou restringir as minhas observações. Provavelmente, porém, não as poderei terminar e ouvir resposta do sr. ministro ainda n'esta sessão.

Pelas portarias de 18 de novembro de 1885 e 28 de junho de 1886 foi nomeada uma commissão para estudar e consultar sobre varias reclamações, dirigidas ao governo, pela companhia das aguas ao governo.

O longo relatorio d'esta commissão vem assignado pelos seguintes nomes: Serpa Pimentel, Jayme Larcher, José Maria Borges, Candido de Moraes, Fernando Palha, Ressano Garcia e Moraes Carvalho.

Procurarei succintamente desenvolver o parecer d'esta commissão e expor as suas opiniões e conclusões.

A companhia das aguas reclamou perante o governo:

1.° Por indemnisação, em virtude de não se ter decretado a canalisação obrigatoria no praso determinado pelo contrato;

2.° Pela necessidade de obras complementares. Affirma a companhia ter necessidade de um grande reservatorio, que não deve ser construido só a expendas d'ella, devendo-o ser por conta do governo, ou pelo menos, de accordo entre a companhia e o governo;

3.° Pelo excesso de consumo das aguas gratuitas para os usos municipaes.

Não quero cansar a attenção da camara, e portanto vou succintamente occupar-me d'estes pontos, para deixar bem claramente expressa a minha opinião, as opiniões da commissão, e depois pedir a opinião do governo, especialmente do sr. ministro das obras publicas.

Em relação ao primeiro ponto, repito, a companhia pediu indemnisação, pela demora que houve em decretar a canalisação obrigatoria.

A resposta que a commissão dá a este pedido, é a que passo a ler á camara:

"Na presença dos factos julgados no accordão e dos textos de direito citados, parece á commissao que não é de vida á companhia a indemnisação que pede, ou seja porque o governo suspendendo o regulamento o fez por caso de força maior e fortuito, qual foi a violenta opposição que se levantou na cidade contra a sua execução, e assim está isento da prestação da indemnisação pelo disposto no artigo 705.° do codigo civil, ou seja porque a companhia, em logar de exigir judicialmente que o governo cumprisse aquillo a que se obrigara ou que a indemnisasse das perdas e damnos, optou pelo meio de ter-se como desobrigada também de cumprir o contrato, suspendendo as obras do canal, conformo o disposto no artigo 709.º do mesmo codigo, no qual se distinguem os tres alvitres que um dos contrahentes tem a seguir contra aquelle que falta ao cumprimento do contrato, alvitres que reciprocamente se excluem entre si, como se vê do disposto no § 1.° do artigo 676.° do codigo.

"Demais, ainda quando se suppozesse por hypothese que a companhia tinha direito a pedir a indemnisação de per-

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1796 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

das e damnos, como estes, secundo o disposto no citado artigo 706 ° do codigo, consistem nos lucros que ella teria tirado da execução do regulamento, seria mister provar no processo competente quaes eram esses lucros, para que o governo podesse ser obrigado a pagal-os. E, n'esta hypothese, teria o governo, com igual fundamento, o direito de exigir que a companhia pagasse, alem das despezas feitas pelo estado com a introducção das aguas do Bellas para acudir á escassez de agua em Lisboa, todos os prejuízos que a cidade soffreu com a demora na construcção do canal que, devendo, como foi julgado pelo tribunal estar concluído em 9 de fevereiro de 1876, so se inaugurou em 3 de outubro de 1880."

Vê a camara que o primeiro pedido, é julgado improcedente pela commissão liquidataria nomeada por este proprio governo.

Passemos agora á segunda parte, relativa a saber-se, se a companhia tem ou não dever de construir o grande reservatorio a expensas suas, ou se tem direito a exigir o auxilio do governo.

A commissão diz o seguinte:

"Desde então a companhia, sem deixar de reconhecer que essa obra é de absoluta necessidade para o regular abastecimento de Lisboa e de alta conveniência para os interesses da empreza, pretende, todavia, que deve ser feita á custa e por conta do estado.

"Parece á commissão que esta pretensão da companhia não tem fundamento jurídico a seu favor.

"Quem se propõe obter um fim emprega para isso os meios adequados, e, se o fim da companhia foi auferir lucros, é a ella que incumbe procurar os meios de augmentar a sua receita.

"Demais a companhia, pela condição 1.ª do seu contrato, obrigou se a abastecer de agua a cidade de Lisboa, á minha custa, por sua conta e risco, e para tal effeito e mister proceder a todas as obras indispensaveis para garantir esse abastecimento. D'onde é forçoso concluir que a obra do reservatorio, necessaria e essencial para o fornecimento regular da agua, o virtualmente uma obrigação do contrato por parte da companhia.

