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to sobre os povos da Província do Minho, e devendo nós ser esciupulosos eai bimilhante matéria é necessário que saibamos se e necessário para bem do Contracto concedei- tudo , se somente parte do quê pede o Proponente ; e se mesmo o queelle pede, é tal, que pôde por força de s>ua exorbitância fazer dasappa-recer essa utilidade, e tornar-se mn gravame (apoiados} , eu não duvido da boa fé do Governo nesta operação; mas por isso mesmo devo também fazer-llie justiça em pensar que elle contiactou cum perfeito conhecimento de causa , mas como o Governo depende também da Camará, tiaga a ella os documentos que instruam sua petição (apoiados). Nem só por meio de uma Plm-presa podem haver boas estradas, antes se nos regularmos pelo que temos visto entre nós, será talvez este o meio de nào haver

estradas no Minho , assim como se pôde dizer que as nào ha na Estremadura. Se ocommodo nào equivaler, ou for superior aoincornmodo, então buscaremos outros meios que se adoptam em outros paizes, e a que os povos por certo se não hão denegar reconhecendo a sua utilidade: por tanto, como nào tenho prova ostensiva do grau de exactidão com que se acha calculado este Contracto, e não sei se heide conceder, se restringir as Condições que dependem do Poder Legislativo ; por isso vpto contra o Projecto , e a culpa tem quem não me dá os meios para votar acertadamente, combinando os lucros da Empresa com os interesses dos povos (apoiadosJ.

O Sr. Presidente: —Deu a hoia ; a Ordem do Dia para amanhã e' a mesma de hoje — está levantada a Sessão. Erão b horas. ,

N.° 35. Sessão de 18 de Maio. 1839.
Presidência do Sr. José Caetano de Campos.
Abertura - Depois do meio dia.
Chamada - Presentes 83 Srs. Deputados: entraram depois mais alguns, e faltaram os Srs. - Jervis d' Atouguia - Barreto Ferraz - Costa Cabral - Cesar de Vasconcellos - Fernandes Coelho - Silveiro - Barão de Noronha - Bispo Conde - Carvalho e Mello - Gomes de Carvalho - Sousa Guedes - Dias d' Azevedo - Aguiar - Velloso da Cruz - Teixeira de Moraes - José Estevão - Brum - Marccos - Ferreira de Castro - Henriques Ferreira - Fontoura - Reis e Vasconcellos - J. M. Grande - Xavier d' Araujo - Sousa Pimentel - Mousinho da Silveira - Valdez - Colmieiro - e Xavier Botelho.
Acta - Approvada.
Correspondencia - Teve o seguinte destino:
Ministerio da Guerra - Um officio incluindo varios documentos a respeito do Capitão Ajudante Major do Corpo Belga, Clemente Estevão Dupoisal - Á Comissão de Guerra.
Ministerio da Fazenda - Um officio acompanhando um mappa demonstrativo da importancia das remissões dos Foros Nacionaes - Para a Secretaria.
Outro incluindo por copia o mappa da exportação de vinhos pela Ilha do Faial no anno proximo preterito - Á Comissão especial de vinhos.
Outro acompanhando uma informação da Contadoria do Thesouro Publico, sobre a pertenção da Abbadeça, e mais Religiosas do extincto Convento de Santa Apollonia, recolhidas no Convento de Santa Mónica - Para a Secretaria.
Outro incluindo por copia a informação da Alfandega da Horta, e a relação, que menciona, ácerca do numero de navios nacionaes, estrangeiros, que deram entrada no porto d'aquella cidade nos annos de 1834, 1835, 1836, e 1837, e direitos de tonelagem, cobrados na referida Alfandega - Para a Secretaria.
Outro incluindo vários documentos ácerca da quantia, que deve admitir-se em moeda de cobre na recepção dos rendimentos d' Estado - Para a Secretaria.
Outro acompanhando varios documentos relativos á extincção do logar do Thesoureiro da Alfândega das Sette Casas, e ácerca do modo porque se suprem as incumbencias do dito logar, e as fianças, com que se garante a arrecadação da receita da sobredita Alfandega - Para a Secretaria.
Representações. - Uma da Junta de Parochia da Freguezia de Santa Maria de Ravinhoda, e outra dos moradores da Freguezia de S. Lourenço d' Arranhó, sobre divisão de territorio. - Á Commissão d' Estatistica.
Outra da Camara Municipal do Concelho de Mondim de Basto, pedindo que se deffira aos Alumnos das Escólas Medico-Cirurgicas de Lisboa e Porto sobre o Gráo Académico que sollicitam. - Á Commissão d' Instrucção Publica.
Outra da Junta de Parochia da Freguezia do Salvador, da Cidade de Beja, pedindo que seja rejeitado o additamento do Sr. Deputado Farinho, em que propõe, que ainda que os fóros, e rendimentos de qualquer Igreja excedam a congrua arbitrada, sejam todos percebidos pelo Parocho. - Á Commissão Ecclesiastica.
Outra dos Membros da Junta de Parochia d' Aguas Santas, pedindo um predio Nacional, para estabelecimento do Cemiterio. - A requerimento do Sr. Passos (José) foi esta representação remettida com urgencia ao Governo para informar sobre o seu contheudo.
Outra da Direcção da Companhia de Fiação e Tecidos Lisbonense, pedindo que se indeffira a supplica dos Commerciantes, ou habitantes de Vianna, em que pedem para a Alfandega d' aquella Villa o sello de chumbo. - Á Commissão de Commercio e Artes.
Outra dos Professores de primeiras letras de Alcobaça, Cella, Coz, Alpedriz, Maiorga, Aljubarrota, Evora, e Turquel, pedindo que pelo Subsidio Litterario lhes sejam pagos seus ordenados, que se acham muito atrazados. - As Commissões de Fazenda e de Instrucção Publica.
Outra dos Professores de ensino primario do Concelho de S. Pedro do Sul, pedindo que a gratificação de 20$000 réis, mandada pagar pela Camara Municipal lhe seja paga pelo Thesouro pelo rendimento do Subsidio Litterario. - Á Commissão de Fazenda e d' Instrucção Publica.

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Foi lido na Mesa um parecer da Commissão de Fazenda, auctorisando a Junta do Credito Publico a dar em pagamento de quaesquer dividas, a que os Bens Nacionaes estivessem legitimamente obrigados, Titulos sem juro, admissiveis na compra dos referidos Bens. (V. Sessão de 17 de Maio.)
Mandou-se imprimir.
Leu-se outro da Commissão de Marinha sobre Proposta do Governo, a fim de se regular o logar, em que na escalla devem ser collocados os officiaes graduados do Corpo da Armada, quando passam a effectivos. (V. Sessão de 17 de Maio) Mandou-se imprimir.
Igualmente foram lidos e approvados para serem mandados ao Governo os Seguintes pareceres da Commissào d' Estatistica.
1.° Sobre a Representação da Camara Municipal de Miranda do Douro. (V. Sessão de 17 de Maio).
2.° Sobre a Representação dos habitantes do logar de Bouças, Concelho de D. Chama. (V. Sessão de 17 de Maio).
3.° Sobre a Representação das Auctoridades Electivas e varios cidadãos da Parochia formada das Povoações de Sendim da Ribeira, Villarchão, e Parada do Concelho de Chacim. (V. Sessão de 17 de Maio).
Também foi lido um parecer das Commissões reunidas de Guerra e Marinha, para se mandar imprimir no Diario do Governo o Projecto de Lei para o Monte Pio do Exercito e Armada, remettido pelo Governo (V. Sessão de 14 de Maio).
Teve segunda leitura o seguinte plano.
Senhores. Tem mostrado a experiencia, que para se conseguir um dederminado fim, basta estabelecer a seu respeito qualquer plausivel systema e segui-lo com inabalavel constancia: entre muitos exemplos que seria possivel citar, é sufficiente o das obras collosaes emprehendidas e ultimadas pelas ordens religiosas em todo o mundo civilisado. Assim não obstante a escacez de meios pecuniarios, que actualmente nos afflige, havemos conseguir a construcção de estradas em todo o Reino se observarmos o methodo que tenho a honra de indicar no seguinte.
Plano para a Construção, Conservação, e Policia das Estradas.

TITULO I.
Da Construcção das Estradas.

Art. 1.° A direcção, dimenção, e construcção das estradas fica a cargo dos Inspectores (de que adiante se tractra); mas o minimo da largura permittirá o transito de dous carros, a par, dos maiores que estão em uzo.
Art. 2.° Não haverá na proximidade das estradas sitio algum que facilite couto a malfeitores, e surpreza dos passageiros.
Art. 3.° As margens das estradas serão guarnecidas com urna ordem de arvores pelo menos: estas serão, sempre que as circunstancias o permittirem, castanheiros, carvalhos, e sobreiros; e quando houver mais de uma ordem em cada margem será a segunda de asinheiras, e oliveiras; quando o clima ou natureza do solo não admittir estas arvores, preferir-se-hão as silvestres que poderem fornecer madeiras de construcção.
Art. 4.° Sempre que possivel for preferir-se-ha o systema de Mac-Adams.

TITUL II.
Da Conservação das Estradas e sua Policia.

Art. 5.° Depois de feitas as estradas ou na mesma occasião, se construirão estalagens nos logares convenientes; e as que houver sobre as estradas se comprarão, e melhorarão por conta do Estado. Tanto em umas como em outras serão empregados como estalejadeiros e serventes os officiaes enferiores e soldados veteranos e os estropiados no serviço.
Art. 6.° Os utensilios e mobilia das estalagens serão fornecidos pelo Estado por uma vez sómente: Os estalagadeiros os receberão e entregarão por um inventario, renovando os perdidos e arruinados á sua custa.
Art. 7.° Em cada estalagem haverá dous estalagadeiros um será encarregado da economia arranjo e policia da estalagem, este será o mais graduado; o outro cuidará da conservação da estrada pertencente á estalagem para cujo fim se fará a divizão da mesma estrada.
Art.° 8.° O primeiro Estalajadeiro terá um livro alfabetado (que será fornecido pela Administração do Districto a que a Estalagem pertencer) em que lance os nomes das pessoas que pernoutarem na Estalagem: no mesmo livro, e em folhas separadas para esse fim, mencionará por ordem Chronologica todos os acontecimentos notaveis que tiverem relação com os passageiros, e com a policia da Estrada uma vez que esses acontecimentos tenham logar na porção d' aquella que lhe pertencer, ou nas suas visinhanças.
Art. 9.° Quando na Estalagem pernoutar alguem que não esteja munido com passaporte, ou titulo de residencia (nos limites para estes prescriptos) o Estalajadeiro lhe tomará todos os signaes, e expedirá logo um dos serventes com essa resenha á auctoridade competente, e mais visinha para que esta promova a captura do suspeito. A resenha e sua remessa será feita com a precisa cautella, a fim de que a pessoa suspeita se não aperceba.
Art. 10.° Sobre os preços da Estiva (havendo-a na Cabeça do Districto) ou sobre o preço medio dos generos, preço que será remettido todas as semanas pela Administração Geral a cada uma das Estalagens do seu Districto se darão 10, 20, 30, etc. por cento aos Estalajadeiros, segundo a considerabilidade do transito de modo que os lucros resultantes sejam sufficientes para o costeio da Estalagem, paga dos serventes, e farta sustentação de todos os Empregados na Estalagem.
§ 1.° A Estiva estará constantemente affixada na porta principal da Estalagem, assim como a designação dos tantos por cento para lucros.
§ 2.° Os lucros serão arbitrados pelos Inspectores das Estradas, todos os semestres, tendo estes attenção aos fructos das arvores da Estrada correspondente á Estalagem pois estes pertencerão aos Estalajadeiros.
§ 3.° O excedente dos lucros será igualmente dividido pelos Estalajadeiros, os quaes só receberão

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do Estado um fardamento completo cada tres annos; o que também se estenderá aos serventes.
§ 4.° Os Estalajadeiros que servirem distinctamente, poderão ser mudados para alguma Estalagem mais rendosa, assim como o poderão ser para alguma menos pingue aquelles que mal se houverem no desempenho do seus deveres.
§ 5.° Os Estalajadeiros e serventes, que mostrarem enaptidão para o serviço, que se lhes incumbe recolherão ás suas companhias e serão substituidos por outros.
§ 6.° Os serventes que bem desempenharem os seus deveres poderão ter accrescimo de vencimento até oitenta réis diários, mas para isso será preciso que o Inspector obtenha informações favoraveis da maioria de todos os Empregados na Estalagem: o augmento de salario será successivo, e só poderá ser alterado em cada semestre.
§ 7.° Quando os Estalajadeiros não poderem por encomodo de saude, exercer, as funcções que se lhes encarregam serão substituidos pelos serventes, que o primeiro Estalajadeiro designar.
§ 8.° O segundo Estalajadeiro substitue sempre o primeiro e neste caso é elle quem nomea o servente que o hade substituir, em quanto elle occupa o logar do primeiro Estalajadeiro.
Art. 11.° As pequenas vendas que houver sobre a Estrada serão subordinadas aos Inspectores, assim como o são as Estalagens do Estado no que respeita a objectos de policia e saude publica.
Art. 12.° Nas Estradas pouco frequentadas em que não for possivel occorrer ás despezas das Estalagens pelo modo acima dito, se annexará a estas uma porção de terreno tal, que o seu producto unido ao do fructo das arvores, e ao do pequeno rendimento do transito chegue para as despezas da Estalagem.
Art. 13.° O segundo Eslalajadeiro fará todos os dias a visita da Estrada pertencente á Estalagem a fim de lhe reparar os pequenos damnos que houver soffrido: nestas visitas poder-se-ha acompanhar com um ou mais serventes, conforme os estragos que tiver observado.
§ 1.° Os trilhos formados pelos carros serão cheios de novo cascalho, nas Estradas á Mac-Adams, e de saibro naquellas que forem abertas no terreno natural.
§ 2.° Quando por desleixo do segundo Estalajadeiro se observar consideravel ruina na Estrada, receberá este sómente uma paga igual á dos serventes, e o restante será applicado para o reparo da Estrada: o tempo deste desconto será arbitrado pelo Inspector, e proporcional ao damno originado pelo desleixo do Estalajadeiro.
Art. 14.° Os Estalajadeiros serão subordinados aos Inspectores das Estradas em tudo quanto respeita a doutrina deste plano, mais nenhuma outra auctoridade.
TITULO III.
Dos Inspectores.

Art. 15.° Haverá em cada Provincia um Inspector das Estradas, que será tirado de qualquer dos Corpos do Exercito, com tanto que tenha o curso de Engenheiros.
Art. 16.° O soldo dos Inspectores será pago pelo Ministerio do Reino, em quanto os rendimentos proprios das Estradas não forem sufficientes para supprirem ás suas despezas.
Art. 17.° Nas Provincias do Minho, Extremadura, e Alemtejo, será o soldo dos Inspectores de 1:500$ rs.; nas outras Provincias de 1:200$ rs.
§ 1.° Cada Inspector receberá por uma vez sómente 200$000 rs. para compra de dous Cavallos, e terá diariamente duas rações de forragens.
§ 2.° Quando fizerem a visita das Estradas, serão acompanhados por uma ordenança de Cavalleria.
Art. 18.° Haverá, durante o tempo da construção das Estradas, um Ajudante para cada inspector: estes Ajudantes serão tirados da classe dos Subalternos do Exercito, com tanto que tenham o curso de Engenheiros.
§. 1.° Os Ajudantes vencerão soldo e meio, e uma ração de forragem, em quanto empregados neste serviço.
§ 2.° Os Ajudantes cumprirão as Ordens dos Inspectores relativas ao especial serviço que a estes se incumbe.
§ 3.° Os Ajudantes substituem os Inspectores nos seus impedimentos legaes, e neste caso vencem soldo dobrado.
Art. 19.° Os Inspectores deixarão de pertencer ao exercito logo que acceitarem este novo serviço; e por isso terão a graduação de Brigadeiros, conservando o direito ao Monte-Pio, uma vez que para elle queiram concorrer como os Brigadeiros; terão como estes o mesmo uniforme, com a differença dos metaes, que serão brancos.
Art. 20.° Os Inspectores terão direito a ser aposentados logo que completem trinta annos de serviço, ou quando impossibilitados de o continuar; o que será confirmado por uma Junta de Saúde, á similhança do que se pratica no exercito; e neste segundo caso, o vencimento da aposentadoria será proporcional ao tempo de serviço, contando-se aquelle que tiver feito no exercito, o que também se entende para a aposentadoria por inteiro.
TITULO IV.
Dos deveres dos Inspectores.

Art. 21.° Os Inspectores farão construir as estradas, pontes, vallas, e todas as mais obras que necessarias forem para facilitar as communicações. Cuidarão da conservação destas obras, e da plantação e duração do arvoredo que guarnecer as estradas. Vigiarão na policia das estradas, e estalagens, e proporão ao Governo todos os meios que julgarem convenientes para melhorar a cultura das suas respectivas Provincias, para facilitar o augmento de população; e para o estabelecimento de fabricas que forem analogas ás diversas situações em que rasoavelmente devam prosperar.
Art. 22.° Os Inspectores farão a visita das suas Provincias duas vezes pelo menos em cada anno: durante estas visitas darão todas as providencias que julgarem convenientes para o exacto, e melhor cumprimento do disposto neste plano, propondo ao Governo todas as medidas que excederem á esfera das suas attribuições.
Art. 23.° Os Inspectores se entenderão com os Administradores Geraes das suas Provincias, tanto

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sobre os objectos de policia, como sobre o arbitramento dos lucros concedidos aos estalejadeiros: caso porém de disconcordancia com os Administradores, dirigir-se-hão ao Governo, para este decidir como melhor parecer.
Art. 24.° Os Inspectores disporão da tropa destinada para a policia das estradas, em quanto as guardas de segurança senão acharem convenientemente organisadas; ou ainda depois disto, caso que a tropa continue a ser empregada neste serviço.
Art. 25.° Os Inspectores darão por escripto, aos estalajadeiros, as intrucções que julgarem convenientes para o bom regimen das estalagens, para a sua rigorosa policia, para o intretmimento das estradas, e para a plantação, e conservação do arvoredo que lhes guarnecer as margens: do mesmo modo se haverão para com as patrulhas destinadas ao serviço de policia das estradas, dando-lhes por escripto, e minuciosamente as instrucções, que deverão observar em todos os casos possiveis de prevêr.
Art. 26.° Os Inspectores deverão residir nas suas Provincias, não saindo dellas sob pretexto algum, a fim de poderem dar todas as providencias que qualquer caso emprevisto exigir; como por exemplo, uma cheia repentina, a queda d' uma ponte, a aparição de algum partido de salteadores, etc. etc.: assim, quando mudarem de residencia o parteciparão aos Administradores Geraes, para que estes se lhe dirijam logo que as circumstancias acima mencionadas, ou outras de natureza analoga, tenham logar.
Art. 27.° Os Inspectores no fim dos Semestres, haverão dos Regedores, de Parochia das suas Provincias, os passaportes que tiverem recebido na conformidade do disposto no Artigo 29.° § 2.°; farão somar as importancias dos direitos de transito, que serão lançados por extenso no livro da Inspecção, designando o Semestre a que pertencerem, e quanto recebeu cada uma das Aucturidades encarregadas de fornecerem os passaportes: desta conta geral se tirarão copias correspondentes a cada uma das Administrações Gerais, a fim de que estas hajam das supra-ditas Auctoridades as sommas que tiverem recebido pelos direitos de transito, enviando-os logo á Administração Geral da Capital da Provincia.
§ 1.° Quando os Inspectores suspeitarem de algum dos individuos encarregados de fornecer os passaportes, recorrerão aos livros de registo das estalagens, e por elle virão no conhecimento da fraude, se a houver, achando nomes que não constem dos passaportes apresentados.
§ 2.° Pelos passaportes se conhecerá tambem quanto importaram as multas pagas nas estalagens, e por ellas se verificará a respectiva contabilidade.
TITULO V.
Dos carros e carruagens.

Art. 28.° Os carros destinados ao transporte de objectos, e tirados por dous, ou mais bois, terão pelo menos seis pollegadas de largura na chapa do trilho; e do mesmo modo, quanto tirados por quatro ou mais cavallos, ou muares.
§ 1.° Sendo os carros destinados á tiragem de dous cavallos ou muares, poderá diminuir-se esta largura até três pollegadas: em todo o caso, o eixo será fixo, e as rodas independentes.
§ 2.° Os direitos que os carros houverem de pagar serão regulados, não só pelo que disser respeito ao seu lote, mas tambem á sua construcção, porque desta depende a maior ou menor ruina das estradas.
§ 3.° Os carros que caminharem carregados preferirão no trilho da estrada, aos que caminharam leves; e em igualdade de circumstancias preferirá aquelle que se dirigir no sentido da Capital do Districto.
TITULO VI.
Dos passaportes, e titulos de residência.

