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SESSÃO DE 16 DE JUNHO DE 1885 2323

diversos cultos gentilicos, mais do que garantidos, regulados, mandados acatar e cumprir por decreto real, na India, - e muito rasoavelmente, e muito naturalmente, - conformam-se mais com a religião do estado, oppõem-se menos á moral e á ordem do que a polygamia, o lembamento, a idolatria africana?
Isto pelo que importa aos indigenas, que emquanto aos europeus creio que ninguem pensa que fosse possivel recusar-lhes a liberdade de que hão de gosar aquelles. (Apoiados.)
E em Macau não ha o culto publico dos chins, não se fazem aquellas grandes procissões phantasticas dos seus variados Ídolos, que muitos dos meus collegas, mais felizes do que eu, terão visto já?
A lei de 1 de julho de 1867, auctorisando o governo a tornar extensivo ao ultramar o nosso codigo civil, auctorisou-o igualmente a introduzir n'este as modificações exigidas pelas circumstancias, o que fez o decreto de 18 de novembro de 1869 dando effeito civil, - que ali as já tinham, - aos casamentos não catholicos e resalvando os usos indigenas na India, em Macau, em Timor e em Moçambique.
Não sei, porém, que mau espirito, muito formalista e bureaucratico, se introduziu no decreto de Rebello da Silva, fazendo-o sanccionar uma indicação pretenciosamente taxativa, - permittam-me a phrase, - da qual, alem disso, era excluido o gentio de Angola.
Lembro isto, não porque deixe realmente de existir em todo o nosso ultramar a mais ampla liberdade religiosa, como devo existir ou como não póde deixar de existir, - não, tão pouco, porque dê á observação do nosso collega, sr. Ennes, uma importância que elle proprio lhe recusou, mas para recordar um proposito ou um trabalho importante que anda um pouco esquecido e que é sob todos os aspectos necessario e importante continuar.
Refiro-me á codificação dos costumes indigenas, que tanto importa á nossa administração e á nossa politica colonial, por um lado, e que tanto ha de servir tambem a sciencia.
Na Africa oriental começou-se este trabalho ha muito, e justamente ha dias recebi as primeiras folhas de uma interessantissima compilação, ensaiada pelo intelligente e dedicado secretario geral o sr. Cunha e Almeida.
Na costa occidental nada se tem feito a este respeito, e mais a nossa velha administração tinha já por principio governar com os usos e costumes indigenas, como se vê, por exemplo, de um regimento de 1763, e nem esquecera esta idéa que muitos suppõem moderna e estrangeira dos residentes, que outra cousa não eram os capitães mores dos sertões independentes, etc.
E para terminar com a questão do artigo 6.° da carta: quando elle devesse entender-se em relação ao ultramar, e nos auctorisasse a levantar objecção ou reservas ás deliberações da conferencia, sabem todos que nos haviam de responder, e muito justamente com o principio corrente, que o marquez de Moustier, exprimia assim, em 1868:
«Um estado não póde eximir-se a uma obrigação do direito internacional pelo motivo de que ella não fora prevista na sua legislação interior. Em tal caso o caminho está traçado: o meio de remediar o mal é preencher a lacuna decretando as medidas legislativas necessarias.»
Que outra objecção se fez aqui ao acto da conferencia? Não me recordo de outras.
A de restricção de soberania onde não exercíamos até hoje, tem-se ensaiado lá fora, sem mesmo se reflectir sequer, não já na rasão e na historia do acto geral, não já nos principios modernos da soberania internacional, mas neste facto bem tangível e evidente que não havíamos de ser mais susceptíveis do que a propria França, nesta questão do exercício, soberano em relação a questões commerciaes.
E depois, é claro: - um tratado, um accordo, um contrato ha de sempre restringir n'alguma cousa a autonomia dos que os negoceiam e assignam.
Mas alem do acto geral, temos a convenção com o Rei doo belgas, ou com a associação do Congo.
A historia d'ella é conhecida, está exposta, ninguém lhe poz impugnação ou duvida.
Mas o que o meu illustrado amigo e nosso collega o sr. Consiglieri Pedroso objecta é a legitimidade dessa associação, é a propria existencia juridica d'esse novo estado.
Não podiamos negociar com elle.
Deveramos dizer isto á Europa?
E podiamos dizel-o, nota s. exa., e podiamos affirmal-o positivamente, terminantemente, com todos os tratadistas na mão.
Mas em primeiro logar a Europa havia de responder-nos, em boa rasão, que havia uma cousa que valia mais do que os tratadistas. Era, por exemplo, ... os tratados.
A Europa e os Estados Unidos da America tinham-n'os feito, faziam-n'os, ou mostravam as mais decididas disposições para os fazer com esse estado, que nem o era ainda, como não é, por ora.
Depois, que s. exa. me perdoe, mas ha muitos tratadistas antigos e modernos, ha até um viveiro d'elles, muito conhecido nesta mesma questão do Zaire, que julgam muito legitima e muito natural a formação de estados, por particulares ou por associações de particulares.
Tivemos mais de um na conferencia.
Nem tambem é perfeitamente exacto que nunca se visse que particulares e associações de particulares fundassem e constituíssem estados.
Sem ir muito longe, lembrarei ao meu illustre amigo muitas formações politicas americanas, a Ordem Teutonica, a de Malta, a republica da Liberia...
O sr. Twiss, que eu tive a honra de contar por collega na conferencia, - e ahi temos um tratadista que vale por uma objecção muito séria á observação de s. exa., - o sr. Twiss cita muitos exemplos, e uma mensagem do congresso americano, exactamente a respeito da associação internacional, e que eu tenho á mão, trata d'isto muito desenvolvidamente.
Mas é necessario lembrar que nós, rigorosamente não negociámos com a associação, mas com a Europa, e as circumstancias em que o fizemos?
É certo que sem mesmo se atíender a isto, se averba de expoliação e de desastre o resultado que essa convenção regista.
Perdemos a margem direita, e parece que ficando sem ella, ficámos sem o que realmente possuiamos, e nada adquirimos que não tivéssemos já.
Mas, francamente, chegáramos nós, n'algum tempo, - e dou todo este partido, - chegáramos nós n'alguma epocha a possuir effectivaramente algum ponto n'essa margem direita?
O que nós possuiamos, o que sustentavamos ter, do Ambriz para o norte, era o direito reservado ao exercício da nossa soberania, e em relação á linha do litoral que foi sempre do que resou a contestação anglo-portugueza.
Nunca official ou internacionalmente sustentámos o direito e a intenção de exclusivamente dominarmos por aquelles sertões a dentro, até ao alto Zaire, á lagoa de Stanley, ou ao Zanzibar.
Mas perdemos a margem direita, ou não ficámos com ella, é certo.
E ao sul, e ao norte, não obtivemos o reconhecimento geral que nos era positivamente recusado ha pouco, da nossa soberania do nosso direito de occupação e de governo, não sobre a linha da costa, não sobre as tribus ripicolas, como dizia o tratado de 1884, mas sobre toda a parte da costa acessivel á grande navegação ao norte e ao sul do rio, e d'este lado sobre os vastos territorios que vão até ao Quango? (Apoiados.)
Ah, sr. presidente, como estas cousas se julgam e como sobre elas se desvirtua e intriga a opinião, entre nós.
Pois não li eu hoje n'um jornal do Porto que nós ficára-