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1763

e a consequencia da pergunta que na sessão de quarta feira passada tomei a liberdade de dirigir a v. ex.ª, para saber a intelligencia que v. ex.ª dava á votação da camara, sobre a proposta do sr. Paula Medeiros; e é alem d'isso senão a traducção litteral, decididamente a traducção logica e rigorosa da votação da camara; porque, a não ser assim, aquella votação teria sido uma superfetação, uma redundancia e uma inutilidade, porquanto a camara tinha já em duas votações, e ambas por grande maioria, declarado que queria occupar-se da discussão do projecto; pela primeira devia ella começar logo em seguida á discussão do orçamento; e depois porque lhe pareceu que o orçamento seria muito demorado, aceitou e votou uma proposta, que eu e o sr. José de Moraes apresentámos, para que na primeira parte da ordem do dia, sem interposição de mais algum outro projecto, aquelle fosse discutido de preferencia.

Já se vê pois que, subsistindo estas duas votações, decidir agora a camara que n'esta sessão legislativa se discuta o projecto, é uma ociosidade, um pleonasmo e um luxo sem explicação, e foi por isso que dirigi a v. ex.ª aquella pergunta, e a resposta que v. ex.ª me deu collocou-me na necessidade de apresentar a proposta que mando agora para a mesa. Demais d'isso pareceu-me que devia vir aqui, e venho só, e desajudado de toda e qualquer combinação, posso assevera-lo a v. ex.ª debaixo da minha palavra de honra, porque não tratei, nem fiz concerto com algum dos meus illustres collegas, venho só levantar uma insinuação que na sessão de sexta feira foi lançada ao meio d'esta camara pelo illustre deputado o sr. Camara Leme.

O sr. Camara Leme: — Peço a palavra.

O Orador: — Esta insinuação cortez e urbana, como não podia deixar de ser, partindo do cavalheiro a quem me refiro, se o é na fórma, na essencia envolve e traz um certo dissabor acre e picante, que o meu paladar rejeita. O meu nobre amigo, o sr. Camara Leme, respondendo ao sr. José de Moraes sobre o assumpto em questão disse:

«Não contesto que se discuta o projecto dos raptos parlamentares, e s. ex.ª sabe que até no anno passado pugnei muitas vezes pela sua discussão, mas desde já prophetiso ao illustre deputado que elle não ha de ser discutido n'esta sessão.»

Sr. presidente, n'estas phrases e nos vehementes apoiados com que ellas foram acompanhadas por parte de alguns amigos politicos do sr. Camara Leme, bem transparece uma insinuação, embora delicada, muito pungente. A quem ella possa ter sido dirigida não o direi eu; o juizo illustrado da Camara supprirá o meu silencio. E contra a prophecia do sr. Camara Leme, contra os sarcasticos apoiados dos seus amigos politicos, que eu venho protestar, pela parte que me toca, como deputado e principalmente como membro da commissão, que elaborou o projecto de lei n.° 89.

Pois que, sr. presidente? depois de tres votações tão significativas d'esta camara, quererá ella porventura entregar ao abandono a discussão d'este projecto, pelo qual se pronunciou tão solemnemente?! Não quererá ella desobrigar se de um compromisso de honra que tão espontaneamente tem contrahido?! Não o creio; e confio que a prophecia do illustre deputado não ha de verificar-se. A camara zela devidamente o seu decoro e a sua dignidade.

Sr. presidente, todos nós sabemos a historia parlamentar do projecto inicial, digo parlamentar, porque me parece que tambem ha uma historia particular, mas essa, se a ha, não vem para aqui. Não fui eu que o trouxe a esta casa: elle entrou, e entrou bem, foi bem recebido por todos os lados, foi acolhido com summa benevolencia, teve uma recepção brilhante e mereceu mesmo as honras de uma commissão especial. Depois de uma entrada assim triumphal, a saída não póde deixar de ser correspondente e gloriosa. E vem o meu nobre amigo, o sr. Camara Leme, agourar lhe uma morte marasmatica, uma morte de inanição? Longe vá o agouro: não ha de realisar-se. A camara não póde abandonar hoje uma discussão pela qual se pronunciou tão decididamente; não póde apresentar-te caprichosa, inconsequente e contradictoria comsigo mesmo, e por isso espero que ha de aceitar a minha proposta (apoiados).

