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SESSÃO NOCTURNA DE 29 DE JULHO DE 1887

Presidencia do exmo. sr. José Maria Rodrigues de Carvalho

Secretarios os exmos. srs.

José Maria de Alpoim Cerqueira Borges Cabral
Francisco José Machado

SUMMARIO

Approvada a acta da sessão antecedente, teve segunda leitura e foi admittido um projecto de lei do sr. Sá Nogueira. - O sr. presidente apresenta duas representações e consulta a camara sobre a sua publicação no Diario do governo. Auctorisa-se a publicação.
Na ordem da noite, primeira parte, é approvado sem discussão o projecto de lei n.º 200. - Requer o sr. Pereira Carrilho, e a camara approva, que entre em discussão o projecto n.º 212. É approvado. - São tambem approvados sem discussão os projectos de lei n.ºs 204 e 201.
Na segunda parte da ordem da noite continua em discussão o projecto de lei n,° 180, relativo ao recrutamento. - Usa em primeiro logar da palavra o sr. Teixeira de Vasconcellos, que apresenta e sustenta uma moção de ordem. - Segue-se o sr. Alfredo Brandão, que faz diversas considerações em resposta ao orador precedente, e manda para a mesa diversas propostas. - Dá-se conta da ultima redacção dos projectos de lei n.ºs 200, 201, 204 e 212. - Combate largamente o projecto o sr. Julio de Vilhena, que apresenta uma moção de ordem contraria á taxa militar estabelecida pelo projecto.

Abertura da sessão - Ás nove horas e um quarto da noite.

Presentes á chamada 61 srs. deputados. São os seguintes: - Alfredo Brandão, Antonio Castello Branco, Baptista de Sousa, Oliveira Pacheco; Pereira Carrilho, Augusto Pimentel, Miranda Montenegro, Augusto Ribeiro, Victor dos Santos Lobo d'Avila, Eduardo José Coelho, Elizeu Serpa, Goes Pinto, Madeira Pinto Estevão de Oliveira, Feliciano Teixeira, Matoso Santos, Fernando Coutinho (D.), Francisco Beirão, Francisco de Barros, Castro Monteiro, Francisco Matoso, Fernandes Vaz, Francisco Ravasco, Soares de Moura, Gabriel Ramires, Guilherme de Abreu, Sá Nogueira, Santiago Gouveia, João Arroyo, Menezes Parreira, Teixeira do Vasconcellos, Rodrigues dos Santos, Alfredo Ribeiro, Silva Cordeiro, Joaquim da Veiga, Oliveira Martins, Simões Ferreira, Jorge O'Neill, Amorim Novaes, Alves de Moura, Ferreira Galvão, Pereira e Matos, Abreu Castello Branco, Alpoim, José Maria de Andrade, Barbosa de Magalhães, Rodrigues de Carvalho, José Maria dos Santos, José de Saldanha (D.), Santos Moreira, Julio Graça, Julio de Vilhena, Vieira Lisboa, Poças Falcão, Bandeira Coelho, Manuel Espregueira, Manuel José Correia, Marianno de Carvalho, Estrella Braga, e Visconde de Silves.

Entraram durante a sessão os srs.: - Mendes da Silva, Alves da Fonseca, Antonio Centeno, Antonio Villaça, Gomes Neto, Pereira Borges, Guimarães Pedrosa, Tavares Crespo, Antonio Maria de Carvalho, Jalles, Santos Crespo, Emygdio Julio Navarro, Almeida e Brito, Francisco Machado, Severino de Avellar, João Pina, Cardoso Valente, Vieira de Castro, Jorge de Mello (D.), José Castello Branco Dias Ferreira, Laranjo, Figueiredo Mascarenhas, Simões Dias, Santos Reis, Abreu e Sousa, Lopo Vaz, Manuel d'Assumpção, Marianno Prezado, Tito de Carvalho e Vicente Monteiro.

Não compareceram á sessão os srs: - Albano de Mello, Moraes Carvalho, Serpa Pinto, Alfredo Pereira, Anselmo de Andrade, Sousa e Silva, Campos Valdez, Antonio Candido, Ribeiro Ferreira, Antonio Ennes, Moraes Sarmento Mazziotti, Fontes Ganhado, Barros e Sá Simões dos Reis, Hintze Ribeiro, Augusto Fuschini, Bernardo Machado, Conde de Castello de Paiva, Conde de Villa Real, Eduardo de Abreu, Elvino de Brito, Freitas Branco, Firmino Lopes, Francisco de Medeiros, Lucena e Faro, Frederico Arouca, Guilhermino de Barros Sant'Anna e Vasconcellos, Casal Ribeiro, Candido da Silva, Baima de Bastos, Pires Villar, Scarnichia, Franco de Castello Branco, Izidro dos Reis, Souto Rodrigues, Dias Gallas, Sousa Machado, Correia Leal, Alves Matheus Oliveira Valle, Joaquim Maria Leite, Avellar Machado, Barbosa Collen, Ferreira de Almeida, Ruivo Godinho, Elias Garcia, Pereira dos Santos, Guilherme Pacheco, Vasconcellos Gusmão, José de Napoles, Ferreira Freire, Oliveira Matos, Pinto Mascarenhas, Julio Pires, Mancellos Ferraz, Luiz José Dias, Manuel José Vieira Brito, Fernandes Pinheiro Chagas, Marçal Pacheco, Matheus de Azevedo, Miguel da Silveira, Miguel Dantas, Pedro Monteiro, Pedro Victor, Sebastião Nobrega, Dantas Baracho, Visconde de Monsaraz, Visconde da Torre, Wenceslau de Lima e Consiglieri Pedroso.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Segunda leitura

Projecto de lei

Artigo 1.° É approvado o contrato provisorio para a illuminação a gaz da cidade de Elvas feito em 15 de maio do corrente anno entre a camara municipal da mesma cidade e Antonio Barbosa Alves Pereira por si e em nome de Emilio Pitoch.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario. = Sá Nogueira.
Lido na mesa foi admittido e enviado á commissão de administração publica.

REPRESENTAÇÕES

Dos empregados na fabricação de tabacos no Porto, pedindo que por occasião da discussão da proposta de lei n.º 2, seja attendida a sua situação.
Apresentada pelo sr. presidente da camara, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.

Dos empregados dos escriptorios da companhia nacional de tabacos, pedindo que lhes sejam extensivas as disposições beneficas que pela proposta de lei n.º 2 são applicadas á classe dos manipuladores de tabacos.
Apresentada pelo sr. presidente da camara, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.

O sr. Presidente: - Dou conhecimento á camara de que recebi duas representações ácerca da proposta de lei n.° 2 que altera o regimen dos tabacos, sendo uma dos operarios das fabricas de tabacos, do Porto e outra dos empregados dos escriptorios da companhia nacional.
Consulto a camara sobre se permitte que ambas as representações sejam publicadas no Diario do governo.
Foi auctorisada a publicação.

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2188 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

PRIMEIRA PARTE DA ORDEM DA NOITE

Leu se o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.º 200

Senhores. - A vossa commissão de administração publica não duvidou converter no projecto de lei n.º 155, a proposta de lei n.º 145-B, de iniciativa governamental, para serem applicaveis as disposições da carta de lei de 11 de abril de 1874 ás juntas de parochia, e ás irmandades e confrarias que não tenham a seu cargo algum estabelecimento de beneficencia pelas suas gerencias anteriores a 1 de julho de 1887, porque entendeu que na passagem de um para outro regimen administrativo; era sempre de equidade e de conveniencia publica a adopção de medidas transotorias, que «auctorisem e facilitem a rigorosa applicação da nova lei».
Esteve desde logo no seu animo alargar aquelle beneficio ás camaras municipaes, nos termos d'aquella mesma lei porque, apesar da sua maior importancia, é da competencia presumida do seu pessoal, prevaleciam em favor d'ellas todas as demais considerações.
Como porem, não appareceu reclamação alguma n'esse sentido, limitou-se aos precisos termos d'aquella proposta do governo.
Mas foi-lhe presente agora o projecto de lei n.° 196-B, de iniciativa dos illustres deputados Antonio Maria de Carvalho, Guilherme de Abreu, e Teixeira de Vasconcellos, para que sejam tambem relevadas as camaras municipaes da responsabilidade em que, pelas suas gerencias anteriores a 1 de julho de 1887, hajam porventura incorrido por falta ou excesso de auctorisações orçamentaes.
Não tendo, pois, soffrido impugnação alguma aquelle projecto de lei n.° 155, e sendo procedentes em favor d'esta proposta as mesmas rasões que o justificaram, temos a honra de propor á vossa approvação, de accordo com o governo, o seguinte projecto de lei :
Artigo 1.° As disposições da carta de lei de 31 de abril de 1874 são applicaveis ás camaras municipaes, pelas suas gerencias anteriores a 1 de julho de 1887.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala da commissão, 22 de julho de 1887. = E. J. Coelho = J. P. Oliveira Martins = Henrique de Sá Nogueira de Vasconcellos = J. de Saldanha Oliveira e Sousa = A. Simões dos Reis = Julio Cesar de Faria Graça - Simões Ferreira = Barbosa de Magalhães, relator.

N.º 196-B

Artigo 1.° As disposições da carta de lei de 11 de abril de 1874 são applicaveis ás camaras municipaes pelas suas gerencias anteriores a 1 de julho de 1887.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara dos senhores deputados, em 20 de julho de 1887. = Antonio Maria de Carvalho = Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu = Teixeira de Vasconcellos.
Approvado sem discussão na generalidade e na especialidade.

O sr. Carrilho: - Por parte da commissão de fazenda requeiro a v. exa. consulte a camara sobre se permitte que, dispensando-se o regimento, entre desde já em discussão o projecto de lei n.º 212, que tem por fim fixar a contribuição predial dos concelhos autonomos.
Foi dispensado o regimento.
Leu-se o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.º 212

Senhores. - Á vossa commissão de fazenda foi presente a proposta de lei do governo n.° 211-A, fixando a contribuição predial dos concelhos constituídos autonomicamente nos termos do codigo administrativo de 17 de junho de 1886.
E porque a contribuição fixada é igual á distribuída no anno civil de 1886, entende que a proposta deve ser approvada e convertida no seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° O contingente da contribuição predial do anno civil de 1887, dos concelhos do reino e ilhas, que sé acham constituídos nos termos da secção II do capitulo I do titulo IV do codigo administrativo de 17 de julho de 1886, é fixada nos termos seguintes:

Lisboa .... 409:000$000
Porto .... 125:416$057
Guimarães .... 31:603$216
Barcellos .... 24:821$185
Ponta Delgada (moeda açoriana) .... 52:820$000

§ unico. A distribuição da contribuição predial que respectivamente competir aos demais concelhos de cada districto, nos termos do § 5.° da lei de 30 de junho de 1887, depois de abatida a parte que em cada districto, e nos termos d'esta lei, cabe aos concelhos autonomos, será feita segundo o disposto na lei de 17 de maio de 1880 e na portaria de 30 de dezembro de 1886, em relação ao concelho de Lisboa.
Art. 2.° Fica revogada a legislação contraria a esta.
Sala da commissão de fazenda, aos 28 de julho de 1887. = Antonio Eduardo Villaça = Vicente R. Monteiro = A. Fonseca = Gabriel José Ramires = A. Baptista de Sousa = J. P. de Oliveira Martins = Marianno Presado = Carlos Lobo d'Avila = A. Carrilho, relator.

N.º 122-A

Senhores. - Em harmonia com o disposto no artigo 424.° do codigo administrativo de 17 de julho de 1886, e tomando por base a distribuição da contribuição predial, que havia sido feita, por concelhos, em relação ao anno civil de 1886, tenho a honra de vos apresentar a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° O contingente da contribuição predial do anno civil de 1887, dos concelhos do reino e ilhas, que se acham constituídos nos termos da secção II do capitulo I do titulo IV do codigo administrativo de 17 de julho de 1886, é fixada nos termos seguintes:

Lisboa .... 409:000$000
Porto .... 125:416$057
Guimarães .... 31:603$216
Barcellos .... 24:821$185
Ponta Delgada (moeda açoriana) .... 52:820$000

§ unico. A distribuição da contribuição predial, que respectivamente competir aos demais concelhos de cada districto, nos termos do § 5.° da lei de 30 de junho de 1887, depois de abatida a parte que n'esses districtos, e nos termos d'esta lei, cabe aos concelhos autonomos, será feita segundo o disposto na lei de 17 de maio de 1880
Art. 2.° Fica revogada a legislação contraria a esta.
Ministerio dos negocios da fazenda, aos 28 de julho de 1887. = Marianno Cyrillo de Carvalho.
Approvado sem discussão na generalidade é na especialidade.

