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N.º 13. SESSÃO DE 20 DE MAIO 1855.

PRESIDENCIA DO SR, FREDERICO GUILHERME DA SILVA PEREIRA

Vice-Presidente.

Chamada: — Presentes 79 srs. deputado». Abertura: — Ao meio dia e um quarto. Acta: — Approvada.

O sr. Secretario (Rebello de Carvalho): — No extracto da sessão de hontem publicado no Diario do Governo de hoje vem um erro que me cumpre rectificar. Eu apresentei uma declaração fazendo constar que o sr. deputado Corrêa Caldeira me tinha encarregado de participar que não comparecia á sessão por justo impedimento; no extracto lê-se o seguinte = uma declaração do mesmo sr. secretario participando que por justo impedimento não póde assistir á sessão de hoje.

Já se vê que é engano; portanto peço aos srs. tachygrafos que façam a rectificação no extracto da sessão de hoje.

CORRESPONDENCIA

Declarações: — 1.º do sr. Garcia Peres, participando que o sr. Passos (Manoel) não pôde comparecer na sessão de hontem, nem na de hoje, por causa justificada Inteirada.

2.ª Do mesmo sr. deputado Garcia Peres, participando que o sr. Palma falla á sessão de hoje e á de amanhã, por justos motivos. — Inteirada.

Um officio do ministerio das obras publicas, acompanhando o projecto de um banco hypothecario, que em 12 de março do anno findo foi dirigido ao governo pela sociedade promotora da agricultura michaelense; satisfazendo assim ao que lhe foi pedido por esta camara. — Para a secretaria.

Um requerimento em que Ignacio Raymundo Alves Sobral, da cidade de Coimbra, pede que a camara conceda licença para que seja citado o sr. deputado Justino de Freitas para ser inquirido como testimunha em uma causa de libello.

O sr. Secretario (Rebello de Carvalho) — O sr. Justino de Freitas, a quem dei conhecimento deste requerimento, declarou que não tinha duvida alguma em ir depor nesta causa.

Concedeu-se a licença pedida.

SEGUNDAS LEITURAS.

Requerimento: — Requeiro que esta camara seja-informada pelo ministerio competente, se os soldos aos officiaes reformados addidos aos batalhões de veteranos tem sido pagos com a desigualdade de alguns mezes entre officiaes na mesma situação; e no caso affirmativo qual o motivo desta differença. — Cezar de Vasconcellos.

Fui remettido ao governo.

Proposta: — Renovâmos os projectos de lei n.º 13 e 20 da commissão da camara dos srs. deputados no anno de 1849 — sobre habilitações — promoções — e recompensas militares. — Palmeirim — Placido de Abreu — Breyner.

Sendo admittida, foram os projectos enviados á commissão de guerra.

N. B. Os projectos a que se refere a proposta antecedente, são os seguintes

Projecto de lei (n.º 13, de 1849). — Senhores: A vossa commissão de guerra, lendo examinado, detida e circumspectamente, a proposta de lei apresentada pelo governo sobre habilitações, e promoções militares, intende que a mesma é adoptavel com as breves alterações, e alguns additamentos que lhe fez, de intelligencia com o proprio governo.

A commissão felicita-se pelo apparecimento de um projecto de lei, que, constituindo um codigo sobre promoções, deve substituir uma serie de medidas desconnexas, nem sempre bem calculadas, e por vezes sujeitas ao capricho governamental; ainda na propria intelligencia das mesmas: oxalá que elle seja precursor de um systema de medidas organicas militares, tão reclamado pelo adiantamento dos tempos, e pela utilidade de um serviço, que, por sua natureza, pede alguns principios excepcionaes!

O projecto de lei, que a commissão vos submette, ainda não iguala talvez o acabamento de habilitações requerido nos paizes mais cultos que o nosso, onde a educação militar se encontra mais desenvolvida; julga todavia que, nas circumstancias particulares de nossos habitos, é por em quanto, o melhor. Dá novo vigor ao principio de que, a pura antiguidade, quando desacompanhada de habilitações, e boas informações, não concede direito ao accesso. Tal foi o pensamento do capitulo 13.º do regulamento de infanteria, e o do alvará de 21 de fevereiro de 1816, quando estabeleceram que ella não bastaria, se os que a tivessem, lhe não ajuntassem a applicação, zêlo, e capacidade requeridas para satisfação do posto a que aspirassem, e se não houvessem a robustez para o serviço.

A commissão, não aconselhou para entre nós a faculdade que tem outros governos, como o francez, o belga, e o inglez (até certo ponto na sua marinha), de prover muitos postos por méra escolha, ou na totalidade, ou no terço dos candidatos naturaes aos mesmos: mas temperou a antiguidade com o merecimento, deixando áquella o seu regular seguimento, dadas certas forças moraes; e concedendo ao governo a eleição, não só para adiantar o genio, e vocação individual, mas para attender ao melhor preenchimento do serviço. Proceder differente seria prematuro, quando a instrucção pública de certa ordem se acha mal defendida no paiz; e em quanto os tempos não forem mais varios das susceptibilidades politicos, a fim de que, apezar dos mais candidatos pro.

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positos, ellas se não possam infiltrar, desapercebidas, no conselho ainda dos mais precatados, com detrimento da justiça, e da conveniencia militar.

O accesso extraordinario no campo da honra ficou salvo, e patente a todos os leitos briosos.

O projecto encarece as provas na entrada das tres distinctas series de postos de official; no de alferes, comêço de vida na companhia: no de major primeiro posto superior no batalhão: quando os conhecimentos tácticos, disciplinares, e administrativos se dilatam; e no de brigadeiro, primeiro gráo do genero-lato posto de suprema importancia, e em que se devem universalisar os conhecimentos; mas em tudo isto só ratificou o que já era direito, definindo-o, e regulamentando-o no sentido da maior utilidade pública.

Outro proposito da commissão foi o excitamento do desejo da instrucção militar, confirmando lhe as vantagens já estabelecidas — creando-lhe outras a que podesse encaminhar-se com segurança de premio — fomentando a emulação mediante os concursos — e alliando tudo com a practica, condição essencial na extensa arte da guerra.

Por esta occasião era de necessidade consignar a effectiva homogeneidade de sciencia nos corpos, e armas especiaes, em que ella abusivamente se não dá.

Deste complexo de medidas deve resultar maior somma de illustração no exercito, illustração de todo indispensavel em tempo de guerra, mas não menos requerida no de paz, sempre mais diuturno, e quando não só a politica, mas a sciencia economica espera hoje dos exercitos, certos deveres, e novos serviços productivos.

A commissão foi escrupulosa em que se respeitassem direitos adquiridos, e, com quanto o principio de algumas incompatibilidades por idade, sejam de certa utilidade, fugiu de o apellar, não só porque a par delle devem estar os de recompensa que gratifiquem o longo serviço, mas inhabil para determinados accessos; mas porque de outro lado deu culto á consideração de deferencia para com todos os casos pessoaes trazidos no largo periodo desde 1820 até hoje, e não quiz prejudicar nem de leve, a esperança, ou a recompensa de bastantes officiaes que tem prestado valiosos serviços ao throno constitucional, e ás liberdades publicas.

A commissão intendeu por ultimo, que a publicidade das antiguidades, e o só preenchimento gradual das vagaturas, eram dois penhores, assim para os direitos individuaes, como para a economia do thesouro, e por isso consignou ambos estes principios.

Assim, pois, tem a honra de vos dizer, que a proposta do governo merece ser convertida no seguinte projecto de lei.

CAPITULO I.

Do tempo do serviço.

Artigo 1.º O tempo de serviço conta-se do dia de assentamento de praça, ao qual ninguem será admittido sem completar 15 ânuos de idade.

§ unico. São exceptuados os tambores, corneteiros, e clarins, e aprendizes de musica, que poderão ser admittidos ao serviço, e contar-se-lhes este, desde os 13 annos completos de idade.

Art. 2.º Não se abonará como tempo de serviço:

1. O «que fôr passado em emprego civil, ou diplomatico, a não ser por missão especial, e temporaria, reclamada pelo bem publico, e como tal declarada no respectivo diploma.

2. O passado em disponibilidade a requerimento de individuo.

3. Todo aquelle que exceder seis mezes de licença registada no periodo de doze successivos, quando a mesma não fôr conferida por escala obrigatoria.

4. Todo o que decorrer na frequencia dos estudos, quando o individuo fôr reprovado na mesma disciplina em dois differentes annos; ou estes sejam successivos ou intercalados.

5. Metade do tempo de licença conferida em resultado de inspecção da junta de saude, quando não motivada em ferimento em combate, ou enfermidade adquirida em serviço.

6 Todo o que anteceder qualquer deserção.

7. O passado em prizão por crime de que resulte sentença condemnatoria pelos tribunaes civis, ou militares; e todo o que durar o cumprimento da sentença.

Art. 3.º Ao tempo de serviço que fôr liquidado, conforme aos preceitos do artigo antecedente, será utilmente accrescentado:

1. Outro tanto como o que fôr por igual modo liquidado, e passado em serviço de campanha; de logares fortificados, e no de missões singulares, e importantes que o governo, ou o general que commandar em chefe, declare como de actividade de guerra, ou de importancia militar, na conformidade dos regulamentos.

2.º Outro tanto como por igual modo liquidado, e passado no serviço das possessões ultramarinas, quando o individuo para ellas tiver ido sem augmento de posto, mas continuando a pertencer ao exercito de Portugal.

3.º Aos que depois de terem baixa por haverem preenchido o seu tempo de serviço, ou em resultado de julgamento da junta de saude, voltarem a assentar praça voluntariamente, se abonará metade do tempo liquidado no serviço anterior, quando practicado sem nota. A disposição deste artigo, não aproveita aos que entrarem nas fileiras do exercito, como substitutos de outros.

Capitulo II.

Do accesso em promoção ordinaria.

Art. k Todo o accesso é gradual, e ninguem será promovido a um posto, sem ter exercido effectivamente o antecedente.

Art. 5.º Quando na regulação da escolha entre dois ou mais officiaes que concorram no mesmo posto, ao accesso immediato, se der paridade de circunstancias, preferirão mais antigo no posto antecedente, salvas as excepções consignadas no artigo 10.º, e seus

Art. 6.º Nenhum soldado será promovido ao posto de anspeçada se não souber lêr, escrever, e tiver servido effectivamente 3 mezes depois de se achar prompto da recruta.

Art. 7.º Nenhum anspeçada será promovido a cabo de esquadra se não souber lêr, e escrever, as primeiras quatro operações, arithmeticas sobre numeros inteiros, e tiver servido effectivamente 3 mezes como anspeçada.

VOL. V — MAIO — 1853.

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§ unico. Nas armas em que não houver o posto de anspeçada, nenhum soldado será promovido a cabo de esquadra, sem ter servido activamente 6 mezes, depois de prompto na recruta, e haver as habilitações acima requeridas.

Art. 8.º Nenhum cabo de. esquadra terá promovido a official inferior, sem ter servido activamente (i mezes, pelo menos, naquelle posto, saber lêr, e escrever correntemente, e as quatro operações arithmeticas sobre inteiros, e fraccionarios.

Art. 9.º Os postos de anspeçada, e de cabo de esquadra serão conferidos sobre proposta do commandante da companhia, ou bateria em que houver vagatura. Os de furriel, segundo sargento, primeiro sargento, sargento quartel-mestre, e sargento ajudante serão promovidos em concurso. O posto de porta-bandeira será conferido sobre proposta do commandante do corpo, ao primeiro sargento aspirante a official, que reunir á maior antiguidade, o necessario merecimento.

§ 1.º Os alumnos militares que completarem com aproveitamento o primeiro anno da escola polytechnica, serão por esse farto graduados no posto de furriel; os que concluirem o segundo anno de qualquer dos cursos da mesma escola, sei no graduados segundos sargentos: e os que terminarem o terceiro, serão graduados no posto de primeiro sargento. Estas graduações valerão como postos effectivos, não só para o desempenho do serviço correspondente'; mas ainda para o concurso á effectividade dos postos subsequentes na conformidade deste artigo. Esta disposição é extensiva aos alumnos não militares que assentarem praça, com a differença de que só lhes começará o direito pela primeira graduação de furriel, ainda quando tenham approvação nos annos superiores ao primeiro da escola.

2. Os alumnos do collegio militar, tendo completado o respectivo curso, seguirão como graduados todos os postos inferiores até ao de primeiro sargento, em um prazo que nunca excederá a ir mezes.

§ O governo fará os regulamentos necessarios á execução deste artigo, estabelecendo as condições para as propostas, e as materias, e provas exigiveis nos concursos.

Art. 10.º O posto de alferes alumno será conferido áquelles discipulos que, lendo satisfeito as clausulas do artigo. 16.º da lei de 12 de janeiro de 1837, assentarem praça em alguns dos corpos do exercito até um mez depois de approvados nas materias do segundo anno da escola polytechnica, e sé acharem promptos na recruta da respectiva arma. O assentamento de praça nestes termos não prejudicará o seguimento dos estudos pela negação da necessaria licença. Os que actualmente forem alferes alumnos serão obrigados a assentar praça desde logo.

§ 1 Os alferes alumnos, logo que terminarem o curso militar a que se houverem proposto, servirão como segundos tenentes addidos em um dos corpos de artilheria, e se ahi perfizerem 2 annos de bom serviço, com excellente comportamento, serão promovidos a tenentes dos corpos scientificos a que se tiverem destinado.

§ 2.º Quando nos corpos do estado maior, ou de engenheria, não houver vagatura, serão os referidos segundos tenentes addidos, promovidos a tenentes e addidos aos corpos de infanteria, ou de cavallaria que escolherem; e nestes servirão até acontecerem

Vagas nos mencionados corpos especiaes, as quaes irão preencher.

§ 3.º Os que destinando-se á arma de artilheria houverem sido alferes alumnos e entrarem nos corpos da referida como segundos tenentes addidos, serão promovidos a primeiros tenentes addidos, e regulada a sua effectividade segundo o disposto no artigo 16º da presente lei.

— § 4.º Os alumnos que achando-se addidos aos corpos de Infanteria, ou de cavallaria, na qualidade de tenentes, na expectativa de vagatura nos corpos do estado maior, e de engenheria, preferirem continuar a sua carreira em qualquer daquellas armas; poderão, querendo, entrar para as mesmas na effectividade daquelle posto, das quaes todavia não poderão de futuro saír, senão nos lermos do § 1.º do artigo 38:º desta lei

Art. 11.º Nenhum individuo será promovido ao posto de segundo tenente, — ou de alferes, sem ter completado 17 annos de idade, e não mais de 25; e reunir algumas das condições seguintes:

1.ª Sem haver servido activamente 4 annos em um dos corpos do exercito, desde o dia em que passar a official inferior, e ser sargento ajudante, ou sargento quartel-mestre, ou porta bandeira, ou primeiro sargento;

— 2. Ser alferes alumno, ter completado qualquer dos cursos das armas scientificas na escola do exercito, ter ultimado O curso do collegio militar: ou o de infanteria, e cavallaria na referida escola, devendo estes ultimos exercer nos corpos, pelo espaço de 2 annos, os postos inferiores, pelo menos até ao de primeiro sargento.

Art. 12.º Na execução dos parágrafos do artigo antecedente, serão preferidos os individuos pela ordem em que vão mencionados nas suas classes. Na igualdade de posto preferirá a antiguidade; no deste o tempo de serviço, na de todas estas circunstancias a maior idade.

Art. 13.º Metade dos postos vagos de alferes nos corpos de-cavallaria, e de infanteria, serão conferidos aos individuos, e pela ordem designada no § 1.º do artigo antecedente, que, além da sua boa educação, e zelo pelo serviço, se acharem cabalmente instruidos na escola do pelotão, na administração, e escripturação de companhia, e forem recommendados, como dignos de serem elevados á classe de official, pelos commandantes dos corpos em que servirem, e pelo general encarregado da inspecção da respectiva arma, ou pelo commandante da respectiva divisão territorial, ou de operações. A outra metade dos postos vagos será preenchida, sempre que fôr possivel, pelos individuos, e pela ordem estabelecida no § 2.º do artigo 11.; havendo delles boas informações.

§ 1.º Quando o numero das vagas a preencher fôr impar, será a vantagem na primeira promoção em favor dos individuos de que tracta o § 2.º do artigo 11.º; e a da seguinte, em favor dos do § ]do mesmo artigo: e assim alternadamente. § 2 Quando na execução da presente lei, aconteça não haver na classe a que se refere o§ l. do artigo 11.º individuos idoneos para entrar na metade das vagas; procurar-se-hão os que fallarem, nas dos mencionados no § 2.º do mesmo artigo; e vice versa.

Art. 14.º Dois terços dos postos vagos de seguiu dos tenentes na arma de artilheria serão preenchidos pelos alumnos que tiverem ultimado o respectivo curso

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segundo n lei de 12 de janeiro de 1837; e houverem boas informações. O terço restante será conferido aos sargentos ajudantes, sargentos quarteis-mestres, e primeiros sargentos que tiverem exemplar conducta civil, e militar, regular educação, pleno conhecimento do serviço braçal da sua arma, e da administração e escripturação de uma bateria; principios de arithmetica, algebra, geometria, artilheria, e lingua franceza, e que por todas estas circumstancias tenham sido recommendados pelos commandantes dos respectivos corpos, e pelo da arma, como merecedores de serem elevados á classe de officiaes.

§ unico. Quando aconteçam circumstancias similhantes ás prevenidas, nos 1. e 2.º do artigo 13.º, se procederá por modo analogo ao alli disposto.

Art. 15.º Nenhum segundo tenente, ou alferes, será promovido a primeiro tenente, ou a tenente, sem ter servido 2 annos naquelle posto.

Art. 16.º Os postos vagos de tenente em todas as armas, excepto no corpo do estado maior, e no de engenhei ia, serão conferidos por antiguidade rigorosa, quando a par da mesma concorram boas informações.

§ unico. Quando algum segundo tenente de artilheria que não houver pertencido á classe de alferes alumno, tiver o curso da respectiva arma satisfeito na escola do exercito, preferirá para entrar na vaga que houver de primeiro tenente, ao primeiro tenente addido que tendo sido alferes alumno lhe fôr mais moderno no posto de segundo tenente effectivo de artilheria.

Art. 17.º No corpo do estado maior, ou no de engenhei ia, o posto de tenente só pertencerá aos que tiverem satisfeito ás disposições do artigo 36. do decreto de 12 de janeiro de 1837, modificado pelo artigo 10.º da presente lei.

Art. 18.º Nenhum tenente será promovido a capitão uns armas de cavallaria, e de infanteria, sem haver servido dois annos naquelle posto, ou tendo mais de 50 annos de idade.

Art. 19.º Na promoção de tenente a capitão, nas armas de cavallaria, e de infanteria, se observará a rigorosa antiguidade, quando a par da mesma concorram boas informações.

Art. 20.º Na arma de artilheria tres quartos dos postos vagos de capitão serão preenchidos pelos primeiros tenentes mais antigos que tiverem o respectivo curso: o quarto restante será conferido á antiguidade, quando em uns e outros individuos concorram boas informações.

§ unico. Quando algum candidato, possuindo habilitações scientificas, lhe couber ser despachado por sua antiguidade, será levado em conta na quinta parte designada para esta. Quando o numero das vagas não fôr divisivel conforme aos principios consignados neste artigo, o governo resolverá o caso por meio analogo ao, prevenido nos § 1.º e 2. do artigo 13.º da presente leu

Art. 21.º No corpo do estado maior, o accesso do posto de tenente no de capitão será por antiguidade, quando a par desta houver boas informações ácerca da conducta, o applicação do individuo, dadas pelo commandante, do respectivo corpo; ou pelo general, ou chefe, a cujas ordens sei vir.

Art. 22.º No corpo de engenheiros o posto de capitão será conferido por antiguidade, quando se der simultaneo merecimento; mas nunca prevalecerá só aquella, na conformidade do que dispõe o artigo 6.º

do regulamento provisional do mesmo corpo, de 12 de fevereiro de 1812.

— Art. 23.º Nenhum capitão será promovido ao posto de major sem ter servido aquelle, por tempo de 4 annos, ou lendo mais de 55 annos de idade.

