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Discurso que devia lêr-se a pag. 237, col. 2.ª, lin 64, da sessão n.° 16 d'este vol.

0 sr. D. Antonio da Costa: — Sr. presidente, esta discussão apresenta um expectaculo singular. O governo declarou-nos que era ministerial a questão de que nos occupâmos, e o que vemos nós seguir-se a esta declaração? Parecia que devia ser a opposição systematica que subisse á tribuna para se oppôr á medida do govêrno. Mas não succede assim. Alem da opposição systematica ou regeneradora, vem acrescer um grupo distincto, posto que pequeno, que não tem tomado uma posição politica n'esta casa; e a estes dois grupos vem tambem juntar se alguns deputados saídos das Oleiras constantes do proprio governo e das primeiras capacidades da camara; não por desejarem fazer opposição ao gabinete, sim para votarem segundo as suas consciencias em materia que julgam grave. Ainda aqui não pára. Aquelles mesmos que não entendem adoptavel a regie, recuam do mesmo modo diante da arrematação actual, e eu vejo que um d'estes illustres deputados e meu estimavel amigo, o sr. Sant'Anna, propoz a substituição do estado actual pela liberdade do tabaco; e outro meu estimavel amigo, o sr. Paulo Romeiro, propoz modificações de tal ordem nas condições primitivas, que a sua aceitação equivaleria, no meu entender, á impossibilidade da arrematação do contrato. Deprehende-se dos factos que acabo de citar, que as duvidas na importante questão que somos chamados a decidir, infundem graves apprehensões no animo dos illustres deputados de todos os lados, e dos differentes grupos que tomam assento na camara.

A face da camara é portanto original, e ella indica bem ás intelligencias menos atiladas, que o parecer da illustre commissão de fazenda encerra duvidas gravissimas áquelles proprios que prefeririam não as ler, e que desejariam poder approva-lo afoutamente.

Quando uma questão reflecte assim, ella está decidida, a meu ver, contra aquelles que a sustentam Embora, todavia, a questão seja ministerial, para mim torna-se indifferente esta circumstancia, porque eu hoje e sempre estou disposto a votar conforme me parecer justo, sem pretender saber de onde vem as medidas, e se ellas são ou não ministeriaes.

E, a proposito, responderei á interrupção que não ha ainda muitos dias, suscitou aqui um illustre deputado a quem respeito pelas suas eminentes qualidades e pelas suas virtudes civicas, um mestre de nós todos, o sr. Passos (Manuel). Livremente, e sem o minimo escrupulo, posso proceder da maneira que indico, porque o chapéu governamental de que s. ex.ª fallou, não metteu dentro de si o meu nome. N'isto nem censuro o nobre deputado nem ninguem; ao contrario. Quando se apresentam nas lides eleitoraes candidatos como s. ex.ª, os governos têem rigorosa obrigação de incluir os seus nomes dentro do chapéu governamental, porque com esse facto prestam um testemunho de respeito e de consideração ás illustrações do paiz. Não o devem porém fazer quando esses candidatos não têem merito nenhum que os recommende, como succedia a mim.

O sr. Passos (Manuel): — Não, senhor; é muito digno.

O Orador: — Sr. presidente, um illustre deputado que se assenta no centro da camara, principiou hontem o seu discurso, dizendo-nos = que o azedume e o escandalo linham partido do lado da opposição =. Eu, que n'esta questão pertenço á opposição da camara, não aceito a censura de s. ex.ª Repitto-a, Não a podemos aceitar, porque é immerecida. O primeiro orador que incetou o debate foi o sr. Fontes; e basta dizer-se isto para logo verem todos aquelles que estão costumados a ouvir este illustre deputado, que o seu discurso respiraria a moderação e delicadeza que s. ex.ª usa de empregar sempre que toma a palavra. Todos os illustres deputados reconhecerão esta verdade, e darão de certo d'ella testemunho, porque a justiça fica bem a todos, amigos e a adversarios. (Apoiados.)