Art. 29.° As pessoas encarregadas da promptificação dos passaportes, terão um livro alfabetado em que lavrem os nomes dos individuos a quem os forneceram, dia em que, logar do destino, e quantia que pagaram, e que será lançada á margem para se poder sommar com facilidade a que contiver cada lauda.
§ 1.° Os individuos que apresentarem os seus passaportes, exigindo novo itinerario para seguirem jornada maior, ou para mudarem aquella que tencionavam fazer, pagarão a differença dos direitos de transito, que lhe serão lançados no passaporte que apresentarem, designando-se-lhe nelle o novo destino.
§ 2.° As pessoas que ultimarem suas jornadas, farão entregar os seus passaportes aos Regedores das Parochias em que forem residir; e uma vez que isto não cumpram dentro do prazo do quinze dias, contados daquelle em que findaram a jornada, serão multados como se diz no titulo correspondente.
§ 3.° Os passaportes terão impressos os dizeres constantes, e serão sellados com o sello da Administração respectiva: nelles se fará menção de Iodos os signaes por onde for facil conhecer a pessoa de que tractarem, e isto com tanta clareza, que não seja facil servir um qualquer destes titulos a outro individuo.
§ 4.° Quando se encher o passaporte, se fará nelle menção de todas as circumstancias da jornada assim como logar de destino; se o portador vai a pé, a cavallo, ou de seje; guiando carro, cavalgadura, gado, etc.; para que (como adiante se diz), não seja estorvado em seu caminho.
Art. 30.° Os Titulos de residencia consistirão em um attestado impresso, fornecido pelo Regedor da respectiva Parochia, no qual este declare que o portador não só nella reside, mas que é pessoa sem suspeita; o que lhe será afiançado por tres testemunhas, que como taes assignarão o Titulo de residencia: neste Titulo se fará menção, assim como nos passaportes, de todos os signaes que indiquem claramente a pessoa a quem se fornecerem.
§ 1. Os Regedores receberão dos Administradores Geraes o numero destes Titulos, preciso para os seus com-parochianos: similhantes Titulos virão sellados com o sello da Administração.
§ 2. O Titulo de residencia poderá se vir em quanto admittir observações; porque mudando o individuo para outra Parochia, ou tendo decorrido um anno conservando-se na mesma, o apresentará ao Regedor para que este o faça sellar, e notar na Administração Geral; pelo que pagará 40 réis, vinte para a Administração vinte para o Regedor.
§ 3. O Titulo de residencia é sufficiente documento; não só para girar em superficie de 5

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legoas de raio, sendo o centro o Povo, residencia do individuo, como para por elle se fornecer passaporte para jornada maior.

TITULO VII.
Das contribuições applicadas ao Cofre das Estradas.

Art.° 31. O Passageiro a pé pagará cinco réis por cada legoa de caminho, e indo a cavallo, pagará 10 réis: o transito menor d' uma legoa inclusivé não soffre contribuição, sómente para os pedestres.
§ 1. Por cada cavalgadura menor se pagará 5 réis por cada legoa, e sendo maior 10 réis.
§ 2. Por cada uma seje tirada por uma parelha se pagará 15 réis por cada legoa; e sendo tirada por duas vinte e cinco réis; os carrinhos tirados por um só Cavallo ou muar, pagarão igualmente 15 réis por legoa.
§ 3. As carroagens, sendo tiradas por uma parelha, pagarão 20 réis por legoa; e quando por duas 30 réis.
§ 4. Os carros tirados por uma junta debois, pagarão 20 réis por legoa, e sendo-o por duas 30 réis.
§ 5. Os guias de carros, sejes, ou gado, não pagarão por si cousa alguma, tanto importa os dirijam a pé, ou a cavallo.
§ 6.° Pelo gado vacum e cavallar, se pagará 2 réis por cabeça, e por cada legoa, e pelo lanigero, caprino, ou suino, um real.
§ 7. Os carros de antiga construcção; isto é, cujo radeiro fórma uma só peça, pagarão mais o terço da contribuição que se estabelece para os de rodas independentes; e isto em todas as circumstancias que para estes se indicam.
§ 8. Quando a espessura das rodas, ou largura da chapa de trilho fôr menor do que se ditrimina neste plano Art.° 28, sera a contribuição do rodado maior em porporção inversa; isto é, se fôr de metade pagará o dobro, se do terço o triplo, etc.
TITULO Vlll.
Das mulctas applicadas ao Cofre das Estradas.

Art.° 32. Todo o individuo encontrado sem passaporte, ou sem Titulos de residencia, dentro dos limites para ellas prescriptos, pagará de mulcta 960 réis; e levando em sua companhia pessoas de familia; pagará mais por cada uma 120 réis.
§ 1. Todo o carro, ou sege, que fôr encontrado sem ser numerado com o n.° da respectiva Municipalidade pagará sempre que isto lhe acontecer 480 réis.
§ 2. Todo o Conductor de gado, de qualquer qualidade que este seja, que não apresentar o passaporte com a indicação de que pagou o direito da Estrada correspondente ao n.° de cabeças que dirigir, ou maior, pagará de mulcta 1$000 réis; e se coudusir maior n.° de cabeças do que as mencionadas no passaporte, pagará mais por cada uma das que exceder 120 réis.
§ 3.° Todo o Porcariço que deixar os porcos remover a terra das Estradas, ou aquella que lhes dê encontros, será mulctado em 480 réis.
§ 4. Todo o indivíduo que cortar, ou destruir, por qualquer modo que seja, alguma das arvores que guarnecer as Estradas, será mulctado em 9:600 réis: se repetir o crime, pagará 24$000 réis, e soffrerá prisão rigorosa durante 60 dias: se reincidir, será degradado para fóra do Reino.
§ 5. As pessoas que não entregarem os passaportes aos Regedores da Parochia em que forem residir, dentro do praso de 15 dias, pagarão de mulcta 480 réis.
§ 6. Os Conductores de Carros; de que se tracta no Art. 28, § 3.°, que não cederem o trilho da Estrada aquelle que a ella tiver direito, pagarão em beneficio delle 800 réis: mais se á contestação se seguir desordem, serão mulctados a favor do Cofre das Estradas; o que tiver direito ao trilho em 480 réis, e o outro no triplo.
§ 7. Todas as mulctas (á excepção das que forem cobradas nas portas das Cidades ou Villas, e que serão arrematadas com os direitos de transito) se pagarão nas Estalagens onde primeiro se conhecer a causa dellas: Os primeiros estalajadeiros lançarão no livro de registo, e em folhas separadas, Art. 8. Tit. 2.°, a importância das mulctas; fazendo outro tanto nos passaportes ou titulos de residencia, quando não trouxerem passaporte, indicando a quantia e causa de proveio.
§ 8. Nas Administrações Geraes se conhecerá pelos Títulos de residencia, quando estes forem a renovar, ou sellar, as quantias que nelles se lançaram provenientes de mulctas, e em que estalagens forem pagas: destas notas se extrairão relações, por estalagens, que serão remettidas aos Inspectores correspondentes a fim de que fiscalisem a contabilidade respectiva.

TÍTULO IX.
Das Fontes, e abrigos para as Rondas das Estradas.

Art.° 33. Fica á escolha dos Inspectores a construcção das fontes; e abrigos para as rondas das Estradas: estes abrigos serão sustentados sobre pilares, ou páos de prumo, e roptos em roda, a fim de não offerecerem logar occulto aos salteadores.
TITULO X.
Das Rondas das Estradas.

Art. 34. As rondas das Estradas, ou sejam fornecidas pelos Corpos do Exercito, ou pelas guardas de segurança, ficam sujeitas aos Inspectores.
§ 1. As Instrucções das patrulhas serão feitas e assignadas pelos Inspectores, e renovadas quando preciso fôr.
§ 2. Serão porém constantes as obrigações de protejer todos os passageiros, habitantes das Estalagens, e visinhos das Estradas, contra os insultos dos salteadores; vigiar que se não cortem, ou arruinem as arvores que guarnessem as Estradas, e embaraçar a pastagem dos gados sobre a relva que houver nas suas margens; perguntar pelos passaportes a todas as pessoas que encontrarem, parescendo-lhes suspeitas, condusindo debaixo de prisão aquellas que os não trouxerem, á Auctoridade Administrativa que mais proxima se achar; e examinar se os carros e seges tèem a numeração das Municipalidades, e se os rodados correspondem ao dizer

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dos passaportes, e caso de falta de algum, ou de ambos estes requesitos, mandar ao Regedor da Parochia a que o carro ou sege pertencer, e pelo correio, a nota de todos os seus signaes, e nome do conductor, a fim de que o Regedor haja delle o triplo da contribuição que elle deveria ter pago pelo rodado, ou a mulcta pela falta da numeração: no Titulo de residencia deverá o Regedor lançar a importancia da mulcta no acto de a cobrar.
§ 3.° As patrulhas terão a sua residencia nas Estalagens, e as que pertencerem ao Exercito receberão pelo cofre das estradas uma gratificação igual aos seus respectivos soldos.

TITULO XI.
Da execução dos trabalhos.

Art. 35.° Os Inspectores, logo que forem nomeados, sahirão a examinar as estradas das suas Provincias, a fim de poderem propor as alterações, que devem soffrer tanto em direcção como em diminuição.
§ 1.° Feitas as propostas, e concorrendo todos os Inspectores na Secretaria d' Estado dos Negocios do Reino, decidirá o Ministro desta Repartição quaes estradas se hão de começar, e com que actividade os trabalhos devam ser feitos; porque isto dependerá não só do maior estrago das estradas existentes, como da frequencia que admittirem.
§ 2.° O Governo ordenará ás Administrações Geraes que remettam á Administração Geral da Capital da Provincia a relação dos fundos provenientes de todas as contribuições, ora applicadas para pontes, vallas, estradas, ou para outras quaesquer obras que digam respeito a cornmunicações.
§ 3.° Reconhecidos assim os fundos, calcularão os Inspectores a porção de estrada, que com elles se poderá ultimar e conservar; participa-lo-hão ao Ministro do Reino, e com o seu consentimento darão começo ao trabalho, e com a maior diligencia possivel, para que essa porção de estrada em breve permitta o transito; do mesmo modo farão construir as estalagens na distancia de 5 em 5 legoas proximamente; ordenando-lhe tudo de maneira que o publico seja fiel, prompta, e aceiadamente servido.
§ 4.° As arvores serão desde logo plantadas, se a estação para isso fôr apropriada, quando não deixar-se-ha por ultimar a porção de estrada, que por ellas haja de ser occupada, a fim de se concluir em tempo opportuno.
§ 5.° Se o estado do Exercito, e circumstancias do paiz o permittir, empregar-se-hão os soldados nos trabalhos das estradas, sendo cada partido de um corpo commandado por um official subalterno: os officiaes inferiores e soldados receberão cem réis diarios sobre seus soldos, e os officiaes subalternos mais meio soldo: este accrescimo de despeza será pago pelos fundos applicados para as estradas.
§. 6.° Os partidos dos diversos corpos serão independentes entre si, e sómente subordinados aos Inspectores das Estradas.
§. 7.° Os materiaes applicados para pontes, muralhas, com portas, etc. etc. serão contractados com os emprehendedores que mais baratos e melhores os derem, e para esse fim se farão em cada Provincia os precisos annuncios; não se ultimando o contracto sem nelle concordar o Administrador Geral respectivo (isto é o do Districto em que a obra se fizer) e o Inspector.
§. 8.° Os Inspectores examinarão em dias diversos os pontos dos differentes Partidos militares, ou das Turmas de operarios paisanos, mandando reunir alguns dos ditos Partidos, ou Purmas, para verificar se os notados como presentes realmente o estão.
§. 9.° O systema de Mae-Adams será preferido, quando a difficuldade de obter pedra não fôr consideravel: em todo o caso, a porção de Estrada destinada para o transito das viaturas será a unica Mae-Adamisada, ou calçada; e a destinada para os passageiros pedestres, de terra arenosa bem calcada: na falta desta terra, será o dito piso coberto com uma camada de pedra miuda a fim de que o solo fique macio e enxuto.
§. 10.° Quando a largura das Estradas o premittir, será esta dividida em tres porções por 4 fileiras de arvores; a porção do centro será distinada para viaturas e cavalleiros, e as duas leteraes para os pedestres.
§. 11.° O Arsenal do Exercito fornecerá as ferramentas precisas, e uma forja de campanha para os seus reparos, a cada Inspector; todos estes objectos serão dados por meio de relações, e entregues ao Arsenal logo que as obras estejam ultimadas.
TITULO XII.
Da Administração dos fundos.

Art. 36.° Os fundos destinados para o fabrico das Estradas se irão buscar ao Cofre da Administração Geral mais proxima á vista das folhas das ferias, e recibos dos vendedores dos generos, umas e outras assignadas pelos Inspectores: estes titulos de despeza ficarão em poder do Thesoureiro da Administração Geral, para sua descarga.
§. 1.° Nas folhas das ferias irão incluidas as gratificações dos Officiaes, Officiaes inspectores, e soldados, empregados nos trabalhos das Estradas.
§. 2.° Um operario de confiança servirá de Pagador para os paisanos; e um Official Inferior para os militares: estes indivíduos receberão do Pagador Geral, que será um Official Subalterno, a importancia das folhas de seus respectivos Partidos ou Turmas.
§. 3.° Os Pagadores parciaes examinarão as folhas das despezas semanaes, que lhes serão apresentadas todas as sextas feiras de tarde pelos Apontadores; e achando-as exactas as submetterão á assignatura do Inspector, a fim de se irem receber os fundos no Sabbado pela manhã, e effectuar-se o pagamento nesse mesmo dia a noite. Caso porém que o tempo não permitta ultimar nesse dia o pagamento, pagar-se-ha primeiro aos operarios paisanos, e aos militares no Domingo pela manhã; vindo por este modo, a comprehender cada folha, sete dias, entrando o Sabbado da semana antecedente.
§ 4.° Logo que as Estradas se achem ultimadas-e a experiencia mostre que se podem diminuir os direitos de transito, os Inspectores o faram saber ao Ministro do Reino, para este o propor ás Cortes.
§ 5.° As contribuições e mulctas de que tratão os titulos 7.° e 8.° irão tendo logar naquelles Povos, que forem comprehendidos pelas Estradas,

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cessando então nesses Povos as contribuições actuaes: este mesmo systema se irá seguindo successivamente, até que se ache generalisado em todo o Reino.
Artigo Transitorio. - O Governo poderá contractar com quaesquer Capitalistas, apromptificação dos fundos precisos para a successiva Construcção das Estradas, hypotecando os rendimentos actuaes, designados no § 2.° do art. 35, e os futuros provenientes dos Titulos 7.° e 8.°.
§ 1.° Os contractos feitos ate hoje com emprehendores das Estradas, ficam em seu pleno vigor.
§ 2.° "As contribuições de transito, indicadas no Titulo 7.°, não serão cobradas na occasião da entrega dos Passaportes, quando o transito se houver de fazer nas Estradas contractadas; isto pelo que respeita ao caminho que sobre ellas se deve fazer; mas se a jornada fôr maior, cobrar-se-ha a dita contribuição pelo caminho feito fóra dessas Estradas."
§ 3.° "Se os fundos provenientes das actuaes contribuições por pontes, Vallas, Estradas, etc. ctc., não forem bastantes para se abrirem diversas Estradas, fica o Governo auctorisado para nomear só aquelles Inspectores que precisos forem; de modo que se uma unica Estrada se poder levar a effeito, será sufficiente um unico Inspector; nomeando-se depois os mais, á medida que houver meios sufficientes para dar plena execução a este Plano.
Sala das Cortes em 13 de Maio de 1839. O Deputado Francisco Pedro Celestino Soares.
O Sr. Sá Nogueira: - Sr. Presidente, sem fazer censura á illustre Commissão d' Administração Publica, parece-me que ella, não póde dar um parecer bem fundado, sem agregar a si algumas capacidades especiaes; em França são encarregados destes objectos homens os mais habeis em engenharia, porque é verdadeiramente a quem compete este negocio; por tanto eu proponho que á Commissão se reunão algumas capacidades desta Camara, ou até mesmo de fóra, para que com mais conhecimento possa dar o seu parecer.
O Sr. Presidente: - Queira o Sr. Deputado mandar para a Mesa a sua proposta por escripto.
O Sr. Leonel: - Para acabar já esta questão digo, que a Commissao d' Administração Publica não quer ter a presumpção de querer saber uma cousa, que na realidade não póde saber, e tem tencionado não só reunir as capacidades especiaes que ha dentro da Camara, mas até convidar algumas de fóra della. Por tanto os desejos do Nobre Deputado são justamente os da Commissão que pedirá á Camara os Membros, que lhe forem precisos, quando o julgar conveniente.
O Sr. Sá Nogueira: - Como são estes os desejos da illustre Commissão, está satisfeita a minha proposta.
A Camara resolveu que este Plano fosse remettido á Commissão d' Administração Publica.
Leram-se na Mesa uns artigos addicionaes á Lei da Congrua dos Parochos, auctorisando o Governo a fazer o arredondamento das Parochias (V. Sessão de 14 de Maio).
O Sr. Midosi: - Peço que esse additamento seja remettido á Commissão Ecclesiastica, para ella aproveitar delle alguma idéa, que julgar conveniente.
Assim se resolveu.
Tambem se deu conta d'um Projecto offerecido pelo Sr. Deputado Soure, e assignado tambem pelo Sr. Costa Cabral, para serem restituidos ao effectivo exercicio de seus logares os Juizes de 2.ª Instancia, e os Membros do Supremo Tribunal de Justiça, que pelos accontecimentos politicos depois de 9 de Setembro de 1836, os perderam (V. Sessão de 15 de Maio) - Á Commissão de Legislação.
O Sr. Lacerda: - A Deputação encarregada de appresentar a S. M. os authographos do Pojecto de Lei, que fixa as forças de terra, deu conta de sua missão, e foi recebida por S. M. com aquella benevolencia que sempre A caracterisam.
A Câmara ficou inteirada.
O Sr. Almeida Garrett: - O principio das garantias estabelecidas na Constituição, é uma colleção de promessas, que pela maior parte estão ainda por cumprir, por falta de Leis regulamentares; e então tomei sobre mim o peso de offerecer a esta Camara um Projecto de Lei, que tende a assegurar a propriedade literaria. Esta materia é inteiramente nova, e tem principios pouco communs, que por isso julguei mister fazer delles menção no relatorio que passo a lêr - e é o seguinte:
Projecto de Lei sobre a propriedade litteraria e artistica, apresentado na Camara dos Deputados, em Sessão de 18 de Maio de 1839, pelo Deputado J. B. de Almeida Garrett.
Senhores! - A Constituição da Monarchia ( ) decidiu para nós uma das questões mais controversas na jurisprudencia moderna, quando reconheceu e garantiu a propriedade litteraria.
Prestámos homenagem, á força intelléctual, ao poder do espirito, que o governo representativo é obrigado a reconhecer e a honrar, e, consagrando os direitos do pensamento, demos ainda mais vigor á liberdade de o communicar.
A muitos pareceu já, nas leis de alguns paizes chegou a ser declarado que esta não era verdadeira propriedade, porque não entra nas regras de direito commum, porque segundo as leis geraes da propriedade ordinaria não póde ser regida, porque nem a sua posse, nem, o seu uso, nem a sua transmissão, nem as acções que a defendem podem ser reguladas como as da outra. E d' aqui pretenderam deduzir que o que nós chamamos propriedade litteraria não era senão um direito de privilegio dado pela Sociedade a favor das letras que a illustram e a enriqhecem.
Certamente que dos tres grandes caracteres juridicos da propriedade commum, a perpetuidade, a inviolabilidade e a transmissibilidade, o primeiro não póde ser mantido nesta, absolutamente e sem restricção. As leis d'Hollanda rigorosamente o fizeram, mas a experiencia obrigou a revoga-las.
O espirito cria o pensamento, cria-o elle só, é só seu. Mas para que esta creação invisivel se fecunde, tome corpo, seja vista, sentida, avaliada, para que della resulte gloria, proveito ao auctor, é necessario que se communique, é preciso que os outros homens concorram; tinha a existencia intellectual; faltava-lhe a existencia physica, existencia que dá