O Art. 24.º Nas armas de cavallaria, e de infanteria, metade dos postos vagos de major será conferida aos capitães mais antigos, quando a par de boas informações tenham satisfeito theorica e practicamente, perante o inspector da respectiva arma, ou de outro general encarregado desta commissão, um exame sobre a escola de batalhão, ou de esquadrão, a economia e administração de um corpo, e a sua parte disciplinar. A outra metade será provida por escolha do governo na totalidade da classe dos capitães, preferindo aquelle que tiver algum curso das armas scientificas, fôr bacharel em mathematica, tiver o curso do collegio militar, ou o da propria arma; e satisfazer ao referido exame.

— § unico. O governo fará um regulamento sobre o modo de verificar o concurso a que se refere este artigo

Art. 25.º Na arma de artilheria o posto de major será conferido ao capitão mais antigo que tiver o curso completo da sua arma, reunir boa informação, mostrar ter proseguido em sua instrucção, desempenhado meritoriamente todas as commissões de que houver sido encarregado, e provar perante o general da sua arma que conhece theorica, e practicamente, a parte economica, e disciplinar de um corpo; e os exercicios practicos da ordenança da sua arma.

§ unico. Os capitães de artilheria que, por não possuirem o curso da respectiva arma, deixarem de ser promovidos a majores na mesma, terão opportunamente accesso, com preferencia a qualquer outro official, para os estados maiores das praças de guerra de primeira ordem,

Art. 26. No corpo do estado maior o posto de major será conferido ao capitão mais antigo, que tiver o respectivo, curso estabelecido pela lei de 12 de janeiro de 1837, boas informações, e mostrar perante o commandante do seu corpo, ou de um general encarregado de o examiar, que sabe desempenhar qualquer dos importantes serviços que póde caber a um official superior do mesmo corpo.

§ unico. Os capitaes do estado maior, que, por falla de habilitações scientificas, deixarem de ser promovidos no pisto de major, everterão ás armas de que tiverem sahido, e alli, esperando, ou entrando na antiguidade que lhe$ caberia senão tivessem deixado as mesmas armas, serão promovidos a majores, segundo as disposições do artigo 04.º da presente lei.

Art. 27.º N'o corpo de engenheiros o posto do major será conferido ao capitão mais antigo, que, Lendo o curso completo da sua, arma, reunir bons informações, e der provas de que sabe desempenhar satisfactoriamente qualquer importante trabalho que possa caber a um official superior da sua arma.

Art. 28. Nenhum major será promovido a tenente coronel sem ler servido 3 annos naquelle posto. Em todos os corpos, o armas, o posto de tenente coronel será conferido por antiguidade, quando o individuo a quem pertencer reunir boas informações.

Art. 29.º Nenhum tenente coronel podera ser pio-movido a coronel sem haver servido effectivamente 2 annos aquelle posto; ou tendo mais de 60 annos de idade. Em todos os-corpos, e armas, o polo de co-

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Tonel será conferido por antiguidade, quando o individuo a quem pertencer reunir boas informações.

Art. 30. Nenhum coronel será promovido a brigadeiro sem ter servido 2 annos naquelle posto, ou tendo mais de 65 annos de idade.

Art. 3].º O posto de brigadeiro será, conferido, na conformidade do alvará de 27 de fevereiro de 1801, mas regulado pelo modo seguinte: metade das vagaturas será preenchida por um dos 10 coroneis mais antigos, que, examinados praticamente no campo, perante um tenente general, como presidente, e mais 2 outros generaes, manobrarem satisfactoriamente com uma porção de tropa, de uma ou mais armas combinadas; e resolverem cabalmente algum problema estrategico. A commissão de exame lerá igualmente presente as informações sobre as habilitações scientificas, e trabalhos practicos dos candidatos. A outra metade dos postos poderá ser conferida por eleição do governo sobre a lista de todos os coroneis do exercito em effectividade, quando os candidatos desempenharem satisfactoriamente o exame acima ordenado.

$ 1.º Nenhum coronel será promovido ao posto de brigadeiro sem que: 1.º a informações dos generaes com quem tiver servido, abonem a sua conducta civil, e militar; 2.º ter mostrado energia, e promptidão nos commandos que lhe houverem sido encarregados; 3. sem ter dado provas de rapacidade nos detalhes administrativos, e disciplinares.

§ 2.º Em igualdade de circumstancias terá preferencia o que se houver distinguido em commissões importantes, sobretudo em campanha, mostrando conhecer a grande arte de commandar as tropas; ou reunir as habilitações scientificas a que se refere o artigo 24.º da presente lei.

Art. 32.º Os coroneis, não julgados sufficientemente aptos para serem promovidos a brigadeiros, ou que tiverem idade maior que a designada no artigo 30.º; mas justificarem bons e diuturnos serviços, sobre tudo em tempo de guerra, serão opportunamente graduados em brigadeiros, e passarão á classe de reformados na conformidade das leis existentes; entendido assim o alvará de 27 de fevereiro de 1801.

Art. 33.º Quando em alguma arma não houver os generaes que o bem do serviço imperiosamente exigir, se fará excepção ao disposto na condição 1.ª do artigo 31., mandando recahir o exame, para oposto de brigadeiro, nos cinco coroneis mais antigos da mesma arma.

Art. 34. O posto de marechal de campo, e de tenente general, serão conferidos por antiguidade, salvo quando o individuo a quem compelir o accesso, se achar physica, ou moralmente inhabilitado de commandar, hypothese em que com o mesmo se haverá a attenção de que tracta o alvará de 28 de abril de 1791.

Art. 35.º O posto de marechal do exercito não pertence á escalla dos accessos, mas será reservado para recompensar extraordinariamente aquelles tenentes generaes, que, a um distincto merecimento, reunirem assignalados serviços, feitos á monarchia constitucional, e á patria; sobre tudo em tempo de guerra.

Art. 36.º As promoções serão feitas por armas ale ao posto de coronel inclusivamente. O corpo do estado maior terá promoção d'entre si. O posto de brigadeiro será provido na conformidade dos artigos 31 e 33.º, e o estado maior general lerá promoção sobre si.

Art. 37. O governo é auctorisado a transferir para as armas de infanteria, e de cavallaria, os officiaes do estado maior, engenheria, e artilheria, que não tiverem as habilitações scientificas indispensaveis; devendo nessa mesma occasião passar para o referido corpo, e armas especiaes, um igual numero de officiaes de infanteria, e cavallaria, que possuirem as convenientes habilitações. Esta troca se effectuará entre officiaes de igual patente.

Art. 38.º Não sendo nas circumstancias mencionadas no artigo precedente, só é permittida a passagem de, umas para outras armas:

1. Aquelles que, em consequencia de ferimento em combate, se inhabilitarem para o serviço da propria arma, achando-se comtudo aptos para continuar em diversa. Esta disposição é restricta aos officiaes de infanteria, e de cavallaria.

2.º Aquelles a que se referem os §§ 2.º e 4. do artigo 10.º desta lei.

Art. 39.º As vagaturas que occorrerem nos diversos quadros, não estarão mais de um anno sem ser preenchidas.

Art. 10.º As disposições do artigo 11.º, em quanto á idade prejudicial de 25 annos, não tem applicação áquelles individuos que, ao ser promulgada a presente lei, já forem sargentos, ajudantes, sargentos quarteis-mestres, porta-bandeiras, primeiros sargentos, ou alumnos militares das escólas do exercito, ou polytechnica.

Art. 41. Não tem direito a accesso em occasião de promoção, o individuo que se achar em conselho de guerra, e o que nas informações tiver nota de má conducta civil, ou militar: se, porém, aquelle fôr julgado innocente, será indemnisado do prejuizo que por acaso tiver soffrido.

Art. 42.º Os prisioneiros de guerra, quando houver provas de que o não foram por modo contrario á honra, e deveres militares, conservarão a sua antiguidade, e direitos para accesso, mas só com relação ao primeiro posto superior ao que tinham no acto de ser aprisionados.

Art. 43.º O motivo da preterição de qualquer official será publicado ao exercito, logo puo o interessado o reclame.

capítulo in.

Das collocações que conferem direito a accesso, dos officiaes que o não tem. Regras que se devem observar nas promoções.

Art. 44.º Tem direito a accesso nos quadros dos corpos, armas, ou repartições a que pertencerem, os officiaes collocados nas seguintes classes:

1.ª No estado maior general.

2.ª No corpo do estado maior.

3.ª No corpo de engenheiros.

4.ª No corpo de artilheria.

5.ª Nos corpos de cavallaria, e seus depositos de instrucção.

6.ª Nos corpos de infanteria, e seus depositos de instrucção.

7.ª Nas repartições do quartel general do commando em chefe do exercito.

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8. Nos orlados maiores dos generaes que os tiverem por ]ei, e no daquelles que forem incumbidos da inspecção de qualquer arma.

9.ª Nos estados maiores das divisões territoriaes, e de operações.

10. a Nos estados maiores das subdivisões militares, territoriaes, ou de commando de brigada.

11. Na secretaria de estado dos negocios da guerra, quando auctorisado por lei.

12. Nos corpos municipaes, e em outros auctorisados por lei.

13. a Nas escólas, collegios, e archivos dependentes do ministerio da guerra, e marinha.

14. Nos estados maiores das praças de Elvas, Valença, Peniche, S. Julião, e forte da Graça, em tempo de paz; naquelles logares fortificados, e guarnecidos regularmente.

15.º Nos arsenaes, trens, e fabrica da polvora.

16. No corpo telegráfico.

17. a Em alguma missão diplomatica extraordinaria.

18. Dirigindo trabalhos publicos, a requisição do ministerio do reino.

§ 1.º Nenhum dos officiaes collocados em algumas destas situações, passará á de que tracta o artigo seguinte, senão em virtude de decreto.

§ 2.º A excepção dos officiaes pertencentes ás classes 13.ª, 17. e 18. do artigo 44º, nenhuns outros terão accesso, senão dentro dos quadros dos corpos, armas, estados maiores de praças, repartições ou estabelecimentos em que se acharem respectivamente collocados. Quando se acharem addidos, ou aggregados aos mesmos quadros serão considerados nas circumstancias daquelles de que tracta o artigo seguinte, salvas as disposições do artigo 10., e seus

Art. 4.º Os officiaes, em quanto permanecerem em alguma das seguintes collocações:

1. Em disponibilidade, sem exercicio em algum corpo, repartição, commissão, ou estabelecimento dos indicados no artigo antecedente.

2. Nos estados maiores de praças, torres, fortes, castellos, ou presidios omittidos no artigo antecedente: p naquelles que em tempo de guerra não forem regularmente guarnecidos.

3. Em veteranos, ou invalidos.

4. No emprego de cazerneiro.

§ unico. Os officiaes desta primeira e terceira collocação só passarão a alguma das mencionadas no artigo antecedente por decreto publicado na ordem geral do exercito; e quando os ultimos, sendo inspeccionados por uma junta de saude, forem reputados prompos para todo o serviço. Neste caso se observará a seu respeito o disposto no artigo 19.º

Art. 46. As vagaturas que occorrerem nas classes 1.ª, 2.ª, 3. 4. 5.ª e 6.º mencionadas no artigo 44.º, serão preenchidas segundo os preceitos do artigo 36.º O accesso dos officiaes que, pertencendo ás mesmas classes, se acham em algumas commissões fóra das mesmas, será registado com referencia ao preenchimento daquellas vagaturas, pelo modo seguinte:

§ 1.º Os officiaes collocados nas classes 7.ª, 8. 9. 10. 11. e 12.ª do artigo 44.º, e os que se acharem addidos a algum corpo, por se haver redusido o seu quadro, terão promovidos em concorrencia com os officiaes das suas respectivas armas, e igual graduação, continuando na situação em

achavam, quando isto se não oppuzer á disposição do § 5.º deste artigo; caso em que irão servir nos corpos das armas a que pertencerem.

2. Os officiaes das classes 13.º 15.º, 17. e 18. do artigo 44.º (no caso em que estas ultimas não pertençam aos quadros das suas respectivas armas) serão, quando houver promoção, graduados nos postos que lhes poderiam competir, comparadas as suas antiguidades com as dos officiaes promovidos em virtude das disposições do paragrafo antecedente: e só entrarão na effectividade destas graduações, quando os officiaes a quem foram comparados, passarem ao posto immediato; ou quando, deixando a situação em que se encontrem, quizerem entrar nos. quadros dos corpos, dos quaes não poderão todavia regressar á mencionada situação, senão depois de servir effectivamente 3 annos nos mesmos corpos.

Succedendo, porém, que algum dos officiaes de que tracta este paragrafo, passando á effectividade do seu posto, fôr exceder o quadro em que estiver servindo, será esta circumstancia removida, contando-o, para esse effeito, na promoção dos corpos da sua respectiva arma; em um dos quaes passará desde logo a servir, quando a isso não prefira conservar-se graduado na situação em que estiver.

§ 3.º Os officiaes pertencentes á classe 14. do artigo 41. serão promovidos nos respectivos quadros, á proporção das vagaturas que occorrerem; preferidos comtudo pelos officiaes de igual graduação, e antiguidade, ou mais antigos nos corpos do exercito que as requererem, sendo principalmente attendidos os capitães de artilheria, de que tracta o § unico do artigo 25.º

§ 4.º Os officiaes da classe 1 (5. serão promovidos no quadro da mesma, até ao posto de capitão, além do qual só poderão concorrer com os de infanteria, na conformidade do disposto no artigo 24.º, e seu § da presente lei. O mesmo principio regerá ácerca dos officiaes empregados no asylo dos invalidos militares.

§ 5.º Os officiaes, a que pertencer a effectividade de algum posto superior ao estabelecido por lei, como o mais elevado no corpo, arma, estado maior de praça, repartição ou estabelecimento em que se acharem collocados, serão promovidos concorrentemente com os outros officiaes da sua graduação, para os quadros das armas a que pertencerem; salva a excepção do § unico do artigo 25.; ou permanecerão, não promovidos, quando prefiram a sua actual posição, tudo de fórma tal que, por exemplo, um logar só devido a um major não seja exercido por um tenente coronel. Se o posto superior fôr o de brigadeiro, concorrerão a este segundo os principios geraes do artigo 31. e seus

Art. 47.º Se algum official de veteranos, tendo sido ferido em acção de combate, vier a restabelecer-se, e fôr julgado, por uma junta de saude, habil para o serviço, voltará á effectividade deste, na conformidade do § unico do artigo 45.º, mas sem direito ás promoções acontecidas; nem preterir os que lhe eram mais antigos; ou conservar o accesso com que tiver saido do quadro effectivo.

Art. 48.º Só poderão ser despachados com accesso para as provincias ultramarinas, continuando a pertencer ao exercito de Portugal, os governadores das mesmas, e um seu ajudante de ordens. Quando regressarem, não entrarão na effectividade dos quadros das suas respectivas armas, sem que tenham passado

que se

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ao posto immediato todos os officiaes que em promoção os devessem preferir no mesmo exercito.

§ 1.º Em quanto os referidos officiaes não entrarem na effectividade dos quadros, poderão ser, todavia, empregados em qualquer commissão do serviço, em que não commandem os que lhes eram mais antigos.

§ 2.º Os officiaes que forem despachados para seguir a sua carreira militar nas provincias ultramarinas, só regressarão ao exercito de Portugal, adquirindo o posto de coronel, e ainda neste caso se lhes contará a antiguidade desta patente, apenas da época da sua collocação no quadro, em que não deverão aliás entrar, quando ella lhes não pertencer, havendo seguido os postos no mesmo exercito. Na comparação do tempo de serviço, se attenderá convenientemente ao disposto no § 2.º do artigo 3.º desta lei.

capitulo IV.

Das promoções em tempo de guerra.

Art. 19.º O preenchimento das vagaturas em tempo de guerra, será feito conforme aos principios acima estabelecidos, reduzido, porém, a metade o tempo requerido para cada posto.

Art. 50.º As vagaturas resultantes das perdas em combate, dentro ou fóra do reino, serão preenchidas pelos individuos do mesmo corpo; ou elles se achem presentes em effectivo serviço, ou ausentes por ferimento em combato, ou por serviço que dure menos de 8 dias, e lhes competisse por escala; ou finalmente, em qualquer outro serviço de igual risco ao que tiver motivado as perdas. Neste caso, o accesso entre estes concorrentes será regulado, quanto possivel fôr, pelas disposições da presente lei, com a só excepção de não ser exigivel o tempo que vai marcado, em qualquer posto, para se subir a outro.

§ unico. Intender-se-ha por corpo de tropa, e para a applicação deste artigo, o corpo de exercito, divisão, brigada, regimento, ou batalhão, que operar em campanha separado do restante exercito, debaixo das ordens de um commandante particular, que obedeça directamente ao general em chefe, ou ao ministerio da guerra.

Art. 51. O militar que practicar algum feito de armas assignalado, poderá ser promovido ao posto immediato, em virtude de proposta do general, ou chefe superior, sob cujas ordens servir; especificando-se na ordem do exercito, por modo explicito, qual o serviço distincto que o tornou digno de similhante galardão. Se não houver vagatura, ficará aggregado.

Art. 52. Os officiaes, que não acompanharem os seus corpos, quando estes marcharem para entrar em operações de campanha; ou que delles se separarem não para serviço rigoroso de igual natureza; serão excluidos de promoções, em quanto se não reunirem aos mesmos, salvas as seguintes excepções: — 1.* Selem obrigados á separação por enfermidade grave, devida á casualidade, em que não sejam culpados; — 2.ª Haverem ficado, ou saido em serviço, ainda mesmo prolongado, que lhes tocasse por escala; ou para alguma commissão auctorisada pelo governo.

Art. 53.º As graduações nos postos immediatos serão apenas conferidas na conformidade do artigo 32.º e do $ 3.º do artigo 46.º; e para os casos de reforma, segundo as Íris que as regularem.

Art. 54.º O governo estabelecerá um systema de informações que o habilite ao particular conhecimento dos individuos militares, e perfeita execução da presente lei.

Art. 55.º O governo publicará, no mez de janeiro de cada anno, uma lista impressa, e comparativa, da antiguidade de todos os officiaes do exercito.

Art. 56. Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da commissão, em 27 de fevereiro de 1849. = Barão de Francos = Augusto Xavier Palmeirim, relator (com algumas declarações em quanto a incompatibilidades, e ao § 2.º do artigo 46.º) = Innocencio Jozé de Sousa (com declarações) — Carlos Brandão de Castro Ferreri = Antonio Augusto de Portugal Corrêa, de Lacerda (com declarações) = Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello (com declarações) = Gabriel Antonio Franco de Castro.

Projecto de lei (n.º 20 de 1849). — Senhores: A vossa commissão de guerra examinou o projecto de lei, apresentado pelo governo, sobre recompensas militares. De sobra são os motivos exarados no relatorio que o precede, para justificação da conveniencia e opportunidade da medida; comtudo a commissão pensa dever lhe accrescentar alguns outros. O governo acabando de resolver, na lei de promoções que vos está submettida no projecto n.º 13, o methodo a seguir, combinando o interesse do estado com o direito dos individuos; tomou sensivel n necessidade de lhe estabelecer parallelamente um codigo de recompensas, que assegure o futuro destino daquelles que, por differentes motivos, não poderem, ou não deverem, progredir na carreira activa das armas.

Se, a tal consideração, addicionarmos a de quanto imporia estabelecer, de uma vez para sempre, que o cidadão que perder a villa pela patria, não deve ter occasião de consternar-se, no momento daquelle sacrificio supremo, pela completa orfandade em que lhe possam ficar os seus filhos — que o cego, o mutilado, e o estropeado no furor dos combates, deve contar que a sociedade, álem de reconhecida, lhe supprirá os meios de que, por outro modo, ficaria privado — que, finalmente, aquelle que tiver abbreviado os seus dias e exhaurido prematuramente as forças, atravez de privações e trabalhos, póde confiar em que terá, na providencia da lei, uma indemnisação pelas economias que a sempre foiçada estreiteza dos soldos, e o errante da vida, lhe vedou ajuntar: devemos concluir que a medida proposta encontrará, no seio dos representantes da nação, o mesmo interesse e a mesma sympathia, que de todo o tempo o povo professou aos seus irmãos votados ao arriscado serviço militar, ou quando o paiz lhes impõe este cruento tributo, ou quando, pela practica ou pela intelligencia, o buscam tornar mais efficaz, na defeza da liberdade e da independencia de todos.

