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2270 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

voltar a occupar a attenção da camara se a minha moção for combatida por fórma que torne isso indispensavel.
Vozes: - Muito bem.
Leu-se na mesa a seguinte

Moção de ordem

A camara, confiando em que a mesa, de accordo com o governo, regulará os trabalhos parlementares da maneira mais consentânea com os interesses do paiz, passa á ordem do dia. = Franco Castello Branco.
Foi admittida.

O sr. E. J. Coelho: - Sr. presidente, comprehende v. exa. e a camara que, tendo eu apresentado a moção que acaba de ser impugnada peio sr. deputado Franco Castello Branco, me corre stricto o dever de a defender, ainda que continuo a crer que ella não póde ser seriamente impugnada. (Apoiados.)
Confesso, pois, que me causou não só surpreza e impugnação, mas tambem e principalmente mo surprehenderam as rasões com que fui impugnada a minha proposta. (Apoiados.)
O nobre deputado, que me precedeu no debate, deu como rasão primeira e principal, que a minha proposta envolvia um principio de desconfiança á mesa, á qual competia dirigir os trabalhos parlamentares.
Contra uma tal affirmativa protestam as minhas intenções e protesta o proprio assumpto da minha proposta; e não se acreditaria facilmente que podesse invocar-se tal rasão, quando é certo que a camará, no uso plenissimo do seu direito, todos os dias se antecipa á presidência, deliberando que entrem na discussão, com preferencia a quaesquer outros, certos e determinados projectos, e não poucos de interesse particular ou secundário. (Apoiados.)
A mesa compete, torno a repetir, a direcção dos trabalhos parlamentares, e fal-o sempre com a illustrada rectidão; de que todos nós damos aqui pleno testemunho; mas isso não altera os factos, que já expuz, nem modifica o direito da camara sobre este assumpto. Ella resolve como quer e julga melhor, e isso faz todos os dias. (Apoiados.) De maneira que a camara hontem, todos os dias, não offende a dignidade da presidencia, porque hontem, e todos os dias, substituo a sua iniciativa á iniciativa da mesa, mas a minha proposta deve ser rejeitada, porque ella exprime falta de confiança na mesa, pelo que respeita á direcção dos trabalhos parlamentares! Confesso que não comprehendo, ou comprehendo de mais. (Apoiados.)
Devo dizer bem alto que, não considerar urgente, em meiado de junho, a discussão do orçamento, é facto que espanta e entristece. (Apoiados.)
O orçamento é a questão maxima em todos os parlamentos; se não confiam na discussão do orçamento, ou a julgam inutil, não confiam no systema parlamentar, ou o julgam inutil (Apoiados.) Não se póde viver de illusões. (Apoiados.)
O illustre deputado, o sr. Castello Branco, no seu ardente enthusiasmo na defeza da dictadura de 19 de maio, disse aqui (se não estou em erro, o que rectificarei, se assim for), que não devia causar grande surpreza esta dictadura, pois que tinha havido muitas dictaduras no paiz, e até dictaduras parlamentares, e parece que chamou á lei de meios verdadeiras dictaduras parlamentares! A impugnação da minha proposta significa, pois, que vamos para a lei de meios, isto é, para a dictadura parlamentar. (Apoiados.)
É a argumentação do illustre deputado, a quem respondo, se não estou em erro.
Temos, pois, em perspectiva mais outra dictadura. (Apoiados.) É commodo, mas é tambem desastroso. (Apoiados.)
Proponho que, de preferencia a tudo, se discuta o orçamento, e a maioria prepara-se para rejeitar a minha proposta. (Apoiados.)
Somos, pois, liberaes, mas liberaes de mera convenção. (Apoiados.) É claro que não me refiro á convenção franceza.
E digo que somos liberaes de convenção, porque entre os principios e os factos ha um verdadeiro abysmo; porque os factos na sua significação exterior exprimem o contrario do que parecem exprimir. A verdadeira realidade é differente, é opposta até ao que inculcam esses factos. (Apoiados.)
São já decorridos seis mezes com parlamento aberto, e que significa este facto isoladamente apreciado, que exprime na sua exterioridade?
Que somos um paiz essencialmente liberal, um paiz modelo de parlamentarismo, parque seis ou sete mezes no anno intervimos directamente na administração do estado. Seis ou sete mezes de camaras a funccionar, são seis ou sete mezes de fiscalisação do paiz, seis ou sete mezes de vigilância directa, continua, dos eleitos do povo aos actos do poder executivo.
Digam, pois, se ha paiz mais liberal.
Qual é, porém, a realidade dos factos?
Que significam, em verdade, estes seis ou sete mezes de parlamento aberto?
Significam que nada se fiscalisa, que o governo faz o que lhe apraz e que nem sequer temos poder para discutir o orçamento, a lei de receita e despeza do estado. (Apoiados.) Não se discutiu em 1884, não se discutirá em 1885. (Apoiados.)
Ainda mais. A nossa constituição politica contém principios que são verdadeiras conquistas liberaes.
Os artigos 12.° e 13.° do acto addicional representam algumas dessas conquistas, as quaes podem causar inveja a muitas nações; e refiro-me a estes artigos, porque são elles os que têem relação immediata com o assumpto em discussão.
O que garantem na realidade estes artigos, como defendemos as prerogativas populares que elles encerram?
Em 1881 o governo actual (porque representa a situação daquella epocha) não se preoccupou com o artigo 12.° do acto addicional; em 18S4 não se discutiu o orçamento, e o mesmo vae repetir-se com o orçamento de 1885. São, pois, letra morta os artigos citados; nullas de facto as garantias que elles encerram. (Apoiados.}
Lembro-me agora que o grande estadista Passos Manuel, encarecendo a importancia do artigo 12.º do acto addicional, que se completa com o artigo 13.° (e fallo só destes artigos, porque são aquelles que têem mais intima relação com o assumpto em discussão), dizia que os ministros, auctores d'esta reforma, eram dignos de uma corôa civica. A estes artigos chamava o notável estadista a chave do systema constitucional; a grande espada do parlamento.
Recordo-me ainda que Passos Manuel tomava a defeza do insigne orador José Maria Grande, que não teve duvida em affirmar que a denegação dos tributos é a ultima rasão dos parlamentos. (Apoiados.)
Haverá alguem que não considere opportunas estas citações historicas? (Apoiados.)
O que são, o que significam na pratica, estas conquistas liberaes?
Eu já disse, e agora repito, que o governo decretou a cobrança dos impostos em dictadura no anno de 1881, e que não discutiu o orçamento em 1884, como não o discutirá no anno de 1885.
Não posso, pois, ser arguido de exagerado, affirmando que a chave do systema constitucional, de que fallava Passos Manuel, se transformou em gazua, e que a grande espada do parlamento não tem já gume, e por isso não é temida, nem ao menos respeitada. (Apoiados repetidos.)
O sr. presidente do conselho, que é em tudo auctoridade, tem dito no parlamento frequentemente que as cousas são o que são. Condemna assim todas as dissimulares.