Leu-se o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.º 204

Senhores. - Á vossa commissão de fazenda foi presente o projecto de lei n.° 135-C da actual sessão legislativa, que leu por fim a concessão do edificio do convento de Sant'Anna, da cidade de Vianna do Castello, ao hospital de velhos e entrevados de Nossa Senhora da Caridade da mesma cidade.

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SESSÃO NOCTURNA DE 29 DE JULHO DE 1887

Pela leitura do relatorio, que antecede o referido projecto de lei, vereis; plenamente justificado o pedido que se faz e de como a institução de beneficencia tem progredido; satisfazendo aos seus nobilíssimos fins.
Ouvido o governo declara que o convento de que se trata não foi ainda supprimido sendo o seu valor de réis 17:000$000, não constando do inventario o valor da igreja, mas sim que em 1858 (ha vinte e oito annos) se achava em bom estado, de conservação; a cerca vale 2:400$000 réis e a casa annexa do capellão 150$000 réis.
Attendendo porem a que o edificio vae ser destinado, quando concedido, a recolher e manter os invalidos e entrevados de ambos os sexos, quer no ultimo quartel da vida não podem sequer mendigar o pão de cada dia, é a vossa commissão de parecer, de accordo com o governo, que deveis approvar o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É o governo auctorisado a conceder á administração do hospital de velhos e entrevados de Nossa Senhora da Caridade de Vianna do Castello, o edifício do convento de Sant'Anna da mesma cidade, com a igreja, alfaias do culto, casa do capellão e a parte da cerca adjacente ao convento com toda a agua; que ao mesmo pertence com excepção da que legalmente já tenha sido cedida a outrem anteriormente á publicação d'esta lei:
§ 1.º Esta concessão será feita por meio de decreto é só se tornará effectiva quando deixe de existir no convento a ultima das religiosas professas, que ali residem actualmente.
§ 2.° Ficará, nulla a concessão, e o edificio e todos os seus annexos com quaesquer bemfeitorias, que n'elles haja, reverterão para a posse da fazenda nacional quando o hospital deixe de satisfazer aos fins da sua instituição ou de empregar n'elles tudo o que pela presente lei lhe póde ser concedido.
Art. 2.° Fica revogada a legislação contraria a esta.
Sala da commissão, aos 20 de julho de 1887. = Vicente Monteiro = A. Fonseca = Oliveira Martins = Carlos Lobo d'Avila = Marianno Prosado = Antonio Maria de Carvalho = F. Mattozo Santos = José Frederico Laranjo = Antonio Candido = José Maria dos Santos = Antonio Eduardo Villaça = A. Carrilho, relator.

N.° 135-C

Senhores: - Ha em Vianna do Castello um estabelecimento de beneficencia o hospital de velhos entrevados de Nossa Senhora da Caridade, estabelecimento tão modesto quanto util e digno da sympathia publica; cujo piedoso e humanitario fim é, como diz o nome recolher e manter os invalidos e entrevados de ambos os sexos, que no ultimo quartel da vida; não podem sequer mendigar o pão de cada dia.
Nos fins do seculo passado um prestante filho de Vianna, José Pimenta Jarro, congregou, alguns amigos pessoaes que com elle tomaram a seu cargo solicitar esmolas e obter donativos, e, comprando com o pequeno producto colhido uma casa terrea installaram ali o primeiro asylado.
Esta piedosa instituição foi alargando successivamente os seus benefícios; á humilde casa terrea foram-se juntando outras contíguas, e hoje albergam-se n'ellas quarenta e quatro velhos de ambos os sexos, cercados do indispensavel conforto, e tratados com os cuidados e desvelos que a caridade inspira e as condições economicas da instituição permittem.
A casa, porém, tal qual está é insufficiente, e as zelosas administrações que têem presidido áquelle estabelecimento já de ha muito cuidam em crear um fundo especial para a construcção de um edificio apropriado; mas, infelizmente, só muito tarde poderá esse fundo attingir a somma necessaria.
N'estes termos, nem póde uma tão salutar instituição estender os seus benefícios a maior numero de asylados, como é indispensavel, porque o está reclamando, instantemente muita desgraça sem amparo, nem tão pouco póde ella tão cedo melhorar as condições de installação.
Existe n'aquella cidade um edifício nacional que pelas circumstancias em que se acha, póde satisfazer ás necessidades que deixâmos apontadas. É o convento de Sant'Anna, onde existe ainda uma religiosa professa.
Concedido que seja esse convento, depois do fallecimento da ultima freira, podem as administrações d'aquelle sympathico albergue não só dispor de um edifício, que os indispensaveis melhoramentos tornarão em breve apropriado ao fim a que se destina, mas tambem o que é ainda mais importante, consagrar o rendimento de todos os seus fundos á manutenção de asylados; augmentando o numero d'estes como o reclamam bastantes desgraçados, a quem por falta de recursos é hoje impossível attender.
Pelo que fica exposto é de harmonia com o artigo 11.º da lei de 4 de abril de 1861, temos a honra de submetter á vossa approvação o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É concedido ao hospital de velhos e entrevados de Nossa Senhora da Caridade de Vianna do Castello o convento de Sant'Anna da mesma cidade com a igreja e suas alfaias, casa do capellão e a parte da cerca adjacente ao convento com toda a agua que ao mesmo pertence com excepção da que tenha já sido concedida a outrem anteriormente, á publicação da presente lei.
Art. 2.° O hospital só poderá tomar posse de tudo o referido no artigo 1.º, quando deixe de existir no convento a ultima das religiosas professas que ali residem actualmente.
Art. 3.º Ficará sem effeito esta concessão, revertendo tudo á posse do estado quando o referido hospital deixe de satisfazer aos fins da sua instituição ou de empregar n'elles tudo o que pela presente lei lhe é concedido.
Art. 4.° Fica revogada a legislação, em contrario.
Sala das sessões, em 20 de junho de 1887. = José Maria Rodrigues de Carvalho, deputado pelo circulo n.° 1 = Manuel Affonso de Espregueira, deputado pelo circulo n.º 1 = Visconde da Torre = Miguel Dantas = Luiz José Dias = Manuel Pinheiro Chagas = Ernesto Julio Goes Pinto.
Approvado sem discussão na generalidade e na especialidade.

O sr. Presidente: - Vae entrar em discussão outro projecto.
Leu-se. É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.º 204

Senhores. - A vossa commissão de agricultura foi presente á proposta de lei n.º 195-B, do governo, tendente a auctorisar a venda, á camara municipal do concelho de Thomar, do pinhal de Santa Citta, situado no mesmo concelho pelo preço de 2:445$620 réis; que serve de base á licitação; em conformidade do respectivo annuncio official publicado pelo ministerio dos negocios da fazenda, lista n.º 64-B.
Considerando que são procedentes e attendivei as rasões adduzidas no relatorio que precede a proposta do governo; e que por ella salvaguardam-se os direitos e interesses do estado, servindo-se ás legitimas conveniencias e representações dos povos e do município de Thomar:
É a vossa commissão de parecer que merece a vossa approvação o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É o governo auctorisado a contratar e effectuar a venda do pinhal de Santa Citta, situado no concelho de Thomar, pelo preço que serve de base á licitação no respectivo annuncio official, á camara municipal do mesmo concelho.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da commissão em 20 de julho de 1887. = Alfredo Pereira = Elvino de Brito = Estevão Antonio de

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Oliveira Junior. = Antonio Maria de Carvalho = J. P. de Oliveira Martins = José de Saldanha Oliveira e Sousa = D. Fernando do Sousa Coutinho = Francisco Pinto Coelho Soares de Moura, relator.

N.º 196-B

Senhores. Por virtude de auctorisação que ao governo confere o artigo 7.º são decreto, de 25 de novembro de 1886 foi annunciada a venda, em hasta publica, do pinhal de Santa Citta, situado no concelho de Thomar.
Acontece, porém; que a camara municipal do mesmo concelho pondera que no referido pinhal se effectua desde remotíssimas eras um mercado mensal de gados e uma feira annual a que concorrem os povos dos concelhos limitrophes se por isso muito conviria que aquella propriedade do estado não passasse ao domínio particular, porque d'ahi resultaria a transferencia do mercado, para outra localidade menos apropriada e deslocação de interesses que affectariam desfavoravelmente o concelho e susceptibilisariam o sentimento popular. N'estas circumstancias e por que o municipio de Thomar se promptifica a adquirir a mesma propriedade pelo preço, que serve de base á licitação como intuito de conservar os habitos tradicionaes que a ella se acham ligados, tenho a honra de submetter á deliberação do parlamento a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.º É o governo auctorisado a contratar e effectuara venda do pinhal de Santa Citta, situado no concelho de Thomar, pelo preço que serve de base á licitação no respectivo annuncio official á camara municipal do mesmo concelho.
Art. 2.º fica revogada a legislação em contrario.
Ministerio das obras publicas, commercio, e industria, em 20 de julho de 1887 = Emygdio Julio Navarro.
Foi approvado na generalidade, e na especialidade sem discussão.

SEGUNDA PARTE DA ORDEM DA NOITE

O sr. Presidente: - Continúa em discussão o projecto de lei n.° 180 e tem a palavra, que lhe ficou reservada da sessão diurna, o sr. deputado Teixeira de Vasconcellos.
O sr. Teixeira de Vasconcellos (sobre a ordem na sessão diurna): - Cumprindo as disposições do regimento, começo por ler a minha moção de ordem, que é a seguinte:
«A camara, affirmando que o projecto em discussão não realisa o principio de serviço militar pessoal e obrigatorio e a reducção do serviço, como unico meio, nas circumstancias financeiras do paiz, de promover a educação militar da sociedade portugueza, continua na ordem do dia. = Teixeira de Vasconcellos.»
Sr. presidente é acaso da inscripção quiz que me coubesse a honra e o prazer de responder ao meu estimavel amigo e talentoso collega o sr. Alpoim. (Apoiados.)
Folgo muito de poder n'esta occasião prestar a minha homenagem muito sincera e muito sentida, não só as elevadas qualidades de caracter de s. exa. como aos distinctos dotes de intelligencia, de que tantas provas s. exa. tem dado já n'esta sessão (Apoiados.)
Satisfeito este dever de justiça e cumprido este preceito de boa amisade, passo a expor á camara o que se me offerece sobre o assumpto em discussãO.
O meu illustre collega, na moção que mandou; para a mesa diz que dá o seu voto ao projecto, porque elle encerra, estes tres princípios que em seu entender, tão indispensaveis são para uma boa organisação militar o serviço militar pessoal, e obrigatorio, o serviço de tres annos e a taxa militar.
Ora, quem examinar o projecto, quem attender ás disposições que elle contém, verá immediatamente que o principio do serviço militar pessoal e obrigatorio não existe (Apoiados.) e que esta affirmação do projecto é inteiramente inexacta. (Apoiados.)
Realmente, se o serviço militar pessoal é obrigatorio é aquillo que está consignado no projecto, onde ha a troca de numeros, onde ha os adiamentos e as isenções com uma tal latitude que serão rarissimos os mancebos, de uma certa posição social, que não escapem ao alistamento nas fileiras do exercito, então não comprehendo bem o que sejão serviço pessoal e obrigatorio. (Apoiados.)
O serviço pessoal e obrigatorio do projecto é simples, mente um luxo de phrase, e é certo que bastantes vezes, em cousas serias e graves, nos contentamos com palavras que nada valem. (Apoiados.)
A instrucção primaria tambem é obrigatoria para todas as creanças desde os sete annos, e esta obrigação, imposta pela lei desde 1847, sabemos nós o que ella é, o que ella vale. (Apoiados.)
Assim, a obrigação do serviço é muito limitada e não seremos injustos affirmando que este projecto impõe o serviço militar obrigatorio ao proletario é isenta d'este dever sagrado, mas rude e pesado, o burguez. (Apoiados.)
É este o fim principal do projecto e só o não vê quem não quer, ou quem não é capaz de ver. (Apoiados.)
O projecto é apenas, mais um documento para a historia de contradições políticas do ministerio progressista, que depois de nos prometter uma lei do recrutamento democratica e equitativa, dá-nos uma lei cheia de privilegios vergonhosos e injustificaveis. (Apoiados.)
O proprio voluntariado, pela fórma e pela largueza com que está consignado no projecto, é, não só um favor, como tambem um elemento dissolvente para a disciplina e para a constituição dos quadros dos officiaes inferiores. (Apoiados-.)
O voluntariado, que foi transportado da Allemanha, da Italia e da legislação franceza de 1872, vae ser applicado por nós com uma tal latitude, que não é arriscado asseverar que o exercito tem de padecer extraordinariamente com tal disposição. (Apoiados.)
A desorganisação do exercito n'aquillo que elle têm de mais valioso e de mais importante, como são os seus quadros dos officiaes inferiores, é evidente e manifesta aos olhos de todos. (Apoiados)
Se todo o mancebo, que sabe ler e escrever; póde assentar praça como voluntarios retirar-se das fileiras no fim de seis mezes, de um anno ou de anno e meio, pergunto eu: Aonde irá o sr. ministro da guerra recrutar o pessoal dos officiaes inferiores? Aonde irá s. exa. recrutar o cabo, o furriel e o sargento? (Apoiados.)
Mas eu disse tambem que o voluntariado era um elemento dissolvente para a disciplina do exercito. E este é talvez o inconveniente mais perigoso do voluntariado (Apoiados.)
Em França, o voluntariado tambem tornou uma extensão extraordinaria, os abusos foram tão grandes que a necessidade de o extinguir tornou-se inadiável.
Não foi o espirito democratico do povo, nem á revolta contra o favor que trouxe a condemnação d'esta instituição, como affirmou no seu discurso o sr. Alpoim; não foi. O voluntariado caiu em França pelos abusos enormes a que deu origem. O voluntariado desappareceu, porque sendo um motivo de favoritismo, permanente, era fatalmente, e por virtude dos seus erros, um incitamento á indisciplina e um pessimo exemplo de derespeito da igualdade de todos os cidadãos perante a lei. (Apoiados.)
O voluntariado desacreditou-se em França, porque os officiaes nunca quizeram ou nunca poderam applicar a essa classe de soldados os mesmos rigores e a mesma disciplina que impunham ás outras categorias de soldados. (Apoiados.)
Esta desigualdade disciplinar, esta posição privilegiada, creada para os voluntarios nas fileiras do exercito, foram as unicas causas que concorreram para a condemnação d'este