Senhores! — A proposta do governo providencèa todas as hypotheses, desde o posto mais elevado até á elementar condição do soldado. Resume toda a legislação até hoje practicado: regula melhor diversos casos: systematisa tudo, de accôrdo com o que se passa nas nações militares mais cultas: e exclue a necessidade de periodicamente rivalidar medidas, que devem ser de todo permanentes: a commissão, em presença do que leva ponderado, e espetando que a vossa sabedoria completará o que por ventura, carecer de maior desenvolvimento, intende que a refe-

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rida proposta, já modificada de accôrdo com o governo, se converta no seguinte projecto de lei.

CAPÍTULO 1.

Das recompensas militares, em geral.

Artigo 1.º As recompensas militares pertencem ás 3 seguintes classes: 1. á dos militares que, achando-se em activo serviço, progridem no mesmo: 2.º áquelles que deixam o serviço activo em virtude de ferimentos recebidos em combate; de desastre ou molestia adquirida no mesmo serviço; ou por sua idade: 3. ás viuvas, filhos e familias daquelles que morreram em combate, ou por alguma casualidade da guerra, ou em resultado de doenças contagiosas ou endemicas, de que, fóra de Portugal e de suas ilhas adjacentes, forem victimas por dever do serviço militar.

§ unico. Em o numero das recompensas militares, fixadas pela presente lei, não são comprehendidos os titulos de nobreza, ou outras mercês de pura graça.

capitulo II.

Das recompensas concedidas aos militares em actividade de serviço.

Art. 2.º Os capitães que no fim de 10 annos de erviço ativo e sem nota alguma, no dicto posto, não tiverem sido promovidos ao immediato, receberão um quarto mais do seu respectivo soldo. Quando, depois deste augmento, permanecerem ainda outros 10 annos, em effectivo serviço, no mesmo posto, vencerão um sexto mais do correspondente soldo.

§ 1.º Para a execução do que dispõe este artigo se não levará em conta o tempo passado em situação que não deva ser abonada como de serviço, na conformidade do que dispõe a lei geral sobre promoções.

§ 2.º E considerado activo, para conferir direito ao augmento de soldo de que se tracta, o serviço feito: 1.º no commando interino de algum corpo, no commando de algum deposito de instrucção, ou no de companhia: 2.º no estado maior do commandante em chefe do exercito — no de divisão territorial, ou de operações — no de brigada, ou sub-divisão territorial — no corpo do estado maior do exercito — no de engenheiros — na secretaria de estado dos negocios da guerra — ou no estado maior de artilheria: 3.º em qualquer commissão das de nomeação do governo que conceda jus a accesso.

§ 3.º A quota do soldo, assim accrescentada, será conservada ao capitão, seja qual fôr a situação militar em que se encontre; mas sempre regulada sobre a tarifa que nesta vencer.

Art. 3.º Fica em pleno vigor o alvará de 16 de dezembro de 1790, no parte em que concede aos officiaes do posto de capitão para cima, tendo 20 annos de serviço effectivo, e boas informações, a insignia de cavalleiro da ordem de S. Bento de Aviz.

Art. 4.º Os sargentos ajudantes, sargentos quarteis-mestres, porta bandeiras, e primeiros sargentos dos corpos do exercito que, no fim de 10 annos de serviço activo nestes postos, e sem nota, não forem promovidos ao de segundos tenentes, ou de alferes =

Vencerão mais um sexto do seu respectivo soldo; augmento que se se lhes repetirá em cada outros 10, que passarem no mesmo posto.

Art. 5.º Todas as praças de pret, á excepção daquellas de que tracta o artigo precedente, usarão no braço esquerdo de uma lista de panno da côr da gola da respectiva farda, por cada 10 annos que completarem de serviço activo, e sem nota. Com esta distincção vencerão mais 10 réis diarios de pret, logo que preencham os referidos 10 annos. Este mesmo augmento de 10 réis se repelirá em cada outros 10 annos mais, que as referidas praças passarem activamente nas fileiras.

Art. 5.º Na conformidade do alvará de 28 de julho de 1832, que restaurou, e de novo reformou, a antiga e muito nobre ordem da Torre e Espada, do valor, lealdade e merito, a insignia, e os gráos da referida ordem, até ao de commendador, serão conferidos opportunamente aos militares de todas as graduações, que estiverem em um dos seguintes casos;

1.º Aquelles que em acção de guerra practicarem um rasgo de bravura ou de intrepidez militar, superior á dos seus camaradas na mesma situação; ou em outra analoga.

2.º Aquelles que conseguirem, na guerra, resultados vantajosos de uma missão melindrosa, ou de uma operação militar, tanto pelo talento, como pela coragem; ou pela combinação de ambas as cousas.

3. Aquelles que, cursando os estudos da universidade de Coimbra, ou escola polytechnica, o depois a do exercito, com destino para qualquer das armas especiaes, obtiverem os primeiros premios pecuniarios, ou honorificos, em todas as aulas das referidas universidade e escólas.

4. Aquelles que apresentarem ao governo uma obra militar de sua composição, a qual o mesmo governo julgue vantajoso publicar, depois de a ler sujeitado á opinião de um jury especial.

§ 1.º Para se concederem as condecorações da Torre e Espada, em qualquer dos casos mencionados, salvo se Os generaes em campanha se acharem auctorisados para a dita concessão, ou que o governo espontaneamente, e com conhecimento de causa, asi conceda; será nomeada pelo mesmo governo, a requerimento do individuo que sollicitar a condecoração, por julgar que a ella tem direito, uma commissão composta de 5 officiaes, que já possuam a mesma condecoração de que se tractar, e que estejam, quanto fôr possivel, nas mesmas circumstancias do reclamante. Esta commissão, tomando conhecimento do caso, consultará com o seu parecer ao grão-mestre da ordem, sobre o gráo de justiça que assistir ao candidato, para este deferir ou desattender a pretenção.

§ 2.º Em qualquer caso, ou por qualquer modo que fôr conferida uma condecoração da ordem da Torre e Espada, será sempre o nome do condecorado, o gráo da condecoração, e o motivo que tiver dado logar á concessão, declarados na ordem do exercito.

Art. 7.º O militar que, em consequencia de ferimento em combate, ficar com alguma lesão, mas que o não prive de continuar no serviço activo (se assim convier) como perda de mão, braço, ou olho, será remunerado com uma pensão pecuniaria, excepto se preferir, em vez desta recompensa, alguma das condecorações ou graças, que o governo estiver auctorisado a conferir, e este annuir. Esta pensão será de

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um quarto mais do soldo correspondente ao posto em que, então, se achar o individuo.

§ unico. Estas pensões são vitalicias, e podem ser accumuladas com qualquer outra recompensa, alheia do motivo porque forem conferidas.

CAPITULO III.

Das recompensas concedidas aos militares incapazes de serviço activo, ou de todo o serviço.

Dos militares ainda capazes de algum serviço.

Art. 8.º Os officiaes e praças de pret, que o governo julgar, ou elles mesmos se considerarem, incapazes de serviço activo nos corpos do exercito; serão examinados por uma junta composta de tres officiaes de patente superior á sua, e de dois facultativos, e segundo o parecer da mesma, e as informações dos commandantes dos respectivos corpos, e dos generaes das respectivas divisões militares territoriaes, ou de operações; despedidos do civico, ou collocados como melhor convier ao mesmo; ou seja nos estados maiores de praças sem accesso, ou em repartições de administração, dependentes do ministerio da guerra, quando para isso tenham aptidão; ou nos corpos de veteranos, segundo o tempo de serviço que tiverem.

Art. 9.º Pela simples consideração da idade, o governo é auctorisado a retirar do serviço activo, se assim convier, e a mandar para os estados maiores de praças sem accesso, para os corpos de veteranos, ou a collocar em repartições dependentes do ministerio da guerra, os officiaes subalternos que tiverem mais de 50 annos, os capitães que tiverem mais de 55 annos, os officiaes superiores que tiverem mais de 60 annos, e os officiaes generaes que tiverem mais de 65 annos.

§ unico. Os officiaes que tiverem as idades marcadas neste artigo, poderão requerer as suas reformas, querendo; ainda quando se não achem incapazes de todo o serviço.

Art. 10.º As feridas ou enfermidades adquiridas na guerra, e os desastres acontecidos em tempo de paz, em acto de serviço, ordenado ou espontaneo, de reconhecida utilidade; ou que incontestavelmente se mostrem consequencias immediatas daquelle acto, dão direito, independente da idade ou do tempo do serviço, a obter collocação nos estados maiores de praças sem accesso, ou em veteranos, com o soldo por inteiro, a qualquer official ou praça de pret que fôr julgada incapaz de serviço activo, pela fórma prescripta do artigo 8.º, pagando-se aos primeiros pela tarifa de 1790, e nos ultimos por aquella de que gosavam nos corpos de que sahirem. Art. 11.º Se aos motivos ponderados no artigo antecedente accrescer a circumstancia de ler o official, julgado incapaz de serviço activo, mais de 25 annos de serviço util, contado como determina a lei de promoções do exercito, poderá ser collocado em qualquer das situações designadas no dicto artigo, percebendo o soldo pela tarifa de 1814.

Art. 12.º As molestias não comprehendidas no artigo 10.º, só derivadas de méra casualidade, mas não de mi conducta, dão direito á passagem para veteranos, ou para os estados maiores de praças sem accesso, com um soldo proporcionado ao tempo de serviço; isto é, com a terça parte do soldo, se o official tiver de 10 a 15 annos de serviço; com 2 terços, se tiver de 15 a 20 annos de serviço; com metade, se tiver de 20 a 25 annos de serviço; e com o soldo por inteiro, quando lenha mais de 25 annos de serviço, sendo os indicados vencimentos pela tarifa de 1790.

§ unico. Qualquer official que, tendo menos de 10 annos de serviço, fôr julgado incapaz de continuar em actividade, pelos motivos indicados neste artigo; receberá por uma só vez 6 mezes de soldo da sua patente, e será demiti ido do posto, conservando-lhe, porém, as honras, se tiver servido bem; ou collocado (não recebendo a dita gratificação) em algum emprego civil, ou repartição, ou estabelecimento dependente do ministerio da guerra, se tiver para isso aptidão, mas percebendo sómente o estipendio que pelo dicto emprego lhe compelir.

Art. 13 As praças de pret que, na conformidade do artigo 8., forem julgadas incapazes de serviço activo, em virtude de molestias devidas a méra casualidade, e não á sua má conducta, terão direito a passar para veteranos, quando contem mais de 20 annos de serviço; porém, se tiverem menos de 20 annos de serviço, e mais de 15, receberão a sua escusa, e com ella uma quantia igual a 6 mezes do seu pret, a titulo de soccorro, para se retirarem ao logar do seu nascimento ou domicilio.

§ unico. As praças de pret que passarem a veteranos, por estarem nas circumstancias designadas no presente, perceberão tres quartas partes do soldo diario, que tinham em actividade, além de pão e fardamento.

Art. 1 1. A cada uma das praças de pret effectivas nos corpos de veteranos se abonarão diariamente 18 réis para massas, como equivalencia do fardamento; e o dinheiro equivalente ao preço do pão, quando este se lhe não dê em especie. Estas quantias serão integralmente pagas ás dietas praças, de 15 em 15 dias, juntamente com o pret.

Dos milhares incapazes de todo o serviço.,

Art. 15.º Os officiaes que, estando nas circumstancias designadas no artigo 9.º, requererem a sua reforma: ou que, examinados como fica pi escripto no artigo 8.º, forem julgados incapazes de todo o serviço, serão reformados, segundo o posto ou a graduação militar que tiverem, como determinam o alvará de 16 de dezembro de 1790. e as cartas de lei de 27 de janeiro de 1811, e de 23 de junho de 1848; recebendo os soldos que lhes competirem pela tarifa de 1814, ou pela de 1790, segundo estiverem nas circumstancias marcadas no artigo 10.; ou nas do artigo 12.º da presente lei.

Art. 16.º As praças de pret, que tambem, pelo modo estabelecido no artigo 8.º, forem julgadas incapazes de todo o serviço, no caso de se acharem nas circumstancias declaradas no artigo 12., serão reformadas segundo as disposições dos parágrafos seguintes, ficando addidas no corpo de vetei anos que escolherem.

§ 1.º Os que contarem 45 annos, e mais, de serviços feitos depois dos 15 annos de idade, tanto nos corpos activos do exercito, como em veteranos, serão reformados com soldo e meio da praça que tiverem, pão, e fardamento.

2. Os que por igual modo tiverem servido de 40 a 45 annos, serão reformados, com o seu soldo, pão, e fardamento.

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3. Os que pois mesma fórma contarem de trinta e cinco a quarenta annos de serviço, serão reformados, com o seu soldo e pão.

$.. 4. Os que houverem servido de trinta a trinta e cinco annos, serão reformados só com o pret, com abono de pão ou de fardamento.

§ 5.º Os que houverem servido de vinte e cinco a trinta annos, serão reformados com dois terços do pret que tiverem; sem direito a algum outro abono.

§ 6.º Se alguma pinça de pret, antes de ter completado vinte annos de serviço, se achar em lai estado. por sua idade e molestias, que seja julgada incapaz de todo o serviço, mesmo de veteranos, e se der nella a circumstancia de ter sido condecorada por destincção em acção de guerra; ou a de merecer muito particular consideração pela sua optima conducta durante o tempo que tiver servido; será reformada (não tendo assentado praça por substituição) com metade do vencimento que tiver na occasião de se lhe conferir a reforma.

Art. 17.º Os officiaes que cegarem, ou soffrerem a amputação de dois membros, braços ou pernas, por effeito de ferimento em acção de guerra, serão reformado:, no posto immediato ao que tiverem, e addidos ao corpo de veteranos que escolherem: ficando percebendo mais um terço do soldo que lhes competir, segundo a doutrina dos artigos 10. e 11.

§ unico. As praças de pret, nas circumstancias ponderadas neste artigo, serão reformadas, e addidas ao corpo de veteranos que escolherem, ficando percebendo o dobro do soldo que tiverem na occasião do desastre, no caso de contarem mais de 20 annos de serviço; e soldo e meio, quando não tenham servido este tempo; e em um e outro caso serão abonadas de pão e fardamento.

Art. 18.º Os officiaes que soffrerem a amputação de um membro, seja braço ou perna, ou perdei em um olho, por effeito de ferimento em acção de guerra, serão reformados no mesmo posto, e addidos ao corpo de veteranos que escolherem, ficando percebendo mais meio soldo, sobre aquelle que lhes competir segundo a doutrina dos artigos 10. e 11.º

unico.. As pinças de pret, nas circumstancias ponderadas neste artigo, serão reformadas, e addidas ao corpo de veteranos que escolherem, ficando percebendo mais meio soldo além do que tiverem na occasião do desastre, no caso de coutarem mais de 20 annos de serviço; ou sómente o soldo por inteiro, quando não tenham servido 20 annos; e em um e outro caso o abono de pão e fardamento.

Art. 19º Os officiaes de veteranos, dos estados maiores de praças sem accesso, ou em qualquer outra situação que lhes confira d II eito a este ultimo, mas forem julgados incapazes de todo o serviço, lerão a sua reforma conforme as disposições do artigo 15.º; para o que se lhes contará por metade o tempo de serviço que tiverem em qualquer das situações supramencionada...

Art. 20.º As praças de pret que, lendo passado aos corpos de veteranos, por estarem nus circumstancias indicadas no artigo 10.º, forem julgadas incapazes de todo o serviço, serão reformadas, segundo as disposições dos parágrafos seguintes.

§ 1.º Os que contarem quarenta e cinco annos, e mais, de serviço feito depois dos quinze annos de idade, tanto nos corpos activos do exercito, como em veteranos, serão reformados com soldo dobrado, pão o fardamento.

§ 2.º Aquelles que, por igual modo, contarem quarenta a quarenta e cinco annos de serviço, serão reformados com o soldo, e mais tres quartos deste pão e fardamento.

§ 3.º Aquelles que contarem, por igual modo, trinta e cinco a quarenta annos de serviço, serão reformados com soldo e meio, pão e fardamento,

§ 4.º Aquelles que contarem, de igual modo, trinta a trinta e cinco annos de serviço, serão reformados com o soldo, e mais um quarto do soldo, pão e fardamento.

$ 5.º Aquelles que coutarem, por igual modo, vinte e cinco a trinta annos de serviço, serão reformados com o soldo por inteiro, pão e fardamento.

§ 6.º Aos clarins, cornetas, e tambores se contará o tempo de serviço desde a idade em que houverem assentado praça,

Art. 21.º Os officiaes e praças de pret, que estiverem nas circumstancias designadas nos artigos 18. ou 19.º, e mesmo aquelles que tiverem perdido a vista, ou o movimento de braço ou perna, e não tiverem familia, ou meios para se tractarem, serão recebidos, com preferencia a outros quaesquer, no real asylo dos invalidos de Huila, e alli aquartelados e tractados, segundo as suas respectivas graduações, e na conformidade dos estatutos daquelle estabelecimento.

Art. 22.º Todo o official ou praça de pret, que, tendo sido julgado incapaz de serviço activo, ou ainda de todo o serviço, fôr collocado em algum estado maior de praça sem accesso, em veteranos, ou mesmo reformado, poderá regressar á effectividade do serviço, não lendo mais de cincoenta annos de idade, possuindo boas informações, e sendo julgado capaz de todo o serviço activo, por uma junta composta de tres officiaes de patente superior a sim, de tres facultativos, e de um official general como presidente. Esta junta será sempre da nomeação do governo, ou do general em chefe do exercito; mas aquellas de que tracta o artigo 8.º serão nomeadas pelo general da respectiva divisão militar territorial, ou pelo de operações.

Capitulo IV.

Das pensões concedida; ás viuvas e familias dos que morrerem em combate, ou por casualidade da guerra e do Serviço.

Art. 23.º Os soldos dos officiaes de qualquer patente, e os vencimentos dos officiaes inferiores, soldados, e mais praças do exercito, que morrerem em combate, ou em resultado de ferimento recebido em acção de guerra, ou por desastre ou occorrencia a que a mesma dê logar, ou em resultado de doenças contagiosas ou endemicas de que, fóra de Portugal e ilhas adjacentes, forem victimas por dever do serviço militar; serão applicados para as suas familias, nos termos seguintes:

§ 1.º Serão percebidos os dicto; soldos pelas mulhes viuvas, e na falla dellas se repartirão pelas filhas solteiras, e filhos menores de quinze annos, emquanto as primeiras se conservarem em estado de viuvez; as segundas solteiras; e os ultimos não forem maiores de dezoito anno,.

§ 2.º Na falla das pessoas especificadas no paragrafo antecedente; pertencerão os soldos á mãi ou irmã viuva; e em sua falla serão repartidos pelas irmãs ou sobrinhas solteiras que tiver o morto; o que, todavia

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se verificará tão sómente nos casos em que a subsistencia das sobredictas mãi, irmãs, ou sobrinhas, estivesse a cargo do fallecido.

Ari. 24.º A disposição do artigo antecedente é extensiva ás familias dos officiaes de qualquer graduação, officiaes inferiores, soldados e mais praças, ou sejam dos batalhões nacionaes, ou de outros corpos de qualquer denominação, mas que tenham existencia e organisação legal.

Art. 25.º As pessoas que tiverem direito a soldos, no termos dos artigos antecedentes, ficam dispensadas, para os effeitos do disposto nos mesmos artigos, de se habilitarem em juizo contencioso. O governo estabelecerá o regulamento, que conveniente fôr, para o supprimento de tal habilitação, por modo que concilie o commodo e a economia da pensionista com a segurança da fazenda.

Art. 26.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da commissão, em 15 de março de 1849. — Barão de Francos. = A. X. Palmeirim (com declaração ao artigo 9.º) = A. M. de Fontes Pereira de Mello (com declaração ao artigo 9.º) = C. B. de Castro Ferreri. — Antonio Augusto d'Almeida e Portugal Corrêa de Lacerda.

O sr. Presidente: — Vão ler-se alguns pareceres de commissões.

