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1954

solver este negocio, porquanto, sondo uma camara nova, tem de occupar-se primeiramente dos negocios das eleições e de muitas outras especialidades proprias da occasião antes de entrar na analyse dos assumptos propriamente legislativos.

D'este modo a reforma do ministerio das obras publicas não poderá ser levada desde logo á execução na sua parte mais importante, e a consequencia será o prejuizo e todos os inconvenientes apontados no serviço publico.

Em vista pois do que ha pouco tive a honra de ler á camara, parece-me que não proferi uma asserção que não seja perfeitamente justificada, quando disse que tinha a favor da minha proposta os votos e o apoio dos homens mais illustrados e mais insuspeitos. Este é o fundamento principal da minha moção de ordem.

Dito isto, permitta-me a camara que eu a tranquillise a respeito das dimensões que pretendo dar ao meu discurso, e tranquillisando a tranquilliso-me a mim proprio.

A sessão está muito adiantada, os espiritos e«tào cansados, divisa-se uma certa impaciencia na assembléa, e portanto é fóra de duvida que as minhas observações não podem ter a extensão que n'outra occasião lhei daria.

Vou portanto limitar me a expressar o meu voto e a dizer a rasão por que insisto pela minha proposta, e por que não poderei approvar o projecto apresentado pelo governo se ella nao for approvada.

Faço isto, sr. presidente, tanto mais desassombradamente e tanto mais á minha vontade, quanto estou profundamento convencido da inutilidade e da improficuidade das considerações que vou apresentar, porque a experiencia me tem mostrado que n'estes ultimos tempos, nem as minhas rasões nem a dos meus collegas e amigos, que se assentam d'este lado, têem o poder de levar o convencimento á assembléa. Fallando pois n'estas circumstancias posso dizer o que entendo sem correr o risco de prejudicar interesses particulares que eu não quero offender, mas que não posso antepor ao cumprimento dos meus deveres de deputado da nação portugueza (apoiados).

Sr. presidente, eu entendo que o projecto em discussão é um projecto que beneficia muita gente (apoiados), e que a muitos aproveita. Prejudica outros, não ha duvida, mas esses não se queixam; são os que pagam. Em uma palavra, como disse ha dias um cavalheiro auctorisado e espirituoso, é um projecto que chega a todos, até chega ao contribuinte!

Já se vê portanto que o meu discurso não o pôde prejudicar em cousa alguma; o projecto ha de ser approvado. O que é preciso é que os contribuintes se preparem para todos os corollarios da reforma do exercito e das outras que lhe andam annexas, e que ficam reservadas para occasião mais opportuna, por quanto se deseja não affectar mais n'este momento a opinião publica.

Dizia eu, proseguindo n'esta ligeira exposição que estou fazendo; dizia eu que o projecto de que se trata póde ser o deve ser encarado debaixo de diversos pontos de vista.

Entretanto as circumstancias forçam-me a tocar apenas os pontos mais capitães, e que melhor caracterisam o projecto de que nos occuparmos, deixando de descei ás innumeras questões que os noventa e oito artigos do mesmo projecto podiam suggerir. Essa analyse deixo eu a oradores mais competentes, porque afastado ha muitos annos da carreira militar a que me honro de pertencer, não me julgo habilitado para poder tratar de todos os negocios que lhe são relativos com a proficiencia com que muitos dos meus collegas o podem fazer.

Li tudo; li o parecer das illustres commissões e li o projecto apresentado primitivamente pelo sr. ministro ria guerra, a quem não desejo ser desagradavel de modo algum, e s. ex.ª sabe o respeito e consideração que me merece; mas, apesar de toda essa consideração e sem faltar a ella, entendo que é do meu dever e dignidade expor á camara succintamente, e em poucas palavras, o meu modo de ver ácerca de um assumpto que reputo de tanta importancia e magnitude como é a reforma do exercito.

Direi agora do passagem, sr. presidente, que sinto que a illustre commissão de guerra, cujo relator fez hontem com tanta felicidade a sua estreia n'esta casa, deixasse consignar no relatorio algumas observações que parece tenderem a amesquinhar ainda mais a importancia de um negocio, aliás gravissimo como este é, e como não pôde deixar de se reputar, dizendo, para justificar o ter sido posta de parte a reforma do arsenal do exercito e do supremo conselho de justiça militar, que eram assumptos de grande transcendencia e precisavam de aturado estudo e meditação, quando essa reforma, de conformidade com o que se faz para o exercito, se limitava a regularisar alguns vencimentos dos militares empregados n'aquellas repartições.

