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2466 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

os serviços embora, trazia em si defeitos e manifestava lacunas, que, antecipadamente se poderia prever, dariam os peiores resultados.
Estes resultados deram-se effectivamente em Lisboa, nem podiam deixar de se dar.
É preciso que estabeleçamos como principio geral que em todas as instituições humanas, onde se manifeste a liberdade, deve com ella coexistir um principio correlativo, que a mantem na sua verdadeira e superior essencia.
É a responsabilidade, que anda inherente ao exercicio de qualquer liberdade. (Apoiados)
De facto, onde a liberdade existir sem responsabilidade correlativa, bem depressa se transforma na sua essencia e a pouco e pouco degenera em abuso. (Muitos apoiados.)
Este principio é já velho e conhecido, e bem me lembro eu de o ter visto desenvolvido em um bello livro do meu velho e illustre mestre Proudhon.
Já se póde no parlamento fallar n'este nome. Trinta annos de silencio da sepultura são sufficientes para apagar os odios e as paixões, concitadas contra aquelle homem, que foi certamente um dos maiores pensadores d'este seculo. (Apoiados.)
Ora, sr. presidente, é esta responsabilidade, que nas manifestações da vida social se encarna no principio de auctoridade, isto é, no supremo regulador dos direitos e dos deveres dos cidadãos.
O legislador do codigo de 1878, permitta-se-me a expressão, concedendo a liberdade às corporações administrativas, esqueceu-se de crear bons elementos de fiscalisação, por forma que a responsabilidade podesse ser-lhe efficazmente tomada.
Não será difficil de demonstrar a v. exa. e á camara como pelo systema do codigo de 1878 em breve um governo duradouro se harmonisa com as juntas geraes, e estas com as camaras municipaes, passando-se tudo depois no melhor dos mundos possiveis. (Apoiados.)
O principal defeito do codigo de 1878 está, a meu ver, no systema da eleição.
O codigo estabeleceu a lista simples sem representação de minorias, e a renovação biennal para a corporação.
Emquanto á renovação parcial não concordo com a doutrina apresentada pelo sr. Luciano de Castro; o systema da renovação parcial é hoje adoptado por muitos povos cultos, e tem para mim a incontestavel vantagem de acompanhar o movimento da opinião publica, conservando no mesmo tempo a tradição administrativa das corporações.
É o principio da evolução, que substitue o da revolução.
A lista plurinominal simples, isto é, sem representação das minorias, que reforça consideravelmente a força da auctoridade, tem uma acção deploravel sobre a constituição das corporações administrativas.
Quando um partido se conserva por largo tempo no poder, muito serena e naturalmente no fim de um certo numero de annos afasta d'estas corporações todos os elementos opposicionistas, constituindo-as a final com os seus. (Apoiados.)
Dadas estas condições, todos os elementos de fiscalisação desapparecem, e os interesses de uma falsa politica, e uma errada consideração partidaria, sobrelevam-se aos melhores principios de administração.
Quer a camara um exemplo frisante?
Não desejo ferir alguem, porque discuto politica, não discuto homens.
Já disse de antemão que os defeitos da nossa administração provém não dos homens, mas, a meu ver, das graves lacunas e das incorrecções da nossa legislação. (Apoiados.)
Tenho muita consideração por todos os meus collegas e por isso peço-lhes que em nada vejam allusões pessoaes, porque tal não é meu proposito. (Apoiados.)
A camara municipal, como uma das suas funcções mais importantes, tem de elaborar os orçamentos, que são depois approvados pela junta geral. Só depois d'esta approvação elles vigoram.
Pois ha uma terra, não sei se distante se proximo de Lisboa, aonde uma camara municipal tem administrado os negocios do municipio com o orçamento de um anno, approvado seis mezes depois d'elle ter começado.
A camara é da parcialidade politica a que pertence a junta geral, a junta é da mesma parcialidade do governo, e como não ha fiscalisação dos elementos opposicionistas, porque a eleição de lista simples os afastou completamente, e por outro lado as disposições perfeitamente innocentes da lei, ninguem as cumpre, quando mesmo cumpridas podessem dar algum resultado, este estado singular e anormal de cousas prolonga-se ha seis ou sete annos a esta parte, pelo menos. (Apoiados.)
Mais ainda; sabe v. exa. como essa junta do tal districto pensava ácerca da tutela? Vou citar a v. exa. um accordão que approva um orçamento municipal. É quasi textual.
«Accordão os da commissão executiva d'esta junta geral, que o presente orçamento municipal tem taes e taes defeitos, que se não cumpriram taes e taes preceitos legaes, que se calculam mal taes e taes receitas, mas como esta commissão entende que o fim da sua tutela não é de forma alguma o de impedir a administração publica, approva este orçamento para os effeitos legaes.»
Quasi textual, sr. presidente, e lido com os meus proprios olhos!
Eis como a corporação districtal comprehende as suas funcções tutelares, ou de cooperação!
Não é facil resistir a este systema, quando a doce harmonia partidaria se estabelece entre o governo e as corporações administrativas.
O governo intervem serenamente e manda os seus partidarios, em nome da disciplina, e por vezes, se é preciso, ameaça com uma simples phrase: temos uma eleição proximamente!

erá isto, talvez, naturalismo politico, que me vejo obrigado a esboçar ; sou politico é certo, mas primeiro que tudo devo ser deputado, e fallar com a maior sinceridade ao paiz.
São estes e outros factos da administração municipal, que provam á saciedade os defeitos do codigo de 1878.
A mais de que um me tenho referido n'esta casa, apontando-o á opinião publica quando mais não seja, porque, sr. presidente, eu conhecia já os defeitos da administração municipal de Lisboa e indicava-os, quando o illustre estadista o sr. Dias Ferreira apenas ouvia fallar d'elles ao de leve.
Disse s. exa. que apenas fizera idéa do que era, pelos mappas que apresentou o sr. ministro! Que grave responsabilidade assiste a s. exa.!
Nós não estamos aqui unicamente para combater systematicamente as idéas do governo e para fazer discursos politicos, bom é que de quando em quando façamos alguma cousa util e pratica.
Ora realmente quando consta que a administração da primeira corporação administrativa do paiz, pelo seu valor e pela sua posição porque está na capital, é má, a primeira obrigação que tem um chefe de partido, um estadista, um homem que ámanhã póde sentar-se n'aquellas cadeiras, é levantar a questão e exigir documentos; e se lhe não forem fornecidos, então lançar a responsabilidade sobre quem lh'os nega. Assim é que têem procedido homens obscuros na politica; assim é que eu tenho feito d'aquella cadeira. (Apoiados.)
Não quero certamente apresentar-me como exemplo, nem dar conselhos a homens superiores; mas quando um deputado se levanta d'aquella cadeira e pede documentos, que lhe não são fornecidos, a sua responsabilidade moral, a unica que temos, fica perfeitamente illibada. Se este é o