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principio, (Apoiados) que aliás tão bons fructos tem dado em Allemanha. (Apoiados.)
A explicação, d'este, phenomeno encontra-se n'uma celebre phrase do Baron Calmar Von Der Goltz, no seu livro La nation armée.
N'esse livro diz o illustre escriptor que distincto militar: «Uma boa organisação deve estar em prefeita harmonia com o caracter nacional».
É esta uma grande verdade e que por si só basta para condemnar este espirito de imitação, que tão funesto nos tem sido a tantos respeitos, (Apoiados) e que em França produziu, sobre este assumpto, uma reacção completa e triumphante. (Apoiados.)
A ligeireza de costumes, a leviandade de espirito e a preoccupação democratica dos povos latinos, oppõem-se fortemente á implantação de um principio que na sua origem, e nas suas consequencias necessarias não é mais que um elemento de perturbação para a boa harmonia e indispensavel cohesão nos elementos constitutivos de uma boa e solida organisação militar. (Apoiados.)
O regimen das castas repugna vivamente aos nossos instinctos igualitarios, (Apoiados). Emquanto que em Allemanha combina-se, n'uma perfeita harmonia com as suas tradições feudaes, com o vigor do seu profundo, e vivo espirito militar, e sobretudo com a differenciação de classes, ainda hoje tão distincta e tão pronunciada, que mais do que nenhuma outra qualidade ella concorre para a supremacia militar d'aquella raça. (Apoiados.)
Na larga e interessantissima discussão do parlamento francez, sobre o projecto do recrutamento do general Boulanger, nenhum orador houve que defendesse o voluntariado e, ao contrario, todas as opiniões foram unanimes em que elle devia terminar visto que aos officiaes faltou a energia precisa e o rigor necessario para sujeitar ao regimen regulamentar commum esta categoria de soldados. (Apoiados.)
Os justos receios de que a continuação d'este regimen trouxesse para o exercito, um fermento permanente de enfraquecimento e de indisciplina, levou o illustre general a propor a sua extincção e o parlamento cumpriu com a sua elevada missão, afastando do exercito uma instituição de que tanto se tinha abusado. (Apoiados.)
Pois é com taes exemplos, e depois de uma experiencia tão elucidativa, que o illustre presidente do conselho vem encarnar na lei fundamental da nossa organisação militar um principio contrario e opposto á nossa indole e aos interesses militares! (Apoiados.)
Mas assim, não custa fazer reformas; assim, facil é escalar o céu sem quebrar as pernas; (Riso) assim, tudo se reforma e transforma assim, todos podem fazer leis e ligar o seu nome a muitas cousas. (Apoiados.)
Mas o peior é que os interesses soffrem, as instituições padecem (Apoiados) e o tempo perde-se inutilmente, porque mais tarde tem de ser reformadas as anteriores reformas. (Apoiados.)
Eu pergunto se a brandura dos nossos costumes, se os desvarios dos nossos pessimos costumes politicos e se o quasi desapparecimento do nosso antigo espirito militar permittirão que se acclimate entre nós, e produza bons fructos, uma instituição toda de favor e de privilegio e cuja condemnação foi ha pouco lavrada por um paiz, que tantos pontos de contacto têem com o nosso. (Apoiados)
Depois, não se julgue do nosso voluntariado pelo voluntariado allemão; seria um erro fazêl-o e mostraria apenas a nossa ignorancia sobre as instituições militares d'aquelle paiz. (Apoiados.)
O voluntariado em Allemanha não é um favor, não é um privilegio, é uma necessidade da sua organisação? (Apoiados.)
O voluntariado é a fórma de recrutamento pelo qual o estado obtem, por meio de uma escolha sevcera e escrupulosa; o nucleo de mancebos, que, depois de uma instrucção apropriada, têem de servir como officiaes nos regimentos da landhver. (Apoiados.)
Lá o voluntariado não é um privilegio, é uma escola de habilitação para os mancebos que pelas suas aptidões pela sua instrucção, se tornaram digno, de cingir a banda de official. (Apoiados.)
Já vê a camara que nem sequer nos podemps abonar com o exemplo, da Allemanha, onde esta instituição é tão diversa nos seus intuitos, na sua fórma e nos seus fins. (Apoiados.)
Não, serei, imprudente affirmando que o voluntariado entre nós terá uma duração ephemera, pelos pessimos resultados que advirão, para a força, prestigio e disciplina do exercito. (Apoiados.)
Se consederarmos o voluntariado pelo seu lado político, porque o tem, (Apoiados.) vemos que elle contribue e muito, para restituir aos administraobres do concelho e sobretudo aos governos civis, o prestígio, e a força partidaria que lhes tinham sido tiradas com a reforma de 1884. (Apoiados.)
Podendo Ter a duração do serviço nas fileiras para o voluntariado desde seis mezes até anno meio, facil é ás auctoridades administrativas influir na duração d'este serviço, segundo as conveniencias do momento. (Apoiados.)
A política; que tudo póde e tudo mandam n'este paiz tambem saberá proceder de fórma a conseguir que determinados voluntarios sejam julgados aptos no manejo das armas no fim de seis mezes, emquanto que outros só serão dados promptos no fim do anno e meio. (Apoiados.)
A mina, como se vê, é boa e ha de de certo ser convenientemente explorada em tempo oppprtuno. (Apoiados.)
Assim sommando todos os valores, temos que o voluntariado entre nós significa privilegio, favoritismo relaxação disciplinar e desmoralisação política. (Apoiados.)
É realmente uma innovação bem boa e que deve immortalisar o illustre presidente do conselho. (Apoiados.)
Depois vêem os adiamentos com as respectivas informações do administrador; outra mina para ser explorada convenientemente pelos agentes eleitoares em tempo opportuno! (Apoiados.) E assim, teremos á accrescentar ao rol monstruoso das contradicções e das retractações, mais esta que prova bem a pouca seriedade e ausencia de principios do partido progressista. (Apoiados.)
Dependendo das auctoridades a maior ou menor duração do serviço do voluntario nas fileiras, e dependendo da sua informação a concessão dos adiamentos, claro está que essas auctoridades ficam revestidas de hoje em diante de um poder e de uma influencia que não tinham. (Apoiados.)
Depois de termos dado um passo para a frente, retrocedemos! (Apoiados.)
É isto o progresso á moda progressista. (Apoiados.)
Quando a opposição, só cessara m os seus ataques á preponderancia do administrador do conselho, do governador civil e do regedor, depois que o accordo de 1884 os despojou d'essas armas de propotencia e corrupção, que tão funestas tinham sido para vida do partido progressista; sugundo elles diziam: «Hoje, como são poder, e os interesses são outros, mudam de rumo e desfazem de um golpe os beneficios conquistados para todos os partidos; (apoiados.) e para a boa administração do paiz. (Apoiados.)
Eis o que vale o projecto e no que para o apregoado principio do serviço pessoal e obrigatorio! (Apoiados.)
É uma arma eleitoral e está dito tudo. (Apoiados.)
E assim devia ser. N'um paiz entregue e dominado pelas corrupelas politicas, o serviço militar obrigatorio deve sel-o sómente para aquelles que nenhuma influencia tem n'este jogo politico. (Apoiados.)
Foi-o sempre e ha de continuar a sêl-o. (Apoiados.)
Durante a vigencia do antigo regimen; era o serviço das armas um mister nobre e por isso as classes dirigentes de então queriam para si o privilegio de sustentar nos cam-