Senti que se dissesse isto no relatorio do projecto, porque eu estimo o exercito e considero-o, não porque tenha a honra de pertencer aquella benemerita e respeitavel corporação, mas porque, como homem publico, entendo que ella é uma garantia de ordem e de independencia nacional, e que isso constituo uma das suas principaes obrigações e uma das suas primeiras glorias.

Desejo portanto que o exercito tenha todo o brilho e adiantamento que for compativel com a justiça e com as forças do estado, e que o accesso seja tão rapido como o é em muitos paizes, porque entendo que vale mais não ter exercito, se isso fosse possivel, do que te-lo mal pago, mal retribuido, mal equipado, mal armado e mal instruido, e onde não achassem remuneração condigna os servidores benemeritos que a elle pertencem.

Já lá vae o tempo em que uma certa opinião politica não era extremamente favoravel ao exercito. Agora têem mudado os ventos, e ha muitos espiritos convertidos. Hoje estão todos convencidos de que o exercito é uma garantia de ordem e de paz publica, e os receios que n'outro tempo se manifestavam de força armada, transformaram-se em complacencias e attenções. Ainda bem.

Mas eu quero exercito para a guerra, porque o exercito só para a paz seria o desperdicio mais completo e o luxo mais dispensavel que eu conheço. O exercito para a guerra é uma necessidade impreterivel, e está demonstrando esta asserção o direito publico internacional da Europa, na presença dos factos que se repetem todos os dias, pelos quaes se está vendo, que a utopia da paz geral não passa da cabeça dos philosophos humanitarios; hoje todos reconhecem a necessidade de ter exercito preparado para a guerra. E neste caso a missão de soldado, e soldado chamo eu a todos que seguem a honrosa profissão das armas, a missão do homem que vae dar o seu tempo, o teu sangue, a sua saude e a sua vida, para defender a independencia do seu paiz, é nobre, nobilissima, e tanto que não conheço alguma outra sobre a terra que se lhe possa comparar.

Mas quero exercito para a guerra, exercito equipado, bem armado, adestrado e instruido como deve ser; e este resultado é que se não colhe com a approvação d'este projecto. Sinto que o nobre ministro da guerra não aproveitasse a occasião de propor uma reforma n'este sentido á camara, que de certo lh'a approvaria; sinto que assim como propoz alguns beneficios pessoaes, aliás louvaveis e justissimos muitos d'elles, que se encontram em diversos artigos d'esta reforma a respeito de certos officiaes, não procurasse fazer, vingar ao mesmo tempo outras disposições concernentes á instrucção, ao armamento, ás promoções, ás recompensas militares, á reserva e a tudo quanto diz respeito a este importante ramo de administração publica.

Eu não comprehendo exercito sem campos de instrucção e de manobra, sem um material de guerra completo, sem disciplina rigorosissima, sem uma reserva prompta a entrar em campanha á primeira voz. Eu não comprehendo exercito finalmente sem o separar completamente das funcções de policia (apoiados). É uma opinião que tenho emittido muitas vezes, e em que insisto sempre. E estou profundamente convencido de que não haverá um pó militar que, mettendo a mão na consciencia, e considerando bem quaes são os serviços em que o exercito está sendo empregado, de policia das povoações, de guarda das cadeias, da escolta de presos, de prestar contingentes aos ministerios do reino, da fazenda, das obras publicas, e a todos os outros, a proposito seja de que for, não julgue impossivel haver ordem, nexo, disciplina, espirito de corpo, instrucção pratica, quando para esses differentes serviços cada um dos corpos tem de ser disseminado em destacamentos de 40, de 30 praças, e de menos ainda (apoiados).

Deste modo não sei que instrucção se possa dar ao officiaes e ao soldado; e sem isso não so formam nem soldados nem officiaes (apoiados). Esta idéa não é nova, é idéa seguida por nações essencialmente militares, e que prezam n'um grau elevadissimo a instrucção e a disciplina dos seus exercitos; que entendem que na instrucção e disciplina do exercito reside em grande parte a segurança da sua autonomia (apoiados).