Parecer (n.º 37 F): — O barão d'Ancede, pardo reino, pede no incluso requerimento que se lhe mande pagar 1:391 $808 réis, sendo 713:300 réis, importancia de generos entregues das suas propriedades aos agentes de tropa organisada no Minho em 1847, não não se podendo concluir bem dos documentos a quem essa tropa obedecia; 433368 réis, quantia que diz ler-lhe sido exigida indevidamente no Porto, na menina época; e, finalmente, 2.18$] 10 réis, valor de vinho, gado, e cereaes, tirados igualmente das suas propriedades, durante a usurpação, e para fornecimento das fôrças que a sustentavam.

A commissão de fazenda parece, que o requerimento se deve mandar ao governo, para proceder ácerca do supplicante como proceder nos outros casos similhantes

Sala da commissão, em 30 de abril de 1853. — Francisco Joaquim Maya — Justino Antonio de Freitas = A. X. Palmeirim. = J. AI. do Casal Ribeiro. F. da Junqueira — A. dos Santos Monteiro.

Foi approvado sem discussão.

Parecer (n.º 37 G): — Os egressos das extinctas ordens religiosas, e residentes na provincia do Minho, queixam-se de que a sua prestação ficasse reduzida a metade pelo decreto de 22 de agosto de 1843; e pedem que se lhes conceda o que foi estabelecido pelos artigos 1.º e 12.º do decreto de 20 de junho de 1834.

A commissão de fazenda, examinando attentamente este objecto, e reconhecendo que muitas outras classes do estado se acham reduzidas ás mesmas circumstancias pela deficiencia da receita publica, é de parecer que a pretenção dos supplicantes depende de uma medida geral, que não póde por agora ser levada a effeito.

Sala da commissão, em 30 de abril de 1853. — F. J. Maya F. da Junqueira. =. A. X. Palmeirim — J. M. do Casal Ribeiro. J. A. de Freitas. = dos Santos Monteiro.

O sr. Placido d'Abreu. — Pedia á illustre commissão de fazenda se servisse dar alguma explicação a este respeito; por quanto, segundo se deprehende da leitura do parecer, a pretenção dos individuos a que elle se refere, versa sobre a diminuição das prestações que se devem a certas classes — a dos egresos da provincia do Minho. Se effectivamente assim é, eu intendo que este negocio deve merecer alguma consideração do corpo legislativo, porque aquelles individuos teem um direito sagrado a que se lhes mantenha aquillo que se lhes prometteu: são homens na ultima época da vida, que não teem outro recurso, e que effectivamente gastaram os seus primeiros annos no claustro; mas pela situação em que hoje se acham, são dignos não só da consideração da camara, mas da consideração de todos os homens que teem coração, por isso que não têem outros meios, e privados, para assim dizer, de familia, e de tudo aquillo que a sociedade tem de mais caro. Assim, eu convidaria a illustre commissão a esclarecer mais este negocio, porque eu intendo que este» individuos são dignos da consideração da illustre commissão, e da camara, f Apoiados)

O sr. Justino de Freitas: — A commissão, no seu parecer, reconheceu aquillo mesmo que o illustre deputado acaba de ponderar: a commissão desejaria mesmo poder elevar as prestações dos egressos, mas o illustre deputado não ignora, que a commissão não podia attender especialmente a estes egressos que requereram, e hão attender a outros que não requereram, e que estão em iguaes circumstancias, e se attendesse a todos importava isso um augmento de despeza que não é possivel nas actuaes circumstancias do thesouro. Foram estas as razões por que a commissão intendeu que devia sobreestar neste assumpto até que se apresentasse uma medida que se applicasse a todos.

O sr. Alves Martins: — Os egressos foram cerceados nas suas prestações em 1843 pelo sr. conde do Tojal, então ministro da fazenda, que apezar de não estar em dictadura, intendeu que os egressos, porque não linham espadas, e não podiam reagir, de 1:200 contos que elles recebiam, podia cercar-lhes 600 contos para arredondar o orçamento.

Ora o decreto de 30 de maio de 1834, por um rasgo de penna disse: — ficam extinctas as ordens religiosas, e os seus donos ficam com uma prestação, e os seus bens ficam pertencendo á nação. — Destes egressos uns ficaram com a prestação mensal de 12$000 réis; outros com a de 7$200. Esta verba pesava sobre o thesouro, e o sr. conde de Tojal, para arredondar o orçamento, porque isto de orçamentos tem sido uma giga-joga de cifras, e nada de real; e para apresentar um deficit pequeno á camara, deitou-se art., egressos, e tirou-lhes 600 contos. Daqui aconteceu, que aquelles que linham 12$000 réis, ficaram com 0000; e o» que tinham 7$200 réis, ficaram com 3$600. Pergunto: qual é o homem que, pertencendo a uma classe decente, que tem ordens sacras, que tem de viver no meio de uma sociedade civilisada, póde viver com 6$000 réis, ou 3 $600 de prestação mensal?

Quando as classes activas estavam em atraso de 10 mezes, estavam as inactivas com 20 mezes de atraso! Os legisladores, vendo este mal, e ouvindo os grilos destas victimas, que fizeram! Disse-se, que nos empregos ecclesiasticos fossem attendidos os egressos com preferencia: e como têem cumprido os governos esta disposição?... (O sr. Justino de Freitas: — Os governos teem attendido) Eu, quando fallo, tenho consciencia do que digo, e estou habilitado para responder. No anno passado, quereis saber quantos egressos

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entraram para igreja», por meio de concurso? Foram apenas dezoito. Eu tenho a relação official, que pedi aqui no anno passado, o sei como os governos teem attendido os egressos. Não ha duvida que os teem attendido, mas não tanto como deviam; porque se desde 1834 até hoje tivesse havido bons governos, já não havia nenhum egresso para empregar. (Apoiados)

Ora, pergunto: é de justiça ou não, attender a estes homens? (Muitos apoiados) Pois estes homens que não podem trabalhar, hão de viver com 3$600) réis? Nós estamos aqui a annullar reformas, a dar dinheiro a quem póde trabalhar, e não queremos attender esta classe? (Muitos apoiados) Será porque ella é inerme e desgraçada? Pois de certo é esta uta espada na mão. (Apoiados)

Na commissão ecclesiastica está um projecto tendente a melhorar a sorte dos egressos; portanto deixemol-o correr os seus termos, e vamos a ver se por elle vem algum meio para levantar esta classe do estado miseravel em que está. (Apoiados)

O sr. Placido d'Abreu: — Sr. presidente, estou bastante satisfeito por ler provocado a discussão que tem tido logar. Os individuos a quem respeita esta representação, são dignos de toda a consideração, para se tomar uma medida que vá attender ás circumstancias penosissimas em que estão; e estas circumstancias são muito attendiveis, porque quando estes individuos entraram para as corporações religiosas levaram um dote que, para assim dizer, era um deposito sagrado a que tinham todo o direito, porque era a parte dos bens a que linham direito, por serem pertencentes ás suas familias; e esses depositos, que deviam conservar-se intactos, que eram o capital donde tiravam os meios de subsistencia; esse capital, como disse o sr. Alves Martins, foi adjudicado á nação; e hoje serve de disputa, porque todos o querem, em quanto que os seus verdadeiros donos estão em desgraça e na miseria. E necessario, pois, adoptar algum meio, tomar alguma medida, pela qual se attenda á situação lastimosa em que se acham estes individuos; porque as necessidades do thesouro são grandes, mas não são taes — e ainda que o fossem — que nos prive de tomarmos uma medida justa para estes individuos pertencentes a uma classe que tem tantos direitos sagrados a serem attendidos, prestando-se-lhes os meios de subsistencia.

Eu pedia que se mandasse a representação destes individuos á commissão, que está tractando do projecto a respeito desta classe, e que essa commissão dê, com urgencia, o seu parecer, e que se consigne nelle o principio de que os egressos tem preferencia absoluta no provimento de beneficios ecclesiasticos; e que em quanto houver um unico egresso, ninguem possa ser provido nos mesmos beneficios com preferencia a elles; porque eu reputo todos os egressos no raso de serem providos nos differentes beneficios ecclesiasticos; e não posso, não devo suppôr, que uni egresso qualquer, não tenha virtudes e conhecimentos bastantes para exercer o ministerio ecclesiastico.

Parece-me, pois, que esta representação deve ser remettida á commissão que está tractando do projecto a que se alludiu na discussão deste parecer, e que ella dê, com urgencia, o seu parecer para se attender a esta classe.

O sr. Dias e Sousa — Sr. presidente, eu não tencionava tomar parte nesta discussão. Este objecto já por muitas vezes tem occupado a attenção das camaras; e todas ellas teem sempre manifestado um sentimento favoravel a esta classe. (Apoiados) Ainda não houve camara alguma que não reconhecesse a justiça que lhe assiste, quando se lhe tem dirigido queixando-se do córte que soffreu nas suas prestações: todos que teem coração, apresentam sempre um sentimento favoravel para com estes individuos. Tem sido o estado da nossa fazenda publica, que tem sempre impedido de se tomar uma medida definitiva a respeito desta classe, E nós não podemos agora tomar uma resolução rasgada, como ora nosso desejo, pela qual se attenda desde já ás representações que fazem objecto do parecer que se discute.

E preciso notar aos illustres deputados, que sem a estatistica do pessoal destes egressos, que ainda actualmente vencem prestação; sem vermos a quanto monta essa quantia que é necessaria para occorrer a essas despezas por via do thesouro, nós não podemos, sem merecer uma severa censura, e sermos Inchados de menos prudentes, tomar uma resolução, que se póde tornar impossivel na pratica, por não estar habilitado o thesouro com os meios necessarios para satisfazer a esses novos encargos. Por consequencia este negocio deve ser resolvido mais de espaço, e depois de se attender a muitas circumstancias, que é preciso não perder de vista.

Eu não approvo o parecer da illustre commissão de fazenda, quanto ás ponderações que allega para o sustentar; approvo a conclusão do parecer; mas não estou daccordo com o que diz a commissão quando expõe — que ha outros empregados que estão nas mesmas circumstancias. — Eu digo, que não ha ninguem nestas circumstancias; (Apoiados) não ha ninguem absolutamente ninguem nestas circumstancias. (Apoiados O acto que se practicou de reduzir as prestações aos egressos das ordens regulares e ás freiras, é um acto que não tem similhança com outros que se practicaram com outras classes; (Apoiados) é um acto que se póde chamar uma verdadeira e completa espoliação. (Apoiados) Se esta palavra aqui se póde empregar, de certo póde-se empregar com toda a propriedade em relação a este objecto.

E certo, porém, que todas as administrações que tem havido, por mais exclusivos que tenham sido os individuos que as tem composto, tem constantemente procurado contemplar esta classe; todas as vezes que se tracta de prover algum beneficio ecclesiastico, tem procurado attender muito a estes individuos, e muitos tem sido attendidos e providos; mas, como v. ex.ª sahi muito bem, ha um grande numero de egressos que, por mais excellente que seja a sua conducta, comtudo por outros motivos são inhabeis para serem providos nos beneficios ecclesiasticos. E preciso que se saiba isto; são inhabeis porque não teem as habilitações proprias e competentes para exercer certos cargos ecclesiasticos. Muitos dos egressos que hoje existem, eram coristas ou leigos quando se extinguiram as ordens religiosas; e estes não podem, por não terem estudos, nem mesmo as ordens necessarias, servir senão para algum thesoureiro, e em verdade os governos teem já attendido muitos destes individuos, admittindo-os para exercerem o cargo de thesoureiros em differentes parochias do reino.

Em regra geral, posso dizel-o aqui, e digo-o bem alto, porque quero que sôe lá fóra: — em regra geral.

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todos os egressos distinctos, e que tem conhecimentos, e teem recorrido ao governo, têem sido attendidos; — (Apoiados) em regra, esta é a verdade; mas é innegavel que, como acontece em t (das as corporações as mais distinctas, ha alguns a quem se lhes não póde entregar o alto e importante ministerio de cura d'almas, porque não teem as habilitações necessarias para isso; faltam-lhes muitos predicados indispensaveis.

Por consequencia já se vê que não é admissivel a condição absoluta que o meu amigo o sr. Placido de Abreu quer estabelecer a respeito da preferencia sempre para os egressos no provimento de qualquer beneficio ecclesiastico. Essa condição absoluta e generica não se póde estabelecer, nem era possivel executar-se. (Apoiados)

E preciso tambem dizer á camara, que, além dos nossos governos não terem, desde 1834 para cá, despresado essa classe, de lerem aliás sempre attendido os individuos que lhe pertencem, quando se tracta de algum provimento de beneficio ecclesiastico; e tem mesmo aos que pela sua idade e molestias não podem já exercer as funções ecclesiasticas, prestado toda a attenção, porque, aos que estão neste caso, se lhes dá o duplo da prestação paga integral e regularmente; portanto o governo tem prestado todo o cuidado áquelles que mais necessidade leiu desse cuidado.

Por ultimo direi, que approvo a conclusão do parecer da commissão, mas não estou de accordo coma comparação que ella faz, porque em comparação se não dá. Em quanto ao mais, desejo que esta classe seja especialmente attendida, porque na verdade o merece; mas todos sabem, como ha pouco disse, que o estado da nossa fazenda tem impedido que se tenha tomado uma medida geral a este respeito.

O sr. Santos Monteiro. — O parecer da commissão ninguem o combate, apenas o sr. Dias e Sousa não concorda com as suas premissas; e intende s. ex.ª que não ha nenhuma outra classe que se possa confundir com os egressos.

Eu farei de passagem á camara uma observação: eu tenho sempre muito receio de que appareçam discussões de improviso, onde se soltem frazes, que, não sendo muito bem calculadas, possam ser aproveitadas por alguem que muitas vezes costuma occupar uma tribuna nesta casa, que felizmente hoje vejo deserta.

Tambem devo observar á camara, que a sorte dos egressos ha muito tempo que é má, mas já foi muito peior do que é actualmente. Foi muito peior quando se lhes cerceavam os vencimentos e se lhes não pagavam; hoje estão cerceados, é verdade, mas felizmente têem-se-lhes pago.

Dizer-se que não ha outras classes que estejam nas mesmas circumstancias, parece-me que não é exacto: os pensionistas do montepio, que tinham prestações por effeito de um contracto, tambem não deixam de estar nas mesmas circumstancias cm que estão os egressos. Ma, além disso, muitos individuos que tinham officios publicos, havidos por contracto oneroso, em que se dispendeu dinheiro, e que ficaram sem elles. Digo isto para justificar os fundamentos do parecer da commissão, porque em quanto á conclusão ninguem deixa de votar por ella.

Ora o sr. Alves Martins, nas suas proprias observações, é quem defendeu a commissão. Aonde havemos de ir buscar os 600 contos para perfazer as prestações? Não é possivel.

Em quanto as arguições feilas ao governo por não ter preferido os egressos para Os provimentos publicos, nessa parte fizeram-me muita impressão as observações do sr. Alves Martins, e estimei velas destruidas pelas outras do sr. Dias e Sousa.

Ora no requerimento referem-se os requerentes a um projecto de lei apresentado por um sr. deputado, que foi eleito para este anno, e que infelizmente não pôde cá voltar — o sr. Ferreira Pontes, mas não sei onde está o projecto.

A commissão de fazenda não podia tractar o negocio debaixo de outro ponto de vista, nem era competente para o Tractar.

O sr. Pinto d'Almeida: — Requeiro que se consulte a camara sobre se a materia está sufficientemente discutida.

Julgou-se discutida — E o

Parecer — foi approvado.

O sr. Placido de Abreu: — Mando para a mesa um projecto de lei, para que os alumnos de Coimbra tenham as mesmas vantagens, quando matriculados na escola do exercito, que os alumnos da escola polytechnica de Lisboa. Isto é uma medida de toda a justiça; e alguns srs. deputados tiveram a bondade de o assignar. Eu pedia a v. ex. que elle se imprimisse no Diario do Governo.

Ficou para segunda leitura.

O sr. Mara (Francisco): — Vou mandar para a mesa um parecer da commissão de fazenda sobre um requerimento da camara municipal de Barcellos; e ao mesmo tempo peço a V.ex.ª se sirva mandar inscrever-me para apresentar um projecto de lei.

O sr. Paredes: — Mando para a mesa o seguinte requerimento pedindo esclarecimentos no governo. (Lin).

Ficou sobre a mesa para ler ámanha o competente destino.

O sr. Alves Martins. — Mando para a mesa uma representação dos habitantes de Castello de V ide, «peço que seja remettida immediatamente ao governo para lhes deferir, porque é objecto que o governo póde conceder. São tres as freguezias que ha em Castello de Vide, e havia uma exigencia dos habitantes ha muito tempo para se reduzirem estas tres freguezias, que eram muitas, a duas; como havia tres parochos collados, a reducção não se fazia; mas morreu agora um, por consequencia está o governo nas circumstancias de fazer esta reducção sem haver contestação nenhuma legal da parte de interessados; ha já o informe favoravel da junta geral do districto.

Agora mundo outra representação, que eu peço que vá á commissão de fazenda; é dos amanuenses de segunda classe do thesouro, que pedem uma cousa da maior justiça; mas quanto a este pedido, sem o governo annuir a elle, não Se faz nada; a camara nada póde fazer sem que o governo intervenha, e reconheça a justiça que elles têem. São amanuenses de segunda classe do thesouro, que é uma repartição superior do estado, e requerem e pedem ser e devem ser equiparados aos amanuenses de segunda classe de todas as repartições do estado da mesma cathegoria. Não ha nada mais justo do que isto; mas isto não se leva a effeito, como disse, sem que o governo intervenha. Deve ser remettido á commissão de fazenda, creio eu, e a commissão de fazenda o convidará para o consultar.

O sr. Bivar: — Desejava perguntar á illustre commissão de legislação, se tenciona apresentar alguma

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providencia de legislação permanente acêrca de divisão de territorio, ou conceder auctorisação ao governo, para nessa divisão fazer as alterações convenientes; porque no caso de resposta negativa da commissão, apresentarei um projecto de lei a este respeito.

O sr. Presidente: — A commissão de legislação ouvio a pergunta do sr. deputado; e então algum de seus membros póde declarar, se a commissão tenciona apresentar algum projecto sobre a divisão de territorio.

O sr. Mello Soares: — Sr. presidente, a commissão tem encetado já trabalhos sobre a reforma da divisão do territorio; até já pediu ao governo esclarecimentos a este respeito, para ver se póde fazer um trabalho mais bem acabado: porém não tem podido ultimar este trabalho, porque tem estado occupada com outros objectos urgentes; mas não deixa de cuidar delle, e parece-me que quanto antes ha de vir trazer á camara um projecto a este respeito.

O sr. Uivar: — A minha pergunta foi, se a illustre commissão de legislação tinha tenção de conceder ao governo uma auctorisação permanente para fazer a reforma da divisão de territorio.

O sr. Mello Soares: — A opinião da commissão a este respeito por ora não está formada; se sim ou não, se ha de conceder ao governo um voto de confiança para esse fim, isto não depende da commissão, depende da camara (Apoiados). Portanto a commissão não póde dizer, se sim ou não, s ha de conceder um voto de confiança ao governo, porque não tractou ainda deste objecto.

O sr. Vellez Caldeira: — Sr. presidente, a commissão de legislação pediu ao governo os trabalhos da commissão externa, porém ainda os não recebeu; eu pela minha parte tenho insistido por que se dê preferencia a esse trabalho. Agora emquanto á pergunta do illustre deputado, se a commissão tenciona dar ao governo uma auctorisação permanente, para fazer a divisão do territorio, parece-me que esta pergunta é um pouco imparlamentar; eu, como deputado, não hei-de conceder tal auctorisação, porque nunca hei-de abdicar no governo o direito de fazer leis (Apoiados).

O sr. Bivar: — Peço ser inscripto para apresentar um projecto de lei.

O sr. Affonso Botelho: — Mando para a mesa o seguinte requerimento, pedindo esclarecimentos ao governo.

Ficou sobre a mesa para ter ámanha o competente destino.

ORDEM DO DIA.