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pos de batalha a honra e os interesses da patria. (Apoiados.)
Era uma honra e tambem um motivo de prestigio e influencia social trazer as armas e por isso aos nobres cabia sómente o exercicio d'esta nobilissima funcção. (Apoiados.)
Então e com estes costumes, seria facil introduzir no paiz o serviço pessoal e obrigatorio. (Apoiados.)
Mais tarde a burguezia triumphante alterou os fundamentos sociaes e o dinheiro, as emprezas lucrativas e os commodos da vida destruiram esse velho preconceito guerreiro, que levara ás especulações da morte a classe então preponderante. (Apoiados.)
Influenciado por esta corrente egoista e burgueza apparecem nas leis francezas de 1818 e 1836 as isenções e as substituições. (Apoiados.) E entre nós apparece em 1833 a ruina das nossas velhas e democraticas instituições militares da sua substituição por uma organisação burgueza e toda copiada á franceza. (Apoiados.)
Este vicio, este favoritismo de classes radicou-se por tal fórma, que o grande marechal Niel, prevenido pelo exemplo frisan tissimo de 1886; quiz dotar o seu paiz com uma organisação militar que assentasse sobre o principio do serviço pessoal e obrigatorio, mas, não o conseguiu e teve de ceder diante dos interesses egoistas das classes dirigentes, representadas por Thiers Julio Simon e Gambetta, que fazia parte do partido de opposição intransigente ao imperio.
As instancias e aos rogos do nobre marechal respondiam-lhe que elle queria transformar a França n'uma caserna.
A esta provocação impensada respondeu Niel com estas propheticas palavras:
«Deus queira que v. exa. não transformem em breve n'um vastissimo cemiterio.» (Apoiados.)
Creio que deu a hora e como tenho a expor ainda algumas considerações peço a v. exa., sr. presidente, que me reserve a palavra para a sessão da noite.
O sr. Teixeira de Vasconcellos (n'esta sessão): - Tendo-me visto, obrigado pela força das circumstancias a ficar com a palavra reservada para a sessão nocturna,
vou continuar nas considerações que tenho a fazer sobre o projecto em discussão.
Dizia eu, na sessão de dia, que as instituições militares para serem viaveis devem relaciohar-se intimamente com o estado social do paiz, e dizia tambem que o estabelecimento da monarchia constitucional em França tinha introduzido na sua legislação privilegios e favores em beneficio da classe burgueza então preponderante. (Apoiados.)
E, se examinarmos a historia do nosso paiz, vemos que factos identicos se repetiram nas nossas instituições militares.
V. exa. e a camara sabem que o grande marquez de Pombal, seduzido pelas victorias do grande Frederico e convencido de que ellas só poderiam ser, attribuidas á organisação militar, prussiana, mandou vir d'aquelle paiz o conde de Lippe para dar ao nosso exercito uma organisação identica á do exercito prussiano.
Esse exercito teve as suas provas praticas-nos campos de batalha, e demonstrou quanto a sua organisação se coadunava como nosso estado social e com as necessidades de ofensivas do paiz. (Apoiados.)
Infelizmente essa organisação desappareceu em 1833 e hoje o paiz resente-se profundamente de um tal erro e de uma falta tão injustificavel. (Apoiados.)
A organisação, que ainda hoje a Prussia conserva, modificada e melhorada, vimol-a nós destruir n'um impeto revolucionario sem escrupulos nem pesar. (Apoiados.) E a Prussia e a Suissa, que são as duas nações classicas do serviço militar obrigatorio, conservaram e melhoraram as instituições que melhor se combinavam com a exiguidade da sua população, com a escassez dos seus recursos e com as necessidades politicas que se lhe impunham pela vizinhança de grandes potencias. (Apoiados.)
Foi com esta organisação que a Prussia, no tempo do grande Frederico, conseguiu, só e isolada da Allemanha, luctar contra as grandes potencias n'uma guerra de sete annos, e acrescentai ao seu territorio a provincia da Silesia. (Apoiados.)
Nós assistimos indifferentes á destruição d'essa bella organisação, e hoje, se o governo e o parlamento estão resolvidos a tratar com seriedade e com verdadeiro empenho do desenvolvimento e aperfeiçoamento das nossas instituições militares, temos, ao contrario dos outros povos, de recuar um seculo para progredirmos. (Apoiados.)
Com bons quadros e uma educação regular e periodica, as milicias; ou, por outra, a landhwers, que assim não soará tão mal, seriam de uma grande vantagem para o desenvolvimento do espirito militar e sobretudo porque permittiriam augmentar consideravelmente as nossas forças defensivas sem grande gravame para o thesouro. (Apoiados.)
E a questão do dinheiro é uma questão importante, importantissima. (Apoiados.) Podem decretar a melhor organisação que encontrarem estabelecer a serio e com rigor o serviço pessoal e obrigatorio, e tudo isso nada valerá se ao paiz faltarem recursos para custear as despezas d'essa organisação. (Apoiados.)
Foi por isso que o illustre ministro da guerra, e grande estadista Fontes Pereira de Mello, fez reviver as remissões a dinheiro para crear a receita indispensavel para realisar a sua reforma.
Andou bem? Procedeu mal? Para o julgar e absolver bastam as necessidades, imperiosas que emergiam da sua reforma. (Apoiados.)
O actual ministro, impulsionado pelos mesmos motivos, extingue as remissões e cria a taxa militar em condições que a tornam mais anthipatica e injusta que as remissões. (Apoiados.)
A remissão era o preço pelo qual um mancebo qualquer se furtava ao serviço militar.
A taxa militar é o encargo imposto não só áquelles a quem a lei isenta do serviço, como aos que não prestaram o serviço, hão por favor da lei, mas por mercê da sorte. (Apoiados.)
De modo que todo o individuo que apresente uma carta de formatura fica livre do serviço das armas, mediante uma annuidade de 2$500 réis.
Aquelle a quem o estado não quiz ou não pôde dar a instrucção militar conveniente, paga do mesmo modo e, sem attenção pelos seus recursos, a annuidade de 2$500 réis. (Apoiados.)
Isto é barbaro e injusto. (Apoiados.)
N'estas condições, não me pejo em affirmar que prefiro as remissões á taxa militar. (Apoiados.)
Na primeira hypothese representam uma compensação dada ao estado por um favor concedido pela lei. (Apoiados.)
Na segunda, não existe a compensação pelo favor recebido e dá-se á injustiça flagrantissima de tributar com igual taxado rico e o pobre e de tributar aquelle que não mereceu os favores da lei, mas a quem a falta de recursos do thesouro não permittiu que fosse chamado as fileiras. (Apoiados.)
Bem dizia eu que com este projecto, que ha de ser lei, folga o burguez e geme o proletario. (Apoiados.)
O burguez não presta o serviço militarão paga por anno a ruinosa quantia de 2$500 réis. (Apoiados.) O proletario presta o serviço quando o chamam e, quando não precisam d'elle, paga a mesma quota do millionario! Isto não póde ser e tal monstruosidade deve desapparecer do projecto. (Muitos apoiados.)
Para o burguez ha as isenções e os adiamentos; para o proletario o serviço ou a emigração e a taxa militar. (Apoiados.)

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Os adiamentos são tambem uma das bellezas do projecto; estes são uma nova categoria de isenções encapotadas. (Apoiados.)
Espero que nenhum dos adiados, não querendo desgostar os administradores, do concelho, terá o incommodo e soffrerá o vexame de entrar nas fileiras do exercito. (Apoiados.)
O que de certo lhes não perdoarão, são os 2$500 réis.
A taxa ou será proporcional, ou não dará o resultado que d'ella esperam. (Apoiados.)
Quando uma contribuição é injusta e superior aos recursos do contribuinte, o resultado é facil de prever; não se paga. (Apoiados.)
As rasões do projecto, para defender a taxa uniforme, são do tal ordem que, tratando-se de um projecto militar, podem-se qualificar de cabo de esquadra. (Riso.)
O sr. ministro do reino diz que a taxa proporcional iria aggravar os defeitos das matrizes; mas o sr. Marianno de Carvalho declara no seu relatorio que a revisão das matrizes está quasi prompta e que as imperfeições que n'ellas se davam, desappareceram inteiramente.
Qual dos dois tem rasão? O sr. José Luciano ou o sr. Marianno?
E é em rasões d'esta ordem que se funda uma contribuição injusta e immoral! (Apoiados.)
Sobre este ponto a minha opinião é que se a burguezia poupa o sangue e os sacrificios, liberalise ao menos o dinheiro que se tem de applicar no desenvolvimento das nossas instituições militares. (Apoiados.)
N'esta ordem de idéas, desejaria que houvesse uma taxa fixa em harmonia com os favores concedidos pela lei e uma taxa proporcional aos haveres do cada um. (Apoiados.)
Este é o systema adoptado na Suissa e a taxa proporcional encontra-se em todos os paizes onde existe este genero de imposto. (Apoiados.)
Só o sr. presidente do conselho, para ser original, estabelece a taxa uniforme, como meio tambem de ser coherente com as incoherendas do seu partido. (Apoiados.)
Na verdade, nada mais democratico, nada mais equitativo do que sujeitar ao mesmo grau do imposto os pobres e os ricos! (Riso.)
É assim que às avessas, se vae cumprindo e realisando o bello programma da Granja, para gloria do partido e desengano do paiz. (Apoiados.)
Sr. presidente, estranho tambem que nem o governo nem a commissão. estabelecessem a reducção do serviço para a infanteria, como meio de proteger a agricultura, som diminuir em nada o valor d'aquella arma de guerra. (Apoiados.)
Em todas as nações da Europa, se exceptuarmos a França, a duração do serviço na infanteria é menor do que nas outras armas. (Apoiados.)
Na Allemanha a duração é de dois annos, na Italia e na Hespanha uma grande parte do contingente passa no fim do dois annos para a reserva.
Só nós, a quem isto conviria, rejeitámos uma medida perfeitamente em harmonia com os nossos recursos e com a necessidade de educarmos militarmente o maior numero de homens. (Apoiados.)
Sem duvida que esta medida trazia a necessidade de manter nas fileiras o numero de homens precisos para que a educação se fizesse sem interrupção e em toda a sua extensão; como seria necessario igualmente organisar os quadros dos officiaes inferiores com um pessoal escolhido, bem instruido, e bem disciplinado. (Apoiados.)
Esta medida traria comsigo a necessidade de crear carreiras de tiro em todos os concelhos do paiz; e eu creio bem que, se este principio da diminuição do serviço, para a infanteria fosse consignado no projecto, as camaras municipaes e as juntas geraes concorreriam de boamente para o estabelecimento d'essas carreiras, que não só serviriam para fazer desapparecer a repugnancia pelo serviço militar, como contribuiriam muito e muito para o derramamento da educação militar. (Apoiados.)
Mas a final o projecto ainda concede mais do que eu peço.
Senão vejamos: se é permittido a qualquer mancebo assentar praça em qualquer arma, como voluntario, desde os dezesete aos vinte annos, logo que saiba ler e escrever, acontece que desde que a instrucção primaria esteja ao alcance de todos, nas fileiras do exercito só se encontrarão voluntarios e, n'este caso, a duração do serviço em todas as armas será desde seis mezes até anno e meio o maximo. (Apoiados.)
Talvez que a commissão não pensasse n'este resultado, mas nem por isso deixa de ser verdadeiro. (Apoiados.)
Emfim é necessario que o soldado, depois de educado, abandone as fileiras; é necessario que o exercito seja a escola onde se instruam todos os cidadãos (Apoiados); é necessario que o não distráiham da sua funcção patriotica em procissões, em destacamentos e em serviços puramente policiaes (Apoiados.); é necessario que elle não tenha outro destino senão apromptar no menor espaço de tempo e com o maior numero possivel de cidadãos. (Apoiados.)
Só assim poderemos conseguir a realisação da educação militar do paiz, porque, pelo systema actual, não póde ser. (Apoiados.)
E este estado de apathia é grave e perigoso e póde ser bem funesto para nós. Apoiados.
Se estivessem bem presentes ao nosso espirito as ameaças contidas n'um livro celebre, escripto por Lopes Domingues, talvez tivessemos mais pressa e mostrassemos maior cuidado em preparar rapidamente a nossa educação militar, (Apoiados.)
Desde 1870 que todas as nações grandes ou pequenas transformam e modificam as suas instituições militares. N'este sentido grandes progressos se têem realisado. Nós, porém, que teimâmos em não reformar radicalmente as nossas instituições, pondo-as em harmonia com os nossos recursos e com as nossas antigas tradições, temos encontrado graves embaraços para realisar o pouco que se tem feito n'estes ultimos vinte annos. Apoiados.
E n'este caminhar, e attendendo á rapidez vertiginosa com que os instrumentos- de guerra se alteram e modificam, de receiar é que fiquemos cansados no caminho, sem nunca attingir a meta a que visámos. (Apoiados.)
Em conclusão, sr. presidente, a diminuição do serviço é, em meu entender, um grande serviço ao paiz e um grande passo para a generalisação da educação militar.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
(O orador foi cumprimentado.)
Foi lida na mesa a seguinte

Moção de ordem

A camara, affirmando que o projecto em discussão não realisa o principio de serviço militar pessoal e obrigatorio e a reducção do serviço, como unico meio, nas circumstancias financeiras do paiz, de promover a educarão militar da sociedade portugueza, continua na ordem do dia. = Teixeira de Vasconcellos.
Foi admittida.

O sr. Alfredo Brandão: - Sr. presidente, quando pedi a palavra sobre a ordem, era meu proposito limitar-me a ler e a justificar em poucas palavras as emendas que julgo convenientes para maior clareza do projecto em discussão, respeitando o seu pensamento fundamental, sem entrar na apreciação da conveniencia ou inconveniencia das instituições militares no nosso paiz, nem comparar o exercito com as outras classes que constituem a sociedade portugueza.
Acceitaria os factos como elles são, conformar-me-ía com elles, e procuraria sómente regulal-os com clareza, indicando as alterações que me pareciam necessarias para a boa or-