"E de passagem observará a commissão que não é só ao referido reservatorio que a companhia está virtualmente obrigada, senão também a todas aã obras complementares que se reconhecerem necessárias para satisfazer ao abastecimento de agua em toda a cidade, ou seja pelo augmento de população cm qualquer zona da capital, ou seja pela abertura de novas ruas e creação de novos bairros, ou seja finalmente pelo alargamento da arca do município, hypothese prevista no § 2.° da citada condição 1.º do contrato".

Logo, a commissão nomeada por este ministerio, nas suas rasões tanto em relação ao primeiro pedido de indemnisação, como a respeito do segundo, diz que não ha motivo justiçado, ou rasão legal para serem concedidas.

Resta o terceiro fundamento, que é o mais importante de todos.

É sabido que o contrato em vigor, feito com a companhia das aguas, diz o seguinte:

"11.º De toda a agua, que a empreza tiver sob sua administração, conforme a condição precedente, pertencerá um terço ao governo c dois terços á empreza.

"§ 1.° O governo poderá dispor da agua, que lhe pertence, em qualquer parte dos encanamentos, dentro ou fora de Lisboa; mas não poderá, applical-a senão gratuitamente e a usos publicos ou municipaes."

Ora, sr. presidente, n'este ponto a companhia das aguas, a fim de pedir indemnisação ao governo, funda-se em que a agua para os usos municipaes, excede o terço de que pôde dispor o governo (ou o município) segundo a letra do contrato.

Quer acamara ver como a isto responde a commissão nomeada pelo governo?

Em primeiro logar devo dizer á camara, que a companhia das aguas pela sua incuria, pelas difficuldades com que luctava (com as quaes nada temos porque só a companhia se organisou para explorar este ramo do industria sujeitou-se a ganhar ou a perder) ou porque fosse, no anno de 1882 ou 1S83, não me recordo bem, em qual d'elles foi, ou talvez mesmo autos, deixou chegar em Lisboa a escassez de agua a tal ponto, que o governo de então viu-se obrigado a mandar proceder a novas explorações de aguas em Bellas, aguas que foram introduzidas na canalização da companhia para abastecer a cidade de Lisboa.

Estas aguas são conhecidas pela designação de - aguas de Bellas.

O governo não podia ter feito isto, em vista do contrato da companhia; mas esta consentiu, porque não podia, de forma alguma, pela sua parte, garantir as necessidades do consumo. Com esta acquisição de aguas gastou o paiz 300:000$000 ou 400:000$000 réis.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - Andou por perto de 500:000$000 réis.

O Orador: - Diz-me o sr. ministro que a despeza com a exploração d'essas aguas andou por perto de 500:000$000 réis. Seja.

Em resultado d'esta exploração obteve o governo certa quantidade de agua, quantidade importante, que entregou á companhia e que ella usufrue ha seis ou sete annos.

O processo da companhia para fundar a sua reclamação foi simples. Diminuiu, quanto possível, o volume de agua de que podia dispor, e depois, calculando o consumo municipal, augmentou-o quanto póde. É evidente, que o resultado devia ser diminuir o terço gratuito, augmentando o excesso de consumo municipal sobre que devia recair a indemnisação.

Sem entrar agora por forma alguma em desenvolvimentos de algarismos, porque este relatorio está publicado e se interessar por este assumpto, póde, querendo, lel-o, vou comtudo citar alguns pequenos trechos mais importantes.

O relatorio acerca da quantidade de agua, que a companhia tem á sua disposição diz o seguinte:

"Assim, pois, a companhia está largamente habilitada a trazer a Lisboa toda a agua do Alviella na estiagem, e ha de trazel-a e aproveital-a, por seu interesse proprio, sempre e logo que o consumo o exija; mas, entretanto, pretende, em contrario do que dispõe expressamente a condição 11.ª do contrato, limitar a 10.000 metros cubicos, como antes fixara em 6:666, o terço gratuito do governo só porque nas memorias descriptivas fallou cm aproveitar apenas 30:000 metros cubicos do Alviella, como se as memorias descriptivas, aliás, em desaccordo n'este ponto com os proprios projectos, bastassem para derogar as clausulas de um contrato bilateral, approvado por lei."

Segue depois um quadro, comparando os terços calculados pela companhia com os terços calculados pela commissão, havendo uma differença de milhares e milhares de metros.

