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2204 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

publicasse qualquer cousa de menos favoravel para o nosso paiz. (Apoiados.}
Abriu-se a conferencia. E para a abrir fez-se um convite. N'elle se marcava qual o seu intuito, estabelecer:
«1.° Liberdade de commercio na bacia e embocadura do Congo;
«2.° Applicação ao Congo e ao Niger dos principios adoptados pelo congresso de Vienna, no intuito de consagrar a liberdade de navegação em vários rios internacionaes, principios applicados mais tarde ao Danubio;
«3.° Definição das formalidades a observar para que as novas occupações nas costas de Africa sejam consideradas effectivas.»
Na resposta a esse convite estava consignado que nós iamos á conferencia de Berlim com a reserva plena e inteira dos nossos direitos.
Em vista dos seus proprios termos era certo que as questões territoriaes não haviam de ser tratadas.
Ao abrir a conferencia, o chanceller do império repetiu mais uma vez esta restricção. Por conseguinte fomos ali como deviamos, isto é, nas condições que propunhamos, guardado a respeito da conferencia pelo que era nosso, e que ella não podia atacar.
Não podíamos ir pedir-lhe o reconhecimento pleno e positivo do direito que nos assistia, porque a conferencia declarara que não ia discutir questões territoriaes, e era porque se declarava que não seriam discutidos que nós podia-mos com menos receio tomar parte nos seus trabalhos.
Tem-se perguntado com que allianças contavamos e como nos íamos apresentar perante um tribunal que nós devia-mos suppor que nos era hostil.
E porque tínhamos o direito de dizer que aquelle congresso não tinha competência para julgar da nossa causa, nem para esbulhar-nos do que era nosso, que podiamos, sem perigo, aguardar as suas decisões. (Apoiados.}
Quaes eram as nossas allianças dizem-no os protocol-los.
Eram as d'aquelles que tinham territorio na Africa como nós; era a da França, que tanto nossa alliada se mostrou em todos os trabalhos da conferencia, porque a ligavam a Portugal a communidade de interesses e as tradições constantes da sua politica, era a França que nos defendia defendendo se a si propria, e que nos animou na lucta em prol das nossas prerogativas de potência marginal do Zaire.
Não quero entrar na apreciação dos trabalhos da conferencia de Berlim; a outra pessoa mais competente do que eu, e que nella tomou parte directa, compete analysal-a e aprecial-a; mas não posso deixar de tocar n'um ponto que lhe diz respeito, ainda para responder ao sr. Ennes.
A principal objecção de s. exa. contra o tratado de 1884 foi a creação de uma commissão mixta, dizendo-nos s. exa. que este era talvez o erro capital de toda a negociação com a Inglaterra.
Pois nós vemos o exemplo de uma commissão mixta que triumphou na propria conferencia e sómente porque variavam um pouco ás condições.
A commissão mixta era anglo.franceza e o rio era o Niger.
As rasões que havia contra ella, quando todas as potências se lhe oppunham, são as mesmas que se dão agora, e comtudo a Inglaterra consegue mantel a só porque tem n'esta maior interesse do que na outra.
Tinhamos adoptado a commissão mixta com a Inglaterra porque só ella pozera obstáculos ao nosso dominio e nos pedira garantias; mais tarde, quando esses obstáculos desappareceram por parte da Inglaterra e surgiram por parte das potencias, dissemos que acceitariamos a commissão internacional em que ellas fossem representadas se a Inglaterra annuisse.
Por conseguinte, não vejo onde esteja aqui um erro capital, e menos ainda uma causa determinante do mallogro do tratado assignado em fevereiro de 1884.
O que exerceu a influencia principal no naufragio d'esse pacto bilateral não foi a commissão mixta, foi essa extraordinaria ambição africana que se manifestou e desenvolveu com extraordinaria violencia, assumindo o caracter de uma verdadeira epidemia. (Apoiados.}
Como nós possuiamos territorios, e outros os não possuiam, queriam que elles fossem repartidos. (Apoiados.}
Contra estas ambições é que nós luctámos com inquebrantavel energia.
E n'este momento não posso resistir á tentação de repetir aqui uma phrase que ouvi pronunciar a um notavel estadista:
«Portugal não é uma grande potencia, mas tem direitos e saberá defendel-os.»
Estas palavras resumem a nossa politica, e explicam o motivo porque a conferencia de Berlim esperou um mez que fosse firmado o tratado entre Portugal e a associação internacional.
Não quero entrar na analyse d'este tratado, mas apesar disso não posso deixar de consignar mais uma vez que se tivemos de quem nos queixar, e se nem todos luctaram contra a corrente de interesses que parecia dever assoberbar-nos, encontrámos comtudo amigos fieis.
Já citei a Franca, mas para ser justo é preciso mencionar tambem a Hespanha.
Todos sabem que durante negociações tão importantes como as que tinham logar em Berlim ha mil pequenos serviços, que, prestados a tempo, auxiliam poderosamente aquelles que maiores interesses defendem. (Apoiados.}
A Hespanha, com uma dedicação constante, sem receiar comprometter se e desagradar ao chanceller, o que tantos muito mais poderosos receiavam, não hesitou nunca em nos prestar auxilio franca e abertamente.
É preciso que o digamos.
Finalmente resta apreciar uma cousa: como ficámos?
Diz-se que as circumstancias em que ficámos, em virtude das concessões que fizemos, são desgraçadissimas.
Com o novo regimen de liberdade commercial como se podem auferir os rendimentos necessarios para administrar os territórios do Zaire?
Com a vizinhança de uma larguissima zona onde se estabelece o livre transito e o commercio livre, como havemos de sustentar o regimen económico da nossa provincia de Angola?
E ao mesmo tempo pergunta se: porque é que, se viamos desde logo as concessões que tínhamos a fazer, fomos seguindo uma política do expedientes, em logar de declarar antecipadamente que o commercio era livro para todos e que haviamos de abolir os direitos de entrada?
Porque é que não advinhámos o que se ia passar? Porque era impossivel.
O governo de Franca, nas negociações que precedem a conferencia, insertas no Livro amarello, diz o que entende por liberdade de commercio. Porém, não o sustenta porque é d'aquelles que nada teem a defender, porque não possuem um palmo de terreno no Congo, e que acham muito bom entrar em toda a parte, sem obstaculos, nem peias, nem encargos.
E extraordinaria esta theoria do liberdade de commercio, que se apresentou na conferencia de Berlim, sustentada por aquelles que menos a applicam no seu paiz.
A industria europêa não consegue penetrar nos Estados-Unidos da America, onde lhe fecham violentamente as portas os direitos protectores, para não dizer prohibitivos.
Comtudo a America está um pouco mais explorada do que a Africa, e carece menos de que protejam o seu desenvolvimento. Querem os americanos que se abra para elles a Africa, e poderia perguntar-se-lhes, invocando os mesmos argumentos, se quem fez a America não foram os europeus; não creio que os americanos tinham a convicção de