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ganisação do recrutamento militar, sem outro intuito que não fosse o de contribuir com o modesto peculio do meu trabalho para que as leis sejam, como devem ser claras, praticas, e accommodadas aos nossos recursos e estado de civilisação.
E não mudaria de propósito se a alteração dos usos parlamentares não podesse ser considerada como um acto de menos cortezia para com o meu illustre collega o sr. Teixeira de Vasconcellos, que me precedeu no uso da palavra, e por quem tenho muita consideração.
Sujeitar-me hei por isso aos usos d'esta casa do parlamento, diligenciando ser breve nas considerações que me occorrerem em resposta ao meu collega, e proseguindo depois na justificação das emendas que mando para a mesa ou antes ha exposição das rasões que me levaram a redigir estas emendas ao projecto em discussão.
S. exa. depois de larguissimas e eruditas considerações sobre a situação militar do nosso paiz e das nações estrangeiras, ponderou, e pretendeu mostrar: que o serviço militar, pessoal e obrigatorio, como o estabeleceu o projecto em discussão, era perfeitamente illusorio e inutil, em virtude das isenções, adiamentos e dispensas, que auctorisa e facilita, e que se não compadecem com a natureza e indole do serviço militar pessoal e obrigatorio: combateu o voluntariado creado pelo projecto, considerando-o privilegiado e aristocratico, e por isso prejudicial á boa organisação e disciplina do exercito, como fôra reconhecido com o voluntariado em França: attribuiu ao projecta o pensamento sinistro de reivindicar para os administradores dos concelhos a sua anterior influencia e preponderancia politica: combateu a troca dos numeros, como uma injustiça: advogou e defendeu as remissões a dinheiro para os mancebos que se pretenderem aproveitar dos adiamentos auctorisados no projecto: impugnou a taxa fixa: aconselhou o derramamento da educação militar: defendeu a reducção do tempo no serviço effectivo: manifestou desejos de que o nosso exercito não fosse distrahido para cirios, paradas e enterros: recordou as ameaças ou esperanças de Lopes Domingues: lembrou a conveniencia de termos milicias para complemento da nossa organisação militar: e censurou a commissão de recrutamento por não ter ouvido as commissões de guerra e da marinha sobre o projecto.
(Interrupção do sr. Teixeira de Vasconcellos.)
A idéa do s. exa. foi então defender as remissões em geral, aconselhando-as e recommendando-as para os mancebos a quem o projecto permitte adiar o seu alistamento.
Está bem.
A simples enunciação das idéas que s. exa. procurou defender mostra bem quanto é difficil e embaraçosa a minha posição.
Farei porém o que podér, pedindo desculpa a v. exa. e á camara, se por esquecimento deixar de me referir a algum dos factos ou theses que o meu illustre collega procurou sustentar e defender, esquecimento naturalissimo em quem tira apontamentos á pressa, e tem de fallar em seguida ao, orador, a quem vae responder, e muito principalmente em mim, que nem tenho o habito das lides parlamentares, nem um peculio de conhecimentos tão variado, que possa de prompto apreciar assumptos que os meus illustres collegas estudam em casa e muito de seu vagar.
E o meio mais apropriado para mo desobrigar deste encargo, sem roubar muito tempo, á camara, de cuja benevolencia não quero, abusar, é recorrer ao projecto, sempre que nas suas disposições encontre elementos para mostrar ao meu collega, que as suas observações, ou não são justificadas, ou são exageradas.
S. exa. certamente mal impressionado com as disposições do capitulo IV do projecto em discussão, foi, a meu ver, injusto nas suas apreciações, quando considerou illusorio o serviço militar pessoal e obrigatório, estabelecido n'este projecto, parecendo-lhe mesmo que ficávamos sem exercito, e muito peior do que estavamos.
A mim afigura-se exactamente o contrario.
Afigura-se-me que o projecto nos dá exercito de mais, obrigando as outras classes sociaes ao sacrificio de se enfraquecerem e debilitarem para crearem e alimentarem uma instituição desnecessária, absorvente, e cara, com manifesto prejuizo para a agricultura, para o commercio, para a industria, para as sciencias, e para as artes, ás quaes rouba os seus mais vigorosos elementos de vida, na epocha mais propria para o trabalho, inutilisando-os e obrigando-nos ainda a pagar o preço da inutilisação.
Eu, sr. presidente, não desejava entrar n'estas considerações, nem vejo utilidade alguma em o fazer.
As cousas são o que são, e poucas vezes são o que devem ser.
E considerando o exercito como uma instituição social, inherente aos nossos habitos de espectaculosa e ridicula grandeza, transigia com estes habitos, como transijo com muitas outras despezas de luxo, que a nossa vaidade, a falsa comprehensão da nossa precária situação financeira, e a falsissima orientação dos nossos processos de governo, alimentam e impõem.
Convencido de que os não posso evitar, procuro concorrer para que sejam menos penosos.
E era esto b meu fim, quando estudei o projecto em discussão e redigi as emendas, que mando para a mesa.
Mas desde que as praxes de discussão parlamentar me obrigam a apreciar idéas alheias, forçoso é emittir as minhas, para, conscienciosamente e com o desassombro de que uso, me desobrigar d'aquelle encargo.
Eu considero muito bonitas e de magnifico effeito as phrases sonoras e patrióticas, e os retumbantes epithetos, de que geralmente nos servimos, quando nos referimos ao nosso brioso exercito, e o considerâmos representante e herdeiro das tradições gloriosas dos nossos antepassados.
E realmente é motivo de justificado orgulho a recordação destas tradições, a que andam ligadas a nossa independencia, as nossas conquistas d'alem mar, e os valiosissimos serviços prestados á civilisação- e á humanidade pelas armas e varões assignalados, que por mares nunca dantes navegados passaram ainda alem da Taprobana.
Mas a nossa independencia está garantida, e por outros processos, as nossas conquistas assoberbam-nos pela impossibilidade de as aproveitarmos, e os serviços que prestámos foi-se o mundo civilisado apropriando d'elles, e por fórma que nem já parecem nossos.
Por isso o nosso exercito que é, como dantes, brioso e valente, representa symbolicamente as nossas tradições gloriosas, como herdeiro dos heroes a quem tanto devemos, mas não é, porque não póde ser, successor e continuador dos assombrosos emprehendimentos que originaram aquellas tradições.
Os tempos são outros, e em não ponderarmos bem esta verdade, que todos reconhecem, está a divergencia entre as minhas idéas e as que, aliás muito eruditamente, expenderam os illustres oradores que teem tomado parte n'este debate, proclamando unisonos as vantagens de uma instituição que teve o seu préstimo e prestou os seus serviços em epochas que já lá vão, e que não voltam.
Acho natural que desejemos ser heroes por herança e representação, e que prestemos respeitosa homenagem ás nossas tradições gloriosas, perpetuando no nosso espirito, o desejo de sermos para os nossos descendentes o que para nós foram os nossos antepassados.
Mas, sr. presidente, o que nós precisámos tambem é conhecer o terreno que pisâmos, o meio em que vivemos, e os recursos de que dispomos.
As tradições, que tão desafogadamente invocâmos, são originadas pelo tributo que pagámos á civilisação nas differentes phases da nossa existencia nacional, e este tributo, accentuando sempre, como feição caracteristica e predominante, a valentia, o brio, a independencia, o genio aventuroso e emprehendedor, tanto como a docilidade e a cordu-

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ra, temol-o pago; como guerreiros, como argonautas, como conquistadores, e tambem como cidadãos pacificos e ordeiros, que comprehendem os progressos da civilisação, e sabem identificar-se facilmente com elles.
A epocha das guerras, das navegações, e das conquistas passou para nós.
E passou porque hoje tudo se substitue pelo numero, e tudo se consegue pelo dinheiro.
E nós somos poucos e pobres?
Se nos convencessemos d'estas verdades, e tivessemos na paz de que gosâmos o patriotismo é bom senso dos nossos antepassados, certamente, em logar de nos embalarmos com as tradições dos seus heroicos emprehendimentos, nas epochas em que esses emprehendimentos eram conformes com a organisação autonomica das nações da Europa, com a sua civilisação e com os recursos de que então se dispunha, procurariamos novos emprehendimentos accommodados á nossa situação actual e em attenção ás nossas actuaes circumstancias:
Mas não procedemos assim.
Já que não somos, nem podemos ser o que fomos, queremos representar que o somos, aproveitando para a nossa representação a parte mais espectaculosa e mais cara dos originaes que imitâmos.
Comprehende-se isto como representantes do passado para vivermos á grande no presente, sem os sacrificios de então; mas mal se póde comprehender como representantes do povo, que paga e custeia similhante representação.
Presentemente o militarismo é uma necessidade para as nações poderosas evitarem a guerra.
D'isso depende o seu predominio e a conservação da sua autonomia, sempre invejada pelos estranhos e minada pelas dissidencias internas.
É o castigo do serem absorventes e grandes. Mas para as nações pequenas o militarismo é um objecto de luxo carissimo e esteralisador.
Absorve e inutilisa as forças vivas do paiz, obrigando as outras classes sociaes a alimentarem-lhe a inutilidade, e a pagarem-lhe o prejuizo que causa.
É desnecessário no tempo de paz para a manutenção da ordem publica, que salvaguardâmos pacata e desapercebidamente com o Africa e com o India.
É irrisorio para o tempo de guerra, quando as guerras se fazem com massas innumeraveis de guerreiros, com utensilios de guerra aperfeiçoadissimos, e com tiros de peça que custam, cada um, 300$000 réis.
É sempre carissimo, porque nos custa mais de réis 6.000:000$000 por anno, desequilibra as nossas finanças, e absorve o melhor dos nossos recursos.
É desnecessario para á manutenção, da nossa autonomia e conservação do nosso territorio, que sómente devemos a nossa posição geographica e a conveniencia e ao proprio egoismo das nações poderosas do mundo que precisara ter no seu giro internacional um porto aberto e seguro, e a quem não convem para o equilibrio europeu, como ellas o desejam e entendem, que se constitua mais uma nação poderosa, excepcionalmente defendida pela natureza por terra e por mar.
Por isso as nossas pendencias resolvem-se, á vontade das nações predominantes, com protocolos, com livros brancos, e com cartas amaveis, em que, fazendo sempre o que querem, nos dão a honra de nos tratarem apparentemente de iguaes para iguaes.
E com isso nos contentâmos, e com isso nos pretendemos illudir, e com isso imaginâmos que nos consideram muito, e nos conhecem mal.
Por isso dissemos que o projecto em discussão nos dava exercito de mais, militarisando sem proveito e sem necessidade uma nação que precisa, para a organisação das suas finanças, e para a sua prosperidade, do trabalho, da abnegação, e do juizo de todos os seus cidadãos.
Por isso consideramos este projecto uma rede varredoura, que só isenpta do serviço militar os anões, os rachiticos, os cegos, os aleijados, os surdos-mudos, os atacados de molestias incuraveis e os moribundos.
Todos os que têem algum prestimo ficam obrigados ao serviço militar efectivo, que podem adiar, ou de que podem ser dispensados temporariamente, alem de outras formalidades, mediante attestados de tres chefes de familia, que tenham algum filho no serviço activo ou recenseado e sujeito a ser chamado a este serviço, com intervenção do administrador do concelho, da camara municipal, da commissão do recenseamento, e do tribunal administrativo, na proporção de 15 por cento dos mancebos aptos para o serviço militar em cada districto.
E ainda neste caso, e por este complicadissimo processo, ficam sujeitos ao serviço militar effectivo, quando as reservas tiverem de o prestar, e á taxa militar, emquanto o não prestam.
É o que nos diz este projecto nos artigos 39.° e seus §§, no artigo 40.° § 3.º, no artigo 41.° §§ 2.° e 3.°, e nos artigos 42.° e 43.° e seus §§.
Como é, pois, que o meu illustre collega nos pode dizer, que isto é illusorio, que não teremos exercito, e que ficamos peior do que estavamos?
Ficâmos peior do que estavamos, porque temos exercito de mais; ou porque teremos mais exercito do que tinhamos, e porque vamos ser uma nação armada, só por luxo e representação espectaculosa com que pretendemos encobrir a nossa pobreza, a nossa falta de patriotismo e de juizo.
Andâmos a enganar-nos a nós mesmos, sem ao menos termos a vantagem de illudir os estranhos, que nos conhecem, bem, e sabem melhor ainda, como, e quando, se hão de aproveitar da nossa vaidade pueril e da nossa miseria.
Mas a representação só durará emquanto os representados a poderem pagar.
E isto não póde durar muito.
Depois quem vier, que feche a porta.
Aqui tem v. exa o abysmo que nos separa com respeito á primeira proposição que o illustre deputado formulou, e que me vi obrigado a combater, por contraria ás disposições do projecto, e em completa desharmonia com o meu juizo a respeito; das vantagens do militarismo no nosso paiz, juizo que não tencionava manifestar, para não creár animadversões sem proveito nenhum.
E da mesma fórma penso com respeito ao voluntariado estabelecido no projecto e que s. exa. considera privilegiado e aristocrático, recorrendo, ao exemplo da França, para mostrar como o nosso voluntariado será prejudicial á disciplina do exercito.
Eu, sr. presidente, não tenho tempo, nem disposição de espirito para estudar demorada e profundamente o que fazem as nações estrangeiras, e não posso por isso acompanhar o illustre deputado na erudita divagação que fez pelo estrangeiro, tendo a devida cautela de especialisar as nações mais aguerridas e poderosas da Europa, para, com o exemplo d'estas nações, fortalecer os seus elementos de combate contra o projecto em discussão.
E muito terei que me lisongear, se conseguir mostrar, que conheço um pouco o meu paiz e o meio em que vivo.
Mas, no caso presente, dispenso bem o conhecimento da organisação militar das nações poderosas da Europa, que tão familiar é ao meu illustre collega.
Basta-me saber, que não estamos a legislar para ellas, e ter uma noticia superficial e vulgar da sua grandeza, da sua prosperidade, e dos seus recursos, para eu concluir, sem medo de errar, que os factos referidos pelo meu erudito collega provam exactamente o contrario do que deseja provar.
É exactamente porque as nações poderosas da Europa se armam até aos dentes, que nós devemos fazer o contrario, do que ellas fazem, mostrando assim, que temos o bom senso de conhecer, que o nosso militarismo, sempre microscopico relativamente, é uma inutilidade em caso de