[Ver tabela na imagem]

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Quer dizer, admittido para o consumo municipal os calculos da companhia, e adoptando, não o terço calculado pela companhia, mas o fixado pela commissão, o excesso de consumo diminuia logo em mais de 50 por cento.

Mas diz a commissão, e muito bem, a forma por que a companhia calcula o consumo é perfeitamente conta de gran capitão. E depois de differentes considerações, depois de muito lucidamente desenvolver os seus calculos, concluo pela forma que vou ler e para que peço a attenção do sr. ministro das obras publicas:

"Portanto, ainda que juntássemos estes numeros aos que já vimos representarem todos os outros consumos publicos e municipaes, ainda que contássemos com um abundante volume de agua para as descargas que a companhia tem feito ás vezes n'alguns, mas poucos, pontos da canalisação, nunca attingiriamos numeros que se approximassem do proprio terço gratuito calculado pela companhia e muito menos do terço apurado pela commissão.

"O excesso do consumo provém manifestamente das avenças sem contador, e por isso a commissão é de parecer que, emquanto ellas subsistirem, não deve o governo reconhecer como excedido o consumo do terço que lhe pertence.

"Querendo, porém, a companhia acabar com o systema das avenças sem contador, poder-se-ha, no entender da commissão, calcular para o futuro o consumo publico e municipal, deduzindo da agua que entrar em Lisboa, liquida da rasoavel percentagem para perdas e fugas, a quantidade que for medida pelos contadores, como gasta em consumos particulares, devendo, porém, a medição ser feita pelo fiscal do governo c os contadores ser atteridos pelo governo ou pela camara municipal.

"A quantidade de agua que se mostrar gasta no primeiro anuo em que esse consumo for calculado nos termos indicados, poderá servir de base para se computar se houve ou não excesso de consumo dos annos anteriores, tendo-se em attenção as differenças resultantes dos elementos que podem affectar esse consumo para mais ou para menos como são o numero de incendios, de horas de rega á lança ou em carros de pipa, descargas nos canos e outros."

Isto é, em relação ao terceiro pedido, diz clara e perceptivamente a commissão que não ha excesso de consumo sobre o terço gratuito e portanto não existe direito algum a indemnisação.

Se adoptássemos os calculos da companhia, perfeitamente contestados por este relatorio, positivo, bem feito, a que se responde apenas com uma casuistica jurídica quasi... não digo a phrase, porque não se pronuncia no parlamento, chegariamos a que a camara municipal ou o governo teriam de pagar á companhia das aguas:

1883 ..... 669:785 metros cubicos
1884 ..... 1:246:721 " "
1885 ..... 2.336:409 " "
1886 ..... 2.632:963 " "
1887 ..... 3:100:440 " "

Calcule v. exa., sr. presidente, que o excesso de consumo pago, não sei com que fundamento, á companhia, por 100 réis o metro cubico, orçaria, na media, por réis 200:000$000 por anno! Ora, realmente, nomear o governo uma commissão numerosa e auctorisada (li os nomes dos membros d'ella, de proposito para mostrar que estavam representados todos os partidos, e sobretudo reunidas muitas competencias indiscutíveis) manifestar esta commissão opiniões tão claras e definidas e o governo depois de tudo isto conceder-lhe qualquer subsidio, parecer-me-ha extraordinario!

Posta a questão n'estes termos, a companhia aproveitou do relatorio da commissão unicamente o que lhe conveiu, e publicou um novo regulamento sobre as avenças.

Este regulamento, cffectivamente, não é illegal, porque a companhia estava no seu pleno direito de o publicar, firmando-se no seu contrato, se este está bem ou mal feito, não é para ser discutido agora; todavia, se o regulamento não é illegal, é sophistico, e foi inventado de proposito para explorar o consumidor, a camara municipal ou o governo e o publico.

O que dizia a commissão? Mandava sujeitar todo o consumo particular a marcação do contador; por esta fórma determinar-se-ia o volume total do consumo particular, e lixado, que fosse, o volume de agua de que dispõe a companhia, por differença se obteria o consumo da camara. Se este consumo fosse igual ou inferior ao terço do volume disponivel não haveria excesso de consumo; se for superior havel-a ha, e por esta rasão direito da companhia a ser indemnisada por este excesso.

Mas o que fez a companhia? É n'este ponto estão a habilidade e a artimanha.

Sujeitou todo o consumo particular, mesmo o dos avençados, á marcação do contador, mas estabelecendo n'este ultimo caso um mínimo de consumo.

