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Sessão de 11 de junho de 1879
Presidencia do ex.mo sr. Francisco Joaquim da Costa e Silva
Secretarios — os srs. Antonio Maria Pereira Carrilho
Barão de Ferreira dos Santos
SUMMARIO
São approvados em sessão secreta os projectos de lei n.º 144, approvando o tratado de commercio e estradição entre Portugal e a. Gran-Bretanha, para regular as relações entre as suas possessões na India; e n.º 145, approvando a convenção assignada em París aos 8 do abril da 1879 para a prorogação do tratado de commercio de julho de 1866 entre Portugal e a França.
Abertura — As tres horas da tarde.
Presentes á abertura da sessão 52 deputados: — Os srs.: Adolpho Pimentel, Fonseca Pinto, Agostinho Fevereiro, Osorio de Vasconcellos, Tavares Lobo, Alfredo Peixoto, Torres Carneiro, Pereira de Miranda, Gonçalves Crespo, Avila, Lopes Mendes, Carrilho, Pedroso dos Santos, Barros e Sá, Pinto de Magalhães, Fuschini, Victor dos Santos, Barão de Ferreira dos Santos, Sanches do Castro, Diogo do Macedo, Costa Moraes, Hintze Ribeiro, Francisco Costa, Van-Zeller, Paula Medeiros, Palma, Costa Pinto, Brandão e Albuquerque, Scarnichia, Barros e Cunha, Sousa Machado, Almeida e Costa, J. J. Alves, Tavares de Pontes, Frederico Laranjo, Frederico da Costa, Sousa Monteiro, Mello Gouveia, Luiz do Lencastre, Luiz de Bivar, Luiz Garrido, Manuel d'Assumpção, Correia de Oliveira, M. J. Vieira, Macedo Souto Maior, Nobre de Carvalho, Miguel Dantas, Miguel Tudella, Pedro Jacome, Rodrigo de Menezes, Visconde de Andaluz, Visconde da Azarujinha.
Entraram durante a sessão — Os srs.: Moreira Freire, Emygdio Navarro, Goes Pinto, Melicio, Dias Ferreira, Barbosa du Bocage, Lourenço de Carvalho, Freitas Branco, Pires de Lima, M. J. Gumes, Mariano de Carvalho, Miranda Montenegro, Pedro Barroso, Visconde da Arriaga, Visconde do Rio Sado.
Não compareceram á sessão — Os srs.: Carvalho e Mello, Alfredo de Oliveira, Alipio Leitão, Emilio Brandão, A. J. Teixeira, Arrobas, Mendes Duarte, Telles de Vasconcellos, Ferreira de Mesquita, Pereira Leite, Neves Carneiro, Zeferino Rodrigues, Avelino de Sousa, Bernardo de Serpa, Caetano de Carvalho, Carlos de Mendonça, Cazimiro Ribeiro, Conde da Foz, Filippe do Carvalho, Firmino Lopes, Fortunato das Neves, Mesquita o Castro, Francisco de Albuquerque, Pinheiro Osorio, Monta e Vasconcellos, Gomes Teixeira, Pereira Caldas, Sousa Pavão, Frederico Arouca, Guilherme de Abreu, Silveira da Mota, Freitas Oliveira, Jeronymo Pimentel, Jeronymo Osorio, Anastacio do Carvalho, João Ferrão, J. A. Neves, Ornellas de Matos, Pires de Sousa Gomes, José Guilherme, Figueiredo do Faria, Namorado, Rodrigues do Freitas, Ferreira Freire, Teixeira de Queiroz, Borges, J. M. dos Santos, Pereira Rodrigues, Sá Carneiro, Taveira de Carvalho, Julio de Vilhena, Lopo Vaz, Almeida Macedo, Faria e Mello, Rocha Peixoto, M. J. de Almeida, Alves Passos, Aralla o Costa, Pinheiro Chagas, Marçal Pacheco, Pedro Carvalho, Pedro Correia, Pedro Roberto, Ricardo Ferraz, Thomás Ribeiro, Visconde da Aguieira, Visconde de Alemquer, Visconde de Balsemão, Visconde de Moreira de Rey, Visconde de Sieuve de Menezes, Visconde de Villa Nova da Rainha.