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a palavra e o escripto, mas que é nulla e como se não fora, sem os olhos e os ouvidos, e a percepcão daquelles a quem se communica. Os immortaes Lusiadas estavam n' alma de Camões e eram já o que são; mas foi mister que se lessem, que se admirassem e estudassem, para adquirirem o valor que tèem.
Logo não basta a creação mental para fazer existir a propriedade litteraria, é precisa a concurrencia da sociedade, e d'ahi é manifesto que a propriedade litteraria fica indivisa entre a sociedade e o auctor.
A sociedade exige pois concessões pela sua cooperação, assim como o auctor as exige della, e por igual motivo. Seja inviolavel, seja transmissivel a propriedade litteraria, mas dentro de um praso determinado, findo o qual o direito do auctor cesse, e o da sociedade comece.
Tal é para uns a theoria desta propriedade especial. Outros a assimilham perfeitamente á propriedade commum, applicando-lhe a doutrina das expropriações por utilidade publica, para o ponto em que a sociedade chama a si, depois de certo periodo, a herança do auctor defunto.
Seja porem qual fôr a theoria que adoptemos, cumpre em todo o caso affastar toda a idéia de privilegio; reconheçamos o direito que a Constituição reconheceu, e deixemos o que só ficará sendo mera questão de nomes, e mais para exercitar o espirito em disputações academicas do que para formar opinião em debates parlamentares.
Mas, Senhores, a justa e solemne declaração constitucional ficará perpetuamente inutil e esteril em quanto não tivermos lei que regule direitos nos quaes não são applicaveis as regras do Codigo civil, e que as precisam tão especiaes como é especial o seu modo e condições de existir.
No antigo regimen davam-se por mercè de El-Rei, privilegios temporarios ou perpétuos que ordinariamente eram expedidos por Provisão do Desembargo do Paço a favor dos auctores, dos impressores, ou de corporações. Findo o privilegio, se era temporário, ou não o havendo, entendia-se que toda a obra impressa entrava no dominio publico, o que, vivo ou morto o auctor, com herdeiros ou sem elles, qualquer a podia reimprimir, vender, representar-se era obra dramatica, usar della em fim como cousa sua ou cousa de ninguem que tanto vale. Se o privilegio era perpetuo, ficava infeudado o vinculo para todas as gerações em detrimento da sociedade e com injuria de seus direitos.
Tal era a nossa lei consuetudinária, lei iniquase absurda que a Constituição fulminou, e que ora insta substituir por outra que seja digna do seculo e dos principios porque protestamos querer ser regidos: que não diga o mundo, ou se não confirme o que de nós tem dito já, que destruimos as leis velhas! que queremos ou não sabemos fazer as novas, e entregamos o Reino á anarchia e o fazemos desesperar da liberdade.
O zelo pelas ditas de que sou humilde cultor, do cuidado pelo credito do systema representativo, que tenho tão caro, não me fez todavia adoecer da modestia do tempo, não vos apresento uma lei improvisada. O projecto que hoje tenho a honra de propor ás Cortes, é fructo de dous annos de meditação e estudo. Colligi, collacionei a legislação de todos os paizes civilisados, procurei accommodar as suas disposições ás nossas circumstancias, hábitos e precisões. E já me parecia te-lo prompto, já, principalmente guiado pela ultima e luminosa lei de Prussia de onze de Junho de 1837, dava por completo o meu trabalho, e me tinha chegado a inscrever para o apresentar, na legislatura passada, quando me fez suspender o annuncio que recebi de França de que o Governo daquelle paiz ia propor as Camaras um Projecto de Lei de propriedade litteraria, resultado das laboriosas conferencias de uma Commissão que eu tinha visto crear em 1836, e que, sob a Presidencia, de não menor homem do que o Conde Philippe de Segur, reuníra em sabios, litteratos, artistas e jurisconsultos, o que se podia esperar n' uma terra em que o saber é tanto, e tanto se honra a quem sabe.
Todavia só no principio deste anno, e em Sessão de 5 de Janeiro, apresentou o Ministro d' Instrucção pública, na Camara dos Pares, o tão desejado Projecto de Lei, redigido com a precisão, clareza e methodo que caracterisa as leis daquelle paiz, e as fazem modelo de redacção que todos deveramos estudar, e nenhum pejar-se de imita-lo.
Sobre elle refundi de novo o meu trabalho, gloriando-me de o seguir em tudo quanto era possível.
Em toda á parte são pouco antigas as leis que mantém e regulam a propriedade litteraria. A Inglaterra sempre adiante de todos os povos no caminho da legalidade e da civilisação, só em 1710 teve a sua primeira lei sobre esta materia, no statuto do oitavo anno da Rainha Anna.
Seguiu-se-lhe a Dinamarca tão zelosa protectora das sciencias, e das letras, que por lei de 7 de Janeiro de 1741 assegurou sua propriedade.
A assembléa constituinte de França, pela lei de 13-19 de Janeiro de 1791, sómente estabeleceu os direitos dos auctores dramaticos. Dois annos depois, o Decreto da Convenção Nacional de 19 de Julho de 1793 applicou o principio aos outros todos; e por estas leis quasi se rege ainda hoje em França.
Na Hollanda é a primeira lei a de 8 de Dezembro de 1796.
A Bélgica, quando pela sua reunião á França recebeu as leis do Imperio e da republica, sob aquelloutra lei viveu, até que em 23 de Setembro de 1814 por uma Resolução Real, constituiu direito proprio, bem que d'ahi a tres annos, em 25 de Janeiro de 1817, foi por lei generalisado para todo o Reino dos Paizes-baixos.
Na Alemanha federal, o acto de Vienna de 3 de Junho de 1815, reconheceu (no art. 18) como direito geral para a confederação, o da propriedade litteraria. Confirmou-o e explicou a declaração da Dicta de 2 de Abril de 1835, e finalmente a lei de 9 de Novembro de 1837.
Muito antes porém, e em quasi todos os Estados d'aquella illustrada e vasta porção da Europa, tinha sido reconhecido e protegido este direito sagrado. Foi-o na Saxonia por Decreto de 1773; em Oldenburgo pelo artigo 416 do Codigo; em Nassau pelos Decretos de 4 e 5 de Março de 1814; em Hanovre pelo de 17 de Setembro de 1827; em Reuss pelo Decreto de 24 de Dezembro de 1827; em Anhalt Konthen pelo de 1829; em Saxonia-Meiningen pelo de 23 de Abril de 1829; em Hess pelo Decreto de 6 de Maio de 1829; na Austria pelo Codigo Civil

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do 1.° de Junho de 1811. A Prussia, que o fizera desde a primeira publicação do seu Codigo (o Codigo Frederico) de 1749 e 1751, na reformação do mesmo em 1791, e na sua correcção de 1794 protegeu sempre este direito, que por fim, na liberalissima lei de 14 de Junho de 1837, estabeleceu de modo, que j' agora lhe fica para sempre a honra de ser a primeira Potencia do Mundo que o fez dignamente, e sobre os verdadeiros principios da eterna justiça, da razão, e da verdade.
Modello de verdadeira civilisação, exemplar de justiça, inveja de povos, lição para Reis, ultima terra talvez que ainda habita a moral e o senso commum, escorrassados de quasi toda a parte, a Prussia do grande Frederico, a patria dos dois Humboldtz, d'Ancillon, e de tantas illustrações de todos os generos, neste grande exemplo que deu á Europa, n' esta iniciativa que tomou para se pôr á frente da civilisação, exhibiu novo documento da perfeição e superioridade de seu systema, que, reformando, constituindo, organisando sempre e em continuo progresso, quer chegar á liberdade politica pela civil, caminhando ao grande desiderandum das nações pela analyse tranquilla e certa, em vez da synthese dogmatica, ruidosa, e tão enganadora.
Em Baviera, também o Codigo Penal de 1813 assegurou a propriedade litteraria; fê-lo em Wurtemberg o edicto de 25 de Fevereiro de 1815, e mais efficazmente a lei de 22 de Julho de 1835. Baden o consignara em seu Codigo Civil de 1809, adoptado quasi litteralmente do Codigo Napoleão.
Não satisfeitos com as leis que herdaram da mãi pátria, os Anglo-Americanos constituiram direito mais explicito neste ponto pela Lei de 3 de Fevereiro de 1831.
Precedera-os a propria Russia com a Lei de 8/20 de Janeiro de 1830, inserta no digesto de todas as leis Russas de 1833, a mais portentosa collecção deste Seculo.
Na Italia, sei do Reino das Duas-Sicilias, em cujo Codigo de 1818 - 19 está consignado o principio, na parte IV, Liv. 2.° O Codigo civil de Sardenha de 20 de Junho de 1837, igualmente o sanccionou no Artigo 440.
Consta-me vagamente que alguma determinação ha a este respeito, e modernamente tomada, pelos nossos visinhos d' Hespanha. Lástima é dize-lo, mas não sei porque fatalidade está decretado que Portuguezes e Castelhanos tarde e mal saibamos sempre uns dos outros, e cada vez nos conheçamos menos e peior. Não me foi possivel averiguar o direito porque se rege em Hespanha nesta materia; mas não ha duvida que alli também foi reconhecido o principio hoje europeu, universal.
Algumas destas Leis, Srs, são imperfeitas, incompletas; mas por toda a parte se trabalha em as aperfeiçoar, por toda a parte, e por movimento simultaneo, e digno do Seculo, se procura assimilha-las, uniforma-las, estabelecer um direito commum e internacional, que realisando a antiga e bella utopia da universal republica das letras, quebre, ao menos para o pensamento, ao menos para a sciencia, estas portagens do feudalismo litterario, estas alfandegas do espirito, que tanto zelam os guarda-barreiras da ignorancia, fieis ainda ás tradicções do despotismo que, alliado natural e interessado da ignorancia, tremia dos resultados que necessariamente traz a livre communicação dos povos, o livre commercio das idéas, a facil permutação dos productos do ingenho.
Assegurar por estipulações internacionaes em uma grande alliança litteraria de todos os Estados civilisados, a propriedade dos auctores, destruir a piratagem dos contrafeições que roubam o suor da industria, o preço da saude, muitas vezes da vida do sábio e do artista - que amiudo tem elles pago com a vida, as grandes obras que fazem a gloria de uma nação; - affiançar-lhes, digo, este beneficio pelas mútuas concessões de todos os povos, é um dos actuaes empenhos da Europa: nem já d' outra cousa se questiona entre os generosos promotores desta grande medida, senão do melhor e mais seguro methodo, porque todos estão conformes na idéa.
A Prussia deu o exemplo na já citada e sempre louvada lei de 11 de Junho de 1837; propoz-se a França segui-lo. Nem uma nem outra com tudo fazem ainda o reconhecimento formal dos direitos dos auctores: são contractos de mútua conveniencia os que se propõem. "Era mais nobre, diz um illustre escriptor contemporaneo, commentando o projecto de Mr. de Salvandi, era mais nobre, mais digno da nação franceza, a quem pertence ordinariamente a iniciativa das resoluções generosas, proclamar altamente que a propriedade litteraria é inviolavel, e que todos os titulos legalmente adquiridos em paiz estrangeiro, são validos deante dos nossos tribunaes."
No projecto que tenho a honra de vos apresentar hoje, e que aperfeiçoado pela sabedoria da Camara, espero que ella tenha a gloria de approvar, eu segui o conselho do jurisconsulto francez. Forçada atéqui por seus estupidos governos a arrastrar-se na reta-guarda da civilisação, e a ser o escarneo de todo o seu exercito, a nação portugueza agora livre e regenerada, deve mover se com outros brios, e pela voz dos seus representantes fazer conhecer á Europa que tem sido calumniada e que ainda merece, ou que torna a merecer, o pôsto de honra que nas primeiras campanhas da civilisação lhe pertencia d' antes, quando marchava com os Pedro-Nunes, com os Garcias da Horta, com Ozorios, com Rezendes, com os Bartholomeus dos Martyres, com os Vieiras, e não ha muito ainda, com os Serras e com os Broteros, na guarda avançada de todas as luzes.
Tão grande exemplo dado por nação tão pequena, iniciativa tão generosa em tamanha questão, tomada por um povo tão calumniado, será summamente benéfica para a Europa, cujas grandes potencias se envergonharão de ficar atraz de Portugal pequeno e pobre, mas generoso como sempre foi. Não descubrimos nós o oriente para o commercio do mundo? Não levámos nós a civilisação e o Christianismo aos sertões d' Africa, não descubrimos, não povoamos nós ametade da America, formando novos imperios, novas nações que um cantinho da peninsula Iberica não podia ter a pertenção de governar e ter em tutella - senão em quanto d' ella precisasse a minoridade dos seus educandos? Mas a língua portugueza, mas a gloria portugueza ficou assim legada a muitos Séculos ainda por vir, a muitas nações solidarias hoje de seu nome e de seus creditos. E não tinham, e não podiam ter outra mira os immortaes fundadores da potencia portugueza tão acanhada em seus limites naturaes, tão vasta e immensa na largura de suas emprezas e pensamentos.

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N'estas idéas, com este prospecto, e collacionando, como já disse, as instituições de todos os povos, redigi o meu trabalho.
Dividi-o, apesar de curto e conciso, em seis titulos, para clareza e methodo.
No 1.° Titulo se define a propriedade litteraria, já consagrada no artigo 23 da Constituição, e se modifica o absoluto deste principio, limitando-o como é do interesse da sociedade, e segundo o espirito da mesma Constituição (artigo citado in prine) a trinta annos contados depois da morte do auctor.
Ampliam-se estas disposições (artigo 7.°) para promover a publicação de nossas antigas chronicas, e monumentos litterarios e artisticos. E (no artigo 9.°) se adopta do direito inglez uma regra de moralidade publica, digna d' aquella grande nação, para destituir, de todo o amparo das Leis as prostituições do talento, que offendem a honestidade, e que devem, por taes, ser postas em bando e desafforadas.
Á protecção da litteratura dramatica é cousagrado o Titulo 2.° Attento o estado de tutella, em que infelizmente precisa ainda de conservar-se o nosso Theatro seguiu-se a legislação com que Bonaparte restaurou as scenas francezas, e que mais se compadece com as nossas circumstancias.
Applicam-se no Titulo 3.° aquell' outras regras ás artes do desenho, modificando-as no que a especialissima natureza de seus productos exige.
O artigo 20.° deste Titulo declara a propriedade dos desenhos dos fabricantes; género de industria e talento, que o progressivo augmento das nossas fabricas muito requer que seja protegido. Não se tracta de novos inventos e descobertas, que lá tem Lei propria, mas das creações do desenhista, do gravador, cujos riscos não devem fazer a fortuna senão de quem lh' os pagar,. e não ficarem como em baldio commum, que quem quer aproveita sem retribuição.
Na presente Lei só era possivel, quanto a este ponto, declarar o principio; as regras de applicação deujandam formulas particulares que precisam de lei separada, e que se Deos me ajudar com a vida, me comprometto a apresentar brevemente á deliberação da Camara.
Distinguem-se no Tit. IV, os dous periodos de usar das producções musicaes, reproduzindo os sons na execução, e os signaes na imprensa ou gravura; e em ambos se affiança aos auctores desta grande arte de civilisação a sua bella propriedade.
Occupam o Tit. V as disposições geraes que excluem o fisco da successão vacante destes direitos, que em tal caso cede para o gôso público; e regulam a forma dos depositos e registos que, por interesse tanto do público como dos Proprietarios, e indispensavel estabelecerem-se.
A classificação das offensas e delictos, e das penas correspondentes nesta materia, são objecto, do Tit. VI com cujos determinados se dá sancção ao direito constituido. Aqui tambem (Art. 32) fica assegurada a regra internacional que protege as sciencias e as artes, e as letras sem distincção de Paiz, e que habilitará o Governo de Sua Magestade a abrir novos mercados, e a manter os antigos, ás producções dos nossos engenhos, que já começam a ser conhecidos no mundo, e que a Lingua Portugueza fallada hoje n' um bom quinto da terra, quando menos, e uma das linguas commerciaes do globo, vai fazendo respeitar e avaliar pelos que em menor conta nos tinham.
Srs., a materia é vastissima na sua idéa, breve e facil nas disposições que se pedem. Tractemo-la que o merece e urge. Fizeram-nos passar por bárbaros; vinguemos a affronta como é da nossa honra; appareçamos no mundo o que sômos. Presumam os governos despoticos da protecção; com que os seus Principes amparam as letras: apezar de quanto disse Alfieri, o mundo ainda os crê, ainda achaca de mesquinhos, e chatins com o talento, aos governos livres. Desmintamo-los. Não temos Mecenas que dar ao genio; temos leis que valem mais, que protegem melhor, que não deixam ao acerto do favor o cahir a protecção em Horacio - ou em Mevio, segundo variar a aura e revolver a intriga dos palacios. O juizo público, a opinião não compravel protegerá ao merito desvalído e tímido, e despirá das pennas do pavão a gralha soberba e confiada.
Devemos esta lei aos homens de letras, aos sabios: são credores avultados da liberdade. Quebrámos-lhes, sim, as thesouras censorias do Desembargo do Paço que muita vez lhes mutilavam o mais bello de seus pensamentos; sim lhes apagámos as fogueiras do Rocio que, outras vezes, lhes devoravam os trabalhos uma vida inteira, quando não ía tambem a vida no mesmo sacrificio barbaro. É certo; mas para elles, para essa familia retirada por suas occupações, tímida por constituição, acanhada por seus habitos - gente que a vulgaridade horroriza, em cuja susceptibilidade morbosa os motejos, as grossarias ferem de morte - para elles, digo, nós levantámos um pelourinho, que os atterra e atormenta, na plena liberdade que démos á imprensa, condição de vida para o Systema Representativo, e que antes soffrê-Ia desregrada e douda, do que açaimá-la, que morra e deixe morrer a liberdade. Para nós assim é, com essas condições acceitámos a vida publica, viemos voluntarios a essas lides: - mas para o sábio, Srs., -- para esses pobres velhos-crianças que no retiro de seu gabinete - (quantas vezes desconfortada trapeira em que falta o pão, e a roupa!) vivem na innocencia dos costumes primitivos, e na feliz ignorancia de nossas questões politicas, cenobitas no meio do mundo, oh! para estes o affrontoso pelourinho dos calumniadores do número, dá-lhes tracto de polé com que não podem; e a suja esquina das immundicies follicularias é cruz de affronta ern que expiram.
O fructo de tão longas vigilias, o cansado producto de tanto dia affadigoso, de tanta noite mal dormida, - o que custou febres a conceber, macerações d'alma e corpo a executar, a obra que arruinou uma organização, que levou-a mocidade das faces, a força do corpo, a energia do coração, e que a miudo deixou no sangue a heiva de morte que o levará a túmulo prematuro (talvez para ser cuspido de nescios, e espezinhado de ingratos!) - o sublimado producto de tão difficeis, e penosas operações - virá o libellista invejoso, o scriblero estupido e presumido chamá-lo á ferula de sua ignorancia, torcer-lh'o de maus geitos, babar-lh'o de suas nojentas críticas, e fazer-lhe amaldiçoar a hora em que se lembrou de honrar a patria e a sciencia!
A intriga morre, o mérito fica; a obra immortal não cabe ás mãos da ignorância malevola; bem o sei; mas o pobre auctor custou-lhe talvez a saude ou a vida: os casos nem são raros nem ignorados. Que

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importa que a posteridade stygmatise os Frèrons depois!
O asno da fabula que topou com a lyra, e a fez ressoar com o couce, cuidava que já sabia tocar, e pasmado de como tanto soube, orneará talvez de gosto se a quebrar. Assim rirá bestialmente o folliculario se der cabo da sua victima; embora o apupe depois o mundo, e lhe diga: asno, quizeste tanger, e quebraste a lyra.
- Nós que nascemos, ou abrimos os olhos sob o imperio d'estas necessidades, nós tomâmos em seu justo valor - quasi sempre negativo - o d'estes inconvenientes. Mas não assim o homem antigo, o homem da sciencia e do estudo. Poucos tem a coragem de Pope para se desaffrontar com uma Dunciada; a maior parte moe comsigo a injúria, e succumbe.
Devemos-lhes pois reparação: dêmos-Ih'a com esta lei, seguremos-lhes na rara velhice a que algum chega, na orphandade, quasi sempre temporã, de seus filhos, na precoce viuvez de suas esposas, algum preço de seus trabalhos, alguma recompensa pelas nobres fadigas que nos trouxeram aonde estamos, que nos allumiaram até este logar, em que nossa maior, nossa unica gloria é ter publicado, e sanccionado o que elles conceberam e nos ensinaram.
Por estes motivos todos, proponho o seguinte Projecto de Lei. Camara dos Deputados da Nação Portugueza, em 18 de Maio de 1839. = J. B. de Almeida Garrett, Deputado pela Terceira.
Projecto de Lei sobre a propriedade Litteraria.
TITULO I.
Dos direitos dos auctores.