Não contesto de forma alguma á companhia o direito de fazer regulamentos d'esta ordem, visto que o contrato os auctorisa, (contrato sobre o qual ha muito que dizer, mas que emfim é contrato) o que não posso, porém, deixar de notar, é esta finura, que mais tarde nos ha de necessariamente fazer cair em erro, se adoptarmos similhante systema para base de qualquer liquidação do excesso de consumo, c, portanto, de fixação de indemnisação.

Repito o raciocínio: se cada, avençado tivesse o seu contador, pagando a agua a 200 réis até 200 metros, a 180 réis de 200 a 400 metros, a 160 réis de 400 a 600 metros, etc., obtinha-se com certeza o volume total da agua consumida; mas não se praticará assim, cada avençado com contador, tem obrigação de pagar ura certo mínimo de consumo. Este é que vae para os recibos, e medições da companhia, e mais tarde ella virá argumentar com o volume mínimo de cada avençado, que póde ter sido consumido ou não.

Nunca gostei de luctar com as grandes companhias.

Em primeiro logar reconheço que uma grande companhia é uma roda essencial no mechanismo financeiro de um paiz, uma fracção da sua riqueza; não se esmaga, pois, um tal elemento, sem mais ou menos directamente ferir a riqueza publica.

Conheço sufficientemente as sciencias economicas para saber que os factores de riquezas se concatenam formando uni todo, uma força unica.

Em segundo logar, não gosto de entrar em lucta com as grandes companhias, porque acho luctar com os fortes e com os poderosos.

Mas também exactamente porque sei que uma grande companhia é um orgão no mechanismo financeiro de um paiz, quero reduzil-o a funccionar regularmente, a ser um productor de riquezas e não um explorador.

Na cidade do Lisboa ha duas companhias que estavam e estão habituadas a ser déspotas, e ambas por meios e motivos differentes chegavam ao mesmo fim.

Uma d'ellas é a poderosa companhia do gaz, que offerecia dividendos de 22 e 25 por cento; a outra é a quasi anemica companhia das aguas, que não dá dividendos, mas que chega ao mesmo resultado a titulo da gratidão publica.

Emquanto á companhia do gaz, a camará municipal de Lisboa, e bem haja ella, reduziu-a á obediência, fel-a entrar nos devidos limites economicos e sociaes.

Segundo imagino não lhe valerão habilidades. Ha de entrar no bom regimen nas suas relações com a camará municipal e com os consumidores, não dará dividendos de 22 e 25 por cento, pois é possível fundar em Lisboa uma nova companhia que dê gaz mais barato ao município e aos consumidores, contentando-se em troca com menos elevados dividendos.

Este negocio está bem encaminhado. Resta o das aguas, que interessa ao município de Lisboa por dois lados; porque elle carece de agua para variados serviços municipaes,

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1798 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

para muitas necessidades da civilisação moderna; porque o deve proporcionar aos consumidores, como uma das primeiras necessidades da vida; emfim a companhia também representa legítimos interesses de particulares, isto o, dos seus accionistas. Na boa harmonia d'estes tres interesses está a resolução completa do problema.

Nilo quero, pois, sacrificar a companhia unicamente aos interesses geraes do município e dos consumidores; não quero também sacrificar os consumidores e a camara aos interesses da companhia, isto é, dos accionistas.

Em virtude pois d'este relatorio, das considerações que acabo de expor e das que farei porventura amanhã, visto que já passou a hora de se entrar na ordem do dia, desejo saber o que pensa e tem feito acerca d'este assumpto o sr. ministro das obras publicas e o governo.

Pretendo conhecer as actos do governo e o seu plano geral de administração, que n'este caso não pôde ser questão diplomática e confidencial; não é a questão do Zambeze.

É importante esclarecer o que se tem feito; v. exa. sabe que, cm virtude do contrato com a companhia, quando se suscitarem questões, que não sejam propriamente technicas, serão resolvidas por um tribunal arbitral.

Já foi sujeita esta questão de indemnisações ao tribunal arbitral?

Foi concedido á companhia algum subsidio pecuniario? Quaes foram as rasões e fundamentos da concessão?

Qual é o plano de administração, que o governo traçou acerca do fornecimento da agua em Lisboa?

São as respostas que aguardo do governo, especialmente do sr. ministro das obras publicas.

Quando intervenho nas discussões, que se dão no parlamento, nem involuntariamente desejo fazer obstruccionismo; como já deu a hora de se passar á ordem do dia, se v. exa. e o sr. ministro assim o entenderem, guardaremos o final da discussão para sexta feira. Se s. exa. quizer responder, com o melhor prazer o ouvirei, reservando-me para responder o que tiver por conveniente, depois da exposição do sr. ministro das obras publicas.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - Se o illustre deputado quizer, responderei na sexta feira, antes da ordem do dia, visto já ter dado a hora.