Acta — Approvada.
EXPEDIENTE
Officio
Do ministerio do reino, acompanhando copia da acta da sessão da junta de revisão de 30 de setembro de 1878 do districto de Braga, satisfazendo assim ao requerimento approvado pela camara dos senhores deputados em sessão diurna de 12 de maio ultimo. Enviado á secretaria.
O sr. Ministro da Guerra (João Chrysostomo do Abreu e Sousa): — Está pendente da resolução da camara dos senhores deputados uma proposta de lei, apresentada pelo meu illustre antecessor, em relação ás fortificações de Lisboa, pedindo auctorisação para ellas continuarem.
Escuso de encarecer a importancia d'aquelles trabalhos, conhecida por todos os lados da camara. Seria realmente desastroso e inconvenientissimo que se suspendessem áquelles trabalhos, porque isso importava não só o descurar-se o elemento principal de defeza do paiz, mas tambem desorganisar aquelles serviços.
D'ahi viria necessariamente um desperdicio porque, deixando se parar as obras, e desorganisados os serviços, seria depois necessario organisal-os de novo, o mesmo acudir á destruição que resultasse de alguns trabalhos effectuados e não concluidos.
Parece me portanto que toda a camara reconhecerá a necessidade de continuarem áquelles trabalhos; por isso pedia ás illustres commissões de fazenda e do guerra que quanto antes apresentassem o seu parecer sobre este objecto, para que o governo possa applicar os meios necessarios na continuação d'aquellas obras.
Não posso por emquanto dizer á camara quaes são as minhas idéas em especial sobre a defeza do paiz, e particularmente em relação ao plano do trabalhos que está em execução; entretanto esse plano está approvado pelo governo o foi commettido a distinctissimos officiaes o generaes do exercito portuguez e estou certo de que hão do satisfazer ás vistas que o governo tinha a similhante respeito.
Não deixará de ser este um dos primeiros objectos do que me occupe, examinando detalhadamente esses serviços procurando que elles satisfaçam aos fins que se tem em vista.
Na presente situação financeira o ministerio tem por principal dever o fazer todas as economias compativeis com a boa organisação do serviço, e evitar todas as despezas que se possam adiar, e posto que n'esta proposta de lei não esteja consignada uma certa verba, eu hei de empregar todos 03 meus esforços não só para que essa verba seja bem applicada, e para isso espero encontrar a coadjuvação dos distinctos officiaes que estão á tosta d'este serviço, alguns dos quaes têem assento n’esta casa, e outros officiaes que igualmente os coadjuvam, mas fazer todas as economias que a situação financeira presente, assás acanhada, nos aconselha.
O sr. Carrilho: — Por parte da commissão de fazenda declaro a v. ex.ª e á camara que a proposta de lei a que se refere o sr. ministro da guerra já tem parecer da commissão do guerra, e esse parecer foi enviado á commissão de fazenda, a qual o distribuiu ao sr. deputado Ferreira de Mesquita.
O sr. Rodrigo de Menezes: — Mando para a mesa a seguinte
Declaração de voto
Declaro que na sessão de hontem rejeitei os requerimentos dos srs. deputados José Maria Borges e José Guilherme Pacheco para que, dispensado o regimento, entrassem em discussão os pareceres n.ºs 137, 130 e 135, e não approvei o parecer n.º 137 que foi votado, por julgar
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inopportuna a tua discussão e approvação. = O deputado, Rodrigo de Menezes.
Mandou-se lançar na acta.
O sr. Sousa Machado: — Tenho a honra de mandar para a mesa um projecto de lei de que peço a urgencia, e se for votada requeiro a v. ex.ª que igualmente consulte a camara se dispensa as prescripções regimentaes, a fim de que entre desde já em discussão.