Quando nós quizermos fazer com que o exercito seja o que deve ser, não é preciso que seja muito grande, não é preciso que os seus corpos se apresentem nos dias de ostentação com grande numero de praças; o que é necessario é que elle seja o nucleo organisado da resistencia militar do paiz, que possa ser augmentado rapidamente sem perturbação, e que esteja prompto para marchar ao encontro do inimigo, quando a independencia do paiz o exigir, com uma disciplina e instrucção militar que estejam na altura da que tiverem os corpos dos exercitos das outras nações. Isto é que é necessario (apoiados).

Depois de ter enunciado algumas das cousas que me parece que faltam n'esta reforma de organização militar que se pretende fazer; depois de ter enunciado isto tão ligeira e perfunctoriamente quanto me permittem as circumstancias do tempo, devo dizer que o ponto principal d'este projecto, o seu caracter mais saliente e mais notavel, é promover o accesso dos officiaes das diversas armas: sobretudo de algumas armas. E esta a feição predominante do projecto n.° 141, desde o primeiro até ao ultimo artigo (apoiados). Se v. ex.ª e a camara se detiverem no exame de cada um dos artigos, sobretudo de alguns, que terei a honra de indicar á assembléa, verão que elles são tendentes a este fim, ao fim de facilitar mais ou menos o accesso dos officiaes dos diversos corpos (apoiados).

E não pensa a camara que me queixo, nem censuro, nem lamento que o accesso se facilite. Entendo mesmo que elle se deve facilitar, e tomo por exemplo o corpo do estado maior, que é um dos mais favorecidos. O corpo do estado maior estava nas circumstancias de serem os seus officiaes, aliás benemeritos, condemnados a estacionar longos annos no mesmo posto que tinham (apoiados). E é claro que sem o estimulo do adiantamento nenhum homem se pôde entregar decidida e corajosamente ao exercicio das funcções do seu cargo, ou ao estudo da sua profissão; não o pôde fazer uma vez que não tenha futuro, e se veja condemnado a jazer perpetuamente na mesma posição (apoiados).

Já se pôde entender que eu não condemno esta tendencia. Demos adiantamento aos officiaes militares, mas demos vantagens tambem ao paiz, porque não temos só a satisfazer exigencias, de certo muito justas e rasoaveis, algumas d'ellas, pelo menos, porém é do nosso dever considerar o paiz e os interesses publicos; e são estes que eu entendo que os corpos constituidos do estado são obrigados a ter primeiro que tudo diante dos olhos (apoiados).

Fallando-se da despeza que este projecto origina, eu ouvi fazer em uma das sessões passadas varias considerações que não deixavam ver claramente qual era o encargo que d'elle resultava. I Em todos os ministerios os empregados respectivos, por uma natural tendencia, e até certo ponto justificada, consideram como de um puis estrangeiro, principalmente no que diz respeito á despeza, os negocios que pertencem ás outras repartições. Isto é uma tendencia natural, que todos aquelles que têem servido em qualquer posição que seja nos diversos ministerios, hão de ter reconhecido, de considerar unicamente os negocios que estão dependentes do seu exame, do seu conselho ou da sua direcção, tudo o mais é estranho a esse ministerio, é como se pertencesse á Inglaterra, á França ou á Turquia (apoiados).

Diz se, por exemplo: «De tal medida resultam réis 50:000$000 de economia para este ministerios. E vae-se a ver e acha-se que d'essa medida resultára 100:000$000 réis de encargo para outro ministerio! Existe economia para quem? Para um dos ministerios de certo; mas existe encargo para o paiz; e ao contribuinte é absolutamente indifferente, quando paga ao estado aquillo a que é obrigado, que essa somma seja applicada no ministerio da guerra, no da marinha, no do reino ou no das obras publicas (apoiados). E nós que somos aqui os zeladores da bolsa publica e os encarregados de applicar os dinheiros da nação pelo modo mais conveniente para o estado; nós que temos, obrigação de contemplar este negocio debaixo de outro ponto de vista, de o considerar á luz de outros principios e á vista de outros fundamentos, não podemos aceitar as rasões com que se nos quer provar que ha certeza de economia, quando esta apparece de um lado e o augmento claramente vera pelo outro (apoiados).