No estado a que esta questão tem chegado, é necessario não deixar flanco á malevolencia, e por isso nós não podemos airosamente procrastina-la, e a camara ha de a resolver, porque vae n'isso a sua dignidade (apoiados).

Sr. presidente, devo declarar que não me move na posição que tenho tomado n'esta questão intuito algum particular, nem mesmo remotamente das minhas palavras quero que se possa inferir a mais distante allusão ao alcance que este projecto possa ter.

O que me move é o credito do systema representativo, move-me a dignidade e o credito d'esta casa, que desejo levantados á sua verdadeira altura. Vejo por differentes partes pairar já sobre a uma um enxame de ambições, que querem fazer passagem por esta casa para se filiarem na familia orçamental (apoiados), que querem ganhar uma cadeira em S. Bento para mercadejar com ella um emprego.

A missão do deputado é muito outra, é mais alta, sr. presidente, e alto é tambem o meu empenho por que ella não caía da altura em que cumpre, por interesse do paiz e gloria do systema que se mantenha sempre.

A missão do representante do povo é cuidar dos interesses publicos, dos interesses do povo primeiro que dos seus (apoiados); e eu não quero que os homens que têem a coragem (que me absterei de qualificar) de dizer alto e bom com, e de escrever, que querem fazer da cadeira de deputado uma especulação, um instrumento dos seus interesses particulares; não quero, digo, que a homens taes nós lhes deixemos abertas e francas estas portas; pelo menos ponhamos-lhes as difficuldades que lhes possamos oppor, já que o actual systema eleitoral os protege e favorece, porque é necessario que se diga, que se comece a dizer, que o actual systema eleitoral não tem correspondido ás esperanças que n'elle depositaram os seus defensores. O actual systema eleitoral tem fallado muito na pratica, e ha de continuar a falhar por mal nosso (apoiados).

Não se entenda com isto que renego as minhas crenças e os meus principios pela maxima liberdade da uma e pela mais genuina expressão da vontade dos eleitores, o que quero que se entenda é que as lições de experiencia para mim não passam perdidas. Agradou-me, seduziu-me este systema, mas declaro hoje que essas bellas illusões caíram.

Não quero voltar ao antigo systema dos grandes collegios eleitoraes, não quero isto de modo algum, mas lembro que em 1851 se fizeram umas eleições indirectas por pequenos collegios (não quero collegios que dêem mais de tres deputados); e a camara então eleita pelo systema indirecto, pelos eleitores de parochia, a camara de 1851, talvez se possa dizer, sem receio de errar, que a nenhuma das suas antecessoras (e não sei se alguma das suas successoras) cedia em independencia, em illustração e dedicação pelos interesses do paiz. Desagradou e acoimaram-na de ingovernavel.

Esta camara foi o resultado de uma eleição indirecta, por eleitores de parochia. Toco de passagem esta materia, e levanto apenas um thema.

Um nome que nunca proferirei sem grande veneração, um grande homem, de quem não me recordo sem que o meu coração sinta uma forte emoção, foi o mais empenhado para que o systema eleitoral vigente fosse a lei do estado; e esse grande vulto, esse nobre caracter esteve para ser victima do proprio systema que tanto defendeu, e por cuja implantação tantos esforços empenhou!

Sei que o primeiro que se atrever a levantar voz, condemnando o actual systema eleitoral, será talvez lançado ás feras, attrahirá sobre si grandes iras, mas eu não recuo porque nunca recuei diante da expressão da minha consciencia. Não condemno o systema absolutamente, condemno o relativamente. Vejo no campo dos factos, e não no das theorias.

Fizemos já dois ensaios e quando os factos mostram que uma theoria convertida na pratica não deu bom resultado, que o ensaio não correspondeu aos nossos desejos e á espectativa, creio que é do nosso dever, creio que é um acto de prudencia aproveitar-se as lições da experiencia, e estudar os factos, fugir do mau, seguir o melhor, e í-la successivamente aperfeiçoando.