(Leu.)
Sr. presidente, como v. ex.ª vê o vê a camara o projecto não é precedido de relatorio.
Eu poderia, como um politico do paiz, dizer que o relatorio é a opportunidade, mas creio que o adiantado da sessão, a urgencia determinada pelas circumstancias extraordinarias da presente situação politica da camara justificam essa falta, que aliás julgo não ser de grande importancia.
Não trato agora de saber quantas coordenadas geographicas determinou o audaz explorador, quantas notas traçou, em quantos rios e lagos fez sondagens, como determinou o seu itinerario, e qual o merito scientifico d'essa exploração.
Estou certo de que ella será gloriosa para o geographo e honrosa para o paiz.
Mas a heroica coragem o inexcedível perseverança com que Serpa Pinto levou a cabo a arriscada, perigosa e sempre trabalhosa travessia da Africa central o elevou tanto na estima e consideração publica de nacionaes e estrangeiros, que o seu nome será recordado com distincção na historia d'este paiz. (Apoiados.)
O projecto do lei que mando para a mesa não é o galardão que entendo se deve dar ao major Serpa Pinto pelos serviços prestados á sua patria com a arrojada empreza de em curto praso atravessar o interior de Africa, porque o considero demasiado modesto em relação á magnitude do feito; mas se a camara o votar desde já, dispensando todas as formalidades exigidas pelo regimento para o estudo das questões que lhe são affectas, dará assim uma evidente demonstração do subido apreço em que tem e merece a coragem d'este bravo e brioso soldado portuguez, constituindo essa fórma e modo de concedia' o verdadeiro merito da recompensa offerecida.
Se, porém, a camara julgar em sua sabedoria que o projecto siga os tramites ordinarios, eu respeitarei, como devo, a sua deliberação, ficando com a consciencia de haver cumprido um dever e interpretado os sentimentos da maioria dos cidadãos portuguezes.
Se 03 contemporaneos não galardoarem devidamente o. valor de animo e intrepidez arrojada do jovem official, a posteridade abençoará seu nome.
Serpa Pinto conquistou um logar eminente na historia patria, e elevou a sua patria aos olhos das nações estranhas.
Mando para a mesa o projecto, que submetto á consideração da camara e do paiz.
Consultada a camara, approvou a urgencia. Leu-se na mesa o seguinte
Projecto de lei
Artigo 1.° É qualificado, sem prejuizo de antiguidade, o posto do major do exercito concedido ao capitão de caçadores, Alexandre Alberto da Rocha Serpa Pinto, por decreto de 8 de maio de 1877, publicada na ordem do exercito n.º 16 de 14 do mesmo mez e anno.
Art. 2.° A antiguidade d'este posto será contada da data da ordem do exercito em que for publicado o disposto no artigo 1.°.
Art. 3.º Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara dos deputados, em 11 de junho de 1879. = João de Sousa Machado, deputado por Cabo Verde.
O sr. Adolpho Pimentel: — No primeiro dia em que o governo veiu a esta camara e n'ella se apresentou uma moção de desconfiança politica, votei essa moção, sendo levado a isso por duas considerações, unta de dignidade propria e outra do lealdade politica.
A dignidade propria mandava-me proceder assim, porque pertencendo eu a um partido em diametral opposiçâo a s. ex.ªs, não queria, que alguem, que me não conhecesse, suppozesse que eu pertencia áquella onda infelizmente muito numerosa em todos os paizes, dos que adoram o sol que nasce, embora tenham não raras vezes de apedrejar o que na vespera haviam adorado. A lealdade politica obrigava-me tambem a votar essa moção, visto que ella não foi apresentada em nome de um individuo, mas sim de um partido.
O illustre deputado que a apresentou é muito distincto o eu respeito muito o seu talento, mas não foi individualmente que apresentou essa moção; apresentou a em nome de um partido, e eu, ainda que sou o ultimo soldado d'esse partido, não podia deixar de a apoiar.