Não se podia comprehender que um projecto que dá em resultado a creação de mais um corpo de artilheria, de mais alguns corpos de caçadores, o augmento do quadro do corpo de estado maior, e outras despezas a maior que no projecto vêem mencionadas; não se podia comprehender, digo, como de tudo isto resultasse uma economia, nem como resultasse apenas a despeza a maior de 19:000$000 réis (apoiados).

E de resto creio que a despeza a mais é esta — são réis 19:000$000; mas é a despeza considerada -em relação ao ministerio da guerra; é a despeza considerada em relação sómente aos officiaes que ahi existem, ou que pelo projecto ahi devem existir; é a despeza comparada com a já votada no orçamento. Mas qual é a despeza que acresce para o thesouro em consequencia da approvação d'este projecto? São 19:000$000 réis? Não, senhores (apoiados).

Não nos illudamos! Approve-se muito embora o que propõem o governo e as commissões. Dê se a todos uma fatia maior á mesa do orçamento, porém diga-se claramente ao paiz que d'este projecto não resulta unicamente o encargo de 19:000$000 réis; resultam encargos de mais alta monta, que nem eu nem s. ex.ª nem os cavalheiros que estão n'esta casa, sem os offender, mesmo incluindo o nobre ministro da guerra, podem dizer exactamente quaes sejam.

Aqui ha um principio que parece predominar n'esta organisação. E esse principio se se podesse seguir, sem excepção, o serviço publico não padecesse com isso, se rasões de uma outra ordem se não oppozessem, creio que era conveniente e justo, militarmente fallando. O principio é — o de dar accesso o vantagens nos corpos do exercito unicamente aos officiaes que estão empregados no serviço militar. O governo julgou encontrar na adopção d'este principio o meio de resolver uma questão que ha muito tempo se tem debatido, principalmente entre o ministerio das obras publicas e o ministerio da guerra. Comtudo uma tal disposição é completamente inutil. O governo não carece d'ella. Está perfeitamente dentro das suas attribuições determinar que se recolham ao exercito os officiaes que estão em serviço estranho ao mesmo exercito. Portanto ainda que o artigo se eliminasse ficava tudo exactamente como d'antes, pelo que, na minha opinião, caduca inteiramente um dos principaes fundamentos da reforma.

Sr. presidente, considerando o principio a que me tenho referido em abstracto, devo dizer, e repito á camara que estou convem ido de que é justo. Entretanto eu creio que ha inconveniente em seguir cega e obstinadamente principios absolutos, porque elles carecem geralmente de excepção quando se trata da administração publica; e é raro que se possa adoptar um d'esses principios, sem restricção alguma, sem que d'ahi resulte algum inconveniente para o estado.

Eu tenho a honra de ser official do exercito, e estou comprehendido nas disposições do artigo 65.° Não fallo por mim, comtudo, e pede a minha lealdade que eu diga ao sr. ministro da guerra—que ao menos pelo que me diz respeito tem s. ex.ª muita rasão. Parece-me absurdo que um homem como eu, embora servisse militarmente no exercito, fazendo sempre diligencia para cumprir com o seu dever, o nada mais, tendo depois de algum tempo passado a occupar uma outra posição inteiramente alheia ao serviço militar, com o caracter de permanencia, e até mesmo de immobilidade; parece-me absurdo, repito, que este homem tenha a pretensão de subir postos e aspirar a commandos no exercito, depois de uma longa carreira inteiramente civil. Já vê portanto a camara que não fallo por mim. Nem eu era capaz de vir aqui fazer um discurso para defender os interesses da minha humilde pessoa.

Mas pergunto eu — será possivel, será conveniente, que este principio se possa applicar absoluta e completamente a todos os serviços do estado em que são empregados officiaes militaras de diversas graduações e armas? Digo redondamente que não. E digo mais que, se a disposição, consignada no projecto das commissões reunidas e do ministerio, passar, o governo será o primeiro que fica coarctado no exercicio das suas attribuições, e se ha de encontrar muitas vezes em graves difficuldades para satisfazer a certas necessidades do serviço publico.

Não quero ver na redacção do artigo uma valvula por onde o governo possa saír na occasião de apuro. E espero