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Mando para a mesa uma proposta de lei, fixando provisoriamente, para os alcoois, os direitos indicados na proposta que tive a honra de apresentar hontem; e pedia a v. ex. que consultasse acamara sobre se permitte que a commissão de fazenda possa reunir-se durante a sessão para dar parecer sobre esta proposta. Leu-se na mesa.

É a seguinte:

Proposta de lei n.° 57-K

Senhores.- Em proposta de lei apresentada hontem n'esta camara, submette-se ao exame parlamentar uma nova tarifa augmentando os direitos de importação sobre os artigos 217.° (alcool e aguardente em cascos ou garrafões), e 278.° (alcool e aguardente em outras vasilhas e bebidas alcoolicas não especificadas). Embora actualmente não exista importação d'estes generos em quantidade de alguma importancia, c conveniente acautelar todos os interesses, sujeitando, desde já, aquelles líquidos provisoriamente aos novos direitos.

N'estes termos tenho a honra de submetter á vossa elevada consideração a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° A aguardente e alcool em cascos ou garrafões (artigo 217.° da pauta), e estes mesmos líquidos que vierem em garrafas, botijas ou vasos similhantes, bem como as bebidas alcoolicas não especificadas (artigo 218.° da pauta), que no dia 29 de maio de 1888 não estiverem nos portos portuguezes, ou em viagem directa dos paizes productores para os mesmos portos, pagarão, provisoria e respectivamente, os primeiros o direito de 1$500 réis por decalitro de alcool puro e os segundos o de 1$900 réis por decalitro de liquido.

§ 1.° A differença entre os direitos acima fixados e os actuaes, marcados na pauta geral das alfandegas, será considerada como em deposito até resolução das côrtes, a fim de entrar na receita publica, ou ser restituída, no todo ou em parte, aos interessados.

§ 2.° No caso de que as côrtes, na actual sessão legislativa, não tornarem resolução definitiva sobre a proposta de lei de 28 de maio, as disposições da presente lei caducam para todos os effeitos, fazendo-se a restituição integral dos depositos effectuados.

§ 3.° As disposições d'esta lei começarão a executar-se no dia da sua publicação no Diario do governo.

Art. 2.° Fica revogada a legislação contraria a esta.

Ministerio dos negocios da fazenda, 30 de maio de 1888.= Marianno Cyrillo de Carvalho.

Consultada acamara sobre a dispensa do regimento para se reunir a commissão de fazenda, resolveu-se affirmativamente.

PRIMEIRA PARTE DA ORDEM DO DIA

Eleição dos vogaes effectivos e substitutos dos conselhos de administração e flscal, da administração dos tabacos

O sr. Presidente: - Vae proceder-se á eleição simultanea dos vogaes effectivos e substitutos do conselho de administração da régie.

Convido os sr. deputados a formularem as suas listas.

Feita a chamada e corrido o escrutínio, verificou-se terem entrado na urna 64 listas para vogal effectivo, sendo 3 brancas e 3 inutilisadas e saiu eleito o sr.:

Antonio Centeno, com...... 58 votos

Para vogal substituto entraram na urna 63 listas, sendo 4 brancas e 6 inutilisadas e saiu eleito o sr.:

Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, com..... 53 votos

O sr. Presidente: - Segue-se a eleição simultanea dos vogaes effectivo e substituto do conselho fiscal.

Convido os srs. deputados a formularem aã suas listas.

Feita a chamada e corrido o escrutínio, verificou-te terem entrado na urna 58 listas para vogal effectivo, sendo 6 brancas e saiu eleito o sr.:

Vicente Rodrigo Monteiro, com....... 50 votos

Obtiveram votos os srs.:

Antonio Maria D. Pereira Chaves Maziotti, com ...... 1 voto
José Augusto de Almeida Ferreira Gralvão, com ... .. 1 "

Para vogal substituto entraram na urda 58 listas, sendo 7 brancas e saiu eleito o sr.:

Antonio M. Dias Pereira Chaves Mazziotti, com..... 51 votos

Foram escrutinadores:

No primeiro escrutínio os srs. Eça de Azevedo e Helioãoro da Veiga.

No segundo escrutínio os srs. Almeida e Brito e Simões dos Reis.

O sr. Carrilho: - Mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda sobre a proposta do governo n.° 57-K,

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SESSÃO DE 30 DE MAIO DE 1888 1799

apresentada n'esta sessão e que tem por Hm acautelar os interesses da fazenda, evitando despachos aritecipados de alcoois cujos direitos de importação são angmentados por outra proposta de lei.