Artigo 1.° O direito de publicar ou de auctorisar a publicação ou reproducção de uma obra, em todo ou em parte, pela typographia, pela gravura, pela lythographia ou por qualquer outro meio, pertence exclusivamente ao auctor durante a sua vida.
Art. 2.° Depois da morte do auctor, o referido direito é mantido por mais trinta annos a favor dos herdeiros ou de quaesquer outros representantes do auctor, conforme as regras do direito commum.
Art. 3.° O auctor poderá, sempre e em todo o caso, dispor livremente, por doação entre vivos ou por causa de morte, ou por qualquer outro modo de transmissão, d'esta propriedade, que será havida como verdadeiro pecnlio quasi castrense.
Art. 4.° O proprietario, por successão ou por qualquer outro titulo, de uma obra posthuma, gosará do direito exclusivo de a publcar ou de auctorisar a publicação d'ella, durante trinta annos contados da primeira publicação da obra.
Art. 5.° O auctor poderá ceder o direito exclusivo de publicar a sua obra, ou por todo o tempo a elle e a seus representantes concedido nos artigos antecedentes, ou por parte do referido tempo.
§ unico. No ultimo caso os representantes do auctor gosarão d'este direito somente no espaço de tempo não comprehendido na disposição por elle feita.
Art. 6.° O direito exclusivo do Estado quanto ás obras publicadas por sua ordem e á sua custa será de trinta annos contados da publicação completa da obra.
§ 1.° O direito das academias e outtos corpos Iitterarios ou scientificos quanto ás obras publicadas em seu nome e por seus cuidados, durará trinta annos contados da publicação de volume que completa a obra. Sendo collecções de memorias sobre diversos assumptos, ou de escriptos que formam collecção, os trinta annos serão contados da publicação de cada volume.
Art. 7.° O editor de uma obra posthuma anterior ao decimo-oitavo seculo cujo proprietario não é já conhecido nem os representantes do auctor, gosará do mesmo privilegio por trinta annos contados da completa publicação da obra.
§ 1.° O primeiro editor de canções nacionaes, proverbios, fabulas, contos ou quaesquer outros menumentos de archeologia nacional, atégora unicamente conservados pela tradição oral, gosarão egualmente do mesmo privilegio durante trinta annos.
§ 2.° O que reimprimir qualquer de nossos antigos monumentos litterarios scientificos ou de arte, anteriores ao meado do seculo decimo-sexto, cujas primeiras edições se tenham tornado rarissimas, gosará do mesmo privilegio durante quinze annos contados da completa publicação da obra.
Art. 8.° O editor de uma obra anonyma gosará durante trinta annos do direito exclusivo da publicação.
§ unico. Se porém declarar e nome do auctor em outra edição subsequente, ou se justificar legalmente a auctoria, o proprietario da obra entrará nos direitos estabelecidos nos artigos primeiro, segundo e terceiro desta Lei.
Art. 9.° A Lei não garante a propriedade das obras obscenas, dos libellos diffamatorios, nem de quaesquer outras composições espurias e de manifesta tendencia immoral.
TITULO II.
Das obras dramáticas.

Art. 10.° As obras dramaticas dos auctores vivos não poderão ser representadas em nenhum theatro sem o consentimento, por escripto, dos mesmos auctores.
§ 1.° As obras dramaticas posthumas não poderão ser representadas sem auctorisação, por escripto dos seus proprietarios.
§. 2.° O direito dos proprietarios de uma obra dramatica posthuma durará trinta annos contados da primeira representação da obra.
§ 3.° Intende-se por obra dramatica posthuma a que nunca foi representada em theatro publico em que os expectadores pagassem para entrar, durante a vida do auctor; ainda que, durante a mesma vida, a referida peça estivesse publica pela imprensa.
Art. 11.° No producto de cada recita theatral, depois de deduzida a terça parte precipuamente para as despezas da noite, o auctor de uma peça dramatica, original em cinco actos perceberá o oitavo dos dous terços remanescentes; se a peça fôr em quatro actos, o decimo; se fôr em tres actos o duodecimo; se fôr em dous actos, o quatorzeavo; se fôr em um acto, o dezeseisavo.
Art. 12.° O auctor de uma peça dramatica tem entrada franca no theatro desde que n'elle começam os ensaios da sua obra; e conservará o mesmo direito, se a peça se conservar no theatro, durante tres

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annos contados da primeira representação, se a dita peça for de cinco ou quatro actos; dous annos, se a peça fôr de tres actos; um anno, se fôr de um ou dous actos.
- § unico. Entende-se que se conserve no theatro a peça que tiver mais de três representações.
Art. 13.° Pelas peças traduzidas pagarão os empresarios ou directores dos theatros as mesmas quotas estabelecidas no artigo undecimo; com a differença porém que um terço da quota será pago ao traductor, e os outros dous terços serão cobrados pelo Conservatorio geral da arte dramatica, sendo um terço destinado a premios para os auctores de obras originaes, e o outro terço para formar a base de um monte-pio dramatico e musical, em beneficio das viuvas e orphãos dos artistas e auctores dramaticos e musicos.
§. unico. Fica o Governo encarregado de formar, immediatamente os regulamentos, e promover a organização de um compromisso para o referido monte-pio, ao qual serão admittidos todos os auctores, professores e artistas que quizerem concorrer com a subscripção que for arbitrada.
Art. 14.° O Conservatorio perceberá egualmente, pelas representações das peças antigas, originaes ou traduzidas que, na conformidade do artigo decimo, cessaram de ser propriedade do auctor ou de seus representantes, a metade da quota estabelecida no artigo undecimo para as peças originaes.
Art. 15.° Os pagamentos de todos estes honorarios serão feitos na propria noite da recita; e os interessados poderão examinar os registos e assentos das entradas, assignaturas e de qualquer outro meio de receita; os quaes lhes serão apresentados em continente.
Art. 16.° Depois da morte do auctor dramatico, e não havendo estipulações particulares, feitas ou com elle ou com seus representantes, toda a empresa theatral devidamente estabelecida poderá representar qualquer peça, não posthuma, do mesmo auctor, comtanto que satisfaça aos herdeiros ou representantes delle uma retribuição egual á que estava percebendo no dia de seu fallecimento.
§. 1.° O direito a esta retribuição durará trinta annos contados da morte do auctor.
§. 2.° O disposto n'este artigo por nenhum modo absolve as empresas theatraes de satisfazer as quotas devidas ao Conservatorio Geral da arte dramatica, na conformidade dos artigos decimo terceiro, e decimo quarto da presente lei.
Art. 17.° Todas as disposições dos artigos precedentes de nenhum modo são alteradas pela impressão da obra dramatica.
§. unico. Quanto á publicação pela imprensa, das obras dramaticas, os direitos dos auctores, e de seus representantes são regulados conforme o titulo primeiro da presente lei.
TITULO III.
Dos productos da arte do desenho.

Art. 18.° O auctor de um desenho, de um quadro, de uma obra de scultpura, de architectura, ou de qualquer outra obra analoga, terá o direito exclusivo de a reproduzir ou de auctorisar a reproducção d'ella pela gravura, pelo desenho, pela moldagem, ou por qualquer outro meio.
§. unico. Este direito durará toda a vida do auctor. Depois da morte, os seus herdeiros ou representantes gosarão do mesmo privilegio conforme as regras estabelecidas no titulo primeiro da presente lei.
Art. 19.° Os auctores das obras mencionadas no artigo precedente, ou seus representantes, poderão ceder o direito que lhes é garantido, conservando todavia a propriedade da sua obra; mas no caso de venderem, ou por qualquer outro modo disporem da dita obra original, o direito exclusivo de authorisar a reproducção d'ella pela gravura, moldagem, ou por qualquer outro modo, passa ao adquiridor, salvo se houver expressa stipulação em contrario.
Art. 20.° É igualmente garantida e declerada a propriedade dos desenhos dos fabricantes, que todavia será regulada por lei especial.

TITULO IV.
Das obras de musica.

Art. 21.° Os auctores de obras de musica e seus representantes gosarão, quanto á publicação de suas obras, por qualquer modo de reproducçao que seja, dos direitos estabelecidos no titulo primeiro d'esta lei; e quanto á sua execução nos theatros, ou outros logares publicos, dos direitos estabelecidos no titulo segundo.
TITULO V.
Disposições Geraes.

Art. 22.° No caso em que os direitos de que tracta a presente Lei venham a fazer parte d'uma herança vacante, não succederá n'ella o fisco; e a publicação, reimpressão, ou representação ficará livre, sem prejuizo todavia dos credores, e salvo o determinado nos Artigos 7.° e 14.° da presente Lei.
Art. 23.° Para haver de gozar do beneficio da presente Lei, o Auctor ou Proprietario da obra reproduzida pela Typographia, pela Lytographia, peIa Gravura, ou pela Moldagem, ou d'uma obra de Arte, posto que reproduzida não esteja ainda, é obrigado a regista-la pelo modo, e nas estações declaradas nos §§ seguintes.
§ 1.° Antes de se verificar legalmente a publicação da Obra pela distribuição dos exemplares, segundo é declarado na Lei da repressão dos abusos da liberdade d'Imprensa, quatro exemplares completos d'ella serão depostos na Bibliotheca publica de Lisboa, se a Obra não fôr dramactica, musical, ou não tractar da nenhuma das Artes do desenho, nem fôr producção de nenhuma d'ellas. O Bibliothecario dará immediatamente recibo da entrega, e lançará o titulo da Obra com declaração da mesma entrega, em um Livro de registo especial que para isso haverá na Bibliotheca; pelo que se levará á parte 200 reis de emolumentos; e outro tanto se levará por cada certidão que do mesmo registo fôr pedida.
§ 2.° Se a Obra fôr dramatica ou musical, ou versar sobre a litteratura dramatica ou sobre a arte musica, o registo será feito no Conservatorio geral da Arte dramatica, pela mesma forma e com os mesmos encargos estabelecidos no § antecedente.
§ 3.° Se a Obra for producção das Artes do desenho, ou versar sobre ellas, o registo será feito na

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Academia de Bellas-Artes de Lisboa, pela mesma forma e com os mesmos encargos estabelecidos no § 1.° deste Artigo.
§ 4.° As certidões destes registos serão o unico titulo legal para se provar a propriedade de uma Obra publicada, e para perseguir em juizo os contrafeitores.
§ 5.° Os Auctores dramaticos ou outros que não querendo publicar as suas Obras pela Typographia, pela Gravura, pela Lytographia ou pela Moldagem, precisarem todavia de provar a propriedade das ditas Obras, deverão apresenta-las nas mesmas respectivas estações para serem registadas, e poderem haver certidão do registo; o que se fará pela mesma fórma e com os mesmos encargos estabelecidos no § 1.° do presente Artigo.
Art. 24.° A Bibliotheca publica de Lisboa, o Conservatorio geral da Arte Dramatica e a Academia de Bellas-Artes de Lisboa, serão obrigadas a publicar mensalmente pela Imprensa os seus respectivos registos; e tambem mensalmente enviarão ao Ministerio do Reino cópia authentica d'elle. Na Secretaria d'Estado dos Negocios do Reino se formará de todos um registo geral, que no fim de cada anno se fará publico officialmenle no Diario do Governo.
Art. 25.° Aquella das três estações mencionadas em que foi feito o registo da Obra reservará para si um dos quatro exemplares, e remetterá immediatamente os outros tres ao Ministerio do Reino para d'ahi serem distribuidos, um á Bibliotheca Real, um á Bibliotheca das Côrtes, e um á Bibliotheca da Universidade.
§ unico. Sendo Obra de arte reproduzida pela moldagem, sómente se deporão dous exemplares, dos quaes um ficará na Academia de Bellas-Artes de Lisboa, e outro será remettido á Academia de Bellas-Artes do Porto.
Art. 26.° O cumprimento dos encargos impostos no Artigo 23.° de nenhum modo dispensa de satisfaxer ao que impõe a Lei da repressão dos abusos da liberdade d'Imprensa.
TITULO VI.
Disposições penaes

Art, 27.° Todo o que maliciosamente, com prejuizo dos direitos nesta Lei garantidos aos Auctores e a seus herdeiros e representantes, publicar, imprimir, gravar, representar em um Theatro, ou de qualquer modo reproduzir em todo ou em parte, sejam Obras escriptas, desènhos, pinturas, esculpturas, composições musicaes, ou quaesquer outras producções do espirito ou da Arte; já publicadas ou ainda ineditas, commete contrafeição.
§. 1.° Commette igualmente contrafeição todo o que, sem licença, por escripto, do auctor ou de seus representantes, por qualquer modo reproduzir as orações pronunciadas na tribuna ou no fôro, os sermões pregados nos templos, os discursos academicos, ou cursos oraes professados nas cadeiras dos Institutos publicos ou privados.
§. 2.° Não será reputada contrafeição a publicação dos discursos parlamentares ou judiciaes ou academicos incorporados nos extractos das sessões que se faz nas folhas periodicas.
§. 3.° A insersão de uma composição ou de uma traducção, feita com a devida auctorisação, em um jornal ou em qualquer outra collecção, não priva o auctor ou traductor do direito de a fazer publicar separadamente, salvo se houver estipulação em contrario.
§. 4.° Cartas particulares não podem ser publicadas sem o consentimento simultaneo da pessoa que as escreveu, e da pessoa a quem foram escriptas.
Art. 28.° Todo o contrafeitor será condemnado a perder, em beneficio do proprietario do manuscripto ou da edição legal, todos os exemplares da edição contrafeita que forem achados por vender no acto do sequestro, a que se procederá immediatamente, e pagará, além d'isso, ao memo proprietario o valor de dous mil exemplares, calculado pelo preço da edição legal, incorrendo outro sim em uma multa, de cincoenta a quatrocentos mil réis, a favor do Conservatorio geral da arte dramatica, da Academia de Bellas-artes de Lisboa, ou Bibliotheca pública de Lisboa, segundo a respectiva natureza da obra.
§. 1.° Se a obra estiver ainda legalmente inedita quando se fez a contrafeição, o valor dos dous mil exemplares será calculado conforme ao preço da venda das obras da mesma natureza e extenção.
§. 2.° Em caso de reincidencia o contrafeitor poderá ser condemnado, além das outras penas; a de prisão, que todavia não poderá exceder o tempo de um anno.
Art. 29.° Todo o emprezario ou director de theatro que sem licença, por escripto, do proprietario, representar uma peça dramatica, ou ella esteja impressa ou manuscripta, e todo o emprezario e director de qualquer divertimento publico que do mesmo modo fizer executar qualquer composição musical, commette contrafeição, e será condemnado a pagar ao dito proprietario, além do producto bruto da récita ou récitas que com a dita peça tiver dado, uma somma igual ao producto bruto de uma récita inteira do theatro ou logar publico em que o delicto foi commettido, e como se o dito theatro ou logar publico, estivera cheio, posto que cheio não estivesse; incorrendo outro sim n'uma multa de cincoenta a trezentos mil réis a favor do Conservatorio geral da arte dramatica.
Art. 30.° O emprezario ou director do theatro ou logar de divertimento publico que recusar pagar, aos auctores ou proprietarios das peças, ou ao Conservatorio, as quotas estabelecidas nos artigos undecimo, decimo terceiro e decimo quarto da presente Lei, e na conformidade do artigo décimo quinto, será condemnado a pagar pela primeira vez o dobro da quota, pela segunda o quadruplo, e pela terceira o annoveado; e poderá além d'isso ser condemnado a prisão, que todavia não excederá o tempo de um anno.
§ unico. Nas mesmas penas incorrerá proporcionalmente o que recusar apresentar os registos das entradas na conformidade do artigo decimo quinto. Art. 31.° Todo o que introduzir no territorio portuguez exemplares de edições contrafeitas em paiz estrangeiro, incorrerá nas penas cominadas no artigo vigesimo oitavo.
Art. 32.° Todo o auctor ou proprietario de uma obra inicialmente impressa em paiz estrangeiro, ou o auctor seja portuguez ou estrangeiro, será havido

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como natural d'estes Reinos para o fim de poder perseguir em juizo ao contrafeitor da dita sua obra, quer elle seja tambem portuguez quer estrangeiro, uma vez que o delicto fôsse commetido em territorio portuguez.
§ unico. Esta disposição sómente approveitará aos subditos d'aquelles Estados que, por Lei ou por tractados, assegurarem a mesma garantia ás obras impressas em Portugal.
Art. 33.° Todo o que maliciosamente expozer á venda uma obra contrafeita, pagará a multa de dez a duzentos mil réis; e será, além d'isso, condemnado a satisfazer á parte as perdas e damnos que forem arbitrados pelo juiz, proporcionalmente e em attenção ao disposto no artigo vigesimo oitavo da presente Lei.
§ unico. Em caso de reincidencia, além das penas referidas poderá o réo ser condemnado a um tempo de prisão que não exceda o de seis mezes.
Art. 31.° Nos casos previstos nos artigos precedentes, o culpado perderá os exemplares contrafeitos, as chapas, pranchas, modelos, matrizes, fôrmas ou quaesquer outros instrumentos do delicto.
§ unico. A parte poderá requerer ou que estes objectos sejam destruidos, ou que lhes sejam adjudicados á conta da sua indemnisação.
Art.° 35.° Todas as acções que nascem do disposto da presente Lei serão intentadas dentro de anno e dia, sob pena de prescripção.

Artigo transitorio.

Artigo unico. A presente Lei é applicavel a todas as obras já publicadas antes da sua promulgação.
§ unico. O proprietario de qualquer obra publicada antes da referida promulgação, somente gosará do beneficio da Lei, durante o tempo que falta para se completar o periodo marcado na mesma.
Ficam revogados etc.
Camara dos Deputados da Nação Portugueza em 18 de Maio de 1839. = J. B. de Almeida Garrett, Deputado pela Terceira.
O Sr. Derramado: - Eu peço a V. Ex.ª queira propor á Camara que se mande imprimir este Projecto de Lei no Diario do Governo, para que a Nação toda saiba qual é o digno presente que acaba de fazer-lhe o illustre Deputado e desde já comece a gozar da sua propriedade (Apoiados prolongados).
O Sr. Presidente: - Não sei se o illustre Deputado quer que se imprima só o projecto ou se também o relatorio (Vozes com o relatorio).
O Sr. Derramado: - Foi a minha intenção que se imprimisse tambem o Relatorio, porque nelle é que se acha o excelente preamblo - do projecto. Mandou-se imprimir no Diário do Governo.
O Sr. Alberto Carlos: - Mando para a Mesa um parecer da Commissão de Fazenda, que é o seguinte:
Parecer: - Á Commissão da Fazenda foi enviado o additamento, que o Sr. Avila offereceu á 1ª parte do artigo 1.° do projecto N.° 25, em que pede, que as dividas contrahidas nos Açôres durante a luta contra o uzurpador, comprehendendo as de faxinas transportes, e as de moeda de bronze, fiquem a cargo da Junta do Credito Publico, e que esta ficasse obrigada a mandar fazer os pagamentos dos juros nas Contadorias de Ponta Delgada, Angra, e Horta em razão de 5 por cento desde a data dos respectivos Titulos; bem como que áquelles credores entrassem em concorrencia nas amortisações que a Junta effectuasse aos mais credores a seu cargo, sem com tudo se prejudicar, qualquer outro meio de pagamento, legalmente estabelecido para as dividas passivas do Estado n'aquelle Archipelago.
A Commissão attendendo a que os Credores dos Açôres tem igual direito ás vantagens, que resultam aos do Continente pelos Cofres da Junta do Credito Publico, attendendo a que seria cauzar gravissimo prejuizo e incomodo aos credores Açorianos, sem vantagem alguma da Fazenda Publica, obriga-los a virem demandar o pagamento de seus juros nesta Capital; attendendo a que muito convem á clara e facil escripturação, que estas dividas e seus juros sejam redusidos aquantia equivalente em moeda forte; attendendo a que sobre a liquidação e fundação desta divida existem trabalhos, e Legislação especial; attendendo finalmente a que não seria methodico, nem conveniente, que a materia do additamento do Sr. Avila fosse inserida no projecto N.° 25, por ser elle relativo a pagamento, e o projecto a recepção. Julga a Commissão mais conveniente considerar de per si esta questão e apresentar em separado o seguinte
Projecto de Lei. Art. 1.° A divida do Estado, contrahida nos Açôres durante a luta contra a usurpação que tem juro promettido por lei, fica a cargo da Junta do Credito Publico, para fazez o seu devido pagamento pelos fundos da sua votação.
Art. 2.° A Junta reduzirá a divida mencionada no art. 1.° bem como os seus juros á quantia equivalente em moeda forte; e dará as providencias necessarias para que esta reducção se faça com o menor encomodo possivel dos Credores, ajudando-se para esse fim do Ministerio das Auctoridades locaes.
Art. 3.° O pagamento dos juros em moeda forte será mandado realizar nas respectivas Contadorias dos Açôres para áquelles credores que não preferirem receber perante a Junta do Credito Publico.
Art. 4.° Fica revogada a Legislação em contrario. Sala da Commissão e 17 de Maio de 1839 - José da Silva Carvalho, Alberto Carlos, Sequira de Faria, Passos (Manoel), C. M. Roma, José Joaquim Gomes de Castro, A. J. da Silva Pereira.
O Sr. Ferrer: - Por parte da Commissão de Instrucção Publica mando um requerimento para a Mesa. (D'elle se dará conta quando tiver segunda leitura).
O Sr. Guilherme Henriques: - Mando para a Mesa um parecer da Commissão Ecclesiastica, que é o seguinte:
Parecer: - Á Commissão Ecclesiastica, foi presente um requerimento dos Beneficiados da Real Igreja, e Collegiada de nossa Senhora da Conceição dos Freires da Ordem de Christo, pertencente ao Mestrado da Ordem, em que pedem, que se decida que têem direito a receber os seus ordenados com tracto successivo, remettendo-se ao Governo esta decisão para lhes pagar.
A Commissão á vista de um requerimento destituido de documentos que comprovem o allegado, não póde emittir opinião alguma sobre elle, e devendo