Discussão do projecto n. 32. É o seguinte:

Projecto de lei (n.º 32). — Senhores: Sendo preceito da carta a existencia do jury (artigo ]19.º);

Estatuindo o mesmo codigo que a lei seja igual para todos <§ 11.º do artigo 14').º);

Não se dando no estado da India circumstancia que obste a que seus habitantes desfructem esta salutar garantia dos seus direitos civis, por isso que

1. Não ha causa que mude a natureza civil dos europeos, que alli vão residir;

S.º E reconhecido que os filhos da Asia têem uma intelligencia em nada inferior á da raça europea;

E 3. Não se habilitam menos, para merecerem esta garantia, que os portuguezes de muitos dos districtos do reino, como, quanto a Gôa, é provado pela estadistica; (1)

Considerando porém: lº que os filhos das Novas Conquistas não estão naquellas circumstancias; e que, insistindo na clausula com que se sujeitaram ao dominio da corôa portugueza, são regidos por seus usos e costumes, entre os quaes ha mesmo o de, em certas circumstancias, serem julgados por seus pares, mas por uma fórma especial; e 2.º a que a vossa commissão não tem toda a necessaria informação para avaliar as especiaes circumstancias de Damão e Dio:

Parece á vossa commissão do ultramar que o projecto de lei n.º 5 G do deputado por Gôa o sr. E. J. Mascarenhas é reclamado pela justiça, e por isso, de accôrdo com o governo, o submette á vossa illustrada deliberação nos termos do seguinte projecto de lei.

Artigo 1.º As leis e mais disposições vigentes no reino, relativas á instituição do jury, são applicadas ás tres comarcas das Ilhas, Salcete e Bardez do estado da India.

§ unico. São exceptuados os processos em que unicamente forem partes os habitantes daquelle estado, que são regidos pelos usos e costume das Novas Conquistas, a respeito das quaes não ha innovação.

Art. 2.º O governo geral, em conselho, é auctorisado a modificar a dita legislação, antes de ser posta em practica, quando ao seu litteral cumprimento se opponha alguma especialidade local; o que fará constar ao governo de Sua Magestade, para este dar conta ás côrtes dessas modificações.

Art. 3.º Fica revogada a legislação em contrario.

Camara dos deputados, 1.º de abril de 1853. = Adrião Accacio da Silveira Pinto, presidente. = =. Frederico Leão Cabreiras D. Antonio José de Mello e Saldanha. — Custodio M. Gomes. — Estevão Jeremias Mascarenhas. = Antonio Maria Barreiros Arrobas. — Guilherme José Antonio Dias Pegado

O sr. Paredes: — Sr. presidente, proponho o adiamento deste projecto até que venham do governo os esclarecimentos que pedi pelo ministerio da marinha e ultramar. Intendo que estes esclarecimentos, nas actuaes circumstancias, podem dar muita luz á questão que se agita; desejo que não sejamos precipitados nesta questão, que póde Trazer talvez ou muito grande mal, ou muito grande bem para os estados da India. Ouvirei as razões que se derem em contrario, e depois votarei conforme a minha consciencia. Mando pois para a mesa a seguinte:

Proposta: — Proponho o adiamento da discussão deste projecto até que venham do governo os esclarecimentos que pedi, pelo ministerio da marinha e ultramar. — Paredes.

Sendo apoiado, entrou em discussão.

(1) Veja-se o relatorio do ministerio do reino de 1852, a estadística da população de Gôa datada de 5 de maio de 1852, e a do movimento das aulas de ensino primario, inseria no boletim de 3 de dezembro de 1852, donde se ê que se o numero dos alumnos do seio masculino está no reino e ilhas, para a respectiva população masculina, como 18 para 1.000, e na antiga conquista de Gôa como 104 para 1.000, é certo que muitos districtos do reino offerecem uni quadro que dá grande superioridade ao districto de Gôa. Com effeito esta proporção para 1.000 é de 10 no proprio districto de Lisboa, de 6 no do Porto, de 4 nos de Bragança e Portalegre, e chega a ser de 1 só no de Villa Real!

Se se attender ainda a que a população gentilica não frequenta em Gôa as aulas publicas, e a que, proporcionalmente, ha mais litteratos nos habitantes da Antiga Conquista que seguem aquella crença, do que Christãos, reconhecer-se-ha que o paralello se torna muito mais favoravel para o districto de Gôa..

VOL.V — MAIO — 1853.

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O sr. Mello Suares: — Parece-me que o adiamento, que se acaba de propor, não póde ter logar. O illustre deputado auctor do adiamento fundou-se na necessidade de esclarecimentos, porém como o sr. ministro da malinha e ultramar está presente, e s. ex.ª está habilitado para responder, intendo que o adiamento é inutil. (Apoiados)

O sr. C. M. Gomes: — Pedi a palavra para convidar o illustre deputado auctor do adiamento para que tivesse a bondade de dizer á camara quaes são os objectos sobre que precisa esclarecimentos; porque estando presente o respectivo ministro talvez s. ex.ª possa dar esses esclarecimentos, se elles forem de natureza de poderem ser desde já satisfeitos. Por isso intendo que não póde ter logar o adiamento.

O sr. Paredes: — Os motivos em que se funda o adiamento que propuz; estão exarados no requerimento que mandei para a mesa. Naturalmente o illustre deputado não deu attenção á sua leitura, e por isso os ignora. Consta-me que no principio de 1837 quando o jury foi estabelecido na India, houve taes decisões delle, que levaram o governo daquellas possessões a representar, para que elle fosse suspenso, porque das suas decisões linham resultado graves inconvenientes: esta representação veiu ao governo de Sua Magestade, e o governo de então, considerando os motivos, que nella se allegavam, deferiu a essa representação. e mandou que os jurados fossem suspensos na India. Ora eu não sei quaes foram os fundamentos dessa representação, porque não a vi ainda, e apenas tive a informação que acabo de declarar; mas dezejava para me instruir, e poder votar mais consciosamente neste projecto, que essa representação viesse á camara; e por isso propuz o adiamento do projecto até que ella venha.

Tenho mais uma razão para propôr o adiamento, que vem a ser: eu quando leio o parecer da illustre commissão, vejo que ella propria vacilla sobre -este objecto: porque no § unico do artigo 1.º faz excepções, e no artigo 2 diz — que o governo geral, em conselho, é auctorisando a modificar a dicta legislação antes de ser po-la em practica, ele. Por consequencia ve-se que mesmo a illustre commissão vacilla sobre este objecto

Ora eu não sou tão fanatico pela instituição do jury que a adore, nem tão inimigo que a rejeite; eu quero o jury, mas não o quero pula maneira como está organisado entre nós; porque a experiencia de muitos annos tem-me feito conhecer que esta instituição tem produzido muito maiores males, do que bens, entre nós; por agora não quero descer a especialidades, nem a factos que tenho presenceado; guardo isto para occasião mais opportuna. Portanto pelo artigo 1.º do projecto vejo eu que é transplantado para a India o jury como está organisado em Portugal; e como eu intendo que elle não está bem organisado, logo é claro que não posso concordar em que mandemos para lá um mal.

Ainda tenho outro escrupulo. Os illustres deputados que desejam os jurados na India, pedia-lhes que me dissessem... (Vozes: — Ainda senão discute a materia) o que desejo é declarar os motivos que tenho para entrar na discussão deste projecto; tenho ainda outra duvida, porque não sei se póde haver jurado na India, porque o artigo 118.º da carta constitucional diz — “ O poder judicial é independente, e será composto de juizes e jurados, os quaes tem logar assim no civel, como no crime, nos casos, e pelo modo que os codigos determinam — » Não sei quaes são os codigos que regem na India; e se alli ha codigos; creio que não; mesmo em Portugal não os ha — temos o codigo civil; e o codigo penal temo-lo ainda ha dois dias — Mas quer haja ou não haja; eu quero o jury organisado de outra maneira.

Não quero entrar na especialidade; quando della se tractar, eu direi o que intender. E a respeito desta questão, devo mais declarar que na commissão de legislação esta um projecto em que se propõe uma organisação regular entre nós sobre o jury. Quando se organise regularmente, como deve, então Veremos se convém a sua applicação á India, do contrario iremos fazer mal aos habitantes daquellas possessões, em logar de lhes fazer bem.

O sr. Jeremias Mascarenhas: — Sr. presidente, o illustre auctor do adiamento, fundamentando-o disse que não provava bem o jury; que linha dado muito máos resultados em Portugal, que o não queria como estava organisado, nem cá, nem para a India, que a transplantação do jury para a India, assim organisado como está, daria um presente funesto: alludiu a cerra conta dada em 1837, e asseverou, que em virtude desta conta é que fóra suspenso o jury na India.

Sr. presidente, tracta-se do adiamento, por isso não entrarei na materia; comtudo direi de passagem que os melhores publicistas são apologistas do jury, reconhecem as suas vantagens, a sua efficacia, alguns até dizem, que onde não ha jury, não ha systema e governo representativo.

Referiu se a conta, que diz, o governo da India dirigiu ao da metropoli em 1837, e em virtude della fóra suspenso alli o jury; eu direi ao illustre deputado, que não tenho conhecimento desta conta; mas o certo é, que não foi suspenso o jury em consequencia da referida conta; nem o podia ser; porque a suspensão do jury é em virtude do decreto de 16 de janeiro, artigo 15.º (Leu); logo não póde ser em virtude da couta de 1837, como diz o sr. deputado, a qual, no supposto que fosse da data do 1. de janeiro do dito anno 1837, não havia tempo para mesmo chegar a Portugal, principalmente então, porque ainda não estava franqueada ao» portuguezes e auctoridades de Goa, o caminho e correio por Alexandria. Se foi suspenso, foi em consequencia da inexacta informação do governo da metropoli, é de notar, que naquelle decreto de 15 de janeiro, que é organico do ramo judicial de Africa, se accrescentou unicamente no artigo 15.º, como incidentalmente a palavra — na Asia — relativamente á suspensão do jury unicamente, ao mesmo tempo que se não havia dicto nada a este respeito no decreto de 7 de dezembro de 1836, que organisou o ramo judicial na Asia. No relatorio do referido decreto de 16 de janeiro se diz, que na Africa não ha illustração necessaria para ia haver jury; e suspende-se o jury na Asia onde não se dá esta falta da illustração, onde elle se linha provado ião bem por tres annos, que alli vigorou, como se diz no relatorio do meu projecto, sobre que recahiu o parecer e projecto da illustre commissão do ultramar, que está em discussão (Leu o periodo da consulta da junta geral de 1840). Agora accrescentarei mais, que o que me consta é, que o governo da India não representou contra o jury na India, pelo contrario reconheceu a sua utilidade, e suas incontestaveis van-

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tagens, por assento tomado pelo governo em conselho de março de 11) 33, ao qual reconhece tambem, que na India não se verifica a razão da falta da illustração, a que -se refere no relatorio do decreto do 16 de janeiro de 1837; «declara, se no entretanto suspende o jury, não é por esta razão do relatorio, mas sim unicamente em obediencia ao disposto no dicto decreto ficando de levar quanto antes ao alto conhecimento de Sua Magestade a Rainha este negocio, para implorar a sua real munificencia, a fim de não serem privados os portuguezes da India da salutar garantia do jury. (Leu o alludido assento) A commissão ouviu tambem o sr. Pestana que governou a India perto de 7 annos, e este illustre cavalheiro «não faltou á justiça, em informar á commissão, que nas tres comarcas, para as quaes se propõe o jury, ha mais que bastante illustração, e lodosos mãi elementos necessarios confirma-o o meu illustre amigo o sr. Gomes, que é membro do commissão, e foi secretario geral do governo da India. Accrescentarei finalmente, que, quando eu fui eleito deputado, a primeira cousa que me recommendaram com todo o empenho para sollicitar cá, foi o restabelecimento alli do jury; escreveram mesmo a este respeito ao meu nobre amigo deputado por Goa e presidente da commissão, o sr. Adrião Accacio. (O sr. Accacio: — É verdade) Logo do que acabo de dize», se conclue, que os povos de Goa reconhecem as vantagens do jury para alli, pedem-na com empenho; os delegados do governo informam, que alli ha todos os elementos necessarios para sua execução, e reconhecem a sua vantagem; que informações mais quer, pois, o sr. deputado, que outras informações póde dar o sr. ministro da marinha? Mesmo no projecto e n'unia nota, vem dados estatisticos sobre o numero dos que sabem lêr e escrever portuguez.; sobre os quaes poderá dar melhores esclarecimentos o meu amigo o collega o sr. Gomes, que é auctor delles.

O sr. Tavares de Macedo: — Sr. presidente, eu necessito ser um pouco mais extenso, mas unicamente para justificar uma proposta de adiamento que vou mandar para a mesa.

Que haja jurados nas causas e-crimes, é um principio consignado no art. 118.º da carta constitucional; mas diz tambem — nos casos e pela fórma que a lei determina — E uma palavra sacramental para quando se der a circumstancia de haver jurados, ou seja nas cauzas civis ou em qualquer cauza crime. Já se vê pois que para a fiel observancia da carta constitucional, não póde deixar de haver jurados no reino. Vamos agora a vêr se se podem estabelecer vantajosamente e sem inconvenientes na India (O sr. Jeremias: — Póde.) O nobre deputado diz que póde haver o jury na India: é exactamente o ponto a que eu quero chegar. Vamos a vêr se as circumstancias alli são as mesmas, e quando vierem as informações que peço, estou certo que ha de apparecer comprovado o que eu tenho asseverado.

Os jurados podem considerar-se como uma instituição judicia, ou como uma instituição politica. E; por esta fórma que os consideram todos os jurisconsultos. Como instituição judicial não vejo que os maiores mestres em jurisprudencia lhe dêem grande importancia; pelo contrario vejo que Lerninier o rejeitava em Inglaterra nas causas civeis; e vejo que; Lerninier, Tocqueville e outros não dão importancia aos jurados para o aceito do julgamento.

Considerando ainda os jurados como instituição judicial, para que ella possa ter logar é necessario que haja grande numero de individuos, que possam exercer las funcções; por que sendo da competencia de poucos póde-se facilmente (ornar em tyrannia.

Na India não ha o necessario numero de individuos aptos para serem jurados, por que muito pouca gente sabe a lingoa portugueza, e peço licença para lêr algumas linhas da Memoria do sr. Lousada sobre o estado da India:

Fallam a lingua portugueza Os nativos e gentios que vivem em communicação com os europeos e a seus descendentes: como são os empregados publicos, os clerigos, os advogados, os mercadores e outros; mas são raros os que fallam correctamente, o commum é um jargão peculiar; e por isso entre a si, nas mesmas repartições publicas, em casa e nos u quarteis elles fallam a lingoagem do paiz; no centro mesmo das familias descendentes de europeos a é o dialecto em voga, entre os domesticos e seus amos: fóra destes logares, um ou outro intendem o portuguez; alguns o escrevem como quem copia notas de musica, sem intenderem uma só palavra; e aldeãs ha, e multas, nas quaes se não encontra a uma pessoa branca, e onde por conseguinte ninguem conhece a lingoa portugueza, pois até nas escólas de primeiras leiras se falla a do paiz. D. Manoel de Portugal e Castro quiz obstar a este máo «uso, e ordenou que nas repartições publicas e nos a quarteis se fallasse unicamente a lingoa portugueza, a o que não póde ter resultado, por que é nos corpos militares, que os soldados, que perfeitamente a manobram á voz portugueza, não percebem pela a maior parte, nem sabem proferir uma só palavra deste idioma. No púlpito e no confessionario falla-ii se a lingoa do paiz. O arcebispo de Goa Fr. Manoel de S. Gualdino, que a conhecia perfeitamente, a fazia as suas homilias naquelle idioma para ser a intendido.

A isto accrescentarei, sr. presidente, que em todos os tribunaes ha sempre um interprete da lingoa do paiz, por que nem réos nem testimunhas sabem a lingoa portugueza. Como poderá pois haver processo com jurados, onde ha tão pouca gente que intende a lingoa dos tribunaes?

Além disto é necessario que o jurado offereça inteira confiança ás partes, ou seja nas causas civeis ou nas criminaes; e duvido muito que lai possa acontecer em um paiz de castas inimigas, ou ao menos sempre de pouca sympathia umas para as outras; o isto chega alai ponto que até na religião, onde todos são iguaes diante de Deos, isto se faz sentir: em outro tempo havia conventos onde só se admittiam individuos de certa e determinada casta — os theatinos e da congregação do oratorio só admittiam bramenes; e outros, como os carmelitas descalços, só admittiam charadós.

Sr. presidente, segundo a theoria de Gans, a decisão dos jurados é a confissão da consciencia do réo expressada pela boca dos seus pares; e como poderá isto verificar-se, quando os jurados foi em de uma casta differente da do réo?

Os membros da commissão para mostrarem que na India ha a illustração necessaria para o estabelecimento dos jurados, disseram que posto o numero dos individuos, que em Portugal frequentam as aulas de instrucção primaria seja maior proporcionalmente

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que na india; comtudo o numero dos que nas velhas conquistas as frequentam, é igual a alguns dos mais importantes districtos de Portugal, e muito superior ao de outro, pois em quanto na India ha 10 individuos nas aulas por cada mil habitantes, em alguns do reino ha 6, 4, e até no de Villa Real um por mil habitantes. Sinto muito que a commissão não tivesse suspeitas da inexactidão dos dados de que se serviu, porque, segundo as informações ultimamente vindas á camara no districto de Villa Real não andam nas aulas 90 alumnos, como a commissão se persuadiu, mas sim 2.871, e de maneira que em vez de um andam 32 por cada mil habitantes; e a respeito dos outros districtos as informações a que me refiro, mostram a inexactidão do que a commissão allega, e por consequencia, nada se póde concluir de tal argumento.

Mas ainda quando fosse certo havei mi India mais gente sabendo ler e escrever do que em Portugal, não se segue d'ahi que tenham a illustração e intelligencia necessaria para as funcções de jurados. A educação de um povo não consiste só em aprender a ler e escrever; são necessarias mais ideias, e a acquisição de habitos para que não basta a frequencia das escólas primarias.

Sinto muito que não esteja presente o sr. ministro do reino para lhe pedir que dê as providencias necessarias para se melhorar a estatistica da instrucção publica, para que não possa acontecer o que fez a (COMMISSÃO, que não só, no seu intender, vai por um caminho errado, mas lança um immerecido desfavor sobre o estado da instrucção popular de alguns distinctos do reino, que de certo o não merecem.

Pelo que tenho dicto, sr. presidente, parece-me que nós não nos achamos habilitados a approvar este projecto sem que nos venham novas informações, porque é necessario que haja um grande numero de individuos que possam ser jurados, e no estado da India parece-me que ha muito poucos que estejam nestas circumstancias; ~é necessario que os jurados mereçam confiança ás partes, e essa confiança parece-me que não póde existir, facilmente, onde ha castas rivaes e castas inimigas.

Mais alguma cousa, sr. presidente: até agora considerei o jury unicamente como instituição judicial, agora considera-lo-hei como instituição politica. Um sr. deputado citou Benjamin Constant, que diz — não ha governo constitucional onde não houver jurados — a isto só responderei que a civilisação e o estado da sociedade asiática é differente da europea, e permitta-me recordar-lhe, que não ha muitos annos um distincto francez escreveu um livro magnifico sobre as differentes civilisações que existem no mundo, classificando-as segundo as differentes religiões.

Mas o que é necessario para ser considerada instituição politica a instituição dos jurados? É que possam todos os eleitores ser jurados, porque é ahi que aprendem a necessidade de que se faça justiça a todos. Ora pergunto: é possivel que isto aconteça, quando q, maximo numero não sabe a lingua portugueza? E possivel que todos os cidadãos do estado da India sejam jurados, quando são tão poucos os que fallam portuguez? A conclusão que tiro é, que no estado actual da civilisação da India parece-me que é inadmissivel a instituição dos jurado naquelle paiz.

Alas, ainda mesmo quando eu queira prescindir das considerações, que me fazem rejeitar o projecto, do que eu não posso prescindir é das informações, que mostrem que ha certos dados a respeito da India, que ainda que não tornem a instituição lá tão perfeita como devia ser, ao menos não offerecem inconvenientes que a façam rejeitar para lá. E por isso mando para a mesa a seguinte

Proposta. — Proponho o adiamento do projecto n.º 3-2, até que esta camara seja informada officialmente aos seguintes respeitos:

1. Qual é o numero de cidadãos maiores de 25 annos, que, em cada uma das comarcas das ilhas de. Goa, de Bardez, e de Salsete, sabem ler e escrever, e fallam a lingua portugueza.