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guerra, e uma instituição absorvente e esterilisadora em tempo de paz.
O illustre deputado, porque em França o voluntariado foi explorado pelas classes privilegiadas e aristocráticas, conclue logo, que o voluntariado estabelecido nos termos do projecto em discussão era prejudicial á disciplina do exercito.
Ora eu tomo a liberdade de chamar a attenção de s. exa. para os numeros do artigo 74.° e especialmente para o § 3.° do artigo 8.°, que fornece o principal contingente para o voluntariado no nosso futuro exercito, e estou certo de que nenhuma duvida restará de que o nosso voluntariado não póde ser aristocratico, e só será privilegiado para as creanças de quinze a vinte annos, destinadas a musicos ou aprendizes de musico, ferradores ou aprendizes de ferrador, corneteiros, tambores e clarins. (Riso.)
E parece-me que a nossa nobreza ainda não chegou a ponto de ir voluntariamente exercer estes misteres. (Riso.)
Apesar d'isso o meu illustre collega chegou a receiar, que o voluntariado absorvesse por tal forma o exercito, que nem houvesse cabos, nem furrieis, nem sargentos.
Então as classes privilegiadas e aristocráticas nem para isto dariam?
Presentemente a nossa officialidade é muito illustrada para suppormos a hypothese, que n'outros tempos aconselhava a necessidade de os sargentos saberem ler e escrever para o caso de os capitães não saberem assignar o seu nome.
E tambem então havia heroes, e é de então que datam as nossas tradições gloriosas.
Não receie, pois, s. exa., que o voluntariado do projecto seja privilegiado e aristocratico, e que faltem cabos, furrieis e sargentos.
Desde que vamos ser uma nação armada havemos de ter tudo e para tudo.
No que porém s. exa. me pareceu muito injusto foi em attribuir ao projecto a maldade de pretender reivindicar para os administradores do concelho a sua anterior influencia e preponderancia politica.
Alem da assistencia da auctoridado administrativa aos actos do recrutamento para abonar a identidade dos seus administrados, não encontro no projecto a intervenção destas auctoridades senão para authenticarem e confirmarem os certificados passados pelos chefes de familia nos termos do § 1.° do artigo 42.°
Mas este acto, que nada mais significa do que o reconhecimento official dos factos certificados pelos chefes de familia, nem dispensa a apreciação das provas pela camara municipal, nem a informação da commissão do recenseamento, nem a deliberação do tribunal administrativo, a quem compete decidir a final, se as petições de adiamento ou dispensa devem ser attendidas.
Como é, pois, que o administrador do concelho reivindica a antiga influencia e preponderancia que tinha, e que explorava com o recrutamento militar?
Parece-me exactamente o contrario.
O projecto poderá dar muita importancia aos chefes de familia, ás camaras, ás commissões do recenseamento, e aos tribunaes administrativos, mas não dá certamente aos administradores do concelho, que ficam fazendo um papel muito secundário e insignificante.
Tambem não comprehendo bem como é- que a troca de numeros, permittida no artigo 85.° do projecto, seja mal vista pelo meu illustre collega, tanto mais defendendo s. exa. as remissões a dinheiro para os mancebos que pretenderem aproveitar-se dos adiamentos.
Com a troca de numeros entre recrutas proclamados, como a permitte o projecto, nenhum prejuizo soffre o exercito, que fica sempre bem servido, o que não succederia com as remissões a dinheiro, que dão dinheiro, e não dão soldados.
E para que havemos do permittir mais este recurso á algibeira dos contribuintes?
Já que temos de ser uma nação armada, e o serviço militar é uma obrigação de todos, bom é que todos a cumpram, e que todos paguem este tributo ás nossas tradições gloriosas.
Com respeito á taxa fixa, que s. exa. desejaria que fosse proporcional aos haveres dos mancebos obrigados ao serviço militar, permitta-me s. exa., que eu me reserve para dizer o que penso a este respeito, quando justiçar as minhas emendas ao projecto.
O derramamento da educação militar, que s. exa. aconselha e recommenda, fica subordinado ás minhas considerações geraes sobre militarismo em Portugal, e não nos parece muito conforme com a reducção do tempo de serviço effectivo, que s. exa. aconselhou tambem, nem mesmo com a repugnancia ao voluntariado, em que se permitte esta reducção.
Já não digo o mesmo com respeito á organisação das milicias.
Esta instituição que é tão nacional, e que tão saudosas recordações deixou aos implantadores do governo constitucional no nosso paiz, é muito conforme com as nossas propensões para a guerra, bem demonstradas n'esta discussão, e até com as ameaças ou esperanças de Lopes Domingues, a que o illustre deputado alludiu para justificar a necessidade do nosso militarismo, e estimular os nossos brios patrioticos.
Assim fica obra acabada. Ficámos com o militarismo em triplicado.
Temos o nosso brioso exercito de mar e terra, de que tratâmos ao presente; temos o famigerado exercito alfandegueiro, e teremos depois as milicias, não contando com a policia secreta e publica, com os cabos de segurança, com os guardas ruraes, etc.
Poderemos então dormir descansados e sem receio de que se realisem as profecias de Lopes Domingues, apesar da má vizinhança e da facilidade de uma invasão pela nossa raia secca e aberta em toda a extensão do nosso paiz, de norte a sul, e mesmo de que se repitam os casos da Charles et Georges.
A questão é saber quem ha de pagar tudo isto.
Também não posso acompanhar s. exa. nas censuras que faz á illustre commissão do recenseamento, por não submetter o projecto á apreciação das não menos illustres commissões de guerra e da marinha.
Eu comprehendia muito bem que todas as commissões parlamentares fossem ouvidas sobre este assumpto, que affecta todas as classes da sociedade portugueza, e prejudica os seus interesses e regalias, menos as commissões do guerra e de marinha, para quem todas contribuem, e para quem todos trabalhâmos.
E não me parece justo que a guerra e a marinha com quem temos sido benevolentes, e que não podem queixar-se de que tenhamos sido escassos n'esta sessão, desejassem apreciar os beneficios que lhe fazemos, e impor-nos condições a esses beneficios.
É uma prova de desconfiança que não merecemos.
Esta sessão tem tido innegavelmente uma feição toda militar na parte que diz respeito á applicação das receitas, e estou certo de que, se fizermos um balanço entre a receita creada para matar o deficit, e a despeza applicada á nossa organisação militar, o saldo é todo a favor do exercito de mar e terra, e o deficit continua como dantes. (Apoiados.)
E isto não obstante o sr. ministro da fazenda trabalhar como um mouro para desmentir os seus adversários, valiosos instrumentos do equilibrio das nossas finanças. (Riso.)
Está averiguado, e para isso basta ler o projecto em discussão, que nós estamos dispostos a transformar o nosso pacifico e inofensivo Portugal n'uma praça de armas, e

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n'uma nação armada, prestando-nos todos voluntaria e involuntariamente a saber manejar as armas para mantermos as nossas tradições gloriosas.
Ora as illustres commissões de guerra e de marinha, que são na sua maior parte ou quasi na sua totalidade compostas de briosos e illustrados officiaes do exercito e da armada, nada mais podiam exigir para a materia prima d'estas instituições do que a universalidade dos cidadãos portuguezes. (Riso.)
Era por isso uma desnecessidade a apreciação que desejavamos fazer, e é consequentemente uma injustiça, a falta de que se queixam.
E a este respeito não posso deixar de fazer dois pequenos reparos.
O facto de nós, que não pertencemos ao exercito estarmos a discutir assumptos militares mostra bem que o exercito não é prejudicado com o projecto em discussão, e que, bem pelo contrario, são as outras classes sociaes que se julgam obrigadas a vir pleitear as suas regalias, que o projecto affecta.
Se assim não fosse, certamente os illustres militares, que fazem parte d'esta camara e das commissões de guerra e do ultramar, levantariam as suas queixas e propugnariam pelas suas garantias.
Mas a verdade é que o projecto em discussão, bem como uma grande parte dos projectos submettidos ao parlamento nesta sessão, traduzem claramente as nossas homenagens e respeitos pelo exercito e pela marinha, o que deve desvanecer a apprehehsão do meu illustre collega com respeito á censura que dirigiu á commissão do recrutamento.
O que, porém, mais me impressionou foi a proposta de um illustre membro d'esta camara, aliás distinctissimo militar, em que pedia hontem o adiamento d'este projecto.
Ora, realmente, tendo-se votado nesta sessão o augmento dos soldos aos officiaes de mar e terra, a classificação das praças de guerra, a creação e organisação das escolas de cavallaria e artilheria, e differentes outros projectos militares de menor importancia, é para impressionar que se pretenda adiar a discussão e votação de um projecto de lei que é, por assim dizer, a base sobre que recáe a applicação destas providencias legislativas.
E isto porque eu não comprehendo bem, ou comprehendo de mais, que as necessidades do exercito se limitem ao augmento de soldo aos officiaes e á existencia de praças de guerra e das escolas militares, sem soldados para aprenderem, para serem commandados e para guarnecerem essas praças. (Riso.)
Este meu reparo é tanto mais para ser apreciado quando é certo, que as escolas militares já existentes são um verdadeiro alfobre de officiaes, que annualmente se espalham pelos differentes corpos do exercito, e em tal quantidade, que tem havido regimentos em que os soldados pouco mais são do que os officiaes.
Por outro lado o adiamento tem uma certa rasão de ser, porque a final de contas o que nos convém e o que todos queremos é paz.
É bom, para o que der e vier, termos um luzido estado maior, uma oficialidade valente, illustrada e aguerrida, e tudo devidamente equipado e remunerado, mas, como todos desejámos a paz, prescindimos bem dos soldados.
E o bom senso do nosso povo, manifestado na repugnancia ao serviço militar, denuncia claramente a grande verdade, de que é preferível e mais util á patria trabalhar com a enchada, com o martello, com os livros, na agricultura, nas officinas, nas artes, no commercio, na industria e nas sciencias, do que andar de armas ao hombro a fazer sentinella, na quadra da vida em que melhor e mais proveitosamente se póde trabalhar.
Eu peço desculpa d'estes reparos e do desafogo com que os apresento á camara.
É este o meu feitio.
Mas todos me farão a justiça de acreditar, que me limito a dizer o que sinto e o que entendo, como costumo, respeitando as opiniões alheias, sem a menor intenção do melindrar ninguem. (Apoiadas.)
O meu illustre collega manifestou tambem o desejo de que o nosso exercito não seja distrahido para círios, paradas e enterros.
E ainda n'esta parte não posso concordar com s. exa. Sem estas distracções o nosso exercito não tinha occasião de fazer boa figura, e ficava privado de uma das suas applicações mais sympathicas. (Riso.)
Tudo vae bem emquanto houver quem pague. No fim quem vier que feche a porta.
N'outros tempos as nacionalidades pequenas desappareciam pela guerra. Hoje não se lhe dá essa importância, nem é preciso tanto incommodo. Esperam, que se rendam pela fome, que succede á demasiada fartura.
Mas, como vamos acabar com o deficit, não corremos esse perigo. Salvo se o equilíbrio das nossas finanças der em resultado o esgotarem-se os recursos do povo, ou, se estes recursos forem convertidos em papel sem valor.
E esta hypothese. está longe de se dar, se attendermos á prosperidade officialmente apregoada do nosso paiz.
Parece-me, sr. presidente, que cumpri as prescripções do regimento, respondendo como pude ao meu illustre collega, que me precedeu no uso da palavra, e peço desculpa a v. exa. e á camara, se o não fiz com a proficiencia costumada n'esta casa.
Agora é tempo de dizer o que me suggeriu a leitura attenta do projecto, indicando e justificando muito succintamente as emendas que mando para a mesa, e que vou ler.
Ao artigo 3.° proponho a seguinte substituição: «É o governo auctorisado a fazer as necessarias alterações nas circumscripções militares, a cada uma das quaes corresponderá uma unidade do exercito activo e um dos districtos do recrutamento em que o paiz será dividido, tendo em attenção as exigencias da segurança publica e a densidade da população.»
Pareceu-me mais conforme com o pensamento do projecto adoptar a mesma base, tanto para as circumscripções militares como para os districtos de recrutamento.
Quanto ao n.° 3.° do § 2.° do artigo 5.°, como este artigo se refere a actos futuros, e às remissões e substituições permittidas nos artigos 86.° e 105.°, fica mais claro se se substituirem as palavras «remiram e fizeram» por «remirem e fizerem», e se se addicionarem a este numero as seguintes palavras: «nos termos dos artigos 86.° e 105.° d'esta lei».
No beneficio do § 5.° do artigo 8.°, proponho que sejam tambem comprehendidos os mancebos designados no § 4.° d'este artigo e no n.° 3.° do artigo 12.°
O § 4.° deste artigo permitte o alistamento dos menores de vinte annos e maiores de quinze no serviço naval pelo espaço de oito annos, permissão que é concedida no § 3.° do mesmo artigo aos mancebos que se alistarem no exercito.
Tanto uns como os outros, ficam sómente sujeitos ao serviço da primeira reserva por virtude do disposto no § 6.° do artigo.
E como na armada não ha segunda reserva, nenhum beneficio ficam recebendo os mancebos, que se alistarem no serviço naval, emquanto que os mancebos que nas mesmas condições se alistarem no exercito ficam dispensados da segunda reserva.
Para remediar esta desigualdade em prejuizo do serviço mais penoso, proponho para o serviço naval nos termos do § 4.° o beneficio do § 5.°, concedido ás praças de pret que receberem instrucção em estabelecimentos do estado.
E igual beneficio proponho para as praças mencionadas no n.° 3.° do artigo 12.°, que, tendo completado o tempo legal do serviço effectivo, não poderem ser licenceadas por