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existir no Ministerio dos Negocios da Justiça, os papeis respectivos á suppressão d'aquella Collegiada; é de parecer que elles se peçam ao Governo, e que conjunctamente informe sobre, o requerimento dos Supplicantes. Sala da Commissão em 14 de Maio de 1839. - Guilherme Henriques de Carvalho, Joaquim Placido, Galvão Palma, Cardoso Castello Branco, V. Ferrer, Januario Vicente Camacho, Diogo de Macedo Pereira.
Foram mandados para a Mesa os seguintes Pareceres de Commissões:
Parecer - Á Commissão do Ultramar, foi presente o requerimento do Cabido da Sé Primacial de Gôa, em que pede seja augmentada a sua congrua quasi em dobro, e dos mais empregados da mesma Sé, pelos motivos seguintes:
1.° Que percebendo o Cabido, quando a Cidade de Gôa estava no seu lustre, e era habitada de immensa população, avultados emolumentos, chegando a perceber cada um dos Conegos e Dignidades três mal xerafins: pela ruina da dita Cidade, e sua inteira depopulação, ficaram inteiramente privados, daquelles emolumentos precisos para com decóro manterem a sua dignidade, e reduzidos á mesquinha congrua, que da Fazenda Publica percebem.
2.° Que não podendo residir na Cidade, por epidémica, são obrigados a ter na Cidade uma casa, para estarem de dia, e outra na Aldéa visinha para pernoitarem, e a pagarem, além dos alogueis das ditas casas, uma embarcação, visto ser-lhes impossivel continuarem de outro modo, sem se esporem a graves doenças, sendo d'estas despezas isentos outros empregados, por poderem morar nos sitios de suas respectivas Repartições.
3.° Que tendo Sua Magestade augmentado aos empregados da Fazenda, Administração, e Justiça, os seus respectivos ordenados, por as circumstancias assim o exigirem, só o Cabido e seus empregados não tèem sido contemplados.
Pela certidão da Contadoria Geral constando perceber o Deão 1,010 xerafins, 3 tangas, 48 réis; cada uma das quatro Dignidades, 610:3:56; cada um dos dez Cónegos 510:3:56; e os quatro meios Cónegos 283:3:34 cada um: constando outro sim pelo attestado de Concelho do Governador Geral, a quem o Cabido fez presente o seu requerimento, ser veridico tudo o que o Cabido no seu requerimento allega, e que por iguaes motivos fôra augmentado o ordenado aos Officiaes da Contadoria Geral da Junta da Fazenda, quando esta existia na Cidade; e que por esta razão julgava merecer a benigna contemplação das Côrtes, e de Sua Magestade, o que o Arcebispo Primaz Eleito coroborava, na sua attestação. - Parece á Commissão, á vista do que o Cabido allega, e prova, dever merecer attenção o seu requerimanto. Mas attendendo a mesma Commissão que a receita da Fazenda de Gôa apenas pôde cobrir as despezas, havendo uma stricta economia, propõe o seguinte
Projecto de Lei. - Art. 1.° É concedido ao Cabido da Sé Primacial de Gôa, e aos seus empregados, constantes da tabella junta, o augmento da congrua na mesma tabella designado.
Art. 2.° Ficam supprimidos os logares de Mestre de Grammatica, Meirinho Geral e Aljuheiro, até agora comprehendidos no quadro dos empregados da dita Sé.
Art. 3.° Fica revogada toda a Legislação em contrario. Sala da Commissão, em 29 d'Abril de 1839. - Leonel Tavares Cabral, Theodorico José d'Abranches, Teophilo José Dias; Lourenço José Moniz; Bernardo Peres da Silva; M. Vasconcellos Pereira; Jacinto Luiz Amaral Frazão; J. P. Pestana; A. C. de Sá Nogueira (com declaração.).
Parecer. - Na Commissão de Marinha foi presente um Officio do Ministro d'esta Repartição remetendo o requerimento de seis Capitães. Tenentes da Armada que tendo sido promovidos a este Posto em 17 d'Agosto de 1837; pedem ir tomar a antiguidade que lhes compete sobre os Officiaes d'igual Patente da Promoção de 24 de Junho de 1821, na conformidade da clausula alli expressa de não prejudicarem os que fossem mais antigos.
A Commissão examinando os papeis colligiu o seguinte - Em 24 de Junho de 1821 se publicou uma Promoção extraordinaria tão sómente a favor dos Officiaes da Esquadra, que conduziu a Lisboa Sua Magestade o Senhor D. João VI, com a clausula, de não prejudicarem os que fossem maís antigos. Sem embargo desta clausula houveram reclamações, e as Côrtes Constituintes de 1821 annullaram a dita Promoção por Carta de Lei de 9 de Novembro do mesmo anno; porém reassumindo Sua Magestade o poder absoluto, revogou esta Lei por outra de 17 de Junho de 1823, e a Promoção tornou a ficar em vigor.
Duas Promoções tèem tido logar para a Armada depois da de 24 de Junho de 1821; a saber - a extraordinaria no Porto em 4 d'Abril de 1833 para galardoar, os poucos Officiaes de Marinha que faziam parte do Exercito Libertador por seus relevantes serviços e proesas em muitos combates em terra e mar, e a ordinaria em Lisboa de 7 d'Agosto de 1837 pana prehencher Póstos vagos attendendo á antiguidade e merecimentos dos Officiaes n'ella promovidos. Os Supplicantes foram deste numero, e desde 1821 estavam preteridos pelos Officiaes d'igual graduação da Promoção do mesmo anno.
Nada pois parece mais simples, como diz o Ministro, do que satisfazer ao que os Supplicantes pedem em observancia da clausula acima referida, mas o caso é na verdade muito complicado como diz o mesmo Ministro, considerando conjunctamente a Promoção de 4 d'Abril de 1833, a qual não teve, e não podia ou devia ter similhante clausula, porque teve por objecto premiar serviços especiaes na restauração da Liberdade e do Governo Legitimo, que os outros Officiaes por ausentes não poderam prestar, serviços de mais alta ponderação, do que acompanhar Sua Magestade o Senhor D. João VI no seu regresso ao Reino em tempo que estava em paz com todas as nações.
Os Officiaes desta Promoção (de 1833), por exemplo os Capitães Tenentes deviam entrar na lista por antiguidades ou escala dos da sua graduação, abaixo dos da Promoção de 1821; porque não estavam preteridos, por elles, ao passo que os Supplicantes, Capitães Tenentes da Promoção de 1837, sendo todos dos preteridos, e pertencendo-lhes, pela clausula daquella Promoção, retomar a antiguidade que lhes é devida, viriam a ficar os primeiros da escala em que eram ultimos os da Promoção de 1833, monstruosidade, que a jerarchia militar consente.
Em presença do exposto parece á Commissão que

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o modo mais justo de restabelecer a ordem sobre o objecto de que se tracta, seria revogar a Lei que revalidou a Promoção de 1821; porém como d'esta medida podem resultar alguns embaraços taes como reposição de vencimentos recebidos, e talvez necessidade de promover logo quasi todos os Officiaes da dita Promoção, por se acharem em circumstancias pouco differentes dos promovidos em 1837; a Commissão em consideração a isso, e tendo só em vista restabelecer a escala sem offensa da justiça offerece o seguinte Projecto de Lei.
Art. 1.° Os Officiaes da Armada promovidos por Decreto de 24 de Junho de 1821 contarão a antiguidade nos Postos a que então foram elevados desde 7 d'Agosto de 1837.
Art. 2.° E ta disposição terá effeito tão sómente para o que respeita á ordem da escala das Promoções ou do serviço.
Art. 3.° Fica revogada toda a Legislação em contrario. Sala da Commissão 7 de Maio de 1839. - Barão de Monte Pedral, Presidente; J. F. da Silva Costa; A. C. de Faria; L. O. Grijó; Manoel de Vasconcellos Pereira (vencido.)
Ordem do Dia. - Continuação da discussão do § 3.° do art. 5.° do Projecto sobre Foraes.
O Sr. Gorjão Henriques: - Sr. Presidente, muito pouco me demorarei, porque na verdade restão ainda tantos artigos da Lei por discutir, que a maior brevidade deve ser tomada em consideração. Refiro-me à substituição apresentàda pelo Sr. Soure para que os bens destinados para pagamento das indemnisações se vendam a dinheiro corrente; parece-me que na Sessão de hontem, alguem produzio a idéa de que os indemnisandos poderião concorrer com os seus titulos d'indemnisação, no mercado, e no acto da compra dos Bens Nacionaes, ao que o Sr. Soure, como auctor da substituição se oppoz, querendo exterminar da acção do mercado esses titulos, passados pelo Thesouro. Sr. Presidente, entre outras razões allegadas pelo illustre Deputado, auctor da substituiçào, combatendo a amplitude, que se quer dar com justiça á admissão d'esses titulos, produzio elle a razão de que se ia cahir no inconveniente, que o Sr. Deputado por Lisboa, AIberto Carlos, tinha querido evitar, de se crear uma nova moeda; eu, Sr. Presidente, não sei até que ponto possa ser exacto o dizer-se que a admissão d'um titulo de credito, passado a favor d'um individuo, equivalha á creação d'uma nova moeda, ou novos papeis de credito, um meio circulante, porque então todos os titulos de credito, que tem havido entre particulares, ou mesmo da Fazenda com particulares, que podem entrar em transações, seriam uma nova moeda (apoiados); eu estou persuadido, que o illustre Deputado não quer que se faça uma oppressão ao direito de propriedade, pertendendo excluir os donos desses titulos, que se lhes dào, de poderem dispôr d'elles, segundo a sua utilidade, ou necessidade o exigir; porque eu creio que estes titulos, assim como outro qualquer, são propriedade de seus donos, e lhes importam o direito, que tem de poderem negociar com elles a seu bel prazer (apoiados. Não é premettido de maneira alguma aos proprietarios destes titulos o poderem negocia-los por qualquer modo; com tal disposição parece ficariam então muitissimo offendidos, e lezados, porque não se podendo evitar, que elles os negoceiem com quem depois vá cobrar o seu valor, nunca se deve obstar a que seus donos negoceiem com elles na praça o preço equivalente áquelle, que tem direito a ir buscar ao Thesouro, resultante dessa mesma venda. Sem duvida que deste modo se evitão difficuldades, calcanas, e demoras, o que tambem se deve attender, porque se deve propôr quanto mais facil, e brevemeute fôr possivel, o que tão facil, e brevemente se tira a cada um (apoiado), e esse effeito de prohibição de concurso de taes titulos na compra ha de sem duvida trazer difficuldades, que induzirão esse depreciamento, que se quer evitar, e por tanto sustento, que é necessario consignar-se a determinação de que os portadores desses titulos poderão concorrer com os lançadores em dinheiro, e que elles serào recebidos, como pelo seu valor no preço das arrematações em praça (apoiados).
O Sr. Soure: - Eu propuz uma substituição a este §, e não respondo pela sua redacção, porque foi feita mui ligeiramente, e por isso é que se não entende talvez qual é o meu pensamento, este é de se pagar aos indemnisandos em dinheiro, e não em titulos; as quantias em dinheiro são representadas muitas vezes por papeis, mas estes papeis não têem credito algum no mercado, e não podem ter credito, em quanto não forem assignados por uma pessoa que o tenha, e que satisfaça as suas promessas; é por isso que eu me opponho, a que se faça agora esta promessa, porque não vejo que exista um credito, que dê valor a esses papeis para serem admittidos, e pagos pelo Governo, porque isto é o que está accontecendo com os papeis, que existem, e digo, que os papeis emmittidos pelo nosso Governo valem tanto, como cousa nenhuma (apoiados). A razão porque eu faço esta substituição, é porque não quero mais papeis, não quero que o Governo continue eternamente no descredito, em que actualmente está; é por tanto preciso, que nós entremos n'outra marcha, e para se entrar n'outra marcha mais rasoavel, é preciso fazer, o que faz todo o homem que conhecendo a importancia de ter credito, infelizmente o perdeo, e bem a ser: não promette pagar, paga logo com dinheiro; sinto muito não se achar presente o Sr. Ministro da Fazenda, de quem sou amigo; porque desejava fazer-lhe algumas reflexões a este respeito, apezar de que elle tem dito muitas vezes nesta casa que já não pagava, senão com dinheiro; já o disse; mas o descredito em que se estava, lançando papeis no mercado, que eram verdadeiramente papeis de descredito, ainda não acabou, nem podia acabar.
O que tem feito o Governo, e o que tem feito as Côrtes, até aqui? não digo só as Côrtes, digo mais todo o que tem exercido o direito de legislar, não tem feito mais do que desacreditar-se em materia de finanças. Disse-se mas não lançando no mercado muitos destes papeis já o Governo se acredita; como Sr. Presidente? Não está só a lançar no mercado muitos destes papeis, é preciso, que se leve aos portadores a convicção íntima de que esses papeis hào de ser pagos; isso é, que não ha, e assim não entendo, nem posso entender, como o Governo possa acreditar-se; um homem desacreditado ainda que assigne uma só letra, e de muito insignificante valor, não póde por isso só de modo algum ser

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acreditado, porque a ninguém persuade, que a ha de pagar. Ainda mesmo, que elle tivesse possibilidade d'isso, pela desconfiança, que todos nelle tinham. Nós temos visto, o que effectivamente tem feito o Governo? Disse o Governo quando se tratou da venda dos Bens Nacionaes; os títulos chamados azues hão de ser admettidos na compra dos Bens Nacionaes; e logo os titulos chamados azues deixaram de ser admittidos nos Bens Nacionaes! Disse depois agora hão de ser outros papeis desta, e daquella natureza, e ainda este modo de pagamento se suspendeu em pouco tempo para dar logar ao das 3 operações, papel moeda, e dinheiro: ora assim torna-se absolutamente impossível, o deixar de perder o credito e não está no poder do Governo o rehabilitar-se de credito em pouco tempo, mas está nas mãos do Governo, e nas nossas o principiar a dar passos para essa rehabilitação. (Entrou o Sr. Ministro da Fazenda). Estimo bem, que chegasse S. Ex.ª o Sr. Ministro da Fazenda, para fazer mais algumas reflexões a este respeito. O que quero, Sr. Presidente, é evitar antecipações e promessas illusorias, (apoiado, apoiado), se nós estivessemos nas circumstancias de podermos fazer promessas concordava que as fizessemos; mas já agora para isso é precisa uma longa serie de factos, ou que o Corpo Legislativo providenceie opportunamente, mas do modo em que estamos havemos nós continuar a fazer promessas? Não Sr., o que havemos fazer, é pagar com dinheiro, por isso eu não quero os titulos, para que se não obriguem os seus possuidores a ir bater á porta dos cambistas. O direito é ver se negoceia-se por meio d'uma cessão, mas isso é muito mais difficultoso, porque eu faço differença de papeis, que representam o direito, e de papeis que representam dinheiro; os primeiros não são negociaveis com a mesma facilidade, como são os segundos; e quando eu fallo em agiotas; eu entendo, que é agiota todo o homem, que negoceia licitamente em papeis de credito; e neste sentido exerce elle um genero de industria mercantil tão decorosa como qualquer outra; mas logo que ha alguma influencia para tornar verdade um papel, que na mão de outrem era mentira, quero dizer, logo que um papel, que, na minha mão se não pagaria, vai ter pagamento na mão de quem mo compra, então muda muito, e a quem assim negoceia, não lhe cabe o nome de agiota, mas outro que todos nós sabemos... Parece-me que um nobre amigo meu que já foi Ministro está offendido com algumas das minhas idéas; eu declaro que não tive a menor intenção de censurar pessoa alguma, e que conheço mesmo as difficuldades em que todos os Governantes se têem achado; eu só referi factos, que são verdadeiros, é de factos que tratei e não de pessoas, e ninguem me negará o direito de sujeitar estes factos ao dominio de minha fraca razão.
O Sr. M. A. de Vasconcellos: - Não me opponho ao que disse o nobre Deputado, em quanto á venda de uma porção de Bens Nacionaes, para indemnisar estes novos credores; mas opponho-me, e com todas as minhas forças, á idea de que os papeis de credito, que se passarem a esses credores do Estado, não possam ser admittidos na compra desses Bens Nacionaes. O illustre Deputado, que ultimamente fallou, não quer de maneira alguma, que se passem titulos de credito a esses credores; mas isto é cuidar mui pouco nos interesses d'elles; visto que se lhe não póde pagar de prompto.
Sr. Presidente: - A regra é que quem póde, paga por inteiro, e logo; e quando não póde pagar pelo menos dá uma caução ao seu credor; e caução de maneira que esse credor possa ter o recurso de valer-se d'ella, como melhor lhe aprouver, e mais conveniente for para elle. De tempos a tempos levantam-se certas idéas de favor, e também se levantam certas idéas odiosas: a idéa d'agiotagem hoje, é odiosa, mas eu não seguirei os extremos quando ella é odiosa, assim como não havia seguir os extremos em quanto ella foi favoravel. Reconheço que a agiotagem é má; mas sei também que é má, porque me faz reconhecer a existência d'uma calamidade, que a produziu. Considero a agiotagem como um effeito do atraso dos pagamentos; e se a quizer extirpar, não a heide attacar de frente, heide attacar a sua causa: (apoiados) em quanto não extirpar a causa, escuso de vociferar contra a agiotagem, porque ella ha de reviver todos os dias apesar das minhas maldições. Reconheço como o illustre Deputado reconheceo, que a agiotagem não é um meio de vida illicito, mas sei, que é um meio de vida perigoso para a virtude dos homens, que nelle se empregam; é um caminho todo de torpeços, de tentações que ultimamente vai dar n'um paradouro de grandes mizerias! mas vá ou não vá dar, não temos nada com isso; como legisladores devemos cohibir-lhe os excessos, quando for possivel, e procurar todos os meios ao nosso alcance para lhe extirpar a causa; mas querer-mos prohibir as pessoas que tem papeis de credito, que não usem delles como d'uma propriedade sua! Longe de lhes fazer-mos bem, faze-mos-lhes um mal; porque se a agiotagem apparece como effeito d'uma cauda ou d'uma calamidade publica, tenho eu tambem, que se não apparecesse, o mal havia ser muito maior para aquelles mesmos, á custa de quem se enriquesse a agiotagem (apoiados); é muito máo cortar uma perna ou um braço quando gangrenam, mas muito peior seria se não apparecesse quem o cortasse. Ora Sr. Presidente, supponhamos que se liquida essa divida a esta nova especie de credores, e se lança esse debito n'um livro que fica na mão do Governo, ou n'uma Repartição publica; não quer o illustre Deputado que se passe a esses credores um titulo que esteja na sua mão para que elles não vão talvez vende-lo a algum agiota? Mas não ficarão elles em peior estado não tendo este titulo de que tendo-o? Podem esses credores ir vender esses titulos por baixo preço; é verdade; mas quem é que tem direito de ser curador desses homens; se elles não são tidos como dementes no Juizo competente? Se elles os forem vender por baixo preço é porque esse mal lhe é menor, segundo as suas circumstancias de que o outro d'esperar pelo pagamento total d'ahi a muito tempo. E para que havemos nós privá-los desse recurso? Não acho razão nenhuma; nenhuma absolutamente. O illustre Deputado disse que não queria emissão de mais papeis; pois então entrem os bens destes novos credores para o Estado, e não se lhe passem titulos (nem se lhe promettam passar) porque logo que se lhe passarem titulos que substituam o pagamento, em quanto elle se não faz, ha uma emissão de papeis a credito; com a differença de ser uma emissão restricta á pessoa do credor, de maneira que para estes ha uma excepção,

