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Discurso que devia ler-se a pag. 265, col. lin. 3 da sessão n.° 20 d’este vol.

O sr. Francisco Coelho do Amaral: — Sr. presidente, quando se discutia a generalidade do projecto que ora nos occupa na especialidade, tinha eu pedido a palavra, porque fazendo aos nossos constituintes o desagradavel presente do aggravamento do imposto, pelo qual hei de votar, queria fundamentar as rasões que determinam a minha conducta. Não o pude fazer então, porque a materia se julgou discutida: fa-lo-hei agora, pedindo disculpa, e contando desde já com a indulgencia de v. ex.ª e da camara.

Sr. presidente, eu não tenho a falua pretenção de vir esclarecer este debate, o meu fim, pedindo a palavra, é unicamente motivar o voto que tenho a dar, que, com quanto não esteja vinculado a compromisso algum, tenho por dever de honra explicar em materia tão importante. O artigo 1.º do projecto estabelece o emprestimo de 1.800:000$000 réis, sendo applicados 800:000$000 réis para os melhoramentos da salubridade da capital, e 1 000:000$000 réis para as obras publicas do reino.

Eu quero melhoradas as condições hygienicas da capital, porque ainda me compunge e contrista a alma a recordação d'esse drama doloroso de luto e lagrimas que por quatro mezes se representou dentro dos muros da capital, e porque não quero ver repelidas essas tristes scenas com todas as suas desastrosas consequencias, que por muito tempo se hão de sentir, e porque não quero ver desacreditada esta bella terra, guardada porventura pelo destino para representar um brilhante papel no andar do progresso e da civilisação geral do mundo.

Para isto, sr. presidente, não votaria só 800:000$000 réis, votaria o dobro, o triplo, ou o quadruplo, porque a economia em vidas, como disse ha pouco um distincto professor e honrado membro d'esta casa, seria muito superior ás despezas em réis que para alcança-las fosse mister fazerem-se.

Mas eu entendo, sr. presidente, que essas despezas deveriam ser formuladas e traduzidas aqui em planos definidos e praticos das obras a emprehender; e naquellas de que reza o projecto em discussão tem sido demonstrado que não se consumirá a verba que lhes é destinada. E então sendo as vias de communicação uma necessidade impreterivel que melhorando as condições economicas, melhoram ao mesmo tempo as condições hygienicas e a salubridade do paiz pelo alargamento dos commodos e confortos da vida policiada, parece que o excedente d'essas despezas deverá ser accumulado á verba dos 1.000:000$000 réis destinados ás obras do reino. Se for preciso mandarei uma proposta para a mesa n'este sentido. E não se entenda com isto que eu tenho em menos conta os interesses da capital. Não é assim. Lisboa é a capital da monarchia, Lisboa é de todo o reino, e as provincias ainda ha pouco deram um testemunho solemne de que a consideravam como a cabeça e a mais querida de suas irmãs. Que a capital retribua ás provincias no meio das suas antigas e multiplicadas attribuições em iguaes affectos de fraternal solicitude.

Voto portanto por a parte do emprestimo destinado para o melhoramento da salubridade da capital, e voto igualmente pelo contingente destinado para as obras publicas do reino porque eu quero estradas e quero-as porque não partilho a opinião de alguem que diz que as estradas ordinarias poucas vantagens produzem nas relações economicas dos povos, e apenas nos prestam alguns commodos pessoaes.

Sem me deter na enumeração das vantagens resultantes da economia do tempo quando se jornadeia por uma boa estrada, da barateza dos transportes que ninguem contestará e da facilidade de levar os generos das localidades d'onde são produzidos aos grandes centros de consummo, aos quaes ou não chegariam, ou só por preços elevados, se lhes faltassem vias faceis de communicação, não serão esses mesmos commodos pessoaes um grande valor, e não será o seu alargamento um verdadeiro progresso?

Se se pretende que a estrada ordinaria ao lado da viação accelerada é uma desnecessidade, convenho, direi mesmo que é um desperdicio e um erro economico, mas este erro provém de não ler precedido um plano geral de vicção ordinaria, e accelerada ao delineamento e realisação de planos destacados.

Mas este erro é antigo, é de todas as administrações, vem de longe e não póde ser imputado á actualidade.

Mas lerão todos os districtos do reino de ser cortados pelas vias ferreas? De certo que não. E aquelles que ellas não vivificarem, terão de ser condemnados á esterilidade, ao abandono e ao violamento? E auferir-se-hão das vias ferreas todos os beneficios de que são susceptiveis, e entreterão ellas o movimento indispensavel para a sua sustentação sem as estradas ordinarias que, cortando o paiz em todas as direcções, vão entroncar n'essas vias ferreas? É portanto innegavel que as vias ordinarias de communicação são uma necessidade urgente, vital e inadiável, não só pelos interesses locaes que proporcionam, mas pela sua identificação com os interesses geraes das vias ferreas. Portanto, sendo as estradas ordinarias um grande elemento civilisador e economico eu não posso deixar de promover a sua continuação: e como quem quer os fins não póde recusar os meios, e a receita ordinaria não póde supprir as despezas extraordinarias, o emprestimo e o imposto para o levantar, derivam-se logica e naturalmente,

É certo, sr. presidente, que o imposto recáe muito desigualmente sobre as differentes classes de contribuintes. Não me occuparei detidamente da percentagem lançada sobre os generos importados nas alfandegas, tanto porque não me julgo competente para tratar d'essa materia, como porque tendo ella sido largamente, e com tanta proficiencia, desenvolvida n'esta casa, o meu contingente nenhuma luz viria lançar na discussão. Direi de passagem que em alguns generos o augmento do imposto terá talvez de reverter em beneficio do contrabandista; porém na maior parte dos generos entendo que não, porque o aggravamento não é tal que possa dar alentos ao contrabando, e trazer ao thesouro uma receita negativa. É verdade que talvez conviesse e fosse justo que alguns generos, que formam a alimentação de uma parte principal das classes desvalidas fossem protegidas,

Tratarei mais de espaço da contribuição predial. A contribuição predial esta distribuida com uma grande desigualdade. A grande propriedade paga pouco, a pequena propriedade esta esmagada.

E quer a camara saber de onde provém essa enorme desigualdade?

Os antigos lançamentos da decima eram muito defeituosos, eram trabalhos feitos sem regularidade, sem systema, e sem guardar proporção alguma entre os grandes e pequenos contribuintes, presidia-lhes o patronato, o compadrio, e em grande parte a ignorancia e a malicia. (Apoiados.) Esses defeitos passaram todos para as matrizes prediaes que mutatis mutandis são copias exactas dos antigos lançamentos. Disse o nobre ministro da fazenda que se quiz entregar a confecção das matrizes ao paiz. Foi um erro deploravel. Eram bem faceis de prever os embaraços e difficuldades que suscitariam as desconfianças instinctivas do nosso povo que infelizmente os factos quasi sempre justificam.

E bem claro era tambem a todos os olhos que trabalhos Ião momentosos com tão extenso alcance não podiam ser organisados, e medianamente bem desempenhados, sendo chamados á sua confecção os elementos a que foram entregues. Trabalhos de tal ordem carecem de homens especiaes e com condições e conhecimentos especiaes: de outro modo não