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se acharem doentes nos hospitaes ou em goso de licença da junta de saude.
Não me parece justo, que as praças que perderam a saude no serviço do exercito ou da armada se não conte para a reserva o tempo em que estiverem doentes, depois de completarem o tempo legal de serviço effectivo.
No § 6.° do artigo 8.° proponho a eliminação das palavras «e 4.°» pelas rasões adduzidas com respeito ao § 5.° d'este artigo.
Aos artigos 13.° e 20.° proponho as seguintes substituições, no artigo 13.° a palavra «ali» por n'ella e no artigo 20.° as palavras «communical-o» por «communicar este facto».
Parece-me que ficara assim a redacção mais clara.
No artigo 28.° proponho a substituição da palavra «logo» por «durante o mez de março».
Este praso é conforme com a doutrina do artigo 26.º E eu não gosto de ver nas nossas leis a palavra «logo» que é parecida com o adverbio, «immediatamente», e que na nossa jurisprudencia forense e parlamentar tem uma elasticidade extraordinaria.
É muito melhor dizer as cousas bem, precisa e terminantemente para evitar mas interpretações e abusos accomodaticios, embora justificaveis. (Apoiados.)
Proponho tambem a substituição do artigo 36.° pelo artigo 34.° do projecto do governo.
A apreciação da authenticidade e do valor dos documentos, que acompanharem as reclamações não pode ser attribuição das commissões de recenseamento, sem que o tribunal administrativo fique apenas uma chancella d'estas commissões, ou sem que as suas decisões possam occasionar uma diversidade de apreciações pouco edificante.
Quanto ao § 2.° do artigo 40.° entendo que a palavra «Funchal» se deve addicionar o seguinte «e de disciplinas ecclesiasticas nos seminarios diocesanos».
Não ha rasão nenhuma para recusar as prorogações aos alumnos dos cursos ecclesiasticos, quando as tres prorogações permittidas no § 1.° d'este artigo não cheguem para completar estes cursos. Esta recusa poderia em muitos casos inutilisar os effeitos do adiamento, depois de muito dispendio e sacrificios.
E nem mesmo me parece justo estar a subordinar os estudos de um curso superior a uma disposição disciplinar da lei, e em manifesta opposição com o pensamento da mesma lei.
No numero 10.º do artigo 41.° proponho que se eliminem as palavras «os clerigos de ordens sacras» que devem ficar excluidos do serviço militar, e consequentemente das reservas, tanto pela natureza especial da sua missão, como tambem pela incompatibilidade deste serviço com o estado ecclesiastico, estabelecida nas leis canonicas, onde o mister da guerra é considerado como uma irregularidade. E desde que a religião catholica é a religião do estado, forçoso é harmonisar as leis civis com as leis canonicas, por forma que entre umas e outras não haja contradicções e desaccordos, que auctorisem justificadas reclamações e conflictos.
Proponho tambem a eliminação do § 3.° do artigo 41.°
Se as dispensas são permittidas, como não podem deixar de ser, por motivos superiores de interesse publico, e certamente no intuito de nos sacrificar os sagrados deveres da familia, e as vantagens adquiridas penosamente pelo trabalho e pelo estudo ao serviço militar, nenhuma rasão ha para subordinar estes principios a um numero fixo de dispensas, auctorisando o arbitrio das preferencias em classes todas dignas e merecedoras do beneficio que a lei lhes concede.
A doutrina d'este paragrapho, alem de arbitraria e cega, parece-me muito propria para explorar a apregoada brandura dos nossos costumes nem sempre muito moraes.
Aos §§ 1.° e 2.° do artigo 42.° proponho as seguintes alterações:
Que se eliminem no § 1.° as palavras «ou recenseado no mesmo anno e sujeito a ser chamado a este serviço.»
Que se addicione a este paragrapho o seguinte periodo: «São dispensados d'estes certificados os mancebos a que se referem os n.°s 2.° e 3.° do artigo 40.° e os n.ºs 9.° e 10.° do artigo 41.°»
Que se addicionem ao § 2.° as seguintes palavras «a requerimento dos interessados».
Que se acrescente um paragrapho impondo expressamente aos chefes de familia a obrigação de passarem os certificados com o maximo da pena do § unico do artigo 100.°, pelo menos.
Nem me parece justo, nem moral, que os chefes de familia, interessados em que se não concedam as dispensas permittidas pela lei, passem certificados, indispensaveis para a concessão das dispensas ou adiamentos nem me parece sensato exigir-lhes certificados, quando os factos que fundamentam as dispensas ou adiamentos são estranhos a sua apreciação; nem me parece regular deixar ao arbitrio do governador civil o agrupamento das freguezias nos casos do § 2.º; nem muito principalmente, repito, me parece acceitavel o arbitrio concedido, ou pelo menos permittido, aos chefes de familia, de passarem ou deixarem de passar os certificados indispensaveis para a concessão das dispensas ou adiamentos.
Por isso indico nas minhas emendas a estes paragraphos os meios que me pareceram necessarios para remediar os males que a sua doutrina pode occasionar.
Ao artigo 43.° proponho as seguintes alterações:
Que no n.° 1.° sejam comprehendidos só os mancebos a que se refere o n.° 1.° do artigo 39.°, porque não me parece justo, que os inuteis para o serviço militar por motivo de lesões, donde resulte impossibilidade de prestarem este serviço, fiquem sujeitos a taxa militar, visto que, se não prestam o serviço militar, é porque não podem, e basta-lhes o seu infortunio.
Que os n.ºs 4.° e 6.° sejam eliminados, porque os mancebos a que se refere o n.° 4.° nada devem ao estado, e os do n.° 6.º ficam na situação dos inuteis, mencionados no n.° 2.º do artigo 39.°
Para o §.1.° indico as duas seguintes proporções, ambas progressivas.
«Esta taxa terá por base a importancia das contribuições predial, industrial e de renda de casas, paga ao estado pelos mancebos a ellas sujeitos ou por seus pães, na proporção de 1$000 réis para os que pagarem de 2$000 réis a 10$000 réis; de 2$000 réis para os que pagarem de reis 10$000 a 20$000 réis; e de 4$000 réis para os que pagarem de 20$000 réis a 40$000 réis; de 8$000 réis para os que pagarem de 40$000 réis a 80$000 réis; de 16$000 réis para os que pagarem de 80$000 réis a 160$000 réis, observando-se sempre esta progressão crescente.
«Ou então proponho este outro systema de taxas, tendo por base as mesmas contribuições: de 2$500 réis a 10$000 réis, 1$000 réis; de 10$000 réis a 20$000 réis, 2$000 réis; de 20$000 réis a 30$000 réis, 3$000 réis; de 30$000 réis a 40$000 réis, 4$000 réis; e assim successivamente, pagando por cada 10$000 réis ou fracção, 1$000 réis.»
Não é maravilha combater a taxa fixa, estabelecida neste paragrapho, e que o illustre relator do projecto defendeu e sustentou como pôde, mas sempre correctamente, no seu brilhante relatorio.
Mas tambem nos é facil a substituição, nem nos queremos a gloria de propormos as substituições mais conformes com a natureza de qualquer contribuição, e d'esta especialmente.
Indicamos dois systemas, que nos pareceram preferiveis a taxa fixa e para os quaes não podemos encontrar uma formula mais precisa e clara.
Por isso recorremos a indicação de algumas bases e taxas para ser melhor comprehendida a nossa idéa, que submettemos a apreciação da illustrada commissão.

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Procurei um systema de proporcionalidade que satisfizesse ao fim de obter uma certa receita que o projecto tem em vista, e que fosse ao mesmo tempo equitativo.
Esta receita é uma gota de agua no oceano das despezas militares, a que nos não podemos ater.
Vamos aproveitando a occasião de lançar mais uma contribuição, cujo resultado se não pode calcular por falta de estatisticas e esclarecimentos officiaes, e é resto pagal-o-hemos, como temos pago até hoje. (Apoiados.)
Ao presente a grande sciencia das finanças consiste em descobrir materia collectavel.
Feita a descoberta todas as despezas se explicam e justificam.
No entanto as minhas, aspirações são modestas. Acceitando o militarismo como um facto social, com que tenho de me conformar, procuro apenas concorrer com o meu trabalho para que o projecto em discussão fique sendo uma lei clara, exequivel e pratica, sem deixar de ser justa e sabia, como recommenda a constituição do estado. (Apoiados.)
O artigo 44.° e § único proponho que sejam eliminados. É consequencia das emendas que apresentei ao § 1.° do artigo 43.°
Proponho que o § 5.° do artigo 45.° seja precedido das seguintes palavras:«Se os membros da junta de inspecção não residirem na capital do districto».
Esta emenda não tem justificação n'um paiz, onde todos querem ganhar sem trabalhar, ou pelo menos trabalhar pouco e ganhar muito.
Peço desculpa. (Riso.)
Proponho a seguinte redacção para o § 1.° do artigo 54.°: «Quando por motivos graves e imprevistos deixe de se fazer o sorteio no dia designado n'este artigo, será fixado novo dia pelo respectivo governador civil».
Não comprehendo a distincção entre motivos graves, que podem ser imprevistos, e motivos imprevistos, que podem ser graves para a intervenção das duas entidades da mesma natureza.
No § 2.° do artigo 54.° proponho a seguinte substituição: «Ao governo compete decretar a annullação do sorteio por se ter omittido no recenseamento a inscripção de um ou mais membros».
Isto simplesmente para se não poder suppor, que o governo fica auctorisado a decretar a annullação de um acto que se ha de repetir, ou que se, ha de annullar antes de repetido.
Ao artigo 55.° proponho que se fixem as bases e hypotheses em que se faz o sorteio por grupos das freguezias, por fórma que o acaso do sorteio não prejudique ou favoreça qualquer das freguezias aggregadas.
Todos os que lidam com as operações do recrutamento sabem, que não é indifferente o sorteio por grupos de freguezias, d'onde pode resultar beneficio ou prejuizo para alguma ou algumas das freguezias agrupadas por acaso.
Ao artigo 66.° «proponho que se fixe responsabilidade especial para a contravenção d'este paragrapho, por causa dos resultados indicados no § 4.°
Desde que a validade e subsistencia do sorteio ficam dependentes da communicação do tribunal administrativo, justo é impor a este tribunal a responsabilidade correspondente para que o seu desleixo não origine infundados direitos e cause prejuizos.
Ao artigo 67.° proponhoa seguinte alteração: «segundo o destino do contingente for o exercito activo, a marinha ou a reserva».
D'esta fórma ficara entendido que o exercito; a marinha e a reserva terão cada um sua classe no livro do recenseamento, sem se attender ao destino d'estes tres elementos da força publica, que é um pouco incerto. (Riso.)
No artigo 68.° e § unico proponho que a palavra «resalva» do artigo se addicionem as palavras «de apuramento», e a mesma palavra do § as «de isenção».
É a significação déstas resalvas, segundo a doutrina do artigo e seu paragrapho.
No § 4.º do artigo 74.° proponho que a palavra «maiores» seja precedida da palavra «portuguezes,» para se não poder entender que este paragrapho modifica o pensamento do artigo 1.° d'este projecto permittindo o alistamento de estrangeiros.
No n.° 2.° do artigo 75.° proponho a eliminação da palavra «excluidos».
O projecto só permitte isenções, adiamentos e dispensas, e não convém a boa interpretação das leis o uso de palavras novas. Ha quem julgue conveniente variar de linguagem na redacção das leis, para assim mostrar a riqueza da lingua. Eu não sou d'esta opinião, porque sei quanto a chicana aproveita com este systema. E até desejaria que ás leis fossem seguidas por um indice com a explicação do sentido que n'ellas têem todas as palavras, a que porventura possa dar-se mais de uma acepção. Isto não é novo. Fazem-no os inglezes, que como homens praticos, comprehendem bem o merecimento da clareza, e os inconvenientes da interpetração, amoldada aos caprichos e conveniencias do interprete.
No artigo 85.° proponho que a palavra «designado» se acrescente o seguinte «no § 1.° do artigo 65.°».
É uma referencia mais explicita, que nenhum mal faz.
Para os n.ºs 1.° e 2.° do artigo 86.°, proponho a seguinte redacção:
«A qualquer mancebo destinado ao serviço militar, ainda que já tenha assentado praça, é permittido substituir-se por um seu irmão; que mostre, não só possuir os requisitos indicados no artigo 74.°, sem que tenha os impedimentos expressos no artigo 75.°, mas tambem haver satisfeito a alguma das obrigações seguintes:
«1.° A do serviço activo e da primeira reserva, nos termos dos artigos 6.°, § 1.°, 7.°, 8.° e 60.°
«2.° Á da segunda reserva, nos termos do artigo 6.°, § 2.°, 8.° e 62.º»
«3.° Á do preenchimento de vacaturas a que se refere o artigo 63.°»
Para que, porém, o beneficio d'este artigo não dependa de requisitos que o difficultem extraordinariamente, como succede tanto com a doutrina do projecto, como com a redacção indicada, proponho a seguinte substituição ao artigo 86.° e seus numeros:
«A qualquer mancebo destinado ao serviço militar, ainda que já tenha assentado praça, é permittido substituir-se por um seu irmão que mostre possuir os requisitos declarados no artigo 74.°, sem que tenha os impedimentos expressos no artigo 75.°, ficando comtudo o substituido sujeito para todos os effeitos ás obrigações que esta lei impunha ao substituto.»
O capitulo XI do projecto estabelece um codigo de penalidades gravissimas para os que transgredirem os seus preceitos, e procurarem evitar os seus resultados.
Não ha de ser cousa de cuidados.
Todas as leis de recrutamento têem sido garantidas com penalidades mais ou menos graves, que se não impõem, porque a brandura dos nossos costumes se não conforma com taes rigores em assumptos d'esta natureza.
Considero por isso do pouco proveito as disposições d'este capitulo.
E até me parece perigosa a doutrina do artigo 89.° que, recusando ou difficultando os passaportes aos maiores de quatorze annos, implicitamente auctorisa e fomenta a emigração das creanças.
Faço este reparo para chamar a attenção da illustre commissão para este assumpto, que se me afigura importante.
Sr. presidente, algumas das alterações que proponho, hão de parecer ociosas e desnecessarias.
Mas d'isso sou eu juiz. Nem eu tenho a vaidade de suppor que as minhas emendas são necessarias e bem funda-