Desde que votei a moção de desconfiança, tenho obrigação do não negar ao governo os rácios constitucionaes para poder governar, porem só esses meios, fazendo excepção unicamente, por considerações de alto alcance e momentosa importancia, a respeito de quaesquer tratados internacionaes que fosse necessario approvarem-se immediatamente; de resto inhibira-me de votar outra qualquer cousa.
E pois, por todas estas rasões que, se hontem estivesse presente quando o meu illustre amigo o sr. José Maria Borges fez o requerimento para entrar em discussão o projecto do lei, que augmentava o subsidio dado pelo estado no monto pio geral, não me importava com a justiça que, creio, estava consagrada n’esse projecto: importava-me apenas a consideração de que era obrigado a abster-mo de votar tudo que não fosse o que já disse.
Cheguei tarde, o por esse motivo não me foi possivel protestar contra, a admissão desse projecto á discussão.
Não pude, portanto, rejeitar o requerimento feito pelo meu amigo o sr. José Maria Borges, cavalheiro a quem presto a maior consideração e respeito, e. fui procedendo assim, que rejeitei o requerimento feito pelo sr. José Guilherme Pacheco, no qual pedia que entrassem em discussão dois projectos, e votei contra, apesar da amisade que consagro a s. ex.% porque quero ser coherente. Cada um veia como entenda, 'e fica satisfeito com a sua consciencia.
Para, que ámanhã me não accusem de incoherente, ou me digam que procedi menus lealmente do que devia proceder, é que pedi a palavra, para dar esta explicação, antes mesmo de saber que o sr. Sousa Machado ía apresentar o seu projecto do lei.
A minha voz n'este parlamento foi a unica que se ergueu ' para elogiar o distincto explorador Serpa Pinto, quando se soube que elle tinha conseguido fazer a importante e arriscadíssima travessia da Africa, e conseguintemente a camara comprehende que eu não poderia votar contra o projecto apresentado pelo sr. Machado, mas em outra occasião que não fosse a actual.
Sou o primeiro a confessar que são dignos do todo o louvor os valiosos serviços que á sciencia e á sua patria acaba de prestar o ousado explorador Serpa Pinto. A nação devo premiar tão relevantes serviços.
Sinto que esse projecto não tivesse sido apresentado antes de ler eu votado a moção de desconfiança, porque desejava associar o meu humilde nome á sua approvação. Hoje, porém, não o posso fazer, porque voto contra tudo que não seja o que, ha pouco, acabei de expor.
Votei a lei do meios, porque não queria com o meu voto negativo empurrar o governo para a dictadura e votarei qualquer medida tendente a regular relações internacionaes, porque não quero assumir a responsabilidade, talvez grave, da sua rejeição. (Apoiados.) Termino, fazendo votos que infelizmente espero não ver satisfeitos, para que os srs. ministros que estão sentados n'aquellas cadeiras governem bem, concorrendo para o bom nome do seu partido e
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o que mais interessa para a prosperidade do paiz, que a todos importa, e que o sr. ministro do reino sustente nas cadeiras do poder as santas e liberaes doutrinas que proclamava quando estava nos bancos da opposição, a respeito da independencia do suffragio e liberdade da urna. Concluo, mandando para a mesa a seguinte
Declaração de voto
Declaro que, se estivesse presente quando na sessão de hontem se votou o requerimento do sr. deputado José Maria Corgos, para que entrasse em discussão o projecto de lei que augmentava o subsidio dado pelo governo ao monte pio official, teria votado contra. — O deputado, Adolpho Pimentel.
Mandou-se lançar na acta.
O sr. Fuschini: — Supponho que não póde haver duvida ácerca das minhas idéas em relação ao actual governo; declaro, pois, que não votarei proposta de lei alguma, das que forem apresentadas n'esta camara, a menos que ella não traduza um interesse geral o primordial, sempre superior a qualquer politica partidaria.
fie votei a urgencia do projecto de lei apresentado pelo sr. Sousa Machado, é porque aquelle projecto, alem de ser patriotico, nada tem de politico.
