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1955

Discurso do sr. deputado Mártens, Ferrão, principiado na sessão de 18 e concluido na de 19 do corrente

O sr. Mártens Ferrão: — Sr. presidente, adiantada como está a sessão, eu não desejo fatigar a camara; mas não posso deixar de fazer algumas reflexões - sobre o capitulo em discussão. Não é que eu dispute a verba, mas desejo dizer alguma cousa ácerca da administração da justiça. A discussão do orçamento é principalmente a discussão da administração e a indicação dos meios de a melhorar. Se a discussão do orçamento não fosse isto, é forçoso confessar que seria bem pouca cousa! Esta tem sido a intelligencia que sempre se tem dado a este debate, e não podia ser outra. No momento em que o parlamento vota os meios para os serviços do estado, quando os dota, tem direito não só a perguntar como se administram, mas a indicar uteis alvitres sobre a administração.

Eu insisto na idéa que já aqui sustentei. Quando certos ramos importantes de serviço publico carecem de uma vasta organisação, quando a necessidade d'essa organisação é reconhecida pelos poderes publicos e reclamada pelo publico, cumpre com impaciencia encarar as reformas em toda a sua extensão, e com desassombro subordina-las a um plano, e satisfazer assim ás necessidades publicas. Não posso approvar o systema de expedientes como norma de administrar.

Partindo d'esta consideração, não posso deixar de apresentar algumas reflexões, breves de certo, a respeito da organisação da administração judicial.

Nã é meu intento censurar nem elogiar a magistratura; não trato d'isso. Pela minha parte respeitei-a sempre, respeito-a, considero-a hoje; mas não venho aqui agora fazer-lhe nem elogios nem accusações; não e essa a missão que me proponho, mas unicamente tratar a questão da administração.

Se a magistratura fosse arguida como classe, levantar-me-ia para a defender, porque isto consideraria [um dever de consciencia. Mas esta minha opinião ácerca da respeitavel classe da magistratura não significa que eu julgue a administração judicial organisada de maneira que não careça de uma grande reforma em quasi todos os seus ramos.

As pequenas reformas sobre um ou outro ponto d'aquelles sobre que mais se insta, quando as necessidades publicas demandam uma reforma geral, têem, a meu ver, grandes inconvenientes; e eu preferiria antes (talvez isto seja um principio paradoxal) o estacionalismo por mais algum tempo, do que o seguimento do systema fatal de expedientes.

Eu fallarei muito franco. Administra-se mal? Inquestionavelmente. A organisação da administração da justiça está má? Ninguem o póde negar. A culpa é da magistratura? Não, senhores; a causa está na insufficiencia e nos defeitos das instituições, e n'um conjunto de circumstancias, sobre as quaes é necessario chamar a attenção dos poderes do estado.

Nós temos na administração da justiça o principio constitucional, que está na carta, que está nos principios da sciencia politica, e que é por isso um ponto fundamental; é a independencia do poder judiciário; eu quero a absoluta independencia d'este poder, e hei de n'esta casa sustenta-la sempre, porque sem ella não comprehendo o poder judicial. Não se trata da independencia de homens, trata-se de uma garantia para a sociedade. Mas a par d'essa independencia é necessario, é indispensavel estabelecer uma grande responsabilidade (apoiados).

É necessario que as instituições paralellas na administração judicial se organisem de modo que possam satisfazer ás necessidades publicas; é necessario que a legislação seja simplificada, e é mister igualmente que a magistratura seja bem retribuida; é necessario estabelecer um bom systema de habilitações para a admissão á magistratura; em uma palavra, precisâmos de uma reconstrucção em quasi todos os pontos da organisação judicial (Vozes: — Deu a hora). Eu não tenho muito que dizer, mas peço a V. ex.ª que me reserve a palavra para a sessão seguinte; hei de ser muito breve, mas preciso fazer algumas considerações, e chamar sobre ellas a attenção do governo.

Sr. presidente, eu disse na sessão passada que a administração da justiça carecia de reformas em quasi todos os seus ramos; e em muitos d'elles carecia de um mais vasto desenvolvimento. Entendia que era de absoluta necessidade que se lançassem, pelo menos, as bases d'essas reformas mais importantes a que as outras estão subordinadas; porque se se quizesse continuar no systema de expedientes, de propostas isoladas e sem connexão, attendendo apenas a um ou outro ponto isolado, havia n'isso grandes inconvenientes, não só porque essas pequenas reformas não se poderiam fazer de uma maneira harmonica por dependerem de desenvolvimentos paralellos que não se realisavam, mas ainda por uma rasão politica; porque satisfazendo-se a alguns pontos que as necessidades publicas reclamassem com mais urgencia, a anciedade publica, a força da opinião, que exigia a ordem de melhoramentos geraes, satisfeitos esses pequenos elementos affrouxava, e seria isto uma causa de difficuldades para que os governos podessem realisar depois as outras medidas que deviam acompanhar aquellas.

Póde ser que pareça paradoxal esta minha opinião, e occasiões haverá em que não seja de todo o ponto verdadeira, mas em principio, entendo que não póde ser contestada.

Eu disse tambem que não vinha aqui tecer elogios á magistratura, nem irrogar-lhe censura, assim como não vinha irrogar censura nem tecer elogios ao governo; e acrescentei que se a magistratura fosse aqui aggredida como classe, eu seria o primeiro a defende-la até onde chegassem as minhas fracas forças, porque esse era o meu dever conforme a minha consciencia; mas que pretendia apresentar ao parlamento, e em presença dos poderes publicos, a maneira por que penso ácerca da organisação da administração da justiça.

Eu creio que este concurso de opiniões, e a apresentação dellas ao parlamento é sempre de conveniencia, não só porque se excitam os poderes publicos, e se podem despertar lembranças dignas de se aproveitarem em alguns pontos, mas porque mostra que o parlamento se occupa de um objecto importantissimo como é este.

Não julgue a camara que eu pretendo fazer uma longa dissertação sobre todos os melhoramentos e reformas a fazer para se melhorar a administração da justiça; mas não posso