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e excepção muito prejudicial; porque os outros credores do Estado por papeis de credito, possuem um papel, que tem uma emissão universal, quando a destes, é restricta; ora qual será a posição mais para desejar? Parece-me que é melhor a d'aquelles que têem um papel de que se podem valer em qualquer necessidade. De maneira que entendo que o illustre Deputado, na melhor fé do mundo, querendo advogar os interesses destes credores, está advogando contra os interesses desses mesmos credores. Ora Sr. Presidente, se se disser na Lei, que se separem Bens Nacionaes; que se ponham em hasta publica para serem vendidos a dinheiro, ou por papeis desta divida, estou certo que estes papeis hãode ter valor como dinheiro, ou quasi como dinheiro. Para aquelles credores, que poderem esperar pela arrematação, têem de certo um valor como dinheiro; para aquelles a quem uma necessidade os ponha nas circumstancias de se valerem delles, têem um valor mais baixo que a moeda metalica, mas entretanto têem a vantagem de, com o desconto de 5, 10 ou mesmo 20 por 100, se valerem desses papeis, e evitarem com isso que a sua familia pene de fome ou trema de frio. E para que havemos nós privar estes homens de um recurso? Nós não os obriguemos a que vendam os seus papeis, mas dado o caso que tenham uma precisão, que se possam valer d'elles como propriedade sua. Se os queremos indemnisar, devemos aproximar-nos o mais possivel á entrega da propriedade, que lhe pertence, e tudo quanto é fugir d'aqui, Sr. Presidente, é fugir á indemnisação; é fugir aos interesses desses proprios credores. Sr. Presidente, é muito bom de dizer que devemos d'aqui por diante tomar novo caminho e inspirar vida nova! É magnifico dizer, que devemos realisar todos os pagamentos em moeda metalica? Todos nós ahi dezejamos chegar, mas como o faremos no caso presente? Aqui é que hade suar o financeiro, e hade suar talvez sangue? Se nós não temos a moeda sonante para dar de prompto a estes credores, demos-lhes ao menos um equivalente, do que elles se possam valer se assim lhe aprouver, ou se suas necessidades assim lhe aconselharem. Entre tanto diga-se positivamente, que esses bens não hãode ser cromprados na praça senão com metal, ou com estes titulos, porque assim damos um valor a esses titulos equivalente ao valor do metal, e deixemos livre a cada um desses indemnisandos o direito de usarem desses titulos como as suas necessidades o exigirem ou como bem quizerem. (Apoiados).
O Sr. Roma: - Sr. Presidente, esta questão é difficil, como hão de ser sempre todas as que se não podem resolver senão dando dinheiro, ou cousa equivalente: por tanto não é de certo perdido algum tempo que se gaste em a esclarecer. Depois do que se disse a este respeito, parece-me que a Camara já está convencida de que a indemnisação de que se tracta não se pode realisar dando-se directamente propriedades de Bens Nacionaes; com effeito o que se ponderou a este respeito pareceu-me não ter resposta: a difficuldade de rectificar as avaliações: a impossibilidade em que se havia de vêr o Governo, de attender aos indemnisandos, que quizessem ao mesmo tempo a mesma propriedade; a difficuldade de attender aquelles que recusassem acceitar propriedades reputadas más, ou avaliadas excessivamente, etc.; por todas estas razões, digo, parece-me que a Camara se convenceu da impossibilidade de realisar a indemnisação com propriedades de Bens Nacionaes; aqui ha mesmo alguns Srs. Deputados, que tendo servido de Administradores Geraes, poderão dizer se lhes era facil, quando estavam no exercicio dessas funcções, rectificar os defeitos das avaliações; ora se os Srs. Administradores Geraes não podiam rectificar taes defeitos, achando-se mais proximos dos avaliadores, e das localidades, como seria possivel ao Governo rectifica-los? Não ha senão dous modos de os emendar; se a avaliação é excessivamente alta, o meio é, ou reduzir a avaliação, ou admittir uma moeda mais fraca; se a avaliação é excessivamente baixa, então a praça é que emenda o defeito; lá está para isso a hasta publica. É absolutamente impossivel que o Governo possa executar a Lei, se ella determinar que uma certa porção de Bens se dê directamente a estes indemnisandos. Convencidos os Srs. Deputados, que ultimamente fallaram sobre este objecto, da impossibilidade de se realisar por tal modo a indemnisação, apontaram diversos arbitrios. O Sr. Deputado por Evora insistiu em que a indemnisação se fizesse em dinheiro effectivo; mas contra esta opinião já eu me pronunciei, porque acho que nas circumstancias financeiras do paiz, não é possivel dar capitaes, quando se pode dar renda; o prejuizo dos indemnisandos consiste n'uma perda de rendimentos, e então se esta perda de rendimentos pode ser compensada com outros rendimentos, parece-me que a indemnisação fica realisada, embora os titulos destes rendimentos tenham no mercado um valor inferior ao seu representativo.
Di-se o Sr. Deputado por Lisboa, o Sr. Alberto Carlos, que se oppunha á indemnisação em dinheiro, ou á venda em dinheiro, de uma porção de Bens Nacionaes especialmente destinados para ella, porque estava convencido de que tal venda não se poderia effectuar; no meu entender, muito bem disse o Sr. Deputado; a experiencia já nos tem ensinado isso mesmo; já por vezes se tem querido fazer vendas só a dinheiro, e essas vendas não tem podido effectuar-se. O Sr. Deputado, que é d'opinião que a indemnisação se faça a dinheiro, disse que sempre se poderiam fazer as vendas a dinheiro, uma vez que se reduzissem as avaliações; assim será, porque não haverá edificio, que não tenha comprador por uma meia duzia de cruzados novos; porém facilmente se vê até que ponto o Estado seria prejudicado. Sendo pois evidente que se não pode fazer a venda dos Bens Nacionaes somente a dinheiro, não insistirei mais neste ponto. O mesmo Sr. Deputado por Lisboa, mostrando a impossibilidade de se fazer a venda somente a dinheiro, lembrou se de que seria conveniente a emissão de titulos, que representassem o direito dos indemmsandos, a fim de que estes titulos fossem admittidos na compra dos Bens Nacionaes separados; já se vê que o Sr. Deputado admitte esta idéa com o fundamento de querer que se facilite a venda; porém é claro que isto não pode conseguir-se senão no caso de que os titulos soffram grande depreciação; se os titulos conservassem o seu valor nominal, é certo que tanta difficuldade haveria em vender Bens por esses titulos, como em vende-los a dinheiro. Mas um grande agio no preço dos titulos seria um desfalque no capital da indemnisação, seria uma fraude motivada pela Lei; e eu não quereria, por modo algum, que essa fraude tivesse logar; por

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isso indico o meio de fazer a indemnisação com titulos de juro; e não se diga que esses titulos tambem soffrem agio, porque eu não considero aqui o capital, considero que a indemnisação é de renda, dá-se uma renda por outra renda, e nada mais.
O Sr. Deputado por Aveiro, que sinto não vêr presente, disse hontem que tinha um orgão anti-agiota; eu tambem o tenho, com a differença que o Sr. Deputado vai por um caminho, e eu vou por outro: o Sr. Deputado entende que o modo de acabar os agiotas é dar-lhes golpes mortaes, e eu entendo que o modo de os acabar é fazer com que os pagamentos se façam pontualmente em dia; e por isso hei de sempre pugnar, com todas as minhas forças, para a reducção das despezas publicas, e para o augmento da receita: eu não quero matar a agiotagem matando os agiotas a golpes de espada, quero matar a agiotagem na sua fonte, como muito bem disse o Sr. Manoel Antonio de Vasconcellos. Já se vê por tanto que eu me opponho á emissão de papeis, e neste caso especial opponho-me formalmente á emissão de titulos, que representem o direito dos indemnisandos. Diz-se que podem não se passar esses papeis, e que basta que se façam declarações em um livro; em lal caso sempre se ha de poder tirar uma certidão desse livro, e com ella, acompanhada de uma procuração, se poderá transferir aquelle direito. Parecerá que estou em contradição, quando proponho que se dêem aos indemnisandos inscripções de juro e lhes nego os titulos. É preciso que nós, primeiro que tudo, nos empenhemos em acabar com os titulos de divida, chamada fluctuante; estes é que offerecem uma margem immensa para a agiotagem; quanto mais golpes se derem no credito, mais depreciados serão os papeis, maior será a differença entre o seu nominal, e o seu valor na praça, e é nesse largo campo que os agiotas colhem grandissimos lucros: supponha se que uns papeis valem 10 por cento, basta que haja uma subida de 1 por cento no nominal para haver um lucro de 10 por cento do capital empregado; assim é que se ganham immensissimas sommas: não se desacreditem, nem se offendam as medidas financeiras, uma vez tomadas, por que isso é que concorre para o descredito da Nação, isso é que dá alento ao agiotismo. Quanto aos papeis com juro, não têem o mesmo perigo; as inscripções de juro, por exemplo param na mão de pessoas que as querem conservar para terem uma renda; são muito insignificantes as transacções que se fazem entre nós em papeis de juro; se não houvesse outros não haveria uma só loja de cambio em Lisboa. Opponho-me á emissão de titulos que representem as indemnisações porque necessariamente esses papeis hão de ser depreciados no mercado, e não me opponho á emissão de inscripções, porque se dá assim uma renda por outra renda, que se perdeu.
Tem-se demonstrado a impossibilidade de verificar as indemnisações directamente em bens, e demonstrado está tambem que nem é possivel vender os bens a dinheiro, nem é conveniente fazer uma emissão de papeis; estou pois firme na minha opinião, e entendo que não ha outro meio de fazer a indemnisação, que seja nem mais justo, nem mais conveniente, nem mais politico, do que o da emissão de inscripções de 4 por cento. Ora quanto á separação de Bens Nacionaes para se venderem, de qualquer modo que seja, a fim de ser o seu producto applicado ás indemnisações, entendo que é indespensavel que o Sr. Ministro da Fazenda diga a sua opinião; porque são tantos os modos, por que se tem disposto dos Bens Nacionaes, que eu tremo de que caiamos em uma cousa que no foro civil tem um certo nome; creio que o Sr. Ministro ficará muito satisfeito se lhe tirarem as difficuldades que sobre S. Ex.ª pesariam, se as indemnisações fossem feitas em Bens Nacionaes; mas é preciso que se declare, sobre a separação de uma porção de bens, para serem vendidos, a fim de se realisarem as indemnisações com o seu producto. Eu voto por que se façam por meio de inscripções de 4 por cento.
O Sr. Gorjão Henriques: - Sr. Presidente, eu ouvi fallar novamente o illustre Orador, auctor da substituição, e que rejeita a idéa de serem admissiveis no acto da compra os titulos, que se passarem, aos indemnisandos, mas em verdade nada produsio, que podesse abalar a opinião, que sustenta o contrario; ouvi tambem que o illustre Deputado por Lisboa o Sr. Manoel Antonio de Vaaconcellos, que fallou antes do ultimo Orador desenvolveu perfeitamente a mesma idéa, que eu tinha emittido. O que eu collijo ainda agora, é que o iIlustre auctor da substituição creou um gigante para o combater, por quanto ninguem fallou em emissão de novos papeis, como moeda, como excogita o illustre Deputado, mas S. S.ª não pòde duvidar, de que se havia de passar um titulo aos indemnisandos, e entào dado este caso, como concebe S. S.ª que seu dono seja inhibido de o poder alienar de qualquer modo, que lha convier? (apoiado) Triste cousa seria privarmos por esta Lei tantos cidadãos de suas propriedades, e dessa compensação, que se lhes dá, não os deixar ser senhores, para della poderem dispôr, e na verdade é nova, inteiramente nova a lembrança do Sr. Deputado por Evora, auctor da substituição, pertendendo uma especie de matricula no Thesouro, por onde se averbem sómente os nomes dos credores, e as quantias do seu credito, negando-se-lhes com tudo o titulo, para elles assim os não poderem negociar; em verdade muito é querer extender o beneficio, dando uma tutella, e uma curatella a esses imdemnisandos, que parece se querem redusir a pupillos, ou a dementes, pois se Ihe nega a livre disposição do que é seu. (Apoiado).
Ora o Sr. Deputado por Leiria tambem negou que pela admissão de taes titulos no acto da compra se facilitasse a venda dos bens, e eu digo o contrario, e porventura explico exactamente o dito do Sr. Alberto Carlos, que o Sr. Deputado por Leiria não intendeu; digo sim que admittindo-se esses titulos se facilita a venda, porque seus donos que não poderiam talvez apromptar dinheiro, virão com tudo afrontar os lançadores, sabendo que podem pagar com esses titulos. (Apoiado). O illustre Deputado disse tambem que poderia acontecer que um homem tivesse um titulo, por exemplo de 1:000$000 de réis, e que lançasse em uma fazenda de 500$000 réis, e que então tinha de vender esse titulo, para pagar os 500$000 réis e que isto o obriga a depreciar esse titulo para obter esse dinheiro; Sr. Presidente onde está a difficuldade? (uma voz - não disse tal) Bem; mas nada mais facil do que dar-se uma hypothese tal, que dada ella a alguem faça duvida, mas nada mais facil do que fazer averbar no Thesouro a quantia já amortisada, ficando o titulo subsistindo

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pelo resto, para entrar em outra qualquer arrematação, ou para os bens que seu dono lhe quiser destinar. Á vista disto creio que ainda procede a justiça e a utilidade de se consignar que esses titulos de indemnisação entrem em concurso com o dinheiro na venda dos bens destinados para taes pagamentos. (Apoiado).
O Sr. Presidente. - Mas na Mesa não ha proposta para esse fim.
O Sr. Gorjão Henriques: - A discussão hontem versou sobre estas idéas, pensei que já teria sido offerecida com o additamento, mas visto que ainda o não foi eu mando para a Mesa este additamento á substituição do Sr. Soure, e é o seguinte.
Additamento. - Que no additamento do Sr. Soure ás palavras a dinheiro, se junte: ou a esses titulos, que se derem aos indemnisandos por concorrencia na praça.
O Sr. Sá Nogueira: - Sr. Presidente, eu não fazia tenção de fallar sobre esta materia, porém quando ouvi o Sr. Deputado não pude deixar de pedir a palavra, para combater as idéas que S. S.ª apresentou, querendo que isto se faça por uma simples proposta sem ser considerado pela respectiva Commissão, pertendendo-se assim prejudicar projectos da mais alta importancia, projectos geraes de fazenda; na Commissão de Fazenda devem estar projectos do Governo, talvez na mesma Commissão haja algum que diga respeito á maneira de considerar o destino que hão de ter os Bens Nacionaes, e então como se pertende propôr já o modo de dispôr desses bens? Embora se diga, ou o diga o Sr. Deputado por Lisboa, que as indemnisações não são muito grandes, porque eu poderei responder ao Sr. Deputado, que não tem dados nenhuns para dizer cousa alguma a este respeito; eu tambem os não tenho, mas talvez tomando por baze o que se sabe a respeito da importancia dos foros dar Ordens Religiosas, talvez que essas indemnisações montem no seu capital a mais de quatro mil contos; porque se não estou enganado, e alguns Membros da Commissão terão a bondade de verificar se a minha asserção não fôr exacta, a importancia em que estavam avaliados os capitaes dos foros, andavam por quatro mil e tantos contos; parece á primeira vista que nós não temos nada a fazer com esta questão, tem muito que fazer digo eu, porque sem duvida a maior parte dos foros que pertenciam ás Corporações Religiosas eram provenientes de foraes, e não é para admirar que esta somma seja igual á dos foros que estavam nas mãos dos Donatarios. Eu vejo que alguns Srs. Deputados se riem desta minha asserção, e eu posso rir-me tambem, porque nunca aprendi a fazer calculos sem dados, nem pude resolver problemas sem elles; a Commissão de certo não os tinha, e por conseguinte não póde dizer nada; comtudo ouvirei o Sr. Relator para me esclarecer, se é que estou em duvida.
O Sr. Seabra: - O Sr. Deputado está fora da especie, tem em vista outro caso; nós queremos indemnisar alguem que houvesse da Corôa certos direitos comprehendidos no Artigo 5.º por titulo de compra ou troca; não se falla de foros, nem de outra alguma especie, é só d'esta; eram estes direitos assim comprados propriedade particular, e ficando elles pela sentença geral da Lei abolidos, era indispensavel dar-lhe uma indemnisação, isso limita-se a muito poucos individuos, e não tem nada com a especie aquillo de que o Sr. Deputado tem fallado, porque não temos a indemnisar os foros, que por foral pertenciam ás Ordens Religiosas, porque esses já estão na Corôa, e a Corôa não tem a indemnisar-se a si mesmo; podia dizer mais alguma cousa, mas não quero interromper o Sr. Deputado.
O Sr. Sá Nogueira: - Sr. Presidente, vejo que o Sr. Deputado esclareceu a questão, mas ainda assim tracta-se de um ponto importante, porque eu conhecendo poucas casas, conheço algumas que a maior parte dos seus bens são provenientes d'essa origem, logo não se dá uma insignificante indemnisação como os Srs. Deputados a tem considerado.
Sr. Presidente, eu repetirei o que já disse n'outra occasião um Sr. Deputado, Membro da Commissão de Fazenda, os Bens Nacionaes estão applicados a uma immensidade de encargos; mesmo as Côrtes Constituintes applicaram os Bens Nacionaes a muitas cousas, nem eu me lembro a quantas; foi uma immensidade de encargos. Ora agora, como é que se quer dispôr de alguma parte desses Bens, sem se saber a quanto monta a sua importancia, e á quanto monta a importancia desse encargo; que calculo se fez? que calculo fez a Commissão! que calculo fez o Sr. Deputado, que fez a proposta? nenhum: por consequencia isso para mim era motivo sufficiente para regeitar a proposta do Sr. Deputado. Disse-se que nós devemos seguir o systema, que se tem seguido até aqui, que era fazer promessas e não as cumprir; o Sr. Deputado quer que se prometta pagar a dinheiro: isto é muito bom, eu estimaria muito que se podesse fazer; mas calculou o Sr. Deputado o dinheiro, a somma necessaria para pagar essas indemnisações? Calculou o Sr. Deputado ou indicou a origem dessa medida? onde havemos de ir buscar esse dinheiro? Falla-se dos Bens Nacionaes, como disse o Sr. Deputado por Leiria, como se fosse uma mina inextinguivel, como as minas de Potosi. O Sr. Deputado propoz que se pagasse em dinheiro; mas como não indicou meios de realisar esse dinheiro, porque os que indicou de certo não são sufficientes, pelo menos não tem uma base segura; o que succederá, se se adoptasse a sua proposta, será arriscar o Governo a ver-se na necessidade de seguir o mesmo systema de não cumprir as promessas, por não as poder cumprir; porque é bem entendido que ninguem é obrigado a fazer impossiveis. Que importa que se diga ao Governo que venda os Bens Nacionaes, que realise dinheiro e pague aos prejudicados, se o Governo tractando de vender os Bens Nacionaes, e precisando de mil contos, não acha se não 60 contos! Qual ha de ser o resultado? O Governo não tem o dinheiro sufficiente para isto, e por consequencia não póde ser satisfeita esta importancia, não podem os indemnisandos ser indemnisados.
Por consequencia em logar de adoptar um systema de verdadeira decepção, é melhor não prometter nada, do que promettermos e arriscar-nos afaltar.
Sr. Presidente, a primeira cousa em que nos devemos empenhar é não tractarmos por incidente de materias tão importantes, como são os negocios de Fazenda, que vão prejudicar muitas vezes o systema geral da Fazenda, e as vezes um que se deseja seguir. Ora vamos a esse systema; qual é o systema que havia a seguir? O Sr. Presidente apontou para os Ministros, e apontou para a Commissão de Fazenda. A Commissão de Fazenda das Côrtes Constituintes