Eu ouvi dizer a um dos srs. deputados, que nós queriamos fazer majores por acclamação com muita facilidade. E possivel; mas o que certamente s. ex.ª não encontra com muita facilidade são homens que atravessem a Africa da costa occidental á oriental...
Estimo sempre vir o merito galardoado, e para mim é um grande merito a energia da vontade e o desprendimento da vida no interesse da sciencia o da humanidade.
Desejo, pois, que fique bem consignado nas actas d'esta camara, que eu não só votei a urgencia da discussão do projecto de lei, que garantia o posto do accesso ao sr. Serpa, Pinto, nosso explorador na Africa, mas que muito gostosamente o teria defendido, se necessario fosse, e approvado.
Hontem tambem votei o projecto de lei que concedo augmento de subsidio ao monte pio official, porque eu sei, comquanto d'elle não faça parte, as precarias circumstancias em que se acha este estabelecimento, e conheço quantos interesses respeitaveis lhe estão ligados (Apoiados.) e quantas familias ficariam reduzidas á miseria, se elle suspendesse ou reduzisse os seus pagamentos.
Agora, era relação ao ministerio, todos sabem que sou opposição migada e franca; farei esta declaração quantas vezes for necessario, o em quantas perguntas tenha de dirigir ao sr. ministro do reino, que hão de ser muitas.
O sr. Alfredo Peixoto: — Serei breve nas considerações para que pedi a palavra.
V. ex.ª sabe perfeitamente que, nas extraordinarias circumstancias em que nos encontrâmos, é obrigação do cada um de nós ser breve em quaesquer considerações, já que ainda temos obrigação de vir a cala casa.
Declarei na sessão de 2 d’este mez, que só votaria, não ao governo, mas á nação, o que fosse absolutamente indispensavel para a administração constitucional do paiz, e unicamente pelo tempo absolutamente preciso.
Com franqueza, entendo que o projecto votado hontem por esta camara, ácerca do monto pio official, está incluido no que é absolutamente indispensavel para a administração constitucional do paiz, pois considero-o urgente e inadiável, e portanto a sua approvação é tão indispensavel para o governo constitucional do paiz, como são os projectos das leis de receita o despeza, sem as quais não póde governar constitucionalmente. (Apoiados.)
A estes projectos, nas circumstancias em que nos achámos, não pudemos recusar, o nosso voto. (Apoiados)
Na lei de despesa, como v. ex.ª sabe, estão incluidos os vencimentos dos empregados publicos; e tão sagrados como estes vencimentos, considero os compromissos que o estado tomou e deve manter com as familias dos empregados fallecidos que foram socios do monte pio official. (Apoiados)
São difficeis o precarias as circumstancias do monte pio official; é indispensavel remedio urgente; e, para que este fosse dado conforme os preceitos constitucionaes, devia a camara approvar, como fez, o projecto tendente o salvar de ruina futura esta bella instituição.
Quanto ao mais, declaro a v. ex.ª que nem voto contra, nem a favor do qualquer projecto que. não esteja n'estas circumstancias, (Apoiados.)
Ha pouco, como v. ex.ª ha do ter notado, fiquei sentado, quando v. ex.ª consultou a camara sobre a urgencia do projecto do sr. deputado Sousa Machado, meu illustre amigo; mas, ficando sentado, não quiz recusar o meu voto a tal projecto; quiz significar assim que nós constitucionalmente não podiamos discutir este, nem qualquer outro projecto que não esteja nas circumstancias que ha pouco indiquei á camara. (Apoiados.)
Declaro a v. ex.ª, com toda a franqueza que, quando este projecto for submettido á deliberação da camara em occasião opportuna, hei de approval-o, se tiver logar n'esta casa, pois é justo.
Se a camara o approvar ainda n'esta sessão, o que não é de esperar, o seu voto ha, de ser inutil; pelo menos é esta a minha opinião, porque, desde que dei um voto de desconfiança ao governo, entendo que elle ha de praticar o que for injusto o impedir o que for justo.