Requeiro que se dispense o regimento para entrar desde já em discussão, em vista da sua importancia e urgencia.

Consultada acamara sobre este requerimento, decidiu affirmativamente.

O sr. Presidente: - Vae ler-se o parecer que mandou para a mesa o sr. relator da commissão de fazenda.

Leu-se na mesa.

É o seguinte:

PARECER

Senhores. - Á vossa commissão de fazenda foi presente a proposta de lei do governo n.° 57-K datada do hoje, tendente a acautelar os interesses da fazenda, evitando despachos antecipados de alcoois e aguardentes cujos direitos de importação são augmentados pela mesma proposta;

E considerando que é indispensável a promulgação da providencia de que se trata, entende que a mesma proposta deve ser convertida no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º A aguardente e alcool em cascos ou garrafões (artigo 217.° da pauta), e estes mesmos liquidou que vierem em garrafas, botijas ou vasos similhantes, bem como as bebidas alcoolicas não especificadas (artigo 218.° da pauta), que no dia 29 de maio de 1888 não estiverem nos portos portuguezes, ou em viagem directa dos paizes productores para os mesmos portos, pagarão, provisoria e respectivamente, os primeiros o direito de 1$500 réis por decalitro de alcool puro e os segundos o de 1$900 réis por decalitro de liquido.

§ 1.° A differença entre os direitos acima fixados e os actuaes, marcados na pauta geral das alfandegas, será considerada como em deposito até resolução das cortes, a fim de entrar na receita publica, ou ser restituída, no todo ou em parte, aos interessados.

§ 2.º No caso de que as cortes, na actual sessão legis lativa, não tomarem resolução definitiva sobre a proposta de lei de 28 de maio, as disposições da presente lei caducam para todos os effeitos, fazendo-se a restituição integral dos depositos effectuados.

§ 3.° As disposições d'esta lei começarão a executar-se no dia da sua publicação no Diario do governo.

Art. 2.° Fica revogada a legislação contraria a esta.

Sala da commissão de fazenda, aos 30 de maio de 1888.= A. Pereira = Antonio Eduardo Villaça = Carlos Lobo d'Ávila = A. Baptista de Sousa = José Maria dos Santos = A. Carrilho, relator.- Tem voto dos srs.: Marianno Prezado e Ramires.

O sr. Ferreira de Almeida: - Peço a v. exa. que mande verificar se. na sala ha numero para se poder votar.

O sr. Presidente: - Vae verificar-se.

Feita a contagem verificou-se que estavam na sala 60 srs. deputados.

O sr. Consiglieri Pedroso: - Pediu a palavra porque queria fazer algumas considerações acerca do parecer e projecto que se discutem.

O governo, pela proposta que apresentou, propunha que se cobrasse o direito de l $500 réis por decalitro de álcool puro que fosse importado, más ficava sem direito, ato que a lei actual fosso votada, o álcool produzido no paiz.

Sabia quê leis iguaes á de que se tratava, se hão referido somente aos direito cobradas nas alfândegas; mas seria equitativo para o thesouro, no momento em que se iam tributar os álcoois estrangeiros, consentir que ficassem sem ser tributados os álcoois nacionaes?

Não sabia qual era a capacidade productos de todas as fabricas de alcool no paiz, nem de cada uma d'ellas em particular, mas parecia-lhe que o estado podia perder, por isso que essas fabricas, no intervallo que ia até á approvação do projecto que lançava o imposto, podiam ir forçar a sua producção, e tirar ao thesouro os redditos que a competiam.

Parecia-lhe, pois, que, não se acautelando as cousas devidamente, podia haver perda para o thesouro.

(O discurso será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, se o orador o restituir.)

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - O assumpto sobre que o illustre deputado fallou, é importante em doutrina, mas na hypothese não tem importancia alguma. E não a tem porque a importação dos alcoois estrangeiros hoje é quasi nulla. Basta saber se que n'um anno inteiro, a receita proveniente do respectivo imposto andou por 13:000$000 ou 14:000$000 réis.

Não se favorecem, nem desfavorecem as fabricas nacionaes com uma tributação mais elevada, quando a importação do genero que ellas produzem é nulla.

O que poderia haver, visto que se levantava o direito de importação, era a tentação de importar alcool estrangeiro no intervallo esperando o direito novo; (Apoiados) mas para isso é que se fez a proposta que está em discussão. (Apoiados.)

Se se fizesse o que pretende o illustre deputado, daria isso logar a grandes transtornos e injustiças.