E n'estas considerações não levo tambem pensamento algum reservado, pela parte que me toca, em relação ás proximas eleições. Não pretendo arredar candidatura que me affronte. A minha candidatura não assoberbará alguma outra, e nem irei pedir, como nunca pedi, á auctoridade que a levante sobre os seus escudos officiaes; não a apresentarei mesmo, não empenharei os meus amigos em favor d'ella; negocio é esse commettido ao seu bom juizo, resolve-lo-hão como entenderem mais conveniente aos seus interesses; e uma vez que elles me continuem a sua estima pessoal, que tanto aprecio, e de que tantas e tão penhorantes provas e gratas recordações conservo; de resto considerar-me-hei estranho á luta eleitoral porque na luta geral, em que os partidos se hão de debater, n'essa me hei de apresentar como membro do partido a que pertenço (porque sou partidario, e muito) (apoiados), e hei de empregar no seu triumpho todos os meus esforços, todos quantos serviços estejam ao meu alcance (apoiados).

Desculpe-me a camara de ter fallado de mim, o que é sempre desagradavel, mas não queria que de modo algum se explicassem as minhas opiniões como resultado de algum despeito porque eu tivesse sido mal tratado pela uma; não o fui ainda por o actual systema, nem o fui pelos outros, devo muito aos meus amigos, jamais o esquecerei, mas a elles, e só a elles, e ainda com elles só no futuro. Terminarei esta divagação, talvez impertinente.

Se a camara na sua sabedoria entender que a minha proposta não merece ser approvada, se ella a rejeitar, lastima lo hei, não por mim, mas pela dignidade e decoro da camara, porque desejo que ella se conserve sempre na sua verdadeira altura, e que mantenha e sustente o prestigio, sem o qual os seus actos não terão no paiz a força que cumpre e que é necessario que tenha (apoiados).

O sr. Blanc: — Mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda.

Leu-se na mesa a seguinte

PROPOSTA

Proponho que se entre desde já, e se prosiga, sem interrupção durante a primeira parte da ordem do dia de hoje e das sessões seguintes, na discussão do projecto de lei n.° 89 de 1863. = Francisco Coelho do Amaral = José de Moraes Pinto de Almeida = Sieuve de Menezes.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Sr. presidente, mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda, e foi para isso que pedi a palavra. Mas permitta-me v. ex.ª e permitta-me a camara que eu faça algumas breves reflexões, em resposta ás considerações apresentadas pelo meu nobre amigo o sr. Coelho do Amaral.

Se a auctoridade da pessoa, se as considerações de nobreza de caracter e de elevação de sentimentos, se todo este apanagio de circumstancias, que tornam um homem verdadeiramente respeitavel para toda a gente de bem (apoiados), fosse titulo sufficiente para justificar uma proposta qualquer e para levar o convencimento a todos os espiritos ácerca d'ella, nenhuma se poderia apresentar n'esta camara com mais força, do que a que acaba de ser apresentada pelo meu nobre amigo o sr. Coelho do Amaral. S. ex.ª possue todos os titulos á consideração publica. (Apoiados.) S. ex.ª é um d'estes caracteres que pelo simples facto da sua apresentação infundem respeito e estima em toda a gente séria.

Estas poucas palavras não são perdidas; porque aos homens publicos, da respeitabilidade do meu nobre amigo, não devem poupar-se estas manifestações n'um paiz, onde tanta mediocridade tem chegado, muitas vezes com fracas bullas, ao apogeu de todas as posições. (Apoiados.) Sirvam pois estas singelas, mas francas palavras, de um amigo sincero do illustre deputado, de homenagem ao seu nobre caracter.

Mas, sr. presidente, se effectivamente eu tenho pelo illustre deputado toda a consideração, de que elle é credor, nem por isso a vassallo as minhas pequenas faculdades, nem a minha consciencia á opinião de quem quer que seja; e no ponto sujeito, devo dize-lo, estou em diametral opposição com a proposta do illustre deputado, e muito principalmente com algumas das considerações que s. ex.ª apresentou.

Não quero fallar de mim. Sou muito pequeno para querer entreter a camara com a minha humilde pessoa.

Se eu entendesse que as considerações pessoaes podiam ter alguma importancia quando se trata de objectos importantes, creio que algumas poderia adduzir com relação á minha pessoa, que me auctorisassem sufficientemente para poder franca e desassombradamente emittir a minha opinião, com relação a este assumpto; mas não se trata da posição do individuo, que não é nada, trata-se da questão em sr.