As ultimas nomeações feitas pelo sr. ministro do reino auctorisam-me já a affirmar isto. (Apoiados)
Vi em taes nomeações escolhido ou antes contemplado um homem que eu imaginava que tinha morrido para todos os cargos publicos. (Apoiados)
Eu tinha visto, sr. presidente, graves accusações dirigidas contra um homem por causa da direcção de um banco, tanto em artigos de responsabilidade conhecida, pois eram assignados e reconhecidos, como em jornaes insuspeitos para o sr. ministro do reino o para o accusado, pois eram do partido do s. ex.ªs; e é certo que taes accusações ainda não foram respondidas.
E o Progressista do Coimbra, que é do partido do sr. ministro do reino, um dos jornaes a que me retiro; é outro O Conimbricense, que não é do partido do sr. ministro do reino, porque não é do partido algum, mas que emfim apoiou sempre a politica da opposição progressista, no tempo do gabinete em que era ministro do reino o sr. conselheiro Rodrigues Sampaio.
Estou convencido do que factos como os d’estas nomeações hão de repetir se com frequencia, o pela ordem por que forem succedendo, terei o cuidado, em quaesquer circumstancias em que a camara se encontre, de anuuncial-os ao paiz.
E estou persuadido até de que, se todos fizerem o mesmo, todos terão que dizer e todos os dias.
Estes factos, como v. ex.ª vê, são mais um motivo para eu insistir na desconfiança em que estou centra o governo.
Creio assim e finalmente que fica bem explicado o motivo porque, ha pouco, fiquei sentado quando foi votada a urgencia do projecto de lei apresentado pelo sr. deputado Sousa Machado.
O sr. Ministro do Reino (Luciano do (lastro): — Só por muita deferencia, para com a camara o para com o illustre deputado, darei ligeiras e brevissimas explicações a s. ex.ª
Parece que o sr. Rocha Peixoto alludiu á nomeação de um funccionario feita por mini. S. ex.ª não disse o nome d’esse funccionario; todavia quem quer que seja, se o illustre deputado entende que essa nomeação foi má e que esse individuo praticou algum acto que o impede de ser funccionario publico, peço a s. ex.ª que apresente esse facto, tomando a responsabilidade da sua accusação e o illustre deputado verá que o governo sabe cumprir com o seu dever (Apoiados)
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Sr. presidente, não se póde aqui vir fazer accusações, fundando-se no que dizem os jornaes. (Apoiados.)
Se este processo fosse bastante para excluir qualquer individuo do serviço publico, poucos homens n'este paiz poderiam ser nomeados para empregos publicos, porque poucos serão áquelles que não tenham sido accusados pelos jornaes. (Apoiados.)
Respeito muito a imprensa. Nasci ahi, estivo lá por muito tempo, tenho veneração por ella, mas a imprensa póde errar quando tem accusado ou elogiado certos individuos, e por isso o governo precisa de factos serios e fundamentados para determinar a sua opinião. (Apoiados.)
Parece-me que o illustre deputado até foi o primeiro a declarar, que não tomava a responsabilidade das accusações que se faziam! e por consequencia, s. ex.ª não pode estranhar o meu procedimento pela nomeação do funccionario a que se referiu.
Não sei se estas explicações satisfarão o illustre deputado; não tenho outras que dar-lhe. Entretanto, se s. ex.ª formular a sua accusação do um modo claro e peremptorio, espero poder-me justificar perante a camara. (Muitos apoiados.)
Agora vou referir-me ao que ha pouco disse o illustre deputado o sr. Fuschini; e a esse respeito direi, como é minha obrigação, que estou prompto a responder, quanto em mim couber, ás perguntas que o illustre deputado entender dever dirigir-me.
Entretanto confio da benevolencia do illustre deputado, que quando as suas perguntas forem de tal maneira fulminantes que não possa dar desde logo uma resposta cabal e completa, s. ex.ª terá a bondade de esperar que me habilite para dar-lhe resposta.