Seria introduzir na legislação um principio novo o tributar-se a industria nacional a proposito de qualquer projecto que o ministro apresentasse á camara tributando a industria internacional.

Seria até injusto; mas ainda que o não fosse, seria impossível dar prompto cumprimento a similhante lei.

Pois como queria s. exa. que, no pouco tempo que vae ato ao encerramento da camara, quê não digo que seja d'aqui a dois ou tres dias, mas que será d'aqui a duas semanas ou um mez, fizesse o regulamento para a fiscalisação e estabelecesse essa fiscalisação? (Apoiados.)

Era impossivel.

Pelo que respeita á hypothese de poderem as fabricai forçar desde já a sua producção, não me parece tambem que tenha fundamento.

E se não vejamos. O que distillam as fabricas? Distillam batata doce das ilhas.

Mas a epocha da sua colheita e distillação já passou.

É sabido que antes de outubro ou novembro não se póde começar a distillação da batata doce.

Tambem distillam o vinho; mas a colheita d'este genero tambem já lá vae ha muito tempo.

Resta o milho; mas como este está tributado com 16 réis por kilogramma, o que equivale a 48 réis em litro da alcool, é claro que n'estas condições ninguém o iria comprar para distillar.

De resto eu procedo agora do mesmo modo por que procedi, quando se tratou do augmento de direitos sobre alguns generos da pauta; e eu não sei que se levantassem quaesquer reclamações.

(S. exa. não reviu)

O sr. Moraes Carvalho: - Combate a proposta e aã idéas expostas em defeza d'ella pelo sr. ministro da fazenda.

Sustenta que a consequencia do augmento do imposto sobre o alcool estrangeiro será que as fabricas nacionaes, não temendo a concorrência estrangeira, virão a augmentar o preço dos seus productos.

(O discurso será publicado em appendice, quando s. exa. o restituir.)

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Acho extraordinario o apparecimento de similhante theoria n'este momento.

Pois o anno passado, quando o governo trouxe ao parlamento a nova pauta, que contendia com todas as industrias nacionaes, não apresentou ao mesmo tempo uma proposta para se cobrarem os direitos provisoriamente e os

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illustres deputados não a approvaram? Como é, pois, que tuna doutrina boa no anno passado deixa do ser boa este anno? (Apoiados.)

Observo a s. exa. que ainda suppondo que, por circumstancias que não temos que apreciar aqui, a camara se prorogue por dois ou tres mezes, nós temos meio de sospender a execução da lei que se discute, quando quizermos.

E ao illustre deputado esqueceu ainda outra cousa: é a difficuldade de montar de repente uma fiscalisação que eu não sei mesmo como havia de estabelecer-se.

Uma fiscalisação não se monta em dois dias. Por isso, ainda que a camara resolvesse que o governo cobrasse já o imposto sobre as fabricas de alcool, e que seria, a meu ver, a condemnacão de todos os bons princípios, eu é que não cumpria essa resolução porque a não podia cumprir. A lei ficava; mas a execução era quasi nulla pela impossibilidade de montar promptamente a necessaria fiscalisação.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Arouca: - Respondendo ao sr. ministro da fazenda, começa por contestar que do projecto em discussão resulte a vantagem indicada por s. exa.

No seu entender o direito de 200 reis sobre as fabricas nacionaes, não lhes dá nem lhes tira: deixa-as nas mesmas circumstancias em que estão actualmente. Se com o direito de 1$150 réis não entra aguardente estrangeira, menos entrará com o direito de 1$500 réis, e as fabricas nacionaes hão de vender os seus productos, bons ou maus, conforme quizerem.

Que elles vão estragar os vinhos portuguezes, por forma que não possam apparecer nos mercados estrangeiros, e que pelo seu excesso do carestia não possam ser comprados ou vendidos cm competência com os vinhos hespanhoes, francezes ou italianos, isso não quer dizer nada para o sr. ministro da fazenda; o que é preciso é arranjar dinheiro para o thesouro, mostrar maior receita no orçamento, tirar d'elle tudo quanto possa cheirar a despeza, motter-lhe lá os juros e dizer por fim que o deficit está equilibrado! E pouco lhe importa saber quem o pagou.

Esta é a theoria que o sr. ministro da fazenda tem seguido desde que subiu ao poder, e em que vae continuando.

Que vantagens tem por consequencia, accrescenta o orador, a lei que se discute?
Unicamente aquella que o sr. ministro da fazenda disse ha pouco, se ella é verdadeira; isto é, impedir que o alcool estrangeiro entre agora em Portugal com o direito de 1$150 réis, porque sabe que as fabricas nacionaes mais tarde pagarão 200 réis por decalitro.