2.º Qual o numero de individuos, em cada uma das mencionadas comarcas, que estando nas circumstancias mencionadas no quesito antecedente, teem de renda liquida 500 xerafins. = Tavares de Macedo.

Foi apoiado este adiamento e ficou tambem em discussão.

O sr. Gomes: — Sr. presidente, vou occupar-me de rebater os fundamentos com que se tem sustentado o adiamento.

O meu illustre collega pela India já mostrou, quanto ao artigo 2.º, que não havia hesitação no parecer; e tambem a não mostra o § unico do artigo 1., como eu vou explicar.

Nós possuimos na India o que se chama Velhas Conquistas desde 1510; e desde o seculo passado tivemos luctas com os nossos visinhos regulos que alli existiam, e destas luctas a consequencia foi, que por occasiões estivemos senhores dos seus terrenos: sublevavam-se depois, tornavamos a perder esses terrenos, e essa perda e acquisição repeliu-se por differentes vezes. Em certa occasião em que estavamos em lucta, esses sublevados, esses que não queriam ser dominados, propuzeram ao governo portuguez o seguinte: — Nós accedemos a sujeitar-nos ao dominio da corôa portugueza, uma vez que nos mantenham os nossos usos e costumes. — E o que veem a ser esses usos e costumes. — É a legislação especial desta parte do terreno de Goa, que lhe ficou adjacente pela ultima conquista, é a sua legislação, parte escripta e parte tradicional. — Ora, o governo que lá existia então, achou que esta transacção era vantajosa, e que das luctas continuadas que linha tido, vinham inales maiores do que annuir a este pedido: respeitaram-se por consequencia esses usos e costumes. Ora notarei que nestes usos e costumes sempre houve a existencia do jury, mas não regulado pelos principios liberaes da Europa, era regulado por esses usos e costumes de um povo menos civilisado.

Effectivamente as causas pertencentes a essa parte do territorio chamada Novas Conquistas, são julgadas por uma cousa chamada camara geral, isto é, por um jury da natureza do nosso, com a especialidade de que, em logar de serem elegiveis para este jury todos e quaesquer individuos, que tenham um certo censo e uma certa illustração, como se regula na Europa, ha rins certos individuos que têem o privilegio de compor esse jury. Por consequencia, note-se que a excepção que se faz, é para uns individuos, que por tractados se não sujeitaram á legislação geral de Portugal; note-se que a excepção é para os individuos, que já effectivamente tinham jury; note-se que estes individuos são a parte de Goa menos illustrada, graças a Deos, porque são aquelles que mais tarde commungaram com a familia portugueza.

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Ora, se nós já transigimos em que esses menos illustrados tenham jury, que difficuldade devemos nós ter em que a parte mais illustrada tenha o jury que ha na Europa

Mas diz-se: o jury que cá temos está, mal organisado. Se está mal organisado, emende-se. Pois devemos ler mais zelo por que seja optimo na India, do que seja optimo entre nós, que somos de cá. O que pedimos é que tal e qual o que existe, seja applicado áquella parte da monarchia. Agora diz-se: deixai aperfeiçoa-lo, e quando estiver perfeito, então iremos implanta-lo lá. Mas eu intendo que o jury como está em Portugal, é um beneficio para Goa, se lá for applicado (Apoiados). Diz-se: aqui a instituição do jury prova mal; mas tambem se diz que a instituição prova bem. (O st. Pinto de Almeida; — Prova optimamente. — (Muitos apoiados) são digo que no jury deixem de apparecer defeitos; mas tambem, apesar de que todos respeitamos muito a classe judicia], creio que nenhum de nós asseverará que todos os juizes são impeccaveis. (Apoiados)

Disse tambem o sr. Paredes que não sabia que codigos regiam na india. Devo dizer a s. ex. que são os mesmos que ha em Portugal, a carta, a reforma judiciaria, o codigo administrativo, o codigo commercial, etc. Por consequencia, existindo lá em vigor os mesmos codigos, em geral a mesma legislação, salvas as especialidades, e tambem cá temos especialidades, não vejo razão para, pelo fundamento de não haver lá os mesmos codigos, fundamento que não é exacto, deixar de existir o jury nos estados da India.

S. ex.ª propoz o adiamento até que viesse um documento que pediu, um officio do governador geral de 1837, e que era contra o jury. Sinto que não esteja presente esse documento; mas se por isso se devesse adiar a questão, então facil era adiar todas as questões na camara; se formos sempre a adiar as questões, porque um ou outro deputado se lembra de pedir um certo esclarecimento, ficam sendo todas as questões interminaveis. Eu não tenho soffreguidão de que passe já o projecto, mas vejo que essa razão trazia o inconveniente de se tornarem interminaveis as questões.

Ora notarei a s. ex.ª, que o governador de 1837 opinava contra o jury, mas o de 1838 opinava a favor; e já o sr. Jeremias leu aqui uma representação de um governador de 1838, e em conselho: aquella poderia ser uma opinião de um individuo; mas este em conselho já não é de um individuo, é de sete individuos, isto é, sete votos contra um.

A outra proposta do adiamento do sr. Tavares de Macedo tem por fim o saber quantos individuos de 25 annos sabem lêr e escrever, e qual o numero de individuos com certo censo para se estabelecer o jurado. Direi, que não havendo escrupulos para Portugal a similhante respeito, não sei porque razão se deve seguir outra regra para Gôa: deverei notar a v. ex.ª que não ha muitos exemplos de pareceres dados por commissões desta casa, que viessem acompanhados de dados estatisticos, como este; mas a commissão mostrou até as fontes insuspeitas, d'onde eram tirados esses dados estatisticos: por consequencia esta commissão não só desejou mostrar u sua boa fé, com que se soccorria a esses dados estatisticos, mas desejou, que todos nesta casa estivessem habilitados a tractar deste objecto. S. ex. disse, que esses dados estatisticos estavam destruidos por estatisticas subsequentes; mas todos farão justiça á commissão, quando ella se soccorre á estatistica apresentada pelo sr. ministro do reino, e que se publicou, e que vem junta ao seu relatorio. Alas disse-se — ha outra, que se não publicou. — Parece-me, que nenhum sr. deputado aqui dirá, o que se contém em todos os documentos que tem sido mandados para esta casa; não é possivel humanamente consultar todos esses documentos: mas direi — a caria constitucional estabeleceu um jury em Portugal; consultou-se nessa occasião a estatistica dos que sabiam lêr e escrever, e que linham um certo rendimento? Eu creio que não. Estabeleceu-se o principio absoluto, de que o jury em Portugal devia existir, mas nós, o que queremos, é, que a mesma legislação, que regula a respeito do jury em Portugal, seja applicada aos Estados da India,

Mas diz-se, — que lá e um paiz de pobertões. — Eu posso informar a camara, que em Gôa proporcionalmente a Portugal muito poucos individuos deixam de ter alguma propriedade, a sua palmeira, o seu bocadinho de terra, ou pelo menos interesses em algumas associações, denominadas com in lin idades agricolas; é um paiz, onde a instituição do jury deve mediar melhor do que aqui, porque a maior parte dos individuos tem interesses seus no paiz.

Quanto á objecção proposta relatimente a elles não fallarem portuguez, parece-me, que prova contra; e eu contarei um facto que se passou n'um tribunal em Gôa. Um individuo foi achado morto debaixo de uma palmeira; encontrou-se mais adiante outro individuo, foi preso e levado aos tribunaes; e todas as testimunhas foram concordes, em que tal individuo-linha sido morto debaixo da palmeira, julgando-se por consequencia que o preso fôra que o tinha assassinado debaixo da palmeira; por um incidente notou-se depois que o interprete traduzia mal o depoimento das testimunhas, porque o que ellas diziam era, que o homem tinha morrido da palmeira abaixo Todos sabem que ha um producto muito importante na India, que é colhido da palmeira, e por consequencia alguns individuos morrem, quando estão neste trabalho pela elevação em que estão: era um destes casos, que tinha trazido a morte daquelle homem.

Agora vamos á applicação deste caso; se em logar de ser um juiz, que não intendesse a lingua do paiz, houvesse um jury composto de gente que intendesse uma e outra lingua, decerto que este equivoco se não daria; (Apoiados) porque se as differentes linguagens impossibilitam os jurados, tambem impossibilitam as testimunhas, e talvez, os auctores e réo?, o que era um absurdo. — Em França e em Hespanha ha tantos dialectos que tornam inintelligiveis entre si os habitantes de differentes provincias, mas ninguem por isso condemna lá o jury.

Agora quanto á objecção das castas, ella é muito procedente para as ligações por casamento, e casos similhantes, mas nada tem com o trácio dos individuos no commercio, nos contractos e no jury; e se as castas estabelecem divisorias, mais fortes são estas entre nós, especialmente no que diz respeito a partidos pelas distincções de miguelistas, e constitucionaes, cartistas e setembristas ele. Ainda sobre castas citarei o que aconteceu em Inglaterra, que com quanto se não digam de castas differentes os inglezes propriamente dictos, e os irlandezes, é certo que a divisoria entre elles é mais pronunciada, do que a que existe

VOL. V — MAIO — 1853.

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nas differente; cautas da India e comtudo têem a instituição do jury. (Apoiados)

Quanto a não ser bastante para a illustração de um povo o saber lêr e escrever, concordo; mas o que eu intendo é que para ser jurado, se não póde exigir mais, do que saber lêr e escrever; e eu declaro que vi em geral mais illustração, mais bom senso na India, do que o tenho visto em muitos povos d'aqui em Portugal. Tenho dicto. (Apoiados)

O sr. 5. J. da Lia: — Sr. presidente, esta questão e summamente importante, e a prova de que a camara a considera assim, e que já muitas duvidas se tem apresentado. Eu tambem tenho alguma duvida sobre o modo porque se quer estabelecer a lei do jury na India, e por isso vou mandar para a mesa uma proposta que a camara a tomará na sua alta sabedoria.

A minha proposta é um adiamento, é verdade, mas é um adiamento que creio estar no caso de se votar desde já, até mesmo porque a commissão a que proponho seja remettido o projecto, pode apresentar o seu parecer em muito pouco tempo.

Todos sabemos que a commissão do ultramar é composta de muitas illustrações, e illustrações competentes no assumpto, quanto á localidade; mas o que é tambem Verdade é que os illustres membros da commissão, e não levarão a mal que o diga, pódem não ter verdadeiro conhecimento da materia de legislação, de que tracta o projecto, que se discute, — materia que eu considero muito importante, e sobre que, intendo, deve ser ouvida a commissão de legislação. Os differentes casos que se tem citado, provam a necessidade deste adiamento.

O illustre deputado pela India que acaba de fallar, quiz mostrar que a India tinha muita illustração, e que por isso estava no caso de poder gozar da garantia do jury; mas isto só não satisfaz. É necessario que se saiba qual o numero de individuos que estão lio estado de ser jurados, tanto por fallarem a lingoa portugueza, como por terem a renda necessaria para poderem funccionar no jury.

Parece-me que os esclarecimentos pedidos pelo sr. Tavares de Macedo são muito justos, porque, uma vez que se quer applicar á India a instituição do jury, é necessario que haja perfeito conhecimento do estado em que a India se acha e se tem individuos bastantes com os requesitos indispensaveis para serem jurados. O caso da morte succedida da palmeira abaixo que o illustre deputado citou, não prova nada a favor do projecto, porque a provar alguma cousa não póde ser se não que daqui por diante a disparidade da lingoa no jury vai causar graves embaraços e difficuldades; e vai fazer com que estas difficuldades sejam reproduzidas tantas vezes quantas forem as causas que forem submettidas ao jury. Não ha nada mais natural do que tomarem uma hypothese por outra, e tirarem consequencias diversas.

Por conseguinte, sendo esta questão de grande importancia e havendo já duas propostas de adiamento, uma do sr. Paredes e outra do sr. Tavares de Macedo, eu mando tambem outra para a mesa, a fim de que seja ouvida a commissão de legislação.

Proposta: — Proponho que o projecto n.º 32 seja enviado á commissão de legislação, para sobre elle dar igualmente o seu parecer. = — S. J. da Luz.

foi apoiado, e ficou tambem em discussão.

O sr. Jeremias Mascarenhas: — Sr. presidente, está em discussão o adiamento apresentado pelo sr. Lourenço da Luz, pelo qual pertende, que o projecto vá á illustre commissão da legislação; mas vejo que todos os argumentos dos nobres oradores, que o apoiam, versam não sobre a questão incidental do adiamento, mas sobre a materia do projecto; eu os não imitarei; reservarei para lhes responder, quando se tractar da materia, e limitar-me-hei unicamente ao adiamento.

O sr. Lourenço da Luz acaba de propôr, que o projecto vá á illustre commissão da legislação, para sobre elle dar a sua opinião; mas eu não comprehendo o motivo, porque apresenta esta proposta, se não é unicamente a vontade de se tirar da discussão este projecto. Eu respeito muito cada um dos nobres membros da illustre commissão da legislação, muitos delles honram-me com sua particular amizade, reconheço as suas luzes; comtudo intendo que nesta não póde dizer nada; por tanto seria inutil esta remessa. Eu intendo, que se neste projecto se tractasse ou de introduzir um novo principio juridico, que não estivesse em vigor no reino, ou fazer alguma excepção do principio vigente, podia e devia ser consultada a illustrada commissão da legislação, para dizer, se na doutrina do projecto havia algum conflicto com os principios geraes de jurisprudencia, ou se encontrava algum inconveniente; se se tractasse de similhante materia, a commissão do ultramar seria a primeira para querer ouvir a illustre commissão da legislação; e não esperaria pela proposta do sr. Luz; porque ella é docil, e de o ser tem dado sobejas provas, mandando dois projectos a ella enviados á nobre commissão ecclesiastica, para ser illustrada por seu valioso parecer; estes dois projectos são, um sobre a educação ecclesiastica no ultramar, e no real padroado na Asia, e o segundo a reforma, e augmento das congruas dos empregados do cabido primacial do arcebispado de Gôa; porque na doutrina destes projectos podia ferir-se algum principio canonico e haver conflicto entre a jurisdicção ecclesiastica, e temporal; porém nada disto acontece relativamente ao objecto do projecto em discussão; não se estabelecem lá principios juridicos differentes dos que vigoram no reino; não se faz excepção alguma, que possa considerar-se em conflicto com aquelles principios; unicamente se tracta de os extender para as tres comarcas dos estados de Gôa. A unica cousa que se póde controverter neste projecto, é, se as tres comarcas de que se tracta, tem a illustração necessaria; se alli se dão todos os elementos necessarios, para se lhes poder fazer extensiva a salutar instrucção do jury; isto pertence aos conhecimentos peculiares daquella provincia; e por conseguinte a unica commissão propria é a do ultramar, que deve informar a camara sobre estas especialidades locaes, unica que leiu a presumpção legal deduzida da sua nomeação, de possuir conhecimentos que não illustre commissão da legislação; ella não foi nomeado pela camara, para a informar sobre especialidades do ultramar. De tudo, que acabo de ponderar, se segue, que não ha precisão de se remetter este projecto á dicta commissão; ella nada póde dizer sobre o objecto; e se, apezar disto a camara resolver o contrario, o que não espero, dará a intender que quer sobordinar a commissão do ultramar ás outras commissões. A commissão do ultramar intende, que goza de igual cathegoria, e de iguaes direitos, e independencias, que todas as outras commissões da casa; tem igual direito de ser considerada;

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(Apoiados) jámais se sujeitará á humilhante posição de subordinada ás outras; ao menos eu, desde já declaro, que se a camara tomar similhante decisão, considerar-me-hei desconsiderado, e não farei mais parte da commissão do ultramar; porque intendo, que, se a camara tem o direito de approvar ou reprovar o projecto, ou modifical-o, não tem o de subordinar uma commissão á outra; portanto voto contra o adiamento

O sr. Tavares de Macedo: — Eu já disse que tenho grandes duvidas sobre o modo, porque se quer applicara legislação do jury respectivo ao continente, ás nossas possessões ultramarinas; porque e um paiz que tem outra illustração e outros costumes; e por conseguinte, concordo tambem em que o projecto vá á commissão de legislação, a fim de vêr se esta legislação póde ser applicavel ao listado da India.

Ora o illustre deputado o sr. Jeremias suppõe que, o ir um projecto a uma outra commissão, isto já depois delle ler um parecer de uma commissão da camara, suppõe, digo, que isto é uma injuria para a primeira commissão. As commissões são especialidades da camara, e cada uma destas especialidades estuda o objecto na parte que lhe diz respeito, Ora sendo o objecto de que, se tracta, um objecto que toca com a materia de legislação, está claro que a camara póde muito bem querer ouvir a sua commissão competente no assumpto, sem que daqui venha o menor desaire para a commissão de ultramar. (Apoiados.) Os membros da commissão do ultramar podem ler muitos conhecimentos locaes a respeito do assumpto, mas não sendo jurisconsultos, não devem levar a mal que se deseje a opinião da commissão de legislação. Nisto não ha capricho da parte da commissão de legislação; mas o que ha, é o desejo de que este objecto seja decidido com verdadeiro conhecimento de causa, e que em logar de se ir fazer um bem á India, com a instituição do jury, se lhe não vá fazer um grande mal.

Portanto, longe de se fazer nisto uma injuria á commissão do ultramar, eu intendo que ha necessidade de ser ouvida a commissão de legislação.

O sr. D. Rodrigo de Menezes: — Requeiro que se consulte a camara, se julga que a materia está sufficientemente discutida.

Julgou-se discutida.

O sr. Presidente: — Parece-me que é mais conveniente propôr a these geral — ha-de adiar-se o projecto n.º 32?

O sr. Mello Soares: — A regra é que se proponha cada um dos adiamentos, conforme a ordem chronologica, porque foram apresentados.

O sr. Presidente: — Pois bem; vou consultar a camara....

O sr. Avila: — Se v. ex.ª quer sacrificar o seu methodo, então consulte a camara para decidir a qual dos dois methodos dá preferencia.

O sr. Tavares de Macedo — Parece-me que a opinião da camara é que, as propostas não se prejudicara umas ás outras.

O sr. Mello Soares: — Os adiamentos são differentes. O sr. Tavares de Macedo propoz um adiamento que é quasi indefinido, porque pede uma estatistica que tarde ou nunca cá virá. O sr. Paredes, pede o adiamento até que venham uns esclarecimentos, uma representação da camara municipal; e o sr. Simão José da Luz, para que o projecto vá á commissão de legislação. Já se vê que todos estes adiamentos são diversos, e por isso o que me parece mais logico, é que sejam postos á votação separadamente.

O sr. Avila: — Parece-me que tudo se conciliará, pondo V. ex.ª á votação em primeiro logar o adiamento proposto pelo sr. Simão José da Luz, porque sendo approvado, é provavel que a commissão de legislação peça aquelles documentos, que intender serem necessarios para que cada um dos srs. deputados possa votar com conhecimento de causa.

O sr. Tavares de Macedo: — Intendo que os adiamentos não se destroem uns aos outros. Eu pedi esclarecimentos, sem os quaes intendo que não posso nem devo votar; e tambem sou de parecer que seja ouvida a illustre commissão de legislação. Os esclarecimentos pedidos pelo sr. Paredes não são exactissimamente os mesmos que eu peço; o que se conclue e que são necessarios esclarecimentos; e não vejo motivo nenhum para que senão espere por estes documentos, mesmo para senão fazer uma cousa mal feita, quando se póde fazer bem feita.

O sr. Maia (Francisco): — Quero unicamente dizer que apoio o modo porque v. ex. queria pôr á votação os adiamentos; e como a v. ex.ª é que compele privativamente resolver este negocio, a camara não póde votar, em quanto não resolver o contrario, senão conformo o methodo que v. ex. indica.

O sr. Mello Soares: — Ainda insisto em que a votação sobre os adiamentos seja pela ordem chronologica, porque as propostas dos adiamentos não se combinam. O modo regular é propôr cada uma das propostas do adiamento segundo a ordem porque foram apresentadas.