Parece-me que...
O sr. Fuschini: — Não fui violento; o se alguma vez o fui, tenho aprendido com s. ex.ª
O Orador: Digo e affirmo ao illustre deputado, que não me envergonho das minhas violencias. (Apoiados.) Cada um é como é...
(Interrupção do sr. Fuschini.)
Exactamente. Eu sou o que sou e o sr. deputado ê o que é, nem mais nem menos.
Agora direi a s. ex.ª que não lhe chamei violento; o que eu disse, foi que se as suas accusações fossem de tal maneira fulminantes contra mim, que não podesse desde logo responder-lhe, confiava da benevolencia de s. ex.ª que me concederia o tempo necessario para me habilitar a dar resposta cabal e completa.
E realmente é para notar que quando estou sendo extremamente amavel para com o illustre deputado, s. ex.ª esteja tirando partido da suavidade das minhas phrases, armando se em guerra contra mim!
Já vejo que é infelicidade minha!
Mas se infelizmente não posso converter em meu favor as iras e o odio do illustre deputado, que parece manifestar-se tão irritado contra mim, ao menos peço a s. ex.ª que use para comnosco d'aquella benevolencia de que tantas vezes deu provas n'esta camara em relação ao ministerio que apoiou, não dando-nos a sua confiança, mas dispensando nos a indulgencia que não é costume negar-se.
Não tenho mais explicações que dar á camara. V. ex.ª sabe que estou disposto a dar todas quantas explicações o sr. deputado ou outro qualquer me peça, 0 se ellas não satisfizerem, creia a camara que a culpa será do meu entendimento e nunca da minha vontade.
(O sr. ministro não reviu este discurso.)
O sr. Alfredo Peixoto: — Nem fiz accusações, nem pedi explicações ao sr. ministro do reino. Não sei, pois, a que proposito veiu o longo discurso de s. ex.ª com insinuação que implicitamente n elle envolveu, de que eu havia feito accusações vagas.
Não fiz accusações. Disso que s. ex.ª tinha escolhido para um alto cargo administrativo, um homem a quem os mesmos partidarios de s. ex.ª tinham accusado de faltas gravissimas; não permittia a lealdade do meu caracter que eu assumisse a responsabilidade d'essas accusações, nem por agora a assumo, porque não conheço os factos o todas as suas circumstancias com a exactidão necessaria para accusar, nem estou disposto a conhecel-os.
Ao ministerio publico compete promover a averiguação dos mesmos factos, que aliás são do dominio publico.
O que me causou estranheza foi que o sr. ministro do reino fosso escolher para um cargo importante um individuo que partidarios seus têem accusado de graves faltas, do faltas que, sendo provadas, importam inhabilitações para qualquer emprego publico.
Se ha fundamento n'essas accusações, o sr. ministro do reino foi infeliz na escolha do magistrado accusado, se não ha fundamento, é certo que os partidarios de s. ex.ª não duvidam calumniar na honra e probidade um homem do seu partido.
Repito, não assumo a responsabilidade das accusações, nem tenho obrigação de dizer o nome do magistrado a quem essas accusações foram dirigidas.
De todo o pessoal administrativo que o sr. ministro do reino escolheu, só conheço esse individuo que tem sido accusado pelos correligionarios de s. ex.ª, que assumirão sem duvida a responsabilidade de taes accusações, logo que lhes for exigida.
O sr. Fuschini: — Diz o Evangelho que é mais grato a Deus a regeneração de um peccador, do que a glorificação de cem justos; pois eu consegui regenerar o sr. ministro do reino?!
S. ex.ª, que n'esta camara apresentou haverá dias principios pouco parlamentares e ainda menos constitucionaes, acaba agora de omittir opiniões completamente differentes!
S. ex.ª que não só disse claramente, mas fez escrever, que achava inopportunas quaesquer respostas dadas pelo governo aos membros da maioria, desde que esta votou a moção de desconfiança, acaba de nos dizer o contrario!
