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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Agora, em consequencia da estreiteza do tempo, por isso que o contrato acaba em 15 de outubro, e não era conveniente para o governo, nem para o reino e provincias ultramarinas, que se não resolvesse este negocio, dei lhe o meu apoio.

Disse hontem tambem que desejava que este contrato se tornasse extensivo á costa oriental da Africa, porque levava ahi a navegação regular a vapor ás nossas provincias ultramarinas, haviam de mudar de situação e prestar grandes serviços ao paiz.

Mas vamos affrontar a questão no seu verdadeiro ponto; expliquemos uma idéa que está pairando sobre a camara, e que se não tem explicado como se devia explicar.

Ha navegação por subsidio e navegação de graça. Este ponto é que eu vou tratar, porque tenho para mim que a navegação de graça póde saír mais cara do que a subsidiada.

O sr. Mariano de Carvalho disse que o subsidio n'estas circumstancias era para a carga, e que o subsidio para a carga não se deve conceder. Eu responderei ao illustre deputado que entendo que o subsidio não é para a carga.

Uma companhia qualquer que é subsidiada pelo estado tem responsabilidades para com o governo, ha de fazer saír os seus vapores todos os mezes, em dias determinados, os quaes hão de tocar em pontos certos que lhe são marcados, e levar as malas do governo, os passageiros do estado, colonos, utensilios militares, etc. etc.

Ora, uma companhia que contrahe obrigações tão rigorosas, está sujeita a multa, se não cumpre as obrigações que estão estipuladas no contrato. Portanto, ha obrigações pelas quaes o estado aufere certas vantagens, e então não podemos dizer que a companhia recebe subsidio só pela carga.

Diz-se que se deve optar pela companhia que fizer este serviço de graça. Companhias n'este caso póde haver muitas, mas ellas não tomam como ponto de partida o porto de Lisboa, nem os seus vapores tomam a bandeira nacional, e então isto póde custar mais caro do que qualquer subsidio que se lhe possa dar.

A minha opinião que está já constatada em documentos officiaes, é que o porto de Lisboa deve ser procurado como o ponto de saída de todos os vapores, e tudo quanto for saírem de Southampton ou Liverpool póde ser muito prejudicial, e porque afugenta o commercio do reino para os paizes estrangeiros, e quebra os laços que devem existir entre a metropole e o ultramar, porque este fica sendo assim colonia estrangeira.

Ainda digo mais ao illustre deputado; se me propozerem que o governo inglez dá um subsidio ao governo portuguez, para deixar saír os vapores de Liverpool com bandeira ingleza, levando as malas e passageiros, e tudo que quizermos, eu não aceito tal proposta; porque quero que a companhia seja nacional; quero que os vapores partam de Lisboa.

Mas diz o illustre deputado que todo o interesse vem a recaír, sobre algumas casas commerciaes de Lisboa, e não sobre as provincias ultramarinas! E que mal é que venha a recaír todo esse interesse sobre as casas commerciaes portuguezas?! Mas diz s. ex.ª que as provincias ultramarinas não lucram nada! Sim, senhor, muito bem; então sejamos claros, entreguemos o commercio a Londres, a Liverpool ou a Nova York, de maneira que esses portos aufiram os grandes interesses, sem vantagem alguma para o nosso commercio, e não façamos caso do reino.

O meu pensamento é que a companhia deve ter a bandeira portugueza, que os vapores devem partir de Lisboa, e que os carregamentos que saírem de Lisboa tragam o retorno ao mesmo ponto; porque assim a navegação nacional aufere grandes interesses e o commercio tambem.

Se o illustre deputado suppõe que n'isto não ha vantagem nenhuma, que a vantagem toda são 100:000$000 réis, 50:000$000 réis ou 20:000$000 réis com que se possa fazer a navegação mais barata e sem subsidio, engana se, porque nós vamos ceder á companhia que não quer subsidio, o transporte de malas e passageiros, que póde custar dezenas de contos. E digo portanto ao illustre deputado que nós aqui devemos explicar essa idéa de subsidio que está pairando sobre a camara.

Ha navegação subsidiada e navegação não subsidiada. Se o nobre ministro a póde fazer de graça, muito bem, póde ser que seja melhor, e mesmo que haja qualquer companhia cujos vapores sáiam do porto de Lisboa, que diga: não preciso já do subsidio, mas dêem-me as malas e os passageiros. Sobretudo as malas, que são uma cousa muito importante; e por esta occasião contarei um facto a respeito de malas.

As malas que vieram agora de Africa já foram quarenta e sete; vieram malas cujo porte das cartas é muito insensível. Se hoje é de centos de mil réis, poderá vir a ser de contos de réis, e já importam em cada anno 14:000$000 réis. Em Inglaterra são milhares e milhares de libras.

Vou contar o facto, para se ver o que é a concessão de uma mala.

Eu vinha de Bombaim n'um vapor da carreira ingleza, e cheguei a Suez. Tinha travado relações com um official de marinha que estivera no cruzeiro de Moçambique. Quando estava a partir de Suez para o Cairo, o official de marinha disse-me: «Agora não o posso acompanhar, porque tenho de dirigir a mala». Perguntei-lhe se se demorava muito tempo, e respondeu-me que dentro de uma ou duas horas estava tudo arranjado. Principiou a saír a mala, em que se empregaram muitas lanchas; e estavam oitenta camellos á espera d'ella para a transportarem através do Isthmo.

Perguntando eu qual o importe d'aquella mala, respondeu-se-me que continha duzentas a trezentas mil cartas, e que importava em 10:000 libras.

Ora sei que não podemos fazer comparação, porque é uma cousa muito pequena, a correspondencia entre Lisboa e as nossas colonias, á vista d'isto, mas de futuro póde vir a ser uma cousa muito importante; e por isso ainda quando uma companhia ingleza fizesse qualquer proposta a este respeito, eu a havia de rejeitar, porque embora ella ainda nos desse subsidio, essa navegação custava-nos muito cara.

É necessario consultar os dados estatisticos, e vermos se o importo da correspondencia entre Lisboa e as provincias ultramarinas, sobe a uma cifra muito grande, porque eu supponho que deve exceder já os 14:000$000 réis, como fui informado.

Portanto, se os vapores saíndo de Inglaterra e tocando nos portos de Lisboa e outros, podem fazer estas vantagens, é porque o transporte dos passageiros e malas lhes garante as despezas e lucro para tocarem nos pontos que se contratar.

A respeito de direitos protectores, precisâmos d'elles nas colonias.

O calçado e o fato que vão de Lisboa têem direitos protectores; têem os as fazendas fabricadas nas nossas fabricas. Mas que mal ha n'isso? Que mal ha em que os sapateiros, alfaiates e fabricantes de Lisboa tenham um commercio importante com a Africa, que sem os direitos protectores deixariam de ter, e iria o calçado e o fato de Inglaterra ou dos Estados Unidos aonde se fabrica mais barato? Tudo seria em prejuizo da metropole.

Eu estou convencido de que não se lucrava com a extincção dos direitos protectores na Africa.

Vou concluir.

Desejarei que o sr. ministro da marinha faça um contrato para a navegação de Africa, mas com uma companhia que aceite as condições de saída do porto de Lisboa para as colonias, com a bandeira portugueza (apoiados), e se for escusado o subsidio, melhor.

Dar o exclusivo do transporte das malas do correio e dos passageiros a uma companhia estrangeira é dar um valor, que póde parecer insignificante hoje, mas que de futuro