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2410 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

S. exa. que tem titulos para chefe do partido radical, com capacidade e talento para isso; que é chefe do partido constituinte, e que parecia destinado a remodelar a nossa constituição, no sentido das mais largas franquias populares, não cessando de dizer á camara que queria o governo do povo pelo povo, e de prégar em nome dos direitos individuaes e de todas as liberdades publicas, o illustre deputado, digo, acaba de nos fazer retrogradar, em materia administrativa, para o codigo de 1842, declarando que não admitte emprestimos municipaes, sem a tutela do governo!
Ora, sr. presidente, era bem melhor não ter s. exa. citado a phrase do estadista francez «Nada de tutelas; confiemos na liberdade». Para que foi citai-a, se minutos depois o illustre deputado havia de atraiçoal-a e dar-lhe uma significação que ella não podia ter quando foi proferida por tão illustre homem de estado?
Por isso eu disse que tinha ouvido este seu discurso com a attenção que a todos os seus discursos costumo prestar, mas que acabara por ficar cheio de tristeza.
É que de ha muito tempo eu sigo a doutrina de que todas as liberdades são solidarias. (Apoiados.)
Eu não comprehendo a liberdade civil sem a liberdade politica, assim como não comprehendo a liberdade politica, assim a liberdade civil. (Apoiados.)
Não comprehendo a liberdade civil sem a liberdade eleitoral, a liberdade eleitoral sem a economica, e esta sem a administrativa. (Apoiados.}
Todas as liberdades formam um complexo; todas se prendem, e são por assim dizer solidarias; não podem umas viver sem as outras, posto que se vão conquistando successivamente.
Mas, sr. presidente, ser liberal quando se trata de discutir as reformas politicas e ser reaccionario quando se discute a reforma administrativa, ser liberal quando se trata de uma questão da imprensa ou do jury, e ser reaccionario quando se trata das questões economicas, isso é que não se comprehende. (Apoiados.)
Essa descentralisação, como a entende o illustre deputado, não comprehendo eu.
Comprehendo o homem publico que faz do alargamento dos direitos individuaes e da ampliação de todas as franquias individuaes e politicas o objectivo constante de toda a sua vida; e eu posso dizer á camara que este tem sido sempre o meu objectivo.
Sabe o illustre deputado, sabem todos, que eu referendei o codigo civil, que contém os mais importantes principios de liberdade civil; (Apoiados.) que referendei igualmente a lei de liberdade de imprensa que é das mais avançadas da Europa; (Apoiados.) a lei eleitoral que é a mais liberal das que até hoje têem apparecido, (Apoiados.) e finalmente a reforma da constituição. (Apoiados.}
Tenho, pois, o direito de affirmar que dentro dos limites da possibilidade, e digo assim porque os homens publicos não podem tudo dentro das circumstancias do paiz, tenho procurado constantemente desenvolver os direitos individuaes e ampliar as liberdades publicas. (Apoiados.)
Mas, como ia dizendo, o que não se comprehende, é que se seja liberal quando se trata da reforma da constituição e reaccionário quando se trata da reforma administrativa; liberal quando se trata do jury e reaccionario quando se traía do leis economicas; e peco licença para dizer uma cousa ao illustre deputado, parecendo-me que n'isso nenhum mal lhe faço, antes lhe faço bem.
Em todo o seu discurso firmou-se s. exa. n'uma idéa que não é de todo o ponto verdadeira.
Proclamou-se o illustre deputado homem liberal em materia de administração publica:- eu digo que s. exa. e um homem economico: mas liberal, não. E dizendo isto, nenhum mal lhe faço: pelo contrario.
Segundo affirma o illustre deputado todas as municipalidades estão empenhadas; a fazenda municipal vae n'um caminho desgraçado, e não podemos contar e s. exa. para quaesquer melhoramentos publicos, quando não haja dinheiro, porque, em materia de administração, o seu systema é gastar-se apenas o que se tem. Quando se trata de alguma obra a fazer, pergunta a si mesmo - tenho dinheiro? Se tem, faz a obra, se não tem, não a faz.
Mas eu pergunto; e o credito publico não serve para nada? (Apoiados.)
De maneira que se tivessemos seguido as idéas do illustre deputado, como o credito publico não serve para nada e é apenas um luxo da civilisação, de 1851 para cá não teriamos feito um palmo de caminho de ferro, e ainda hoje teriamos da andar a cavall, como unico meio de locomoção, quando tivessemos de percorrer as nossas provincias.
Esta doutrina do illustre deputado ao menos tem uma vantagem; é que não sobresalta ninguem.
Ha dinheiro? Caminhamos.
Não ha dinheiro? Paramos.
Ninguem se sobresalta, e ficam todos sabendo com o que devem contar.
O peior é que quando não houver dinheiro, tornar-se-ha uma realidade o dito do sr. presidente do conselho, «parar é morrer».
O sr. Presidente: - Ha deveres que custam a cumprir, mas que eu n'este logar não posso preterir. Já na ultima sessão nocturna procedi do mesmo modo quando fallava o sr. Dias Ferreira. Deu a hora. Se v. exa. quer concluir hoje o seu discurso, póde continuar; mas se o não quer concluir, melhor será ficar com a palavra reservada.
O Orador: - Já não é muito o que tenho a acrescentar e por isso poucos minutos mais tomarei á camara.
Como eu ía dizendo, a doutrina do illustre deputado cifrava-se toda n'este ponto; - quero tudo, menos que se gaste dinheiro quando o não houver. - A este respeito peço licença para coutar uma historia.
Um negociante da provincia pediu a um seu amigo de Lisboa que lhe comprasse uns certos generos; elle comprou-lh'os e enviou-lhe letras a tres, seis e nove mezes.
Respondeu-lhe o negociante que não gostava de letras a tres, seis e nove mezes, porque estava acostumado a pagar de prompto.
Se costuma pagar de prompto, replicou-lhe o amigo, como sabe então se tem credito? O que equivalia a dizer «venha para cá outra vez que eu o ensinarei». (Riso e apoiados.)
Ora, eu, nem estou resolvido, em materia politica, a voltar á constituição de 1838, nem, em materia administrativa, a retroceder ao código de 1842, e não tenho senão a conservar-me, apesar do muito respeito que tenho por s. exa., distanciado do illustre deputado.
Ora, vejamos quaes foram as doutrinas do projecto que principalmente mereceram ao illustre deputado, não direi a sua animadversão, mas pelo menos a sua opposição.
Foi uma d'ellas a instrucção publica.
S. exa. não gosta de gastar dinheiro com as escolas; comparou as escolas de Lisboa com a universidade, como se o ensino elementar podesse comparar se com a instrucção superior, como se as escolas de instrucção primaria de um ou outro municipio se podessem comparar com um instituto scientifico do paiz! (Apoiados.)
O illustre deputado apenas não se lembrou de uma cousa; é que na universidade, onde vivemos juntos, e onde s. exa., conforme me recordou, ha pouco, foi meu discipulo, lembrando-mo assim que eu já &ou velho, o que infelizmente é uma verdade. mas onde tambem foi meu collega tendo sido um estudante distinctissimo, como poucos lá apparecem; o illustre deputado não se lembrou, digo, de que na universidade, outrora frequentada todos os annos por oitocentos a mil estudantes, tem ultimamente diminuido muito esse numero, não excedendo talvez hoje a setecentos a media dos alumnos, emquanto que as escolas de