Estou,» pois, muitissimo satisfeito, porque effectivamente imagino ter concorrido para o bem geral do paiz e para a regeneração moral do sr. ministro do reino, o que é tambem um ponto especial importante.
E como s. ex.ª se referiu, ti minha linguagem fulminante respondo exactamente como s. ex.ª cada um é o que é, este é o resultado da minha organisaçao, parece-me todavia que no pequeno discurso que em outro dia fiz, não ataquei nenhuma das qualidades individuaes dos srs. ministros nada disse que podesse ferir os caracteres de s. ex.ªs se houvesse de o fazer, o que pensa a Deus não succeda jamais, fal-o-ia com justiça, não ignorando que este logar é menos proprio para isso... o logar então não seria este.
Agora devo fazer notar ao sr. ministro que os maus exemplos são perniciosos.
Entrei n'esta casa cordato e sereno; quando, porém, me habituei a apreciar os discursos tribunicios de s. ex.ª, e tantos foram elles! Quando principalmente escutei aquelle famoso discurso pronunciado em uma poética meia noite de abril enluvado na sua bella eloquencia, comprehendi que s. ex.ª antes de ser um parlamentar distincto era um tribuno admiravel.
Então senti igualmente grandes tendencias para ser tribuno, e como mestre o adoptei.
Se s. ex.ª entende que sou violento, de si se queixe o não de mim.
Como mestre o reconheço e oxalá que o obscuro discipulo possa ainda dar alguns dias de satisfação ao seu mestre illustre...
O sr. Ministro do Reino: — Não estou em contradicção com o que disse ha pouco n'esta camara. Entendo que depois da approvação da moção do dia 2 d'este mez, o governo não póde ter mais relações com a camara, se não aquellas que forem absolutamente indispensaveis para
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o gabinete poder governar; mas isto não queria dizer que eu não estivesse habilitado para dar quaesquer explicações que se me pedissem, nem isto importava uma retractação do que eu havia dito á camara.
Eram estas as poucas palavras que tinha necessidade de dizer.
S. ex.ª diz que tomou o meu exemplo, e que as minhas palavras lhe dispertaram a vontade de ser tribuno.
Se o que eu disso fez com que o illustre deputado quebrasse o silencio a que parece se tinha imposto, para subir á tribuna e para se revestir dos ares de tribuno, eu não tenho senão a folgar com isso.
O sr. Fuschini: — Eu declarei-me seu discipulo.
O Orador: — Dou os parabens ao illustre deputado pelos progressos que tem feito, e á tribuna portugueza por contar com mais um ornamento.
(O sr. ministro não reviu os discursos que proferiu nesta sessão.)
O sr. Presidente — A camara vae constituir-se era sessão secreta, por assim o exigir o bem do estado.
Eram tres horas e tres quartos da tarde.
As cinco horas e vinte minutos continuou a sessão publica.
O sr. Presidente: — Na sessão secreta foi approvado por 47 votos contra 9 o projecto de lei n.º 144 sobre a approvação do tratado de commercio entre Portugal e a Gran-Bretanha, para regular as relações entre as suas possessões na India, o por 47 votos contra 3, o projecto de lei n.º 145 sobre a approvação do tratado de commercio assignado em París aos 8 de abril ultimo, para a prorogação, até ao fim do corrente anno, do tratado de commercio de 11 de julho de 1866, entre Portugal o a França, sendo o artigo 2.° substituido pelo seguinte artigo:
«E o governo auctorisado a convencionar uma nova prorogação do mesmo tratado, ou a acceitar o tratamento da nação mais favorecida, até que se regule definitivamente este assumpto.»
O sr. Secretario (Carrilho): — A commissão de redacção não fez alteração alguma nos projectos de lei n.ºs 144 e 345.
Vão ser expedidos para a outra camara.
O sr. Presidente: — A ordem do dia para sabbado é trabalhos em commissões, e para segunda feira apresentação de pareceres.
Está levantada a sessão.
Eram cinco horas e meia da tarde.
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