O sr. Presidente: — Eu vou propôr á camara a these, se o projecto n.º 32 deve ficar adiado. Se fôr rejeitada, cairam todas as propostas de adiamento; e se fôr approvada, então ha logar a votar sobre cada uma das propostas. (Apoiados.)

Foi rejeitado o adiamento por 47 votos contra 41.

O sr. Presidente: — Continua por tanto a discussão sobre a generalidade do projecto.

O sr. Mello Soares: — Sr. presidente, eu approvo o projecto da commissão, e intendo que de justiça deve ser approvado. Tracta-se unicamente de fazer extensiva a uma possessão da monarchia portugueza o direito que está consignado na carta constitucional para todos os cidadãos portuguezes.

Sr. presidente, sendo um principio geral consignado no artigo 118. da carta constitucional da monarchia — a instituição do jury, tanto no civel, como no crime — será mister mostrar, que nos Estados da India, onde se quer replantar esta bella instituição, ha alguma circumstancia especial que inhibe os seus habitantes de gosarem tão util instituição. Ella é um dos maiores apanagios do systema representativo (Apoiados) sem a qual não póde haver verdadeira garantia no processo crime. (Apoiados) Honro-me de ter pertencido á classe da magistratura judicial, e muito a respeito; mas conheço que para o interesse da sociedade e da segurança individual, e da familia, a instituição dos jurados é como a unica e mais util das garantias. São estes tambem os principios reconhecidos por todos os publicistas que têem escripto sobre esta materia, e não sei qual a rasão porque, tendo o systema do jury produzido o melhor resultado no nosso continente, não se applique este mesmo systema aos nossos irmãos da India.

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Sr. presidente, argumentou-se que a applicação desta instituição naquelles estados não se podia estabelecer, pela falta de illustração, mas a camara, depois da discussão que sobre o adiamento teve logar, das explicações que então se deram, e dos dados estatisticos que o projecto apresenta, parece-me que lia de reconhecer que os cidadãos portuguezes dos referidos estados lêem sufficiente illustração para deverem ser jurados da benefica instituição do jury. Custa-me acreditar, sr. presidente, que se dê a circumstancia notada, de uma grande parte dos individuos das ires comarcas (aonde se pertende annullar a practica dos jurados) não saber sequer fallar portuguez! Mas se o facto se verificar tal qual o reconta o illustre deputado, então lá está a provisão do artigo -2. do projecto em discussão, acautelando qualquer inconveniente local para a applicação practica; e por consequencia não havia perigo em decretar o principio da applicação do jury nas dietas comarcas. Para provar que os habitantes da India estão nas circumstancias de gos.ir da instituição do jury, apresentarei á camara uni testemunho insuspeito nos dados estatisticos do sr. barão de Sabroza, quando governador da India, e que na minha opinião devem ter preferencia áquelles que apresentou o sr. Tavares de Macedo, porque aquelle governador esteve alli, conhecia bem os habitos, a indole, e illustração dos habitantes daquellas possessões (Leu).

Ainda mais, sr. presidente, todas as informações das juntas geraes reclamam esta instituição, e a camara não a póde recusar, porque isso serie desconhecer um direito que a caria constitucional confere. Seria o maior dos absurdos querer que se não renove ali uma instituição tão util, unicamente com o receio de que póde haver um ou outro jurado que seja ignorante; intendo que estão salvos no artigo 2.º do projecto todos os inconvenientes da applicação practica, sendo o governo geral em conselho auctorisado a modificar esta legislação, quando as circumstancias o exigirem; concluo, sr. presidente, que o projecto se deve votar, e que a camara approvando-o cumpre um dever de justiça, e practica um acto de politica (Apoiados).

O sr. Santos Monteiro (Sobre a ordem): — Eu vou mandar para a mesa uma nova substituição ao artigo 1.º que me parece que comprehende perfeitamente os principios estabelecidos pelo sr. Mello Soares, com os quaes me conformo.

Substituição: — As leis e mais disposições vigentes no reino e ilhas, relativas á instituição do jury, são applicadas a todos os estados e possessões ultra-marinas da Azia, Africa, e Oceania. — Santos Monteiro.

Foi admittida, e ficou conjunctamente em discussão.

O sr. Tavares de Macedo: — Sr. presidente, eu já fiz algumas considerações sobre a materia, quando se tractou do adiamento, mas para responder aos argumentos apresentados pelo sr. Mello Soares, algumas palavras lerei ainda que dizer.

A consequencia logica que s. ex.ª tirou do artigo 118, é a do estabelecimento do jury em todas as provincias ultramarinas; mas perguntarei, se isto é possivel? Ninguem o affirmará; (Apoiados) e a prova de que não é possivel, deu-se ainda ha poucos dias, votando-se uma medida para que em Angola e S. Thomé não haja jurados. É verdade que o artigo da carta determina que o poder judicial seja composto de juizes e jurados; mas accrescenta logo — nos casos e pelo modo que os codigos o determinarem — e então dá-se a questão da conveniencia, que cumpre examinar.

Em Portugal, onde, como já indiquei, a illustração é mais do que na Asia, e a educação social e politica muito superior em relação á dos seus naturaes, acontecem factos que depõem contra esta instituição; e o que não será na India, onde a educação está muito mais atrazada, e os habitos e a linguagem são totalmente differentes dos da Europa! Não basta só saber lêr e escrever para exercer as funcções de jurados; a instituição do jury é muito melindrosa, e para se apreciar devidamente, bastará lembrar desde que em Portugal se admittiu que nas causas civeis a instituição do jurado fosse facultativa, nunca mais tomou a haver jurados nessas causas; e isto não só porque a nossa legislação a este respeito estava defeituosa; porém mesmo, porque quando os juizes propunham os quesitos aos jurados, estes quando respondiam, davam respostas tão incoherentes, e as mais das vezes ião contradictorias, que nasciam dahi questões interminaveis. (Apoiados)

E respondendo a uma observação que já ouvi fazer nesta discussão, devo dizer — que o jury entre nós é muito differente do jury inglez: o jury inglez nas causas civeis julga de direito e de facto, mas não só pelos costumes e habitos daquelles povos, e segundo a organisação do mesmo jury, os jurados vão sempre atraz do juiz, e se o jury dá alguma vez por qualquer circumstancia uma decisão injusta, o juiz annulla a decisão do jurado (Uma voz: — Tambem cá é o mesmo; tambem o juiz póde annullar a decisão do jurado) é verdade, com a differença porém que é com relação a decisões manifestamente iniquas, e ha-de o juiz annullar a decisão immediata e peremptoriamente.

E do que se tem passado entre nós a respeito dos jurados nas causas civeis, tira-se uma conclusão que faz muita honra á magistratura portugueza, que é o direito de preferencia que ha a respeito dos juizes sobre os jurados; isto é, a preferencia que as partes dão á proficiencia, probidade e confiança dos juizes sobre os jurados para decidirem sobre as causas civeis por ellas intentadas.

Ora uma das condições essenciaes e necessarias para que os processos possam ler andamento, e ser organisados com legalidade, é poderem ser instruidos em nina lingua que todos intendam, e não é possivel que na India esses processos possam assim ser formados, porque uma das cousas alli mais frequente, é a diversidade das linguas, dos lermos, e da fórma de expressar e representar qualquer cousa ou nome de pessoas. O depoimento das testemunhas, que é sempre importante, quando feito diante do jury, para que este possa observar o modo como ellas se expressam, não terá logar, por isso mesmo que lerá de ser interpretado ou traduzido por um lingua, que muitas vezes poderá não expressar bem o que a testemunha depoz. Ha emfim muitas outras cousas a attender, O que não podemos aqui fazer, não só por estarmos desacompanhados dos esclarecimentos indispensaveis, mas de mais a mais da absoluta e indispensabilissima declaração da parte do governo sobre se julga não haver inconveniente na adopção deste projecto. Tambem a respeito deste ponto seria de toda a conveniencia que o governo nos dissesse alguma cousa.

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Não deve esquecer, que, segundo a nossa legislação, para que qualquer possa ser jurado é preciso que possa ser eleitor, e na India não ha muita gente com as habilitações proprias para isto.

Sr. presidente, o sr. João de Mello apresentou a informação de um governador que esteve na India, querendo com ella combater a memoria escripta pelo sr. Lousada; nessa memoria do sr. Lousada não ha uma unica palavra, por onde se deprehenda que ella podesse ser escripta por motivos politicos, ou de antipathia para com os povos do ultramar; nesta memoria não ha nenhuma questão politica; é uma memoria puramente litteraria, escripta sem affectação nenhuma, nem amor nem desamor para com os habitantes da India. Terminando digo — que voto contra a generalidade do projecto.

O sr. ministro da marinha (Jervis d Atouguia): — Sr. presidente, a camara talvez tenha notado, que eu não tomasse parte na discussão, que teve logar sobre o adiamento; porém eu não tomei parte nessa discussão, porque intendo que o governo não póde emittir opinião sobre a proposta de adiamento da discussão d'um projecto, que não é propriamente da iniciativa do governo, mas de algum sr. deputado; e neste caso a questão da conveniencia ou inconveniencia do projecto que se discute, ser mandado a uma outra commissão, ou demorar a sua discussão definitiva até que se apresentem certos e determinados esclarecimentos, é propriamente da camara. Mas parecendo-me que algum sr. deputado fizera glande reparo ácerca d'uma expressão, com a qual até se argumentou que vem na ultima parte do relatorio, que precede o projecto em discussão, pela qual se declara — que o governo acceitou este projecto como está, e que de accordo com a commissão é que veiu á discussão da camara — devo dizer que esta expressão até certo ponto não é exacta.

Sr. presidente, todos os membros do governo, o eu com especialidade, respeitam, como devem, todos os projectos que possam ser apresentados pelos dignos deputados nesta casa; e peço mesmo o testemunho do nobre andor deste projecto n.º 32, que tem tido repetidas provas de que eu desejo muito annuir sempre aos projectos que faz (O sr. Jeremias Mascarenhas — Apoiado) e isto pela força que elles trazem em si; e pelo conhecimento que os nobres deputados, mais que ninguem, têem das necessidades das localidades a que pertencem. Mas deste projecto de que se tracta, ha muito poucos dias que o governo teve conhecimento delle por um nobre deputado que faz parte da illustre commissão do ultramar, e a esse illustre deputado que m'o apresentou, e me consultou ácerca delle, dei eu a seguinte resposta, que é sempre a que dou em casos identicos — que me faziam muito pezo as observações e o apoio que ao projecto davam os srs. deputados que formavam a commissão do ultramar, por isso que tendo sido já alguns delegados do governo, e merecendo-me todos a maior consideraçao, me inclinava muito a acha-lo bom, e em circumstancias de ser posto em execução na India; mas disse logo que precisava ouvir mais alguem a respeito delle, a fim de vêr se me podia persuadir de que era um projecto de tanta urgencia que o governo o acceitasse como tal, e o apresentasse aqui como desejando ve-lo passar. Poucos momentos depois do acto de me apresentar o sr. deputado o projecto, fallei a outro sr. deputado, empregado na repartição a meu cargo, da marinha e ultramar, e as observações que s. ex. já aqui tem feito, foram-me tambem suggeridas. Vi então que este projecto não era tão simples, como me parecia á primeira vista; e effectivamente tenho estudado mais nesta discussão de hoje sobre o projecto, do que me foi possivel no pequeno espaço de tempo que medeiou entre a primeira vez que me foi apresentado, e hoje que se discute.

As observações feitas nesta camara, sr. presidente, têem feito sobre mim bastante pezo, nem podem deixar de m'o fazer. Tractando-se de dados estatisticos sobre a instrucção necessaria para ser jurado, parte dos srs. deputados apresenta aquella parte da população, a das tres comarcas, como tendo bastante instrucção. Eu neste ponto devo ser franco, e digo que as informações que tenho recebido de Goa, dão realmente a instrucção alli em ponto muito mais superior do que talvez nas provincias do ultramar de outros paizes, com especialidade nos alumnos que alli se destinam para o exercito. E honra seja feita ao nobre Visconde do Ourem) Na ultima participação que me fez enviando alguns requerimentos dos naturaes da India, em que pedem ser attendidos nas promoções que alli se fazem, diz muito explicitamente — lêem razão estes alumnos; talvez aqui haja em geral mais instrucção, para seguir os postos do que em qualquer outra parte do mundo, para a carreira que seguem das armas. Tenho muita satisfação em dizer isto á camara.

Sobre a questão de que se tracta, como governo, acceito a decisão da camara, e o que desejo é que seja discutida por lai fórma, que tanto da parte dos illustres deputados que impugnam o projecto, como daquelles que estão convencidos da sua bondade, possa chegar-se a uma conclusão, que satisfaça não só aos principios de justiça e de necessidade, como tambem aos desejos que existam da parte de seus habitantes.

Realmente a disposição do artigo 2.º não póde deixar de satisfazer, porque se o governo intender que por alguma especialidade local a execução deste projecto póde trazer inconvenientes superiores ás conveniencias, o governo tomará sobre sua responsabilidade de o não mandar executar. Desta fórma, se ha uma questão aberta é esta. Entretanto de qualquer fórma que o projecto passe, o governo ha-de continuar a procurar obter todas as informações que julgar necessarias; e declaro á camara, que me não comprometto a seguir o que aqui fôr resolvido, porque realmente é uma questão que, com quanto possa ser decidida pela camara, o governo tem de proceder na conformidade das informações que deve obter, e só quando as tiver obrará, e dará conta do modo como obrou.

Julgo ler-me explicado bastante: a camara resolverá como intender em sua sabedoria.

O sr. Avila: — (Sobre a ordem). A camara, em vista das declarações francas que acaba de fazer o sr. ministro da marinha, não póde deixar de reconsiderar a decisão que adoptou rejeitando os diversos adiamentos que lhe foram submettidos. (Riso) Não é caso de rir, é serio, é muito serio o que eu estou dizendo. Tem-se invocado aqui a carta constitucional, e tem-se-lhe referido o que ella não diz. A carta constitucional não diz em parte alguma que ha-de haver jury nas possessões do ultramar, nem no continente, diz só que ha-de haver jury pelo modo e nos casos que os codigos determinarem. O acto addicional diz que ha-de haver para as possessões do ultra-

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mar a legislação que fôr exigida pelas circunstancias peculiares dessas possessões. Ora o acto addicional é igual á carta: não são os srs. deputados, que o fizeram, que o reputaram necessario, que podem hoje negar-lhe esta qualidade. Eu respeito tanto como os srs. deputados o acto addicional. Faço desde já esta declaração para que não venham dizer depois, que eu me insurrecciono contra elle. Não se diga com tudo, que a carta exige a instituição do jury em todas as possessões do ultramar; porque a ser isso exacto, a consequencia era adoptar desde já a substituição do sr. Santos Monteiro.

Eu tenho pelo nobre ministro da marinha a maior consideração possivel, e poderia invocar o testimunho de cavalheiros que me ouviram em particular, para que dissessem a s. ex. em que termos de consideração eu me tinha explicado a seu respeito: mas sinto que o nobre ministro não dissesse quando se tractava da questão do adiamento o que disse agora, porque estou persuadido de que a questão do adiamento havia de ter um resultado diverso do que teve (Uma vox: — Não podia). Podia e devia faze-lo, porque o governo é que sabe se as leis existentes são sufficientes para a boa governação do paiz, ou se essas leis precisam ser modificadas. O sr. ministro não devia pois vir aqui dizer, que esta questão é uma questão aberta; porque esta questão é essencialmente governamental, e quando vem aqui sem ser pela iniciativa do governo, devia vir de accôrdo com elle, não só de accôrdo com o sr. ministro da marinha, mas de accôrdo com todo o ministerio. Mas eu vejo que o sr. ministro da marinha não se concertou com os seus collegas a este respeito, e que a sua opinião é contra o projecto. O sr. ministro não tem a convicção de que esta medida seja necessaria: os inconvenientes que a sua não existencia tem cansado, não produziram esta opinião no nobre ministro. S. ex.ª não tem uma opinião decididamente formada a este respeito: diz que ha-de acceitar a opinião que prevalecer na camara. E é depois desta declaração que a camara quer continuar neste debate! Póde a camara faze-lo? (Vozes: — Póde, póde) E tambem acceita o nobre ministro a opinião da camara dos dignos pares se lá prevalecer uma opinião contraria á desta camara?

A vista da maneira porque teem corrido aqui certas discussões; e do modo como alguns srs. deputados fallam, julgo dever lembrar-lhes que o poder legislativo não é só esta camara, que ha ainda duas instancias, além da camara dos deputados; e que se uma lei votada nesta camara fôr mal meditada, não fôr convenientemente elaborada, póde ser esse defeito corrigido em qualquer das duas outras instancias: póde a camara alia emenda-lo: póde o poder moderador negar a sua sancção a essa lei Não sejamos pois precipitados no que fizermos para não passarmos por este desar.

Repito, a resposta do sr. ministro da marinha não póde satisfazer-me, e eu julgo por isso ter direito de exigir, que o sr. ministro diga cathegoricamente qual é a opinião do governo a este respeito. Se s. ex.ª o não sabe, se ainda não consultou a opinião de seus collegas, consulte-os e diga-nos depois francamente a opinião do governo. Tenho direito de exigir isto, e por consequencia a obrigação de propôr tambem que seja adiado o projecto até que o governo possa na discussão delle tomar o logar que lhe pertence em todas as questões governamentaes.

O meu dever está preenchido. Desde o momento em que o governo não tomou a responsabilidade da discussão e resolução desta medida, a discussão não devia continuar. Mas vejo que a questão continua e continua, porque se quer considerar esta questão como uma questão politica, como o disse In pouco o sr. Mello Soares. Tracta-se pois de uma questão politica, e a politica é que eu não queria vêr nunca em objectos taes.

Agora devo notar á commissão do ultramar que não tem razão quando pertende que ella e só ella tracte de todos os negocios respectivos ás nossas possessões ultramarinas, seja qual fôr o objecto a tractar reputando-se até injuriada quando a camara decida que sobre tal ou lai objecto do ultramar seja ouvida uma outra commissão. Não tem razão, primeiro porque com quanto a commissão do ultramar deva dar o seu parecer sobre os negocios do ultramar, não deve comtudo ser ouvida exclusivamente em todos os assumptos, que dizem respeito áquellas possessões, porque materias ha. relativas ao ultramar que pela sua especialidade exigem, que ácerca dellas sejam ouvidas outras commissões, por exemplo nos objectos judiciaes deve ser ouvida a commissão de regulação, ca commissão do ultramar: quando se tractar de materias de fazenda, deve ser ouvida a commissão de fazenda, e a commissão do ultramar e assim em relação aos outros assumptos. Querer a commissão do ultramar arrogar-se as attribuições que pertencem ás outras commissões, é uma pertenção tão absurda que a camara não deve, nem póde de modo nenhum consentil-a. (Apoiados) Em segundo logar a commissão do ultramar não deve reputar uma injuria em que seja ouvida outra commissão. Pois quando a camara manda á commissão de fazenda muitos objectos determinando ao mesmo tempo que seja ouvida tal e tal commissão segundo a especialidade década um desses objectos, a commissão de fazenda julga-se injuriada por isso, ou qualquer das outras commissões póde julgar-se injuriada por que seja ouvida a commissão de fazenda? Só a commissão do ultramar é que pertende uma excepção a seu favor!

Sr. presidente, eu não quero deixar passar sem resposta certas proposições que aqui se avançaram, e que hei-de rebater quando se tractar da materia; até quasi se chegou a dizer que os habitantes do ultramar eram mais illustrados que os do continente! Mas sobre tudo pertendo satisfazer a um dever imperioso da minha consciencia. Visto que o governo senão póde pôr á frente desta discussão como lhe pertence, este objecto deve ficar adiado até que elle mesmo possa vir apresentar á camara a sua opinião sobre a questão. Por conseguinte mando para a mesa a seguinte

Proposta: — Proponho que o projecto n.º 32, que está em discussão, seja adiado até que o governo venha declarar á camara, se é necessaria a sua discussão, e se tem uma opinião formada sobre as suas disposições. — Avila.

Sendo apoiado este adiamento entrou em discussão.

