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1971

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Projecto de lei

Senhores. — Venho submetter á vossa elevada consideração uma proposta de lei que tenho por conveniente, se não por essencialmente necessaria, á boa administração das provincias ultramarinas.

E das boas praticas das nações cultas destinar uma verba nos seus orçamentos para mandar aos outros paizes estudar os melhoramentos moraes ou materiaes que porventura lá se tenham iniciado, o dos que o estudo pratico suppra a defficiencia dos relatorios que os livros ou o jornalismo transmitiam.

Começa hoje a crer-se que a maior parte dos enviados das nações a similhantes descobrimentos ou estudos tem antes por fim propocionar-se viagem de recreio por conta do estado, do que o estudo aturado e consciencioso de que são; incumbidos.

É sempre o argumento do abuso prevalecendo contra a santidade da doutrina.

O projecto que tenho a honra de submetter á esclarecida consideração da camara, não póde soffrer a pecha de intuitos egoístas em passeios recreativos, através de povos cultos, nem tambem proponho que se estudem instituições adiantadas que possam para já ou para mais tarde servir de norma a governantes, se não que se procure em povos semi-barbaros sujeitos á real corôa portugueza a rasão de suas miserias e do seu atrazo, inventariando quanto seja possivel as fontes estagnadas da sua riqueza, que para muitas estão sendo, em vez de manancial de vida industrial e commercial, lagos paludosos e mephiticos, em que se asphixiam os povos e os funccionarios, não sem murmurações dos outros povos que vão adiantados, e que nos lançam em rosto o descuido com que tratámos as vastas regiões que ainda nos restam das muitas que soubemos descobrir o conquistar, e que vamos deixando morrer no marasmo fatal da ignorancia e da pobreza.

É desgraçado costume em Portugal attribuir aos governos locaes das nossas provincias ultramarinas, quer seja pelo seu desleixo, quer pela sua ignorancia, quer pelas suas nem sempre legitimas ambições, a falta do toda a ordem de melhoramentos, que, se não fossem reclamados pelo brio nacional, o seriam pela humanidade: o é não menos frequente nas colonias attribuir ao governo da metropole a falta de todos esses melhoramentos muitas vezes lembrados e reclamados pelos governos coloniaes, quer seja pela desconfiança que o governo central nutra a respeito dos seus delegados, quer seja pelas influencias partidarias a que não podem ser estranhas colonias que se regem tão liberalmente como as nossas, quer seja pela ephemeridade dos nossos ministerios constitucionaes.

Entendo que n'uma o n'outra queixa ha erro e ha injustiça, e, se me não engana o pouco estudo que tenho feito das cousas do ultramar, todo o nosso infortunio repousa na falta de unidade governativa, tanto mais necessaria nos negocios do ministerio da marinha e ultramar, quanto menos racional é a sua centralisação absoluta.

Aos governos do ultramar é forçoso que se dê a maxima liberdade de acção, impondo-se lhes a maxima responsabilidade.

Como, porém, casar esta descentralização com a unidade governativa no governo central ou da metropole?

Eis aqui, senhores, o problema para cuja solução me occorreu formular esta proposta.

Para conseguimento da descentralisação é indispensavel nas colonias que o governo central confira aos seus delegados o mais largo voto de confiança que seja possivel para todos os assumptos de administração.

Ora, n'esse caso parece que o governo da metropole não governa, e póde dar-se o estranho espectaculo de, a titulo de necessidades nem sempre justificadas eu justificaveis, se mudarem as instituições, as leis o os regulamentos, sem base o sem systema; quando systema houvesse seria individual, o que daria um systema em cada provincia, e que seria alterado com a nomeação de cada novo governador, teriamos assim realisado o cahos governativo com todos os seus característicos, a promiscuidade, a desordem e a ephemeridade dos elementos.

Não é, pois, esta a descentralisação governativa de que se carece. Seria a abdicação completa da auctoridade central.

E essencial que haja para as provincias ultramarinas leis fundamentaes que a um tempo confiram o regulem oi poderes de auctoridade de cada provincia sem lhes tolher a justa liberdade, mas sem as desligar do centro d'onde irradiam e de que dependem..

A confecção d'estas leis é seguramente, e o parlamento o sabe, a maior difficuldade da administração colonial, porque alem dos preceitos geraes que prendendo por um lado ás instituições do paiz, o por outro' lado aos direitos e deveres communs e reciprocos dos cidadãos portuguezes das provincias ultramarinas, no ponto de vista superior das leis geraes, ha tambem a confeccionar estatutos especiaes que têem de ser saldados pelas circumstancias peculiares de cada uma d'essas provincias.

Para confeccionar 03 primeiros é essencial que o governo possa ter debaixo de um só ponto de vista todas as suas colonias, porque para todas legisla e não raro ha de acontecer que á falta d'este conhecimento synoptico ou concreto e geral de todo o ultramar portuguez a lei pareça antes dictada para uma provincia especial do que para todas.

Para a confecção dos segundos ainda é mister e essencial este ponto de vista geral, para que, se a descentralisação não obsta que a lei consigne providencias especiaes e adequadas aos interesses das provincias a que se destina, e da qual nos conselhos da corôa e nas casas do parlamento póde haver conhecimento especial A unidade governativa, convem e é essencial que n'ella se não consignem principios que destoem dos preceitos das leis fundamentaes o geraes.

Ora, acontece que em Portugal ha trabalhos especiaes sobre cada uma das nossas provincias ultramarinas e a respeito de cada uma se tem estudado e escripto muito illustrada o conscienciosamente a respeito de um ou de outro ponto em especial muitos homens distinctos conhecem uma ou outra das nossas provincias ultramarinas, alguns d'elles por longa pratica administrativa, o que lhes dá incontestavel auctoridade; falta, porém, ao governo um valioso e indispensavel subsidio, um estudo methodico, geral e uniforme debaixo do ponto de vista governativo de todas e de cada uma das nossas colonias, que são muito valiosas para serem desprezadas, que podem mesmo ser a salvação de Portugal n'um futuro mais ou menos proximo, se Portugal se vir em apuros externos, o que Deus não consentirá e se nós tratarmos como paes áquelles que na decrepitude, nos devem servir de filhos.

Sem duvida, cada homem que tem escripto sobre um ponto especial de administração de uma ou de algumas das nossas provincias ultramarinas, tem feito um assignalado serviço, mas insuficiente.

O conjuncto de todos estes escriptos, apesar de fontes abundantes, é tambem insuficiente, mão só pela diversidade dos seus auctores, cada um dos quaes apreciou segundo a sua Índole, tendencias o aptidões, o objecto singular que mais o impressionou, mas porque cada um tomou um ponto de vista para suas observações.

N'estas circumstancias, lembrei-me de que se poderia prestar um bom serviço a Portugal, auctorisando o parlamento o governo a mandar individuo competente visitar todas as nossas provincias ultramarinas de Africa, Asia o Oceania, fazendo um relatorio o mais possivel completo sobre as seguintes bases:

1.° Sobre a administração em geral de cada uma das provincias, notando as deficiencias ou excessos de lei que lhe pareçam remediaveis;

Sessão de 6 de junho de 1979