1898-D DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
patriotismo, porque era preciso que a França não alimentasse duvidas sobre factos que os inimigos d'ella muito bem conheciam.
Sr. presidente, é por esta fórma que se procede em toda a parte onde se acata a opinião publica, (Apoiados.) onde as redeas do governo não estão confiadas a homens de partidos abastardados, (Apoiados.) onde se presta culto ao patriotismo e ao desinteresse. (Apoiados.)
E como a França não esqueceu até hoje a severa lição que lhe foi infligida em 1870-1871, a sua camara dos deputados votou, com applauso da nação, os avultadissimos creditos que lhe eram pedidos, e que o senado pouco depois igualmente approvava; mas teve tambem a consolação de saber, decorridos tres ou quatro mezes, que os sacrificios feitos não tinham sido infructiferos.
Em Barcelona, no certamen de esquadras que ali se effectuou, e segundo li na imprensa local, a esquadra franceza apresentou-se por modo verdadeiramente brilhante.
Mas não foi só a França que votou, para assim dizer, por acclamação, os creditos pedidos para augmento da sua esquadra e para as fortificações dos seus portos e costas.
Na Italia acaba de succeder o mesmo.
Uma proposta pedindo augmento de credito, a fim de serena dotados convenientemente os differentes serviços militares e de ser augmentada a força armada, foi approvada sem discrepancia, por todos os deputados.
Só entre nós, triste é recordal-o, se não trata de assumptos militares com a seriedade com que se devia tratar! (Apoiados.) Oxalá que não tenhamos de nos arrepender, em periodo breve, d'esta nossa imperdoavel incuria. (Apoiados.)
Pela minha parte, sr. presidente, não me accusa a consciencia de ter sido atacado d'esse pernicioso indiffereutismo. No limite das minhas fracas posses, contra elle tenho reagido, tanto na imprensa como no parlamento.
N'esse proposito ainda, e seguindo o exemplo dos homens superiores, cujos nomes ha pouco citei, proseguirei denunciando ao paiz outros factos de que tenho conhecimento, - factos esses que não podem nem devem continuar a subsistir, se quizermos pensar um pouco na defeza da patria. (Apoiados.}
Assim, vou occupar-me ainda de um assumpto relativo á ínstrucção militar.
Refiro-me ás missões no estrangeiro. Depois tratarei dos fornecimentos, como prometti, e por ultimo da defeza geral do reino, perante as nossas caducas e desmanteladas praças de guerra, do caminho de ferro da Cascaes, das fortificações de Lisboa e seu porto, e das nossas escolas praticas e das escolas regimentaes.
As missões militares no estrangeiro não constituem, como é sabido, uma novidade. Ha bastantes annos que ellas existem, não só cá, mas tambem nos outros paizes. D'ellas tiram proveito os officiaes commissionados, os governos se se derem ao incommodo de ler os relatorios que devem formular os commissionados, e até com ellas poderiam lucrar todos os officiaes do exercito, se esses relatorios fossem publicados apenas na parte que não podesse susceptibilisar ou melindrar as nações amigas, que acolheram os hospedes que lhes enviámos. (Apoiados.)
N'este sentido se manifestou já no anno passado o illustre deputado o meu amigo, o sr. Francisco Machado; e quando s. exa., que apoia tão calorosa e dedicadamente a actual situação, não conseguiu demover o illustre ministro, do systema de mysterios e infundadas reservas, que com tanto esmero cultiva, não serei eu que terei a pretensão de ser mais feliz.
E a despeito de, como disse, as missões ao estrangeiro não constituirem novidade, nem por isso deixarei de me congratular por o illustre ministro se não ter afastado da tradicção.
O que representa novidade, contra a qual que insurjo desde já, é a fórma como foi feita a escolha dos commissionados, mandados no anno passado a França e a Italia.
Nada tenho, convem que isto se saiba, contra os officiaes escolhidos, que são reputados como muito distinctos; mas emquanto poder elevar a voz n'esta casa, protestarei, como o faço agora, com toda a energia, contra a inaudita exclusão que se fez dos officiaes de cavallaria e de infanteria, do desempenho d'essa commissão. (Apoiados.)
Já no anno passado me insurgi, por occasião de se discutir a proposta de lei sobre praças de guerra, contra o pensamento que n'esta proposta transparecia de se desconsiderarem aquellas duas armas. (Apoiados.)
Os meus protestos encontraram então echo no parlamento, e o projecto de lei foi modificado em conformidade com as indicações por mim feitas e pelo meu velho e prezado amigo, o sr. Serpa Pinto.
Pouco tempo, porém, decorreu que não se patenteasse novo exclusivismo, o qual, por manifestar reincidencia mais censuravel se torna. (Apoiados.)
É preciso que o illustre ministro saiba que, no caso sujeito, a sua preferencia pelo corpo do estado maior e pelas armas de artilheria, e especialmente de engenheria, significa mais do que um acto incorrecto; - representa um erro imperdoavel de administração, (Apoiados.) que nem sequer encontra desculpa, na necessidade de fazer economias, - desculpa sediça e estafada, que não encontra echo era parte alguma, quando invocada por este governo, cuja perdularia gerencia tem excedido até o que era dado prever. (Apoiados.)
E depois, não seriam dois magros subsidios, dados durante dois mezes, o maximo, a dois officiaes, um de cavallaria e outro de infanteria, que arruinariam o thesouro. (Apoiados.)
Com a exclusão d'estas duas armas, se não houve o proposito de as desconsiderar, como difficil será demonstral-o, houve, pelo menos, um esquecimento indesculpavel, como facil é evidenciar.
Quem conhecer um pouco as questões militares sabe perfeitamente que as armas que mais carecem da instrucção que se colhe nas missões ao estrangeiro, são a cavallaria, a infanteria, a artilheria e o estado maior.
Ora, mandar, como s. exa. mandou para a Italia, unicamente um official de engenheria, é simplesmente assombroso. (Apoiados.)
Se lhe mandasse estudar praças de guerra ou fortificações de outra qualquer natureza, perfeitamente de accordo. Mas excluir a cavallaria e a infanteria para mandar um official de engenheria assistir ás manobras do exercito italiano, não se justifica, nem sequer se desculpa. (Apoiados.)
O sr. Abreu e Sousa: - No programma de manobras do exercito de Italia, figurava o ataque ás praças da guerra.
O Orador: - Permitta-me v. exa. que lhe diga que a objecção que me faz não está á altura do seu comprovado talento.
Nem o exercito italiano se occupava exclusivamente do ataque e defeza de praças, que, a realisarem-se, constituiriam uma questão secundaria, nem a engenheria é empregada n'essas operações, senão como um simples auxiliar.
A engenheria occupa-se, como v. exa. muito bem sabe, em construcções de toda a especie, em lançamento de pontes, em levantar trincheiras, na feitura e reparação das obras de fortificação, antes e durante o ataque. As outras armas é que defendem e atacam, e por isso mais necessidade têem de assistir a simulacros d'essa natureza. (Apoiados.)
E por tudo isto que eu digo que a paciencia tem limites, e desde o momento em que se entra no caminho dos exclusivismos e das preferencias, deve-se esperar a correspondente reacção, - reacção motivada pelas provocações que