O sr. José Estevão: — Sr. presidente, a questão está adiada, porque o relogio a adiou. Oh! Sr. presidente, que queremos nós adiar? Esle projecto? Por que? Que é este projecto? E uma manifestação de principios, um enunciado de verdades constitucionaes; (Apoiados) uma repetição de principios do

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systema representativo; um desejo de que uma instituição benefica seja extensiva ao ultramar. É nos prohibido fazer este enunciado, repelir esta proposição, robustecer esta fê, ou precisamos recorrer ao beneplacito dos srs. ministros para allongar uma instituição benefica que nós queremos que os nossos irmãos do ultramar gozem? Podemos nós admittir que em similhantes questões a discussão venha previamente do governo? Póde qualquer que seja a sua opinião modificar os preceitos da carta constitucional, e as nossas crenças? Que lemos nós que adiar? Nada; absolutamente nada; porque aqui não ha nada que prejudique ou faça parar a machina governativa por que neste projecto se attende ás especialidades a que é preciso attender. Por consequencia este projecto é mais que constitucionalissimo, é mais que governamentalissimo. (Apoiados)

Esle projecto no 1.º artigo diz — a camara julga que uma certa porção das nossas po-sessões do ultramar é digna pelo seu estado de illustração, de receber, a instituição do jurado. — Esta é a opinião da camara, mas não obstante diz no artigo 2.º — Se se demonstrar depois que a camara errou nos seus juizos; se apparecerem inconvenientes, ou resultar algum perigo na execução desta lei; nós admittimos desde já que se faça esta excepção. — no governo geral em conselho é auctorisado a modificar a dicta legislação, antes de ser posta em practica, quando ao seu littoral cumprimento se opponha alguma especialidade local; o que fará constar ao governo de Sua Magestade, para este dar conta ás cortes dessas modificações.) > — Por consequencia que posição hade o governo tomar nesta questão? Ha de tomar uma posição contra o 1. artigo? Não, porque isto é tomar uma posição contra a caria constitucional. (Apoiados) Hade tomar uma posição contra o 2. artigo? Hade dizer — eu não quero o artigo, porque quero que o abuso continue: não quero a faculdade que a camara concede a respeito da applicação ou não applicação desta lei a uma ou outra parte das nossas possessões do ultramar

Sr. presidente, não ha motivo para esta questão, aqui não ha senão a rejeitar o pedido da reconsideração proposta, porque não ha que reconsiderar. (Apoiados) A reconsideração é um grande absurdo, impossivel de acreditar sahido da bocca do illustre deputado, em quem todos reconhecemos talentos, e a quem a sua longa vida na administração publica o devia tornar mais reflectido, quando se decide a tomar parte nestas questões. Mas eu não sei onde está esta agitação, nem este rebate de hostilidade politica, nem este cheiro a ambição de poder, nem esta inquietação; não ha nada disto. Esta questão não sei se é aberta, se e fechada; a camara é que não póde estar sempre fechada. E uma questão simples, simplissima, e se nós lemos sahido de outras de mais difficuldades sem transtornar a acção das cousas publicas, desta não póde vir transtorno, só se teimarem em a transtornar. O que disse o sr. ministro da marinha? Disse que não contrariava a idéa, que acceitava o principio para depois o applicar como fosse conveniente. Mas é pasmoso!... O sr. Avila está de tal maneira cioso de direitos, que até quiz negar á commissão do ultramar as suas funcções naturaes e imprescriptiveis, e queria que a commissão do ultramar que accumulla de certo o conhecimento de todos os negocios do ultramar como os accumulla o ministerio da marinha, não houvesse de emittir voto sobre qualquer assumpto de administração para o ultramar, sem consultar a commissão respectiva!... Provavelmente o zelo do nobre deputado referia-se ás altas prerogativas da commissão de fazenda, que por muito tempo geriu com assistencia de s. ex.ª as finanças deste paiz, e que tambem havia de gerir as finanças do ultramar, não lendo chegado a publicar-se o orçamento completo desses estudos, senão ha dois annos; mas é que em Portugal tem havido commissões de fazenda, e ministros de fazenda que governam e gerem perfeitamente as finanças, sem nunca verem o orçamento; as do ultramar haviam de ser geridas da mesma maneira!

Sr. presidente, o que esta discussão prova é a fé constitucional de certa parcialidade politica. Nós estamos cançados de ouvir gemer por attentados contra a carta; estamos cançados de ouvir lastimar a nossa subserviencia aos interesses materiaes, e o acabamento de todos os principios constitucionaes. Vendemos a liberdade, mas ainda a não vendemos toda; a parte que nos ficou, queremos presentear com ella uma parte das nossas possessões ultramarinas, que tão pouco a tem visto, que tão pouco a tem gosado, e immediatamente, contra este bom acto, contra esta medida de alia justiça e de excellente politica, levantam-se logo embaraços sobre embaraços, adiamentos sobre adiamentos, vem a caria, vem os principios governamentaes, vem a necessidade de attender á opinião do governo, e comtudo nós não tractamos senão de notar que o jury é uma bella instituição, e que se deve ir applicando pouco a pouco a todas as partes da monarchia constitucional, onde a experiencia provar que se póde applicar!... (Apoiados) Mas nega-se isto, e nega-se porque alguns dos nossos collegas lêem duas vistas para ver a carta; veem a carta com certos olhos, quando se tracta da dictadura do governo; mas não veem a caria com os mesmos olhos, quando se tracta da dictadura judicial, que por longo tempo tem pesado sobre aquelles paizes, porque eu intendo que o poder judicial sem jurado é uma tremenda e insupportavel dictadura. (Apoiados) Sr. presidente, não é o jury um principio constitucional? Pois que diz o artigo 118. da caria?. O poder judicial é independente, e será comporto de juizes, e «jurados, os quaes lerão logar assim no civel como «no crime, nos casos e pelo modo que os codigos de 44 terminarem, estou a ler os artigos 119, 120. e 121., para ver se vem cá alguma excepção para as provincias ultramarinas, mas não está cá nenhuma. (Apoiados) O que se diz, sr. presidente, é que a applicação deste principio deve ser conforme o modo e os casos que a lei determinar. Pois é pelo modo e nos casos que o jury está estabelecido no reino, que nós queremos que se estabeleça na India (Apoiados).

Mas o illustre deputado mostrou até nesta discussão um certo ciume de portuguez de boa laia, de portuguez limpo de sangue, com os portuguezes mais mesclados de raças, menos puritanos, que são irmãos nossos, irmãos dignos e dignissimos (Apoiados) e tanto mais dignos, quanto que a longas distancias, o n'um completo desamparo da mãi patria, ainda se conservam presos ao nome portuguez, presos a gloria e tradições da nossa historia! (Apoiados: — R verdade). 44 Mas o que querem é aproveitar a occasião, para dizerem indirectamente que os povos da

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India estão mais adiantados do que nós, e que lá se sabe mais lêr e escrever, do que cá.» Ora, forte desgraça esta! O modo de responder a esta desigualdade é faze-la desapparecer a nosso respeito, mas não por um ciume vergonhoso e deploravel ir negar a capacidade de adiantamento, que aquelles paizes tem adquirido, de certo sem auxilio do governo de Portugal. Sr. presidente, eu estimo muito que a india seja um dos estados portuguezes mais adiantados; mas isto não é ponto de rivalidade, póde ser ponto de vergonha o de emulação.

Eu não posso deixar passar esta occasião, sem me congratular cordialmente com todos os magistrados, que independentes dos preconceitos da sua classe, e a elles superiores confessam, como bons juizes, como homens constitucionaes, que a instituição do jury é uma instituição essencialmente moral (Apoiados) protectora dos direitos dos cidadãos, sufficientemente poderosa para castigar o crime e perseguir os malfeitores (Apoiados).

Sr. presidente, porque não se quer.... não digo que não se quer, porque se trepida, porque se receia que a instituição do jury vá ás provincias ultramarinas? Porque os juizes de lá, pela maior parte, desaffrontados deste poder moderador do poder judicial, e naquelles paizes, onde o arbitrio é consuetudinario, nada se apresenta sempre com uma justificação de necessidade, pegam em todos os homens que lhes desagrada, em todos aquelles que os contrariam, e de um momento para o outro lançam-lhos em cima estes anathemas incontrastaveis do poder judicial, e umas vezes mandamos para o sertão, outras vezes fazem com que na noticia da barra se diga — um navio com taes e taes criminosos — criminosos feitos por juizes que não respondem para cá, ou respondem pouco, porque respondem uns para os outros, e que estando lá, lêem a garantia da classe e a garantia da distincção. Ora, sr. presidente, eu não sei nada das circumstancias especiaes em que se acha cada uma das nossas possessões; não tenho duvida nenhuma em votar pela proposta do sr. Santos Monteiro, e levantar o interdicto de inconstitucionalidade em que tem estado as provincias ultramarinas. Nós, pelo primeiro artigo, dizemos: «a carta constitucional, que nós ha vinte e tantos annos applicámos para o continente, julgamos que é applicavel a todas as possessões ultramarinas;» e acrescentamos no artigo 2.º «no caso de se provar que são capazes de receber esta instituição.» Não ha mais nada; para isto não é preciso ouvir a opinião de ninguem; não póde haver duas opiniões a este respeito. Para ler opinião contra o artigo 1 º, é preciso não ser constitucional; para ter opinião contra o 2.º, é preciso não ter juizo (Riso).

Sr. presidente, desgraçadamente os nossos governos têem sido escaços, e mais que escaços em melhoramentos materiaes e beneficios de civilisação para as nossas provincias ultramarinas, sem o que a liberdade não é senão a selvajaria. As nossas provincias ultramarinas quasi que não sabem que ha metropoli, senão para saudarem os governadores, que lá apparecem, e que a maior parte das vezes não costumam deixar saudades. Raras vezes veem ti emular ali a bandeira portugueza em algum navio do estado; e quando vai lá algum, d para tirar daquelles cofies quantias enormes para occorrer ás suas despezas.

Quando nós não lemos colonias, se não para citar os nomes dellas nos titulos da Rainha de Portugal; se não para lermos um ministerio da marinha e ultramar, organisado com uma secretaria, cujos empregados vem em massa offerecer objecções, e dar o seu voto contra uma instituição benefica, que se quer estabelecer nestas mesmas colonias, podemos e devemos nós regatear o preço desta concessão, que se lhes quer fazer pelo projecto, deixar de votar esta garantia de liberdade, e não considerar estes nossos irmãos, como taes, para poderem commungar os principios constitucionaes? Se não dermos este testimunho de liberdade, o que se segue é, que nós queremos conservar as nossas possessões n'uma situação inferior, que ellas não merecem, e que queremos estorvar os seus habitantes, nossos irmãos, de participarem e gozarem das garantias constitucionaes, que fazem as garantias da sociedade; dando assim uma prova a mais cabal, de que nós temos governado e administrado tão mal, que depois de termos passado ha 20 annos do regimen absoluto para o regimen constitucional, não lemos tomado as necessarias e convenientes providencias, para educar aquelles povos, a ponto que se lhes possam applicar os principios do governo constitucional!!!

Concluo, pois, votando pelo principio da commissão como está no projecto, sem que considere isto uma questão politica, porque não o é, nem póde ser. (Apoiados) Quando quizermos propôr questões politicas, não as embucemos nem encapotemos. Para os homens de partido, a franqueza é o unico meio de acção legitima; quando quizesse fazer questões politicas, declarava-as como taes; tinha bastante coragem para o fazer clara e desassombradamente. Por tanto voto pelo projecto e contra o adiamento, porque intendo que não se póde ser constitucional nem governamental sem votar por-este projecto. (Apoiados)

O sr. Avila: — O illustre deputado que acabou de fallar, esteve a fazer a maior de todas as censuras, que é possivel, não só ao governo, mas tambem a si proprio, e aos II lustres cavalheiros que constituiram a maioria tanto da camara passada, como da desta camara, de que o mesmo sr. deputado faz parte, quando disse — que não se tem olhado para as provincias ultramarinas como devia ser, que se tem governado e administrado tão mal essas possessões, que os seus habitantes têem estado privados de quasi todas as garantias constitucionaes, e de todas as regalias de que gozam seus irmãos do continente — isto por outras palavras quer dizer — que o nobre deputados tem estado a sustentar, ha dois annos, um governo que governa mal, e muito mal, segundo a opinião do mesmo nobre deputado. Eis-aqui o que acontece todas as vezes que se falla só guiado pelas impressões de momento; porque, em taes circumstancias, havemos de cahir sempre nestas contradicções. O nobre deputado está sustentando uma administração, que elle proprio confessa que governa mal, que administra mal, e que merece todas as censuras por não vir tomar a iniciativa de uma medida, que o nobre deputado repilla indispensavel para as possessões ultramarinas! (O sr. José Estevão: — Peço a palavra.) O nobre deputado está sustentando uma medida, a respeito da qual o ministro competente em declarar á camara, que não tem ainda a sua opinião formada! O nobre deputado ha-de reconhecer que os papeis mudaram-se, e hão-de mudar sempre que vierem as questões governamentaes na sua essencia; porque o nobre deputado

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ha-de estar sempre do lado do desgoverno, e eu hei-de estar pelo lado do governo,

Mas o nobre deputado foi tão infeliz e inexacto, que até disse que tendo eu sido membro da commissão de fazenda tantos annos, nunca se apresentou aqui o orçamento do ultramar; e que só ha 2 annos é que appareceu aqui esse orçamento. Não ha em tudo isto uma só palavra que não exprima uma idéa falsa. Pois ha quantos annos sou eu membro da commissão de fazenda! Não o fui senão em 1840 e 41, e em 1818 e 49. Quereria o nobre deputado fallar do tempo em que eu fui ministro 1 Pois eu tenho administrado a fazenda por muitos annos!! O nobre deputado está no costume de me fazer responsavel por aquillo que fiz, e que não fiz; de maneira que sou responsavel pelo que se fez antes, e depois da minha entrada no ministerio, e tambem pelo que se fez depois da minha sahida; e o mais é, que isto que o illustre deputado vem dizer na camara, é exactamente o que me diz fallando particularmente comigo, e que eu suppunha que era mero gracejo... (O sr. José Estevão: — Veja o sr. deputado quanto eu sou franco!...) Muito obrigado. (Riso) O nobre deputado elevou-se a lai ponto de poesia, que disse — que não tinha visto o orçamento do ultramar se não ha 2 annos — porém o nobre deputado podia vêr o orçamento do ultramar aqui apresentado em 1843; podia vêr o orçamento apresentado pelo sr. visconde de Castellões, durante o ministerio de que fiz parte, orçamento que serviu de base áquelle que apresentou a actual administração. Por consequencia, já vê o illustre deputado quanto fui injusto e inexacto, asseverando o contrario.

Realmente não posso saber em que desconsiderei os estados da India, quando disse que não podia votar o jury por aquelles estados, em quanto o governo nos não dissesse, que lai instituição é conveniente alli. É a carta que o exíge, disse o nobre deputado. De modo que a carta só tem valor para o nobre deputado quando lhe parece que ella lhe fornece argumentos para sustentar as suas opiniões. Para mim a carta é sempre a lei fundamental deste paiz, que todos devemos respeitar. O illustre deputado não ha de apresentar-me um só facto da minha vida publica, que prove o contrario. E assim como o illustre deputado me combate com inexactidões, porque me não hade combater com factos verdadeiros? E porque os não tem.

A carta constitucional diz no artigo 118.º

«O poder judicial é independente, e será composto de juizes, e jurados, os quaes lerão logar assim no civel, como no crime, nos casos e pelo modo que os codigos determinarem

Logo a caria não prescreve absolutamente, que haja jurados. A carta diz, que essa instituição só existira nos casos e pelo modo que os codigos determinarem.

E o acto addicional diz no artigo 15.º

As provincias ultramarinas poderão ser governadas por leis especiaes, segundo o exigir a conveniencia de cada uma dellas.

Logo o acto addicional, que é igual á caria permitte, que as leis do reino não sejam applicadas ás provincias ultramarinas, se assim o exigir a conveniencia das mesmas provincias. Porque se está pois aqui a abusar das palavras carta e constitucionalismo, quando a carta não determina o que os illustres deputados dizem

O proprio sr. deputado foi obrigado a confessar que esta questão é uma questão governamental; e não era eu membro da opposição que devia estar a dar lições governamentaes a nobres deputados quer formam a maioria da camara. O presidente da commissão diz:

«Parece á vossa commissão do ultramar que o projecto de lei n.º 5 G do deputado por Gôa o sr. E. J. Mascarenhas é reclamado pela justiça, e por isso, de accordo com o governo, o submette á vossa illustrada deliberação nos termos do seguinte projecto; a

Vem o sr. ministro da marinha e diz, não ha exactidão nisto; porque eu não exprimi a opinião do governo de uma maneira tão positiva como a aí se diz. Qual deve ser pois a consequencia desta declaração? Para uma camara que quer acertar, e eu acredito que esta o quer, bastava esta declaração para não dar a este projecto o andamento que se lhe quer dar: a consequencia logica era esta. A commissão julgou precisa a annuencia do governo a este projecto, e a prova de que reputou precisa essa annuencia, é que procurou obtel-a, e declarou no seu parecer, que a tinha alcançado, como um argumento que devia fazer impressão na camara: logo uma vez que o governo diz, esse argumento não se póde invocar; porque não dou ao projecto a annuencia, que diz a commissão, a consequencia era não continuar este debate, e intender-se o governo de novo com a commissão.

Disse-se — pois nós precisamos de licença do governo para legislar? Não: mas vós não o podeis dizer, porque invocastes como um argumento a favor da vossa opinião o accordo do governo, accordo, que não existe. Estes arroios de independencia agora da parte de deputados, que não tem feito senão approvar actos de dictadura, é que eu admiro... Pelo amor de Deos! Não me obriguem a ír a este terreno: não quero ír a elle... Agora é que ha esta independencia! Até aqui votaram-se 235 decretos que estão a cair um a um, votaram-se para sustentar o governo, agora finge-se não se fazer caso do sr. ministro da marinha! E nesta occasião que o sr. deputado quer tambem dar uma prova, um testemunho de que é verdade o que se escreve a respeito da saída do sr. ministro da marinha do ministerio!.. Pois já não é ministro o sr. visconde d'Atouguia?..

Sr. presidente, eu quando apresentei o adiamento, confesso francamente que a primeira idéa que me occorreu, foi pedir á camara a reconsideração das suas votações: mas depois lembrei-me de que havia outro meio sem ferir as susceptibilidades da camara, susceptibilidades que eu não teria, porque eu tenho reconsiderado muitas vezes, e espero que o hei de fazer ainda, porque não pretendo ser infallivel: hei de errar, e em conhecendo que errei tenho prazer em emendar o meu erro. Não propuz por consequencia a reconsideração, mas propuz o adiamento, e os nobres deputados ficaram muito afflictos e pediram a palavra com expressões e gestos que indicavam que eu os tinha offendido em tudo o que havia de mais delicado na sua honra! Não é assim, não era minha intenção offendel-os, propuz o adiamento, porque a situação mudou desde o momento em que o nobre ministro declarou que elle não tinha opinião formada sobre este assumpto, e então os nobres deputados podiam votar esse adiamento sem que

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dahi lhes resultasse a menor desconsideração. Pelo contrario a sua insolencia era rejeitar esse adiamento, e em querer discutir o projecto depois das declarações terminantes do governo, é que me faz desconfiar de que os nobres deputados aqui veem outra cousa que não e o projecto, veem aqui uma questão politica, como já, um illustre deputado teve a franqueza de declarar.

Quiz dar estas explicações á camara para motivar a minha proposta de. adiamento.

O sr. Arrobas (Sobre a ordem): — Eu pedi a palavra simplesmente para declarar que tendo sido eu o membro da commissão, que foi consultar a opinião do sr. ministro da marinha sobre este projecto, s. ex.ª disse-me que estava de accôrdo com o principio geral delle, e é isto o que está declarado no relatorio, e o que S. ex.ª ha pouco repeliu. Por consequencia são muito exactas as palavras de accôrdo com o governo, que se lêem no relatorio do projecto.

O sr. Mello Soares: — Proponho que se prorogue a sessão até se votar o adiamento.

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