O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

APPENCICE Á SESSÃO DE 8 DE AGOSTO DE 1890 1784-A

O sr. Manuel de Arriaga: - Começo por declarar que sinto profundamente que a sessão em que se discute este assumpto grave não seja secreta.

Sou da opinião d'aquelles que pensam que este debate póde ter alguma influencia n'uma questão que está pendente de uma arbitragem lá fora, e não desejo assumir a responsabilidade das revelações que tenha de fazer e a que sou levado pelo meu syotema de discutir: de pôr a verdade acima de tudo, custe a quem custar, som aliás deixar de attender n'este momento ás conveniencias diplomaticas que as circumstancias recommendam.

Se a sessão fosse secreta, a ordem que daria ás minhas reflexões seria inteiramente differente d'aquella que sigo, porquanto, apesar da verdade da factos se me impor por tal fórma, que me obriga, quer queira quer não, a fazer revelações que do certo serão dolorosas para muitos, hei de dirigir-me por forma que mais tarde essas revelações não possam prejudicar lá fóra o bom credito que a todos deve merecer a nação portugueza.

E preferindo, para conveniencia do paiz, que este debate não fosse agora levantado, entro n'elle contrafeito, em conflicto commigo proprio, porque o meu silencio perante os abusos e escândalos que elle esconde, e que bem posso classificar de criminosos, e de que serve como remate a actual arbitragem, poderia parecer suspeitoso aos olhos de estranhos, e eu desadoro as situações equivocas.

Não gosto de equivocos; não os quero na minha vida particular, e muito menos os quero na minha vida publica.

Desde, porém, que assumo a responsabilidade de fallar, não posso deixar de fazer as observações que principalmente o discurso do sr. ministro dos negócios estrangeiros me inspirou.

Serei tambem sincero em dizer a s. exa. que no campo em que o sr. Navarro collocou a sua interpellação, a resposta por elle dada era geral, pareceu satisfazer a muita gente; e eu mesmo me dei até certo ponto por satisfeito.

O sr. Navarro, com uma prudencia, aliás digna de louvor n'este momento, tratou a questão n'um campo muito restricto, e n'esse campo foi facil ao illustre ministro dos negocios estrangeiros dar uma resposta que apparentemente satisfazia. Mas o sr. ministro, apesar da prudencia, cautela e diplomacia em que tem sido insigne nesta sessão parlamentar, desta vez, como se achava um pouco seguro na facilidade da resposta que dava, foi mais longe do que provavelmente desejava, e foi tão longe que me obrigou a pedir a palavra para condemnar uns factos que elle denunciou e que o parlamento não póde acceitar incondicionalmente.

Este acontecimento do caminho de ferro de Lourenço Marques, e doloroso dizel-o, com todas as consequencias que d'elle hão de vir, ha de ficar archivado na historia portugueza, posso bem dizel-o, como exemplo de quanto custa a aprendizagem de um ministro da corôa em Portugal! (Apoiados.)

Os conflictos que se têem levantado, os que estão de pé, e os que ainda hão de surgir ate á, liquidação final, representam, repito, quanto custa a aprendizagem de um ministro da corôa, de um ministro da corôa na investidura de uma pasta como a das colónias, que n'um paiz como o nosso sempre considerei a mais difficil, a mais onerosa a de maior responsabilidade de toda a administração do estado!

Se o ser-se ministro da corôa carecesse simplesmente da graça de El-Rei para bem servir a nação, ninguem melhor do que o sr. Pinheiro Chagas a teria, e que serviu a contento do seu soberano disseram-lh'o de certo as palavras sacramentaes do decreto que o exonerou d'aquelle espinhoso encargo.

A nação, porem, é que não póde, infelizmente, dizer outro tanto, e está agora expiando amarga e cruelmente a confiança demasiada e cega que tem até hoje depositado na suprema magistratura do estado!

N'um paiz cuja missão historica se definiu em alargar e enriquecer o mundo com as descobertas o conquistas de mares nunca d'antes navegados, de continentes e ilhas destinados a grandes emporios da civilisação, a pasta do ministerio da marinha devei ia constituir o titulo mais honroso dos nossos homens de estado, a prova provada do seu talento, saber e virtudes civicas, e tanto mais quanto e certo que ella encerra todos os ramos da administração publica. É a que exige no seu conjuncto maior cabedal de saber e de qualidades, que não será facil de encontrar mesmo nos nossos homens mais distinctos. Alem de outros e este um dos absurdos mais caracteristicos das actuaes instituições!...

É esta a pasta destinada para desgraça nossa á aprendizagem dos nossos homens publicos! Serve apenas para começo de carreira! Quanto esta aprendizagem sáe cara ao paiz, quanto lhe custa rios de dinheiro e lhe assedia o seu destino de ciladas e perigos, dil-o bem eloquentemente a materia d'esta interpellação!...

Mas bom será que se tire desta gravissima lição ao menos algum ensinamento para o futuro!

Não se me leve a mal, que eu desejasse que esta sessão fosse secreta para que podessemos lealmente dizer tudo quanto sentimos a respeito desta questão, mas já que e publica o que e pena e que ella ao menos não tivesse precedido a discussão do caminho de ferro de Mossamedes, porque então teriamos sido muito mais cautelosos pela rude lição que este debate nos está dando...

Creio mesmo que se a discussão do caminho de ferro de Mossamedes precedesse a interpellação do sr. Navarro, pouca gente daria o seu voto áquelle projecto!...

A questão do caminho de ferro de Lourenço Marques, srs. deputados, constitue uma lição tão dura, tão caracteristica dos tempos que se atravessam, que supponho, ficará na nossa historia constitucional como o monumento mais completo, para os vindouros, da nossa administração publica, da decadencia dos nossos costumes e da degeneração rapida dos nossos homens do estado!...

Uma observação basta para o demonstrar.

Tudo quanto se fez depois do contrato primitivo, assignado pelo sr. Pinheiro Chagas, só serviu para demonstrar a toda a evidencia que o unico caminho que tinhamos a seguir, era o do annullar pela base áquelle maldito e vergonhoso convenio; e, no entanto, tudo quanto agora se fez tardiamente com tanto sacrificio e vergonha nossa, esteve no poder do sr. ministro de então, o sr. Pinheiro Chagas, e do governo que se seguiu ao partido regenerador, o partido progressista, do o conseguir sem nos custar então o minimo sacrificio, no uso dum direito indiscutivel!... Nem uns nem outros no entanto quizeram usar d'elle!

Quantas vezes o aventureiro Mac-Murdo deu a este paiz pretexto legitimo para o correrem d'aqui para fóra, outras tantas vezes áquelle aventureiro encontrou nos dois partidos monarchicos taes complacencias com as suas especulações e abusos, que chegaram a ultrapassar os limites da honra e dos brios d'esta nação!

O aventureiro Mac-Murdo veiu ao nosso paiz sem ninguem saber quem era; ainda hoje se discute se era inglez ou se era americano!

O aventureiro era de tal ordem, que não tinha credito em parte alguma. Ainda depois de protegido nas altas regiões do estado e de cobrir-se com a honrada bandeira portugueza para as suas aventuras e de se investir de parte dos nossos direitos magestaticos, ainda assim andou lá fora sem exito para os seus fins enxovalhando o nosso bom nome, estendendo ate nós a desconfiança e o descredito que pesavam sobre elle!

E é triste dizel-o: os governos que tão complacentes foram com este sinistro desconhecido, foram avisados ainda a tempo do que elle era e do que elle valia!

Tenham-se em vista as informações officiaes prestadas

100 *