Ao sr. Fontes seguiu-se a fallar o nobre ministro da fazenda; a acrimonia e o escandalo, se o houve, saíram da bôca do nobre ministro. A camara inteira o ouviu. Foi s. ex.' que trouxe para a discussão as contradicções do sr. Fontes, e a esta parte estou certo que s. ex.ª responderá quando lhe couber a palavra. Foi o nobre ministro que invocou tambem o anno de 1815; e que lançou um stygma sobre o funccionalismo portuguez, e sôbre a moral publica do paiz.

A proposito dos caminhos de ferro, o nobre ministro accusou de lerem combalido os homens que no anno de 1845 pela primeira vez proclamaram aquella idéa civilisadora, aquelles que hoje sustentam a régie, e que reputam sua a realisação dos caminhos de ferro em Portugal. Peço licença ao nobre ministro para lhe lembrar que a censura que s. ex.ª pretendeu fazer á opposição, foi bater de chapa não só na grande maioria da camara, que se présa de progressista e de liberal, mas igualmente em outros membros do ministerio; foi bater no presidente do conselho o sr. marquez de Loulé, e no sr. ministro da marinha visconde de Sá. O nobre ministro não se recordou de que ss. ex.ªs, um anno depois, combaliam da maneira mais efficaz contra os homens que, como s. ex.ª diz, primeiro haviam incitado a idéa da viação ferrea. S. ex.ª não se lembrava de que uma grande parte dos membros d'esta camara se achava em identicas circumstancias; e creio que elles se honram ainda hoje do procedimento que tiveram. Eu, pelo menos, honro-me muito; é do facto da minha vida publica de que mais me glorio. Verdade seja que na minha curia carreira publica não tenho ainda praticado muitos factos.

Lamento que do banco dos srs. ministros saísse a declaração de que a immoralidade lavrava entre o funccionalismo do nosso paiz. (Apoiados.) Lamento que um stygma de similhante ordem fosse lançado ás faces de todos, quando aliás existem muitos (e Deus nos livre que não fosse assim) que não vendem o seu pundonor, e que não mal barateam a sua honra. (Apoiados.) Lamento emfim que pela bôca de um ministro da corôa fosse solemnemente sanccionada a impotencia da auctoridade publica e a nullidade do poder. (Apoiados.) Lamento isto tudo, e entendo que similhantes palavras se não deviam nunca proferir perante o paiz, e dentro do parlamento, sem virem acompanhadas das convenientes propostas de lei que reformassem o estado anarchico do serviço publico e do pessoal administrativo. Eu pela minha parte declaro que se fosse empregado de confiança, no momento em que recebesse pelo correio o discurso do nobre ministro, pelo mesmo correio enviaria ao governo, não o pedido da minha demissão, mas a entrega immediata do cargo que occupasse. Não podia servir nem mais um instante. (Muitos apoiados.) Veja s. ex.ª o que proferiu; e veja tambem o illustre deputado a quem anteriormente me referi, que não foi este lado da camara que azedou o debate nem calumniou. A iniciativa não partiu d'aqui, partiu d'acolá. (Apoiados.)

Sr. presidente, eu ajuízo que não me excedi n'estas reflexões que apresentei. (Vozes: — Não, não.) Se acaso, moço e inexperiente ainda nas lides da tribuna, o fiz, retiro qualquer palavra menos parlamentar. Nunca fallo senão quando estou convencido do que digo; e a força da palavra exprime o convencimento da idéa. (Vozes: — Muito bem.)

Entro na materia. Penetrando na questão, eu não vejo senão contradicções a pulularem de todas as partes. Se comparo o excellente relatorio do nobre ministro da fazenda com as opiniões manifestadas por s. ex.ª na presente discussão, encho-me de espanto ao presencear como as opiniões de hontem são manifestamente contraditas com as de hoje. Censuram o eclectismo. E o que significa este facto senão um eclectismo de nova especie? Até aqui conhecia-se o eclectismo n'uns individuos com, relação a outros; agora apparece de