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SESSÃO NOCTURNA DE 16 DE JUNHO DE 1888 2059

seja remuneradora, a agricultura portuguesa ha de procurar desenvolver a o mais possivel.

Emquanto á proposição apresentada pelo sr. relator de nós termos chegado a acreditar-nos como um paiz exportador de trigo, para d'aqui tirar a Conclusão de que nós produzimos pouco, ou não podemos produzir mais, respondo a s. exa. que produzimos pouco pelas circumstancias espe-ciaes que se têem dado, e lembrarei que não está muito longe de mim um nosso collega, o sr. Estevão Antonio de Oliveira Junior, cavalheiro meu amigo, muito respeitavel e entendido em lavoura, que tem extraordinariamente restringido a area da cultura dos cereaes, desde o momento em que essa cultura começou a tornar-se pouco remuneradora, ou antes nada remuneradora.

A este respeito devo mais fazer uma outra observação.

Não se deve concluir do que acabo de affirmar que eu acredito que, desde que haja um preço geralmente remunerador para a cultura dos cereaes, todas as regiões, que antigamente se destinavam á cultura d'elles com vantagem e com proveito, continuarão, ou antes tornarão, a ser aproveitadas para a cultura dos cereaes.

Eu a esta respeito tenho opinião fixa, baseada em factos.

Havia umas certas regiões, umas certas áreas, e nomeadamente nos arredares de Lisboa, que estavam por assim dizer isoladas dos outros centros da producção de cereaes, no paiz pela falta de communicação, e eram aptas para produzir trigos, que eram consumidos nas proprias regiões, onde eram produzidos, obtendo preços de venda remuneradores. Com o desenvolvimento da viação ordinaria e da viação accelerada naturalmente estes centros de producção hão de ser atacados pela producção de outros pontos, como por exemplo do Ribatejo, e por consequencia elles não poderão tão desafogadamente sustentar a concorrencia dos produ-ctos das outras regiões.

Eu estou convencido de que, desde que o preço dos cereaes seja geralmente remunerador, a cultura se ha de desenvolver e tomar grande incremento, mas não julgo que todas as regiões, mais ou menos limitadas, que foram antigamente productoras de cereaes, o hão de forçosamente tornar a ser; pelo contrario, eu sustento que, ainda que venha a haver esse preço remunerador, umas certas regiões, que antigamente produziam cereaes, não ficarão em condições de poder sustentar a concorrencia com a producção de outras regiões do paiz.

Mais adiante refere-se s exa. ao preço do trigo, que torna a sua cultura rasoavelmente remuneradora, e eu vou tratar d'este ponto, que é capital.

Quando eu e os meus amigos, e digo os meus amigos, porque um individuo só nada póde, e a prova é que eu vejo homens intelligentes e trabalhadores que só por si nada conseguem, nada podem, repito quando eu e os meus amigos procurámos encontrar uma solução para a crise agricola, uma das questões, que mais nos preoccupou foi a do quantitativo da elevação dos direitos dos cereaes.

Com a elevação dos direitos consegue-se necessariamente elevar o preço de venda do trigo, em condições normaes e regulares da venda e procura d'esse genero.

Não póde succeder assim quando, havendo o monopolio da fabricação das farinhas e do commercio dos cereaes, como succede em Portugal, a simples elevação do direito sobre o trigo estrangeiro for desacompanhada de outras medidas.

Em todo o caso, seja como for, é certo que, para determinar ou estabelecer qual deve ser esse augmento de imposto, é indispensavel o conhecimento de qual o preço remunerador de venda para o trigo.

Depois de termos luctado com grande numero de difficuldades, chegámos á conclusão de que o preço remunerador é para o trigo de 600 réis.

Era este o mesmo preço remunerador que eu aqui sustentei em 1887, quando foi da discussão das pautas.

Eu conto o que se passou.

Uma das cousas difficeis n'uma exploração agricola é, dia a dia, determinar á risca o preço da producção de cada genero, e quem para isso recorresse a um systema mais ou menos complicado de escripturação, embaraçaria certamente a vida pratica da exploração, havia de gastar muito dinheiro, e poucas ou nenhumas vantagens tiraria de tudo isso.

Eu fui funccionario publico durante muitos annos, dirigi um estabelecimento fabril do estado, e talvez não saibam que a maior difficuldade com que luctei durante os dezeis annos que ali estive, foi convencer os empregados publicos de que a contabilidade é um meio e não um fim.

Quando entrei para aquelle estabelecimento encontrei o trabalho subordinado á escripturação, e eu entendi que se devia fazer o contrario.

Alguem poderá dizer: pois se não têem escripturação da qual conste a que horas entraram os bois para o trabalho, quantas geiras fizeram, quantas séstas houve, quanto ganhou cada operario, como é que podem saber por quanto saiu cada trabalho, cada producto.

A isso respondo que ninguem ignora que ha individuos, que não sabem ler nem escrever, e comtudo fazem contas de cabeça, e inclusivamente passados annos lembram-se dos preços por que venderam um certo numero de cabeças de gado, n'uma certa e determinada feira.

Eu conheci um homem, que não sabia ler nem escrever, e que apesar d'isso' tinha as contas da sua casa todas de cabeça, e, quando lhe perguntavam por que preço vendera em tal dia na feira do Campo Grande, ou em qualquer outra, um certo numero de cabeças de gado, lembrava-se não só da porção de gado que vendera, mas até dos preços por que o vendêra em tal dia na feira do
Campo Grande, ou em qualquer outra, um certo numero de cabeças de gado, lembrava-se não só
porção de gado que vendêra, mas até dos preços por que o vendêra.

Nós, lavradores e agricultores, podemos dizer com mais ou menos certeza qual é o preço remunerador de qualquer producto, mas se nos perguntarem se temos elementos escriptos que o provem, geralmente respondemos que não.

Podemos arranjar os elementos, não temos geralmente os calculos feitos, mas sabemos que vendendo tal genero ou producto por tal preço ganhamos, e que vendendo-os por outros preços perdemos.

Eu ufano-me de ter concorrido para estabelecer o preço de 600 réis.

Talvez s. exas., o sr. ministro da fazenda e o sr. relator se admirem de que nós, lavradores, nos não contentemos com os 580 réis e que peçâmos 600 réis. Pois é exactamente esse vintemsinho que s. exa. não nos querem dar, que nos faz muita falta.

O sr. relator escreveu algures que 580 réis é um preço remunerador, e nós dizemos que esse preço remunerador só póde ser o de 600 réis.

Esse vintem, que s. exa. julga ser uma differença pequena, representa muito para o lavrador, e eu digo porquê.

A maior parte da gente, sobretudo nas regiões officiaes, estava n'outro tempo completamente enganada sobre o modo de viver do lavrador. Hoje parece que as regiões officiaes vão estando sobre esse ponto tambem pouco mais esclarecidas.

N'essa epocha ía-se a casa do lavrador e via-se uma casa farta, comparada com o viver da cidade, apresentando assim um certo bem estar.

Os individuos, que o lavrador recebia em sua propria casa, a quem dava de comer, julgavam que elle nadava em dinheiro! Foi a sua infelicidade porque lhe caíram os impostos em casa, e tem sido um nunca acabar de impostos!

Quer v. exa., sr. presidente, saber o segredo da abelha, como se costuma dizer. (Riso.)

A explicação é muito simples.

Ganhava-se pouco em muitas cousas, e esse pouco, multiplicado, dava para uma familia viver mais desafogadamente do que se vivia nas cidades.