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SESSÃO DE 9 DE JUNHO DE 1885 2171

obra por elles, isto é, para servirem de pontos fixos ao traçado de uma linha de proceder diplomático.
Se os proprios tratados, feitos com todas as formalidades da etiqueta internacional, nem sempre seguram a justiça e o direito contra os interesses e as paixões dos contratantes, as taes ou quaes demonstrações que algumas potências haviam dado de reconhecerem Portugal, quando assim lhes convinha, como exercendo certa jurisdicção no Zaire, não tinham senão um precario valor moral que não devia inspirar confiança, como inspirou, ao governo portuguez. Não o dispensavam, pelo menos, de promover actos mais explicitos, mais obrigatórios, de reconhecimento, e elle proprio o comprehendeu algumas vezes, embora n'outras conjuncturas parecesse convencido de que, por exemplo, bastava o caso tão fallado da corveta Hero para forcar o governo allemão a prestar homenagem aos nossos direitos.
Vamos, porém, aos motivos por que se modificaram tão completamente as disposições das potencias para comnosco.
As da Franca foram constantemente benévolas; não vejo, era todo o decurso das negociações, que o seu governo nos desse um motivo de desgosto antes de nós lho termos dado a elle.
Vem aqui a pêllo o fallar do incidente occasionado pelas palavras do sr. Duclere, que o sr. Fernando de Azevedo transmittiu de uma maneira que o ministro francez achou inexacta; mas não me demorarei com similhante assumpto.
Realmente é difficil, entre asserções contrarias, de dois homens respeitaveis, relativas a uma conversação a que elles só assistiram, pronunciar juizo que não seja aventuroso; devo notar, porém, que o sr. Arroyo, apesar da sua habilidade de jurisconsulto, poz a questão em termos que não me parecem favoraveis à causa que s. exa. defende, porque entre suppor que o sr. Fernando de Azevedo interpretou mal as palavras que ouviu ao sr. Duclere, e suppor que um documento publicado no Livro amarello pelo governo francez não é authentico, o que presuppoe a cumplicidade de tres homens como o sr. Duclere, o sr. Júlio Ferry e o sr. de Laboulaye numa fraude cuja necessidade ou conveniência não se comprehende bem; entre estas duas supposições, digo, a opção do bom senso não póde ser duvidosa. (Apoiados.} Mas eu não insisto n'este incidente, porque, se é certo que tem uma grande importância para quem deseja averiguar as responsabilidades da nossa diplomacia, tambem é certo que pouco ou nada influiu nas negociações.
As negociações com a Inglaterra e só com ella estavam entabuladas antes da conferencia do sr. Duclere com o sr. Azevedo, continuaram sem modificação depois d'ella; e prosseguiram nos mesmos termos quando o nosso governo se desenganou de que o governo francez não estava tão disposto, como elle julgou n'um dado momento, a reconhecer incondicionalmente a soberania portugueza.
Emquanto a outro episódio a que alludiu o sr. Arroyo, o das negociações com a França encetadas em julho de 1884 e logo abandonadas, esse nada prova contra a correcção e lealdade do governo francez.
Note a camara uma circumstancia, que devia ter prevenido o sr. Arroyo de que a verdadeira significação d'esse episodio não favorece os nossos negociadores: se temos conhecimento d'elle, é pelo Livro amarello, porque os coordenadores do Livro branco omittiram-no, esconderam-n'o, e não de certo para maior honra e gloria da diplomacia franceza.
Effectivamente, o principio de negociações, que o orador que me precedeu adduziu como prova da má fé ou má vontade do gabinete de Paris, só dá testemunho, na realidade, da obstinação cega com que o governo sacrificou ao tratado com a Inglaterra todos os apoios, todas as amisades, que podíamos ter obtido e até se nos offereceram, sem ver sequer, que essas forças moraes, bem aproveitadas, deveriam contribuir para facilitar e tornar menos oneroso aquelle tratado. E se não, julgue-o a camara.
Em julho de 1883, o sr. De Laboulaye officiou ao lord Challemel-Lacour dizendo-lhe que o sr. Serpa lhe tinha enviado uma nota em que, alludindo a certas contendas que se haviam levantado entre as auctoridades portuguezas e as auctoridades francezas na Guiné, fazia sentir quanto seria conveniente que as duas potencias procedessem á delimitação dos seus territorios n'aquella região.
A nota continha, porém, phrases que certamente se referiam a assumpto mais importante do que essa delimitação, porque o sr. Serpa dizia:
«Ao vivo desejo que anima o governo de Sua Magestade de manter e estreitar com o governo da Republica franceza os laços de amisade, que unem os dois paizes, corresponde completamente a idéa de uma perfeita harmonia e de uma cooperação scientifica entre os dois governos em tudo o que diz respeito á colonisação e civilisação da Africa nos territórios em que somos vizinhos».
Mais adiante acrescentava:
«A civilisação do continente africano é um dos problemas que hoje se impõem ao estudo e á acção dos povos europeus que, como o povo francez e o portuguez, foram, ha séculos, os iniciadores dos primeiros trabalhos de colonisação nessa parte do mundo; só tem a lucrar com a boa harmonia e cooperação franca dos governos que possuem territórios contignos nas vastissimas costas d'esse continente.»
Para se poder avaliar bem o alcance d'estas palavras do sr. Serpa, é necessario conhecer qual era neste momento o estado das negociações com a Inglaterra.
O governo portuguez devia ter pelo menos a suspeita de que o gabinete britanico queria romper as negociações. Depois de exigencias formuladas na camara dos communs por Jacob Bright, depois do commercio de Manchester haver rompido as hostilidades contra qualquer accordo com Portugal ácerca do Zaire, o governo inglez havia posto de parte todas as bases das negociações que antes tinha acceitado, e numa nota datada de 1 do junho exigira novas concessões que difficilmente podiam ser acceites. O governo portuguez respondera resignando-se a uma parte d'essas exigencias; mas durante algum tempo, tempo em quanto durava em Inglaterra a opposição do tratado, em Portugal não se soube, não se podia saber, quaes eram as verdadeiras intenções, e qual seria a deliberação definitiva do gabinete Gladstone. Ora, foi justamente neste periodo que appareceu a nota do sr. Serpa; essa nota significa, pois, no meu entender, que o governo portuguez, desanimado com o estado das cousas em Inglaterra, procurara voltar-se para a França. Foi tambem assim, que o entendeu o sr. Challemel-Lacour, e este estadista caminhando direito ao fim com que suppoz, e muito bem, que o sr. Serpa se tinha dirigido ao sr. de Laboulaye, declarou que o governo francez acceitava a proposta da delimitação das possessões da Guiné como muito conveniente, e que estava prompto a tratar tambem com Portugal ácerca da demarcação de todos os territórios da África occidental, em que as duas nações fossem vizinhas, o que significava que se propunha a tratar da delimitação dos dominios portuguezes no Zaire.
(Interrupção do sr. Luciano Cordeiro, relator.)
Não se tratou da mais cousa nenhuma. O sr. de Challemel Lacour propoz immediatamente a nomeação de commissarios. Repare bem a camara que o governo francez prestou-se a tratar comnosco uma delimitação dos territorios do Zaire, e não se póde por em duvida que, desde que a França concordasse nessa delimitação, reconheceria ipso facto a nossa soberania no territorio que nos ficasse pertencendo. (Apoiados.)
Vamos a ver, porém, como respondeu o governo portuguez. Com um verdadeiro fin de non recevoir. Depois de ter trazido a Franca a estas negociações, de repente põe a mão na ilharga e responde: «Acceito as negociações para