Em primeiro logar todos nós sabemos que, em virtude do acto addicional, todo o deputado que aceita um emprego perde o seu logar. Na lei vigente existe a comminação. Ora, eu supponho que se devia dar mais alguma latitude á consciencia do individuo; é elle quem deve saber se deve ou não aceitar os logares que lhe são offerecidos, se está ou não no caso de os desempenhar, se póde dignamente trocar o seu diploma de representante do paiz por um cargo publico qualquer. Digo que se deveria dar uma certa latitude á consciencia do individuo, e entendo que n'um paiz onde não abundam as especialidades, onde muitas vezes se precisa de um homem com certas e determinadas qualidades para desempenhar certa ordem de funcções, me não parece conveniente estar sempre multiplicando as restricções á faculdade que tem o poder executivo de procurar, já extra-parlamentarmente, já dentro d'esta casa, os homens proprios para desempenhar qualquer emprego. No entretanto esta é uma opinião individual; a camara póde julgar esta questão como entender. Creio mesmo que já se tem pronunciado n'um sentido opposto, não com o meu voto, porque votei contra. Mas, repito, a camara póde apreciar por um lado os motivos que apresentei, e pelo outro as rasões tambem ponderosas offerecidas pelos meus contradictores, e tomar uma resolução definitiva sobre o assumpto.

O que me parece que se não póde adduzir como argumento para discutir esta questão e para resolve-la no sentido em que o illustre deputado deseja vela resolvida, é a questão da lei eleitoral (apoiados). Pois então nós podemos dizer que a experiencia já sanccionou a efficacia ou a não efficacia da lei eleitoral? (Apoiados.) Qual foi o ensaio mallogrado que se fez? Pois esta camara não foi o primeiro ensaio?

Vozes: — Foi o segundo.

O Orador: — Foi o segundo, melhor para a minha argumentação.

Pois então a maioria a que o illustre deputado pertence; esta maioria que tem mettido hombros a tão importantes commettimentos; esta maioria que resolveu a questão dos vinculos; esta maioria que fez a lei hypothecaria; esta maioria que fez a lei dos bancos, que se tem constantemente pronunciado no sentido das idéas mais liberaes emprehendendo as reformas mais rasgadas; esta maioria que tem tido a honra de ter no seu seio o illustre deputado, e que por elle tem sido constantemente acompanhada, lutando sabe Deus com quantos embaraços, mas sempre forte no proseguimento das suas idéas de progresso, sempre sincera e firme nas suas convicções e nas suas crenças politicas; pois esta maioria póde considerar se um ensaio mallogrado da lei eleitoral?

Permitta-me s. ex.ª que lhe diga que eu tenho mais fé n'este principio do que s. ex.ª parece ter; e digo parece, porque sei que s. ex.ª tem crenças muito profundas, e se por uma momentanea aberração, que mesmo os entendimentos mais illustrados podem ter, s. ex.ª poderia ter vindo apresentar a esta camara uma opinião tão pronunciada contra a lei eleitoral.

Tambem eu commemoro com veneração e com profunda saudade o nome de um caracter illustre, de uma grande gloria d'este paiz, que foi effectivamente um dos que mais instaram pela discussão da lei eleitoral.

Tambem peço ao illustre deputado que, competrando-se mais dos motivos serios que tinham actuado sobre aquella robusta intelligencia, para a levar a propor com tanta instancia e a defender com tanto calor a lei eleitoral, não venha s. ex.ª, como por incidente, fazer uma censura tão severa á lei eleitoral.

Eram estas as poucas considerações que eu queria apresentar á camara. Entendi que as devia fazer; não as teria feito, se se tratasse simplesmente da questão, para mim muito secundaria, dos raptos parlamentares, que em todos os tempos se tem feito em maior escala, e é esta a occasião de commentar as calorosas manifestações de apoio que os illustres deputados da opposição tem feito sempre que se tem fallado n'esta questão.

Ss. ex.ªs sabem perfeitamente que usaram largamente d'essa faculdade; ss. ex.ªs despacharam os seus amigos, e estou convencido de que sempre agraciaram pessoas muito aptas para os cargos que lhes incumbiram.

Eu vou envelhecendo; a experiencia da vida publica corrige a impetuosidade do temperamento, hoje sinto verdadeiro prazer em fazer justiça aos meus adversarios; muitas vezes me tenho expressado a respeito d'elles com a consideração que merecem o seu patriotismo e a solicitude pelos negocios publicos (apoiados); digo patriotismo, porque presumo que a nenhum partido que mereça este nome, a