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não teve receio de incorrer no odio fosse de quem fosse, e propoz tributos para occorrer ás despezas publicas, porque vio que a causa de todas as revoluções e da instabilidade do paiz, era o não se pagar a quem se deve; é uma das causas principaes, não digo a unica. Como é possível fazer o serviço publico sem se pagar a quem serve? Como havemos de mandar um official, como eu disse no outro dia, que foi d'aqui um meu conhecido para as Provincias, e que querendo realisar dinheiro para cumprir as ordens do Governo, rebateo os seus soldos a 50 por cento. Qual o resultado disto? chegar occasião em que officiaes, mandados para um serviço, respondam ao Governo, que querem obedecer mas não podem; o resultado é a falta de di-ciplina, falta de serviço, e o resultado da falta de serviço é a anarchia, a desordem e a não observancia das Leis.
Por consequencia, Sr. Presidente, a primeria cousa de que devemos tractar é de obter meios para pagar as despezas, que não podem deixar de pagar-se. Por ventura ignora a Commissão de Fazenda, que temos um deficit, que no Orçamento se chama deficit corrente, que importa em 7500 contos, que não são só 7500 contos, e appello para o Sr. Ministro da Fazenda, porque se conta no Orçamento com a divida do Brasil, e quando virá esse dinheiro? é preciso attender a tudo. Ora bem, não sabe a Commissão de Fazenda que ha este deficit de 7500 contos, que eu digo que é maior, e deficit de que? de despeza corrente, que não póde deixar de ser paga, porque é divida aos empregados publicos e divida aos empregados militares, a todos os servidores do Estado. Não sabe a Commissão de Fazenda, que ha um deficit da despeza ordinaria do Estado para o anno economico? O Sr. Ministro da Fazenda apresenta no Relatorio do seu Orçamento um deficit de 3 mil e tantos contos; e que se tem feito para occorrer a isso? nada. O que havia a fazer? é preciso não nos illudirmos uns aos outros; eu sou tambem advogado da economia, hei de votar por toda a economia possivel; mas por maior que seja ella poderá chegar para cobrir esse deficit de 7500 contos? Supponhamos que chega para metade; não resta ainda tão grande deficit? Então porque se não tracta disso? não sei; porque alguns Projectos existem na Commissão, que certamente não são sufficientes; creio que ha por exemplo na Commissão de Fazenda um Projecto, que o Sr. Ministro da Fazenda apresentou para tornar realisaveis 120 contos, que se votaram na Sessão passada, e que se fez? estamos reunidos ha cinco mezes, quero dizer, está reunida esta Camara ha cinco mezes, e não se tem tractado disso; por consequencia já se têem perdido 50 contos, depois que as Côrtes estão reunidas, que é o que corresponde aos cinco mezes, em que nada se tem feito.
Sr. Presidente, vi-me obrigado a fazer esta diggressão, por que vi o Sr. Deputado de algum modo accusar-me, como Membro da Commissão de Fazenda do anno passado, e por isso me vi obrigado a responder.
Esta questão é muito seria; é preciso que a Camara entenda, e se desengane por uma vez que é preciso vêr o estado das nossas finanças, ver o que devemos, o que temos, e o que podemos ter, quero dizer, os impostos, o lançamento, e o melhor meio de os arrecadar, porque sem isso nada se faz; e então, ainda digo mais, que sem isso se fazer seriamente, não é possível haver Governo nenhum em Portugal, seja a fórma do Governo qual fôr, ou absoluta ou constitucional; não é possivel viver assim.
Agora, Sr. Presidente, limitando-me a responder ao Sr. Deputado por Evora, direi que não é exequivel a proposta de S. S.ª, porque não é possivel que os Bens Nacionaes, que restam depois de vendidos, aquelles que já tèem uma applicação especial, cheguem para satisfazer todos esses encargos, e por consequencia voto contra a proposta do Sr. Deputado, e proporia que, visto o § 3.º em discussão, ter relação com o que se ha de decidir a respeito do § 2.º e 1.º, que já foram remettidos á Commissão com os respectivos additamentos, pedia que elle fosse tambem alli mandado para ser considerado, mas ouvindo a Commissão de Fazenda.
O Sr. Passos (Manoel): - (Este Sr. Deputado não tendo podido rever o seu discurso, será publicado em apendice em uma das Sessões seguintes, referindo-se á pagina, e columna, em que devia ser collocado nesta Sessão.)
O Sr. Soure: - Sr. Presidente, em quanto á minha substituição disse-se que não era possivel adoptar-se, por isso que os Bens Nacionaes estavam applicados a differentes encargos, e já se não podiam tirar para este fim alguns desses bens; se esta duvida procede, não é a respeito da minha substituição, mas sim contra o parecer da Commissão, porque é a Commissão que propoz a indemnisação por meio dos Bens Nacionaes, eu já disse que me tinha servido desse meio para secundar a opinião que eu via que mais geralmente vogava na Camara.
Ora agora, eu referi, para razão do descredito dos nossos papeis, assignados pelo Governo, referi, digo, factos que importavam a falta de cumprimento de promessas; disse logo que não me referia a pessoas, nem a Administração alguma, porque eu reconhecia as difficuldades em que se tinham achado essas Administrações, mas que os factos, e ninguem me podia privar do direito de eu os analysar; parece-me que o Sr. Deputado, que acaba de fallar sentindo-se ferido pelas minhas expressões, teve menos razão em me fazer allusões, e allusões odiosas; eu Sr. Presidente, disse voltando-me para o Sr. Deputado, que era seu amigo; que eu não queria attribuir nem lançar censura em pessoa alguma, e que só fallava de factos; mas o que fez o Sr. Deputado? Fez-me allusões, e allusões odiosissimas; e que não vinham em cousa alguma para fundamentar os seus raciocinios; eu Sr. Presidente, como Deputado, tenho sido sempre consciencioso nesta Camara, e tão consciencioso nas minhas votações, como o Sr. Deputado tem sido e como foi na Administração Geral do Paiz, em que tomou parte; pois, Sr. Presidente, por eu votar por uma medida para a conversão de fundos em certa época, com a clausula de que a divida Nacional não havia de ser augmentada, emitti eu um voto menos consciencioso, emitti por ventura uma opinião que fosse prejudicar a Nação?!... Não Sr., e de mais votei conforme entendi, votei conforme a minha convicção, e ainda hoje estou persuadido que se o meu voto, que fez parte do da maioria da Camara foi preenchido exactamente, a Nação não foi prejudicada, nem o podia ser por meio de uma similhante resolução; (apoiados) então

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a que preposito vem o Sr. Deputado fazer essa allusão? A que preposito fez outra, cujo facto me parece que não póde provar?.. Disse o Sr. Deputado que eu tinha votado pela emissão dos titulos azues, e para elles serem apresentados como dinheiro corrente na compra dos Bens Nacionaes; parece-me se me não engano, que ainda que fiz parte da maioria da Camara de 34, o Sr. Deputado, não me póde provar que eu votasse de similhante maneira; não sei se votei com toda a certeza; mas parece-me que não me achava nessa occasião na Camara, mas se votei acho que seria em sentido contrario.
O Sr. Deputado que acabou de fallar querendo combater a minha asserção veio justifica-la cabalmente; S. Ex.ª apresentou um longo catalogo de promessas não cumpridas por todos os Governos; e eu havia dito, que o descredito actual era em virtude de se não terem comprido as promessas, e em virtude da oscillação politica financeira em que tem estado o nosso Paiz; de maneira que o Sr. Deputado querendo responder-me, não fez senão ratificar a minha opinião; mas agora, Sr. Presidente, que não errassem os membros das Administrações que tèem precedido a actual, isso não ha de provar, o Sr. Deputado; então em que fiz eu injuria a alguem? Nem mesmo me servi da palavra errar, mas sirvo-me agora por que o Sr. Deputado me auctorisou. Todas as Administrações tem errado, e hão de continuar a errar, por que os homens são sujeitos a erros, e é de homens que ellas são compostas. Disse se que não se queria prevenir a grande questão financeira, mas entretanto preveniu-se e trouxe-se á discussão a maneira de nós sahirmos dos embaraços em que nos achamos; então como o Sr. Deputado ennunciou a sua opinião a este respeito dir-lhe-hei tambem qual é a minha para que elle não fique em duvida; a minha opinião, Sr. Presidente, é que nós podemos sahir das difficuldades em que nos achamos a respeito de finanças, por dous meios: 1.° economisando as despezas do Estado. 2.º augmentando meios - e como, Sr. Presidente? Por impostos honra seja feita á Assembléa Constituinte, que em quanto a mim fez um serviço eminente ao Paiz; encarando a questão pelo lado capaz de de nos salvar no estado em que nos achamos; a questão d'impostos, sem os quaes nós não podemos viver como Nação; é d'impostos que hoje em todos os Paizes civilisados se sustenta a força publica, e é por isso que eu ainda agora alludindo ao meu nobre amigo o Sr. Ministro da Fazenda disse que sentia, e digo ainda que sinto, que me magôa no fundo do meu coração, o S. Ex.ª ter apresentado n'esta Camara a opinião de que a Nação não podia pagar mais; eu sou um pequeno proprietario, mas sou proprietario; sou um pequeno lavrador, mas sou lavrador; posso fallar desapaixonadamente, porque ainda que tambem sou empregado publico, digo que quero reducções, e digo que quero impostos, e quero impostos porque só d'impostos é que póde viver o Estado, e nós havemos necessariamente precipitar-nos uma vez, que não haja impostos...
O Sr. Presidente: - É necessário entrar por uma vez na questão; (apoiados) nós estamos discutindo um § por dia; se continuamos assim é impossivel chegarmos ao fim da Lei; (apoiados) peço perdão ao Sr. Deputado de o ter interrompido, mas julguei do meu dever fazer esta observação.
O Orador. - eu cedo de muito boa vontade; mas V. Ex.ª ha de reconhecer que eu fui levado a esta questão agora porque fui d'alguma maneira provocado; então resumindo-me eu sustento a minha substituição, e não fallo mais para acceder á vontade de V. Ex.ª.
O Sr. Monjz. - Sr. Presidente, a hora está quasi a chegar: não me cançarei no mar das recriminações: o menor mal que disso nos póde vir, é o de com ellas perdemos uma sessão quasi toda como hoje nos tem acontecido, (apoiados), quero fazer só uma ou duas reflexões que me parece poderem servir d'alguma utilidade ao menos para minha propria illustração. Eu, Sr. Presidente, já votei pelo principio sagrado da indemnisação, e concordo com aquelles de meus collegas que consideram essa indemnisação como tendo por objecto, satisfazer a uma expropriação; tendo ella este objecto, parece-me que o modo de pagamento mais concorde com esse caracter é o a dinheiro; mas para esse fim sinto eu muito não ter presente para me poder guiar um calculo ainda que fosse aproximado do quanto será necessario para satisfazer a sua importancia; tenho ouvido a alguns Srs. Deputados mais illustrados na materia que isso não será muito; porém este não ser muito, é sempre relativo; o que não era muito antes dos bens nacionaes estarem tão onerados póde nas actuaes circumstancias delles ser mais que muito. A intenção da Commissão e de muitos dos Srs. que tem fallado é que ou se dêem estes bens em pagamento; ou o seu valor a dinheiro servindo elles como hypotheca da promessa até a solução della: ora V. Ex.ª sabe que os bens nacionaes já estão presos por tantas hypothecas, e envolvidos em tantas obrigações, que ao ser muito o que se precisa para mais esta; talvez que tudo se torne em uma decepção.
Ha ainda outra razão porque eu desejaria saber o que indico, e é porque se forem muitos os bens de que se precisa, será difficil vende-los a dinheiro sómente, a não ser a pequenas prestações, o que será mui longo.
O Sr. Deputado por Evora no seu discurso de hontem avançou que os Bens nacionaes estavam quasi todos vendidos; e que se a maior parte se tinham vendido, não haveria receio de vender a menor porção que resta. Mas o Sr. Deputado não advertio que essa maior parte não se vendeu só a dinheiro: pelo contrario, as porções que se tèem tentado vender a dinheiro, tèem sempre encontrado grandes difficuldades; e sem longos prasos de pagamento, tem sido inexequivel. Mesmo antes da restauração era sempre mui difficil vender grandes massas de bens a dinheiro á vista, ou a prestações avultadas e a pequenos prasos de tempo. De alguma provincia sei eu onde nunca se póde effectuar venda importante, a menos de dez annos, e nem assim se póde vender a totalidade dos bens adjudicados á Fazenda Publica. Por estas razões quando se adopte a venda a dinheiro desejava eu que o modo quanto o ser á vista, ou a prestações, não se incluisse neste § porque isso póde causar grandes embaraços á venda; e tornar a lei inexequivel.
Taes são as reflexões que tinha a fazer sobre esta materia, e concluirei instando porque se apresente, se é possivel, o calculo dos bens necessarios para as indemnisações; e se entenda que o modo da venda a dinheiro não fica determinado neste §.

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O Sr. Alberto Carlos. - Sr. Presidente hoje é um dia curioso para mim! tenho recebido no mejo desta discussão corôas de rozas, e ao mesmo tempo corôas d'espinhos! já se sabe que todas ellas tèem vindo fora da ordem porque a discussão tem andada inteiramente desvairada do seu verdadeiro objecto; mas antes de agradecer aos que me coroaram, fallarei da questão.
Se se quer fazer uma verdadeira indemnisação entendo, que o additamento do Sr. Soure não póde passar tal qual está; porque salta a todos os olhos, que a venda a dinheiro não é praticavel, sem outros accessorios: eu já indiquei o meio que me parecia rasoavel, que era mandar admittir como dinheiro, o titulo ou documento que se passar aos prejudicados da quantidade dos seus prejuizos; é dando-lhe ingresso na praça a par do dinheiro; em tal caso é muito provavel, que haja quem queira os bens; d'outra sorte é impossivel; O Sr. Gorjão já mandou para a Mesa uma emenda no sentido da minha indicação; e por conseguinte espero que a Camara a approve, d'outra sorte faremos vans, e illusorias promessas de indemnisação. Agora em resposta ao que disse o Sr. Moniz, de certo não é possivel satisfazer-lhe, como elle deseja. Eu creio que a soma das indemnisações não será consideravel depois de feitos os encontros que votamos no §. 2.°. São conhecidos alguns casos de venda desses direitos, mas pela maior parte não costumava a Corôa fazer muitas destas alienações, e julgo, que quando mais tiveram logar foi por occasião da extincção dos Jesuitas; por outro lado os direitos dominicaes, alienados a retro aberto; como erão quasi todos esses contractos, devião ser alienados por muito baixo preço, e havendo de fazer-se a indemnisação pelo que custaram, é evidente, que esta circumstancia fará muito menor a sua quantia; alem de que ainda que se fizesse nova avaliação pelo que hoje custarião, certamente seria modica; porque havia de regular-se pelo que actualmente se cobrava; e isso estava muito reduzido, pela resistencia que os póvos lhe farião. Entretanto tudo isso são hypotheses, e persuações, que se não podem circumscrever a esta, ou aquella quantia fixa, nem por aproximação.
Quanto á difficuldade que se tem achado na admissão de novos papeis para o mercado julgando-se isso uma calamidade, parece-me que não tem havido muita coherencia nestas proposições nem se falla com verdadeiro conhecimento de causa. Em geral uma grande quantidade de papeis, de credito no mercado, póde reputar-se um mal, em quanto alimenta a agiotagem, que é um verdadeiro flagello, não só porque especula sobre a maseria dos credores do Estado; mas principalmente porque distroe os Capitães das emprezas agriculas, industriaes, e de Commercio; que são verdadeiramente as que podem dar productos á sociedade; e augmentar os seus Capitaes; mas tambem ha casos em que os papeis de credito têem sua utilidade, ou para facilitar a circulação dos valores, ou principalmente para facilitar as transações, e a alienações de certos fundos; ou para adiantar o gozo de certa renda, que sendo segura, tem ás vezes demoras na arrecadação etc. Mas tudo isto é obra digna de mais profundo exame; e parece-me que uma reprovação total de papeis nem é justa, nem os que a fazem tèem exacto conhecimento de todas as especies, e circumstancias, que reprovão. Tambem eu disse, que não houve coherencia neste modo, nesta rejeição, e nisto me refiro principalmente ao Sr. Deputado por Leiria, o Sr. Roma, que mostrando agora tanto receio destes papeis, se esqueceu, de que hontem, ou antehontem assignou um parecer, que a Commissão de Fazenda mandou para a Mesa, para que aos credores das extinctas Corporações, se passassem titulos admissiveis na Compra dos bens Nacionaes, pela importancia dos seus creditos! (o Sr. Roma pareceu duvidar e ignorar a especie em que fallava o Orador, e elle continuou.) Não tem duvida de que isso é verdade, nem o nobre Deputado póde duvidar, e eu torno a explicar melhor o caso. O Governo sobre Consulta da Junta de Credito Publico, propôz que aos credores das extinctas Corporações se passassem titulos admissiveis na compra dos Bens Nacionais; esta proposta foi tractada na Commissão de Fazenda, e achou-se de justiça, porque aquelles homens, que tinham prestado o seu dinheiro para as Corporações de que recebião juros, e com hypothecas em seus bens foram mandadas pagar pelo producto desses mesmos bens, segundo a determinação da lei de 15 de Abril de 1833; porem como o producto das vendas não eram senão trapos de papeis (desculpe-me a Camara esta expressão) resultou d'ahi, que a maior parte dessa divida está por pagar, em quanto a hypotheca se vai distrahindo em beneficio de outros credores. Ora isto é que se acautela pelo projecto que a Commissão approvou, e que está na imprensa, para que se mandem passar titulos admissíveis na compra dos Bens Nacionaes. Este projecto como disse foi assignado pelo Sr. Roma, e conseguintemente não ha coherencia em convir á dous dias na emissão de titulos para aquelles credores, e ter agora tantos receios, e instar para que se recusem aos credores desta imdemnisação de que tractamos, que de certo não são menos sagrados, nem menos respeitaveis do que os outros, antes mais, porque a estes se vai tirar o que é seu, e se lhes tira sem seu consentimento; e os outros, ainda tinham consentido nesses contractos do emprestimo etc.
Segue-se agora dar os agradecimentos ao mesmo Sr. Deputado, por vir hoje proclamar, e canonisar de boa uma doutrina, que eu no anno passado sustentei com os meus amigos; é por causa da qual fomos vexados, e accomettidos com toda a casta de improperios, e descomposturas, como os maiores immoraes de todo o mundo; fallo da Capitalisação! Disse o Sr. Deputado por duas ou tres vezes - nós, Srs. podendo pagar capitaes com rendimentos não devemos sacrificar capitaes; poupemos os Bens Nacionaes, e paguemos aos prejudicados com inscripções da Junta do Credito Publico. Bellamente; e esta toda, e a unica theoria da Capitalisação, que nós sustentavamos, e que muita gente chamava immoral porque as dividas que nós devemos são os capitaes, e nós queriamos fundi-las, e dar-lhes um rendimento possivel pela Junta de Credito Publico, e pagar assim com estes rendimentos aquelles capitaes que não podemos pagar! Eu agradeço pois ao nobre Deputado esta justificação da nossa praguejada proposta; e lho agradeço tanto mais, quanto ella se faz principalmente apreciavel por vir da boca do nobre Deputado, e talvez

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sem advertir o obsequio que me fazia, e aos meus amigos (sensação e riso).
Entretanto advirto, que nos termos em que o nobre Deputado quer applicar esta bella theoria, ella me parece injusta; porque é excepcional, e todo o seu merecimento só póde consistir em ser simultanea para toda a qualidade de credores, e era fazer por todos uma justa destribuição dos rendimentos possiveis, como nós propunhamos; por que fóra disso, seria iniqua, assim como tambem não sendo para conseguir um grande fim, e remover um grande embaraço, o que neste caso se não dá!
Cumpre-me tambem dizer alguma cousa em resposta ás arguições, que o Sr. Deputado por Cabo Verde, O Sr. Sá Nogueira, fez á Commissão de Fazenda: não fallo por mim porque pouco importa, que digam, que eu trabalho, ou não, eu tenho a convicção de que trabalho quanto posso e mais do que posso, e do que muitos que podiam trabalhar igualmente; mas fallo por amor dos meus Collegas que vejo sempre assiduos nas suas obrigações, e fallo por amor da Nação; porque já que não falta quem lá por fóra nos desacredite, sem conhecimento de causa, nem das difficuldades que nos cercam; ao menos não quero que este ecco aqui ressoe tambem, sem fazer vèr como elle é falso, e infundado. Se a Commissão de Fazenda trabalha ou não, deve-se avaliar pelas suas obras; ainda ha poucos dias eu mandei para a Mesa 4 Projectos, e alguns de muita gravidade; todos os dias tenho estado a mandar pareceres seus para a Mesa; e sem offensa das outras Commissões, nenhuma tem feito tanto, não só pelo numero do que tem apresentado, mas ainda pela sua importancia; e se não são projectos que fação nascer dinheiro; é porque isso está fora das attribuições de Commissão. Alguns dos Projectos de maior importancia apenas lá chegaram ha 4, ou 5 dias, qual é o das transmissões da propriedade para tornar effectivo o seu rendimento; se nesta demora houve alguma culpa não era ella da Commissão; mas eu tambem não quero culpar o Sr. Ministro da Fazenda; por que este negocio dependia da Consulta da Junta do Credito Publico, e naturalmente só ella agora a enviou; porque em toda a parte ha muito em que cuidar; direi tambem, que ella tão pouco se tem esquecido do direito addicional sobre o Tabaco e Rapé, que hoje mesmo se devia occupar delle; e eis- aqui o Relatorio, que só elle comprehende 2 cadernos de papel, (amostrou um masso de papeis) porque depois que o Governo reunio este negocio ao do agio do papel do antigo contracto, tornou-se d'uma tal complicação, que só os papeis formam já uns autos de 2 dedos de grossura, como a Commissão verá brevemente, e isso gasta muito tempo a examinar. De resto os meios que a Commissão póde propôr para cubrir o dei it são bons, e estricta economia nas despezas; e cuidem todas as Commissões nisso, e apresentando os seus Orçamentos que o da Fazenda deve ser a fecho dos outros; e pelo que eu entendo ninguem espere della, que apresente novos impostos; porque isso nao está nos seus desejos, nem julga conveniente que se faça; e deixemo-nos de entrar em comparações do que em outros annos fizeram as Commissões de Fazenda, que isso não vale de nada, nem talvez fosse lisongeiro, no mesmo Sr. Deputado, que lembrou a comparação.
Finalmente tinha-me esquecido tocar a especie a respeito do valor dos Bens Nacionaes, que ainda restão. Por certo que esta circunstancia é importante para a resolução desta questão; mas não se póde fazer com exactidão. No anno passado requisitei eu do Governo esta informação, e em Officio da Junta do Credito Publico, que se ha de achar na Secretaria das Cortes, respondeo ella, que só podia informar por Orçamento visto que de grande parte dos bens ainda não tinha obtido informações; mas aqui tenho conta do seu calculo (Leu). Avaliações recebidas................................................................... 4:699:400$000
Bens ainda não avaliados, calculavam-se em ............................ 3:895:310$000
Valor dos Foros, dependentes da Lei, que estamos fazendo...... 3:000:000$000

