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SESSÃO DE 15 DE JUNHO DE 1885 2275

e familia para se internar tambem no mysterioso continente.
Disse eu que este plano allemão bem poderá chamar-se portuguez, e pondo já de parte a tradição dos nossos tratos sertanejos, os nossos esforços antigos e repetidos de abrir o caminho da contra-costa e de fazer para os nossos portos, de um e do outro lado, a drainagem dos sertões; nada mais conforme, realmente, com o nosso interesse economico e com a nossa segurança politica, - hoje particularmente, - do que pormos todo o empenho, - um esforço forte e continuo, - em derivar, e melhor direi, em assegurar e prender o commercio do interior, aos nossos territorios do sul do Zaire; - em promover a communicação das regiões centraes e a sua exploração e conquista pacifica, atravez dos nossos territorios occupados e a partir dos nossos portos de uma e outra costa que são os melhores de ambas ellas. (Apoiados.}
Sem fallar agora d'aquella margem esquerda do baixo Zaire que ficou sendo nossa e que tão maltratada tem sido por uma critica superficial e falsa, é certo que ao sul do grande rio possam as melhores e mais importantes correntes do commercio indigena que vem demandar o mar, e difficilmente se ha de conseguir affastar dos seus caminhos tradicionaes esse commercio.
Stanley e Brazza palparam este facto importante, que não entrou em pouco na sua hostilidade commum contra o estabelecimento e expansão do nosso dominio para o norte do Ambriz.
A questão é de uma administração previdente, liberal e pratica.
Mas o que fazia, a par d'este movimento crescente, definido, geral; d'estas ambições e d'estes planos insofridos, a nossa administração ultramarina?
Ha vinte e tres annos, em 16 de março de 1862 escrevia o conde de Lavradio, ao então marquez de Loulé:
«Muitos annos ha que o governo de Sua Magestade me está declarando que vae incessantemente occupar se da grande quentão das nossas colonias, mas até agora nada tem feito tendente a conservar o que tem, ou a recuperar o que individamente perdeu, excepto a occupação do Ambriz, cuja conservação foi inteiramente devida aos meus esforços e á minha energia, o que posso provar com documentos e com o testemunho de pessoas insuspeitas.»
E podia.
E logo quatro mezes depois, elle que estava em Londres então o quartel general da exploração africana, dizia ao mesmo ministro, em 16 de julho:
«Eu chamo tambem sobre ella (a questão colonial) a séria attenção do governo de Sua Magestade e se acaso Me não quer perder a Africa, tomo a liberdade de observar-lhe que é tempo, e mais que tempo de resolver o que cumpre fazer.»
Alma e palavra de velho portuguez, a d'este homem!
Aviso e conselho similhante vinha muitas vezes das nossas proprias possessões.
Algumas das nossas auctoridades coloniaes, e temol-as tido, previdentes, dedicadíssimas, leal e nobremente francas, pediam, insistiam, exoravam do governo da metropole que olhasse fundo e longe no presente e no futuro do nosso dominio, que as armasse com os meios e com os processos de assegurar a honra, a segurança, o desenvolvimento da soberania e da civilisação portugueza; que entrasse, de vez, n'uma politica essencialmente pratica, rompendo sobretudo com as preoccupações e com as illusões doutrinarias que levavam a applicar ás cegas e á aventura, a territorios inexplorados e a povos selvagens, instituições e leis moldadas para sociedades perfeitamente cultas.
Não houve só ministros que tivessem planos coloniaes. Houve governadores tambem que os elaboraram e estudaram,... no terreno.
Para encurtar, citarei um apenas. Apraz-me citar o homem que não conheço, do qual fui e sou adversario politico, mas ao qual estimo poder agora prestar a homenagem humilde do meu respeito e da minha sympathia pelo claro talento e pela previsão realmente notavel que elle demonstrou na governança de Angola.
Refiro-me ao sr. Sebastião Calheiros. (Apoiados.}
O sr. Calheiros foi um d'esses governadores do ultramar, nada vulgares, infelizmente, que se têem empenhado no estudo das provincias confiadas aos seus respectivos cuidados, e que têem podido tracejar com mão firme e olhos perspicazes, um plano de administração e reforma.
Um seu trabalho, pouco conhecido geralmente, o relatorio referido ao anno de 1861, contém lições e advertências importantissimas que não deixaram de o ser ainda.
O livro póde ter envelhecido, antes mesmo de ter sido meditado onde mais importava que o fosse. As idéas, muitas d'ellas, pelo menos, conservam-se mais opportunas e praticas do que certos factos que já então as sugeriam.
Colhâmos algumas.
«Achei a auctoridade administrativa dos concelhos» diz o sr. Calheiros, «ligada á auctoridade militar, princpio com o qual ineiramente me conformo, mas achei em varios d'elles, ao lado d'aquella auctoridade, instituições municipaes e judiciaes, de que a população não está de modo algum ao alcance, e que exercidas por gente absolutamente incapaz, são um grande vexame directo para o povo e um obstaculo muito poderoso á acção benefica e energica da unidade de pensamento e acção governativa que é indispensavel haver n'um paiz selvagem, como não póde rasoavelmente deixar de considerar-se esta provincia.
«Já declarei que acceitava inteiramente o principio da união da auctoridade civil e militar; direi agora que voto com todas as minhas forças para que se reuna no mesmo individuo a auctoridade judicial, como existe na maioria dos concelhos. O principio fundamental do governo d'esta colonia deve ser o da grande centralisação, prevalecendo o elemento militar que é o da acção, da disciplina e da obediencia.»
Convem considerar despreocupadamente estas idéas, na sua relação logica com as origens e tradição do nosso dominio angolense, e na situação relativa d'elle pelo que importa ás suas condições sociaes.
Angola foi uma conquista, e na sua maior parte está longe de ser ainda uma colonia contínua e assente.
Convem sobretudo não attribuir ás palavras do sr. Calheiros uma extensão doutrinaria que ellas não têem, como ha de ver-se.
Continuemos, porém:
«As instituições municipaes (acrescenta) e as jsutiças ordinarias não offerecem no meu entender e no das pessoas que conhecem o sertão de Angola, a menor vantagem social. O concelho de Massangano possuindo-as desde que cessou a occupação dos hollandezes, é um dos mais atrazados e menos importantes do interior.»
E juntava as respostas ao questionario que mandára correr.
Coincidiam em dizer «... que os julgados em vez de produzir utilidade obrigam os povos a emigrar para diversos pontos gentios a fim de se eximirem ás extorções e vexames dos juizes ordinarios, de paz, sub-delegados, escrivães e meirinhos, e alem de tudo as decisões d'estas auctoridades são quasi sempre absurdas e irrisorias...»
O chefe de Massango escrevia:
«A camara d'esta villa foi fundada ha mais de duzentos annos e hoje não tem, nem me consta que tenha tido, sequer ao menos, uma modesta cubata aonde celebre as suas sessões, nem um banco ou cadeira possue...
«Os rendimentos da mesma camara são absorvidos de uma maneira mysteriosa.
«A camara em cousa alguma se occupa dos interesses dos povos.
«Alguns dizem, que a referida instituição, aliás liberal e util no sentido com que foi creada, não satisfaz aos fins

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