O que as fabricas pagam agora, é nada ou quasi nada. Imposto industrial, nenhum.

Desde que se eleve o direito de importação de 1$150 a 1$500 réis não dará resultado nenhum para o thesouro, antes dará prejuízo, durante o tempo que o parlamento estiver aberto, como já o demonstrou o sr. Moraes de Carvalho.

O orador, depois de resumir a sua argumentação conclue, repetindo que, no seu entender a lei é uma inutilidade, porque só faz com que as fabricas augmentem o preço do alcool, por isso que sabem que não têem concorrencia. Se com o direito existente de 1$150 o alcool estrangeiro quasi que não vinha para o paiz, com o direito de 1$500 réis menos virá.

(O discurso será publicado em appendice, guando s. exa. o restituir.)

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Pouco tenho que responder ao illustre depurado. S. exa. não se occupou d'este projecto, e sim do outro que ainda não veiu á discussão; por isso, quando vier, terei occasião do responder a s. exa.; e para o fazer, hei de invocar a opinião dos srs. D. José de Saldanha, Estevão de Oliveira, José Maria dos Santos e de outros illustres deputados que fizeram parte do congresso agrícola.

N'esta questão eu estou de accordo com os princípios sustentados n'outro tempo pelo partido regenerador.

O sr. Arouca: - Tenho muito gosto em o ver unia vez a meu lado.

O Orador: - E que o illustre deputado pertence a um partido que augmentou os direitos do alcool.

O sr. Arouca: - Mas que depois os reduziu, emendando assim o erro.

O Orador: - E o mesmo que me ha de acontecer, sem me convencer de que errei; mas em todo o caso a verdade é que o partido regenerador já votou o augmento dos direitos do alcool.

E quem disse ao illustre deputado que os srs. D. José de Saldanha, Estevão de Oliveira e José Maria dos Santos não têem rasão, e que é s. exa. que a tem?
Não sei se os factos...

O sr. Arouca: - Os factos são contra v. exa. Em 1880 fez uns calculos para o preço do pão, e em 1888 faz outros.

Em 1886 votou-se uma cousa, depois viu que os calculos lhe saíram errados e mudou de opinião.

O Orador: - Mas quem disse ao illustre deputado que os meus calculos estão errados? Quando vier a discussão dos cereaes, eu hei de mostrar que a sua demonstração é que está errada, como estavam errados os cálculos do sr. Arroyo sobre a questão dos tabacos. Mas, deixemos isto, que não vem agora para o caso.

O illustre deputado argumentou dizendo que o imposto é pequeno; que o producto ha de ser insignificante, e que o calculo foi precipitado.

Será tudo isso; não dará muito dinheiro, mas sempre ha de dar cerca do 60:000$000 réis.

Portanto, vê se que os calculos do illustre deputado não estão certos.

Repito; s. exa. não fallou no projecto que se discuto; occupou-se do outro.
Reservo-me, por consequencia, para quando elle vier á discussão.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Franco Castello Branco: - Está de accordo com as considerações apresentadas pelo seu collega e amigo o sr. Moraes de Carvalho, quanto ao projecto em discussão.

Da questão principal se occupará quando for discutido o respectivo projecto.

No discurso será publicado em appendice a esta sessão, logo que s. exa. o restitua.)

O sr. Presidente : - Está esgotada a inscripção. Vae ler-se o parecer para se votar.

Leu se e foi approvado.

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Mando para a mesa uma proposta de accumulação.

Leu-se na mesa.

É a seguinte:

Proposta

Senhores. - Em conformidade com o disposto no artigo 3.º do primeiro acto addicional á carta constitucional da monarchia, o governo pede á camara permissão para que possam accumular, querendo, o exercício das suas funcções legislativas com o dos seus empregos ou commissões dependentes d'este ministerio, os srs. deputados:

Antonio Centeno.
Francisco Limpo de Lacerda Ravasco.
Vicente Rodrigues Monteiro.
Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti.

Ministerio dos negocios da fazenda, 30 de maio de 1880. = Marianno Cyrillo de Carvalho.

Foi approvada.

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SESSÃO DE 30 DE MAIO DE 1888 1801

O sr. Presidente: - Como a hora está muito adiantada, não dou agora a palavra ao sr. deputado Ferreira de Almeida sobre o orçamento rectificado, ficando-lhe reservada para a sessão nocturna.

A ordem da noite é a mesma que estava dada para a do dia, e a sessão abre-se ás nove horas em ponto.

Está levantada a sessão.

Eram quasi seis horas da tarde.

Redactor = S. Rego.

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