Somma Rs.................................................................................. 11:594:710$000

Bens Vendidos, até 31 de Janeiro de 1838, comprehendendo os das Ilhas, avaliados em................................................................................ 4:615:766$253
Bens requesitados, e da los poderiam valer................................ 2:000:000$000
Resto de bens, que naquella epoca havia para vender............... 4:913:944$714
Eis-aqui o que a Junta informou em 31 de Janeiro de 1838, e que iam continuar, as avaliações; hoje é crivel que isso esteja concluido, ou muito adiantado e como tambem se tem feito algumas vendas, ainda que poucas, é por isso que ha 15 dias, ou 3 semanas eu renovei o meu requerimento para que o Governo informe o que ha realmente; e agora peço novamente ao Sr. Ministro da Fazenda, que veja se me póde informar com brevidade; porque realmente este é um dado cujo conhecimento é essencial para muitas das decisões, que aqui se tomam todos os dias, e deve existir na Camara. Entretanto, pelas informações do anno passado bem se vê, que tendo se feito desde então até hoje muito poucas vendas; e tendo-se consignado especialmente bens para pagamento da Companhia Confiança (o Sr. Roma - essa não tem nada disso - o Orador continuou) sim é o Banco, cujo contracto foi no mesmo dia; ainda que a Companhia tambem estipulou a venda de 500 contos de foros, que são bens Nacionaes; tudo isso é negocio de pouca monta; e ainda restão seguramente muitos que sobejam para a indemnisação especial desta Lei; e dos Credores dos Conventos, de Papel Moeda, dos Predios arruiados, etc., que eu entendo, merecerem preferencia, e uma consignação especial; e já se vê que não fallo das outras dividas, especialmente de Estrangeira; porque para essa, junta com as outras já não chegariam os bens a quasi nada. Antes de concluir quero retificar uma expressão do Sr. Passos (Manoel) a respeito das despezas do Exercito; disse S. Ex.ª que a Officialidade que commanda despende 1:500:000$000, quando os soldados despendem muito pouco; e que é preciso cortar pelos Commandantes etc. Creio que S. Ex.ª se equivocou em misturar toda a Officialidade; por que os Officiaes, que andão nas fileiras, e que combatem, esses parece-me que não podem ter menos do que tèem, e bem empregado é o soldo de

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quem tantos trabalhos soporta, e nestes por conseguinte não é que deve cahir a reducção: agora onde ella devia recahir com energia é nos outros Officiaes, que só apparecem nas festas, e nas pagadorias, commissariado, obras militares, arsenaes, trens, governichos de castellos arruinados, e de baterias desmantelladas, e auctoridades de commissões pacificas e parasitas; porque tudo isto é que absorve quantias enormes, sem nenhuma utilidade publica (vivos apoiados) (o Sr. Passos Manoel não são só essas despezas com as auctoridades parasitas, e casarões arruinados, é com as espadas Commandantes - o Orador continuou). Ahi é que está o equivoco de V. Ex.ª, são tambem as espadas; mas não as dos Commandantes das fileiras, e dos que andão no serviço, são aquellas espadas, que ou estão fechadas num gabinete, ou atraz d'uma porta dependuradas, e ás vezes cheias de ferrugem, aquellas que tem feito voto de nunca ver a face ao inimigo (riso) essas sim, devem entrar na conta das que precisam grande reforma; porém de nenhuma maneira estas se devem comparar com as dos Officiaes, que estão em serviço activo, e que commandão; porque estes não podem receber menos (apoiados). Vou concluir, porque é já vergonha, que só com este pequeno § se tenham gasto 2 dias! só elle já custou mais talvez do que o resto do Projecto; e a final qual ha de ser o resultado, é approvar as idéas de admittir a indemnisação por bens Nacionaes, e com dinheiro, ou os respectivos titulos em pagamento; e eu peço ao Sr. Soure, que se realmente quer que haja indemnisação, consinta na admissão dos titulos, senão os seus desejos não aproveitão aos prejudicados (vozes votos - votos - uma voz - já deu a hora).
O Sr. Seabra: Sr. Presidente, disse-se alguma cousa a que a Commissão deve responder. O illustre Deputado, o Sr. Soure, considerou estes credores com igualdade de circumstancias aos mais credores do Estado, e permitta-me o Sr. Deputado que diga que por ora não posso estar de accordo nesta parte; estes indemnisandos não são por ora credores; somos nós, Sr. Presidente, que vamos agora crea-los, fazendo as expropriações. Estes direitos e prestações agrarias eram do Estado, mas desde o momento, em que o Estado os alienou e vendeu, passaram a ser bens propriamente particulares (Apoiados) O Decreto de 13 d'Agosto não feriu, nem poderia ferir estes direitos, assim tornados particulares pelo facto da sua venda, e por consequencia somos conduzidos a este dilema; ou havemos de indemnisar as expropriações, antes de as effectuar, ou havemos de deixar o Povo debaixo do peso dessas abusivas prestações; mas neste caso commetteriamos a mais flagrante injustiça, beneficiando uns, e outros não, só porque o Estado por uma casualidade, ou necessidade urgente transmittiu a outras mãos o direito de receber essas prestações independentemente da vontade e intervenção dos colonos e foreiros. Aboli-los é pois uma necessidade e um acto de rigorosa justiça, se o é nada, é tambem de menos justiça, de menos rigogorosa necessidade decretar a indemnisação previa, ou pelo menos simultanea. Já vê pois o Sr. Deputado que os outros credores do Estado não estão no mesmo caso; nem se póde comparar á obrigação, em que estamos para com estes, que ainda depende d'um acto nosso, e que só póde admittir-se segundo as regras marcadas na Constituição para os casos de expropriação, como a obrigação de pagamentos de dividas anteriores por muito importantes que sejam. É em verdade que em certos casos urgentes, a Constituição admitte a expropriação por utilidade publica, com indemnisação posterior, mas não estamos agora nesse caso; quanto ao modo de se fazer a indemnisação, differentes idéas se tem apresentado, a Commissão tinha-se lembrado de fazer essas indemnisações por Bens Nacionaes, como meio mais prompto de acabar com a existencia desses bens, por que cada momento que continuam na administração publica, estão perdendo seu valor; entretanto a Commissão aceita de muitissimo boa vontade todo o meio que torne effectivo seu pagamento. O Sr. Ministro da Justiça disse outro dia quando se tractou da congrua dos Parochos, que o Governo não fazia questão senão de que as congruas deviam ser pagas; quanto ao modo, não lhe importava; a Commissão faz questão do pagamento da indemnisação, porém mais severa que o Sr. Ministro, faz tambem questão do modo, e nenhum que não seja real e effectivo. Eis-aqui a razão porque não póde admittir o meio proposto pelo Sr. Roma; este meio além dos inconvenientes já ponderados, traz um muito grande, e é: faz-se uma grande injustiça, dão-se inscripções de 4 por cento, porém esses individuos que compraram, compraram por um valor, que lhes havia de render pelo menos 5 por cento; ora dando-lhe nós 4 por cento damos-lhe na realidade um capital inferior, ao que elles desembolsaram; demais essas inscripções de 4 por cento serão pagas pontualmente? Serão propriedade como o dinheiro, que elles deram? Ninguem dirá que sim; correrão ellas no mercado sem rebate? Effectivamente o tem; e tudo isto é fraudar o legitimo credor. Disse-se tambem que se paga uma renda por uma renda, é preciso cautella com isso, muita cautella; nós não pagamos uma renda por uma renda, nós devemos pagar um capital, e não uma renda, e devemo-lo pagar com outro capital: por exemplo, a casa de Marialva comprou certos foros por 12 contos de reis, se estes forem dos extinctos, deveremos embolsa-la dessa quantia, e não da renda maior ou menor, que haja recebido por ella; se fossemos a seguir este principio, além das difficuldades das avaliações e liquidações, correriamos o risco ou de prejudicar os compradores, ou a Fazenda. Mas disse o Sr. Roma que antigamente a moeda valia mais do que hoje; é verdade, mas tambem os generos valiam menos, e lhe deram n'essa proporção, nem é possível fazer agora esse computo, quando essa alteração foi filha do tempo, e não da variação legal da moeda.
Perguntou outro Sr. Deputado se a Commissão calculou em quanto importavam essas indemnisações, e se havia bens nacionaes sufficientes para as satisfazer. Sr. Presidente, a Commissão não calculou, nem o Governo, nem ninguem póde calcular com exactidão a importancia dessas indemnisações; essas compras foram feitas por alguns particulares em differentes tempos, e por varias Repartições, e que se acham notadas na immensidade de registos do Thesouro ou da Torre do Tombo; quem póde dar esclarecimentos sobre esta materia são os interessados, mas nós não sabemos quem elles são, nem o Governo o sabe, e só depois de um chamamento para se vêrem seus titulos, e o principio porque houverão

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esses direitos, é que se poderá fazer essa averiguação, e havemos nós, Sr. Presidente, esperar para então para reformar a Lei dos Foraes? comporta o estado da nação que um esclarecimento desta natureza seja causa de se não darem muitas providencias de immensa utilidade, que estão no projecto, e que desde já se podem tornar effectivas? seria tornar dependente de um cabello a salvação de uma nação inteira, nesse caso devemos passar por cima dessa difficuldade, devemos prescindir desse esclarecimento, nem elle é de absoluta necessidade, para a factura desta lei. Consigne-se o principio; mas diz-se não haverá bens nacionaes, para tanto? a Commissão presume com bons fundamentos, que as indemnisações são poucas, mas demos que esses bens não chegam para fazer esse pagamento; aqui diz-se que voltará ás Cortes esse negocio, com os esclarecimentos que hora se desejam, e se não bastarem, ha de procurar-se outro meio infallivelmente. Por todas estas considerações parece-me que não haverá grande difficuldade em approvar-se a doutrina do artigo.
O Sr. Pereira Brandão: - Se não houvesse quem pedisse a palavra, eu pediria a V. Ex.ª consultasse a Camara sobre se a materia está discutida.
O Sr. Roma: - Pedi a palavra principalmente pelo desejo de ser esclarecido; não comprehendi bem uma passagem do discurso do Sr. Relator da Commissão, a respeito do capital da indemnisação; eu entendo que qualquer que seja o modo que se adopte para as indemnisações, é necessário que se proceda á avaliação dos direitos que se tracta de indemnisar, e essa avaliação ha de ser feita segundo o preço medio do rendimento em um certo numero dos ultimos annos. (O Sr. Seabra) - Nós tractâmos de compras feitas por individuos, de bens que foram abolidos; por consequencia é necessario saber quanto deram por elles, quando os compraram. (O Orador) - Mas, Srs., esta idéa é muitissimo importante; é preciso, pelo menos eu assim o julgo, não querer indemnisar pelo que se deu, porque podem ser contractos feitos em epochas muito remotas, e em que a moeda tinha um valor immenso em relação ao de hoje; se fôr saber-se quanto se deu pelos rendimentos de que se tracta, ha de haver um prejuiso immenso para os indemnisandos; tracta-se da indemnisação de rendimentos que se estavam recebendo, logo é necessario ir buscar o capital correspondente a esse rendimento; porque da renda actual é que se devem indemnisar os prejudicados, e elles seriam summamente defraudados, se se fosse remontar a um seculo ou mais para saber quanto deram pelos direitos extinctos. Se isso se fizesse ficariam muito peior do que se se lhes dessem os titulos, ainda que fossem dos asues, que valem apenas 18 por cento.
Eu disse que devia dar-se uma renda por outra renda, e accrescentei o modo porque se havia de avaliar o rendimento abolido; então não me lembrou, por certo, o calculo que se faz agora, e que é seguramente muito commodo; entretanto eu desejo que se façam effectivas as indemnisações, e na occasião em que se faz a abolição: é agora que eu quizera que se determinasse a fórma de as fazer, e que ellas se realisariam desde já, sem dependencia de voltar este objecto ás Cortes. Proponho por tanto a suppressão do § 3.°
O Sr. Seabra: - Sr. Presidente, se a moeda nesse tempo tinha grande valor, tambem os generos que se deram foram dados na razão do mesmo valor da moeda; este principio que a Commissão estabelece não é novo, foi apresentado pelo Corpo Legislativo de 1822 na reforma dos foraes; é um principio estabelecido geralmente em contractos de similhante natureza, que por via de regra são feitos, a retro: e se não ha essa declaração está o principio geral do nosso direito, que não soffre que se considerem como perpetuas taes alienações, antes as deixa sujeitas á confirmação, ou revogação dos successores da Corôa.
O Sr. Guilherme Henriques: - Eu acho muito importante este incidente sobre o modo de se fazer a liquidação da indemnisação, e pedi a palavra; porque se emittiram idéas, que me parecem pouco exactas; e que podendo influir no modo porque o Governo ha de fazer essa liquidação, convém muito rectifica-las para que o Governo se conforme na mesma liquidação com as regras de justiça e de direito. Podem haver duas especies de vendas feitas pela Corôa: uma especie que nas vendas antigas era a mais usada e frequente, com o pacto de retro aberto, outra especie de venda ou troca absoluta sem esse pacto ou condição: na primeira especie ou na venda com o pacto, de retro, não ha duvida nenhuma de que a indemnisação deve ser feita pagando-se só o preço dado pelo comprador: porque no contracto se estipulou que ficasse desfeita a venda em se dando o preço recebido; esta condição valiosa por direito commum e pela nossa Ordenação mostra que o rigor de direito e de justiça não exige mais nada para a inteira indemnisação do que o pagamento do capital que o comprador deu em preço da cousa vendida; pois não tinha direito a conservar essa mesma cousa vendida senão até ao momento de se lhe restituir o preço. Se a Corôa pois vendeu com o pacto de retro alguns desses direitos abolidos pelo Art. 5.º; em se pagando o preço recebido pela Corôa na venda, está completa a indemnisação; porque dado esse preço revertiam para a Corôa esses direitos vendidos conforme o primitivo contracto. Porém se a venda foi absoluta, então tambem não é arbitraria a liquidação da indemnisação; mas deve neste caso a Fazenda Publica prestar a evicção; visto que pela auctoridade da lei foi tirada ao comprador a cousa vendida; e o modo de se prestar a evicção é determinado expressamente na Ordenação do Reino, e no direito commum; com cujas regras neste caso se deve conformar o Governo na liquidação da indemnisação; na qual poderia soffrer grave prejuizo a Fazenda Publica se em ambos os casos sem distincção se houvesse de calcular a indemnisação sobre o rendimento ultimo dos direitos abolidos; devem distinguir-se as duas hypotheses; e em cada uma dellas seguir-se as regras de direito commum, e das nossas Ordenações que ficam indicadas, e que lhe são applicaveis.
O Sr. Seabra: - Peço que se vote hoje ao menos este paragrafo, para fazermos alguma cousa (apoiados). (A Camara geralmente pediu votos).
Decidiu-se que a materia estava sufficientemente discutida.
O Sr. Presidente: - Eu vou propôr á votação o § 3.º, salva a redacção.

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O Sr. Sá Nogueira: - Ha uma proposta minha para que este paragrafo seja remettido á Commissão.
O Sr. Presidente: - Não está na Mesa.
O Sr. Sá Nogueira: - Pois eu vou manda-la.
O Sr. Seabra: - A materia está discutida, é necessario que votemos (apoiados).
O Sr. Roma: Quando se votou o § 1.º foi salvo o modo por que se havia de fazer effectiva a indemnisação; isto é, ficando por decidir se havia de ser por bens nacionaes, ou não; por consequencia, se formos votar este § 3.°, sem attender áquillo que a Camara quiz que ficasse salvo, quando votou o § 1.º, parece-me que haverá uma contradicção: quando se votou o § 1.°, repito, foi salva a resolução sobre fazer-se ou não a indemnisação pelos bens nacionaes; e por isso se mandou o § á Commissão, agora se votarmos o § 3.° ficará prejudicada a decisão da Camara.
O Sr. Presidente: - Ha uma questão prejudicial para que este § com os additamentos e emendas devam voltar á Commissão.
O Sr. Seabra: - É muito bom que os additamentos vão á Commissão, mas é no caso de redacção; mas quando uma materia se tem aqui ventilado, e se julga suffcientemente descutida, manda-la de novo, á Commissão, é pôr-nos no embaraço de não sabermos o que havemos de fazer, e depois reproduzir se a mesma discussão, quando essa materia volta á Camara; proponha pois V. Ex.ª á votação o artigo por quesitos, e então V. Ex.ª dirá: os prejudicados por esta lei hão de ou não ser indemnisados? sim, ou não. Hão de ser indemnisados pelos bens nacionaes, vendendo-se estes em hasta publica? sim, ou não. Hão de ser admittidos nesta venda titulos desses proprios prejudicados ou indemnisandos? sim ou não; e está acabada a questão (Apoiados geraes)
O Sr. Gorjão Henriques: - Não sei mesmo se se determinou que a suppressão que se fez no § 1.º passasse para este logar?
O Sr. Presidente: - O Sr. Secretario informa que não houve resuloção nenhuma a este respeito; só que os additamentos foram remettidos á Commissão.
O Sr. Leonel: - Sobre o modo de propôr... (susurro.)
O Sr. Presidente: - O modo de propôr é o que indicou o Sr. Seabra; não ha outro. (Apoiados geraes).
O Sr. Seabra: - A V. Ex.ª compete resumir as questões, e pô-las á votação da Camara, (Apoiados geraes.) (Votos, votos, susurro.)
O Sr. Sá Nogueira: - Sr. Presidente, eu peço tambem ser ouvido: Sr. Presidente, este negocio é muito serio; quem tem pressa não venha cá; quem não quer cumprir o seu dever não venha cá; e quem não quer estar incommodado não venha aqui; o Sr. Relator da Commissão propoz um quesito muito serio, isto é, se acaso a indemnisação deve ser feita por tal modo: esta é que tem sido toda a questão: não sei se está uma proposta na Mesa, mas foi hontem aqui lembrado, que aquelles que recebem beneficio por esta lei concorressem tambem para a indemnisação dos prejudicados; talvez fosse tambem mais conveniente que por esta indemnisação se dessem os foros, que a Fazenda Nacional tem ainda; mas em fim é necessario que a Commissão considere estes meios, e escolha aquelle que lhe parecer mais conveniente; portanto insisto pela minha proposta, para que o § com os additamentos, e emendas voltem á Commissão.
O Sr. Presidente: - Eu vejo a Camara inclinada a votar hoje este §, e para evitarmos questões eu proponho á votação a proposta do Sr. Sá Nogueira. (Apoiados.)
A Camara resolveu que o § não fosse á Commissão.
O Sr. Presidente: - Agora vou pôr á votação por quesitos.
Hão de os prejudicados ser indemnisados por bens nacionaes?
Venceu-se que sim.
Estes bens nacionaes hão de ser vendidos em hasta publica?
Venceu-se que sim.
Nesta venda só serão admittidos dinheiro, e os titulos, que se derem aos ditos indenmisandos pela sua indemnisação?
Venceu-se que sim, e por estas votações ficou prejudicada a indicação do Sr. Roma para a suppressão do paragrafo.
O Sr. Presidente: - A ordem do dia para terça é a mesma de hoje. -- Está levantada a sessão. - Eram quatro horas e um quarto da tarde.

N: 36.

to 21 íne

1839.

Presidência do Sr. José Caetano de Campos.

.bertúra—Depois do meio dia. Chamada—Presentes74Srs. Deputados; entraram depois ujais alguns, e faltaram osSrs. Jervis d' sltau-guia— Cosia Cabral—César,de f^ascoacellos— fcr~ nandes Coelho — jB.irâo de Monte Pcdral — Barão de. Noronha—Gorjáo — Bispo Conde—Conde da Taipa—Carvalho e Mello — Sousa Guedes—Dias de Azevedo—«João Elias—Aguiar —Velloso da Criw t— feixeira de Morac$ — Borges Peixoto —

Silveira — Moniz —• Snitsa Saraiva — Coltnieiro — o Xavier Botelho.

síçta—Approvada.

Expediente— Um oiTicio do Sr. Deputado Ribeiro Saraiva, parheipando á Camará nào poder comparecer nenta Sessão de hoje-.—^Inteirada. . Outro do Sr, D.i:j)utado (j,orj'io, participando que por causa de se lhe ler agravado a sua moléstia não poderá comparecer a:algumas Sessões.— Inteirada.

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