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das. O que ellas significam innegavelinente são as duvidas que me occorreram quando estudei o projecto, e os meios que me pareceu conveniente empregar para tirar estas duvidas, tornando as disposições do projecto mais accessiveis a minha intelligencia.
E tambem não quebro lanças pela adopção d'estes meios.
O meu fim é ser esclarecido, não tanto pelos meios que indico, como principalmente pela apreciação da illustre commissão e da camara, com respeito as emendas que apresento.
Esta apreciação ver-se-ha da acta das sessões, ou expressa ou tacitamente, e será um auxiliar valiosissimo e da muita authenticidade para a boa interpretação e applicação da lei, especialmente para aquelles que, como eu, virem pouco, ou mal.
N'esta parte eu sou, infelizmente, representante de uma grande maioria. (Riso.)
E por isso mesmo as considerações que tenho feito poderão ser importunas para a camara, mas não são indifferentes ou de todo inuteis.
Nem eu tenho o habito de gastar tempo sem necessidade.
Sr. presidente, a fórma desconnexa das minhas considerações, e a leitura das emendas que mando para a mesa, em substituição da minha moção de ordem, mostra bem que eu não espero resposta senão da illustre commissão, depois de as examinar detidamente, aproveitando-as ou rejeitando-as.
E é esse simplesmente o fim que tive em vista. Nem o que disse aqui, em cumprimento da missão que me propuz, pode por isso ser classificado como discurso.
Desobriguei-me como soube do encargo que tomei de concorrer com o meu modesto trabalho para a boa intelligencia do projecto em discussão, acceitando e conformando-me com o seu pensamento geral.
Sr. presidente, dou aqui por findas as minhas considerações, agradecendo a v. exa. e a camara a benevolencia que se dignaram dispensar-me, e pedindo desculpa do tempo que lhes roubei.
E aproveito a occasião para, mais uma vez, instar para que sejam remettidos a esta camara os documentos que pedi, pelo ministerio da marinha, esperando que v. ex. dará as providencias necessarias para que se de cumprimento a lei.
Tenho dito.
Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Emendas ao projecto n.° 180:
Artigo 3.°:
Pela redacção d'este artigo os districtos de recrutamento podem não corresponder as circumscripções militares, visto que aquelles têem por base a densidade da população e estes a unidade do exercito activo.
N'esta hypothese proponho a seguinte redacção em seguida a palavra «guerra»: «É auctorisado o governo a fazer as necessarias alterações nas circumscripções militares, devendo cada uma d'estas corresponder a uma unidade do exercito activo, e a dividir o paiz em districtos de recrutamento em relação a densidade da população».
Parece, porém, mais conforme com o pensamento do projecto adoptar a mesma base, tanto para os districtos do recrutamento, como para as circumscripções militares.
N'esta hypothese proponho a seguinte redacção: «É o governo auctorisado a fazer as necessarias alterações nas circumscripções militares, a cada uma das quaes correspondera uma unidade do exercito activo e um dos districtos do recrutamento em que o paiz será dividido, tendo em attenção as exigencias de segurança publica e a densidade da população.
Artigo 5.°, § 2.°, n.° 3:
Proponho que se substitua «remiram» por «remirem» e «fizeram» por «fizerem» e que se addicionem as seguintes palavras: «nos termos dos artigos 105.° e 86.° d'esta lei».
Artigo 8.°, § 5.°:
Proponho que sejam comprehendidos no beneficio deste artigo os mancebos designados no § 4.° d'este artigo, e no n.° 3.° do artigo 12.° ... tratam os §§ 2.°, 3.° e 4.° d'este artigo, e o n.° 3.° e § 1.° do artigo 12.°
Artigo 8.°, § 6.°:
Proponho a eliminação das palavras «e 4.°», comprehendidas no §. 5.°, para não ficarem sem beneficio, visto que na armada ha só primeira reserva atraia o § 3.°, fica...»
Artigo 13.°:
Proponho a substituição da palavra «ali» por «n'ella» para mais clareza.
Artigo 20.°:
Proponho a substituição das palavras «communical-o» por «communicar este facto».
Artigo 28.°:
Proponho a substituição da palavra «logo» por «durante o mez de março».
Artigo 36.°:
Proponho a substituição d'este artigo, pelo artigo 34.° do projecto do governo.
Artigo 40.°. § 2.°:
Proponho que a palavra «Funchal» se addicione o seguinte «e de disciplinas ecclesiasticas nos seminarios diocesanos».
Artigo 41.°, n.° 10, § 2.°:
Proponho que se eliminem as palavras «os clerigos de ordens sacras», addicionando-as em separado ao § 2.°
Artigo 41.°, § 3.°:
Proponho a eliminação d'este paragrapho.
Artigo 42.°, §§ 1.° e 2.°:
Proponho a seguinte substituição a estes paragraphos:
Que se eliminem no § 1.° as palavras «ao recenseado no mesmo anno e sujeito a ser chamado a este serviço».
Que se addicione a este paragrapho o seguinte periodo:
«São dispensados destes certificados os mancebos a que se referem os n.ºs 2.° e 3.° do artigo 40.° e os n.ºs 9.° e 10.° do artigo 41.°» (Por serem os factos que fundamentam estes adiamentos e dispensas estranhos a apreciação dos chefes de familia.)
Que se addicione ao n.° 2.° o seguinte: «a requerimento dos interessados».
Que se imponha ou que se acrescente um paragrapho, impondo expressamente aos chefes de familia a obrigação de passarem os certificados, com o maximo da pena do § unico do artigo 100.°, pelo menos.
Artigo 43.°:
Proponho as seguintes alterações:
Ao n.° 1.°:
«Os mancebos comprehendidos nas disposições do n.° 1.° do artigo 39.°»
Ao n.º 4.°:
Eliminado.
Ao n.° 6.°:
Eliminado.
Ao § 1.°:
Substituido da seguinte fórma:
«Esta taxa tera por base a importancia dos contribuições predial, industrial e de renda de casas, paga ao estado pelos mancebos a ellas sujeitos ou por seus paes, na proporção de 1$000 réis para os que pagarem de 2$000 réis a 10$000 réis; de 2$000 réis para os que pagarem de 10$000 réis a 20$000 réis; e de 4$000 réis para os que pagarem de 20$000 réis a 40$000 réis; de 8$000 réis para os que pagarem de 40$000 réis a 80$000 réis; de 16$000 réis para os que pagarem de 80$000 réis a réis 160$000, observando-se sempre esta progressão crescente.»

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SESSÃO NOCTURNA DE 29 DE JULHO DE 1887 2201

Ou então proponho este outro systema de taxas, tendo por base as mesmas contribuições: de 2$500 réis a l0$000 réis, 1$000 réis; de 10$000 réis a 20$000 réis, 2$000 réis; de 20$000 réis a 30$000 réis, 30$000 réis; de 30$000 réis a 40$000 réis, 4$000 réis; e assim successivamente, pagando por cada l0$000 réis ou fracção, 1$000 réis.
Artigo 44.°, § unico:
Eliminado.
Artigo 45.° e § 5.°:
Proponho que a este paragrapho se addicionem ou precedam as seguintes palavras: «Se os membros da junta de inspecção não residirem na capital do districto».
Artigo 54.°, § 1.°:
Proponho a seguinte alteração: «Quando por motivos graves e imprevistos deixe de se fazer o sorteio no dia designado n'este artigo, será fixado novo dia pelo respectivo governador civil».
Artigo 54.°, § 2.°:
Proponho as seguintes alterações: «Ao governo compete decretar a annullação do sorteio por se ter omittido no recenseamento a inscripção de um ou mais membros».
Artigo 55.°:
Proponho que se fixem as bases e hypotheses em que se faz o sorteio por grupos das freguezias, por fórma que o acaso do sorteio não prejudique ou favoreça qualquer das freguezias aggregadas.
Artigo 66.°:
Proponho que se fixe responsabilidade especial para a contravenção d'este paragrapho, por causa dos resultados indicados no § 4.°
Artigo 67.°:
Proponho a seguinte alteração: «Segundo o destino do contingente for o exercito activo, a marinha ou a reserva.»
Artigo 68.°:
Proponho que á palavra «resalva» se addicione «o de apuramento».
§ unico. Depois da palavra «resalva» se addicione «de isenção».
Artigo 74.°, § 4.°:
Proponho que a palavra «maiores» seja precedida da palavra «portuguezes».
Artigo 75.°, n.° 2.°:
Proponho que se addicione a palavra «excluidos».
Artigo 85.°:
Proponho que a palavra «designado» se acrescente no § 1.° do artigo 65.°
Artigo 86.°, nos. 1.° e 2.°:
Proponho a seguinte redacção:
«A qualquer mancebo destinado ao serviço militar, ainda que já tenha assentado praça, é permittido substituir-se por um seu irmão, que mostre, não só possuir os requisitos indicados no artigo 74.°, sem que tenha os impedimentos expressos no artigo 75.°, mas tambem haver satisfeito a alguma das obrigações seguintes:
«1.° Á do serviço activo e da primeira reserva, nos termos dos artigos 6.°, § 1.°, 7.°, 8.° e 60.°
«2.° Á da segunda reserva, nos termos do artigo 6.°, § 2.°, 8.° e 62.°
«3.° A do preenchimento de vacaturas a que se refere o artigo 63.°»
Para que, porém, o beneficio d'este artigo não dependa de requisitos que o difficultem extraordinariamente, como succede tanto com a doutrina do projecto, como com a redacção proposta, proponho a seguinte substituição ao artigo 86.° e seus numeros:
« A qualquer mancebo destinado ao serviço militar, ainda que já tenha assentado praça, é permittido substituir-se, por um seu irmão que mostre possuir os requisitos declarados no artigo 74.°, sem que tenha os impedimentos expressos no artigo 70.°, ficando comtudo o substituido sujeito para todos os effeitos ás obrigações que esta lei impunha ao substituto. = Alfredo Bandão.
Foram admittidas.
O sr. Julio de Vilhena: - (O discurso será publicado quando s. exa. devolver as notas tachygraphicas.)
O sr. Presidente: - A ordem do dia para ámanhã é a continuação da que estava dada e mais os projectos nos. 142, 173, 205 e 208.

Está levantada a sessão.

Era meia noite.

Redactor = S. Rego.

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