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Discursos proferidos na sessão de 14 de junho, o primeiro na sessão diurna, inserta no Diario n.° 136, e o segundo proferido na sessão nocturna, e inserta no Diario n.° 137

O sr. João Chrysostomo: — Tendo pedido a palavra sobre a ordem, aproveito a occasião para dar algumas explicações á camara em referencia ao objecto de que se occupou o illustre deputado que me precedeu.

S. ex.ª referiu-se á classificação do pessoal technico do ministerio das obras publicas, effectuada em consequencia das reformas d'aquelle ministerio em 1864, e em virtude de uma auctorisação dada pelo parlamento.

O serviço technico do ministerio das obras publicas era feito por 413 empregados de differentes classes e categorias, e d'este numero 330 ou 340 eram officiaes militares que se achavam em serviço de commissão n'aquelle ministerio.

Organisou-se o serviço da engenheria civil pelo decreto de 3 de outubro de 1864, e em consequencia d'essa organisação procedeu-se á classificação dos differentes individuos que haviam de constituir a nova corporação, tendo em vista os trabalhos de uma commissão que tinha sido nomeada antes do referido decreto, para indicar ao governo quaes eram as bases em que devia assentar a mesma classificação.

A commissão com effeito indicou essas bases, as quaes estão consignadas nos artigos transitorios do mencionado decreto, aonde com effeito se diz que na primeira organisação do serviço serão considerados habeis para fazerem parte dos quadros os individuos que tenham sido encarregados de funcções de serviço technico de natureza e importancia igual e similhante ás que, segundo a nova lei, pertencessem a cada um dos corpos technicos, e que a classificação dos mesmos individuos em cada corpo fosse determinada, em primeiro logar, com relação ao grau de importancia das funcções que cada um tivesse exercido, e ao modo como as tivesse desempenhado; e, em segundo logar, em relação á antiguidade de serviço e habilitações.

Realmente confesso a V. ex.ª que esta tarefa de classificar 400 individuos sem base completamente segura e bastante definida para o fazer, era uma tarefa ardua e nova em Portugal n'estes ultimos tempos; pois não me recordo de ministro algum, ha longos annos a esta parte, que se achasse collocado nas circumstancias em que eu me achei, tendo de proceder a esta classificação.

Classificar 400 homens em grande numero de merito provado e distinctos por habilitações e serviços, que se achavam em serviço n'aquelle ministerio havia mais ou menos tempo, dos quaes a maior parte pertenciam ao exercito, e que portanto deveriam ou recolher a elle, ou ficando no ministerio das obras publicas, receber uma certa posição em indemnisação do que perdiam no ministerio da guerra; avaliar as condições pessoaes de tantos individuos, não tendo quasi que outro meio de apreciação senão a minha rasão e o conhecimento pessoal dos individuos, sem que houvesse lei alguma anterior que regulasse, nem a sua posição, nem os seus direitos, nem aquillo emfim que podesse servir de principio ou regra para formar uma escala de merecimento relativo que abrangesse todos os individuos de proveniencias tão diversas, uns militares, outros civis, em variadissimas circumstancias, com habilitações muito differentes e heterogeneas e interesses muito pouco harmonicos, era incontestavelmente um trabalho de grande difficuldade (apoiados).

E é preciso que saibamos que entre os individuos que compunham o pessoal technico do ministerio das obras publicas, só uma parte tinha completas as habilitações escolares da engenheria militar ou civil, e uma grande parte nem uma nem outras tinha; mas muitos n'este caso tinham um longo tirocinio e serviços importantes, e pelo seu longo serviço, e pela distincção com que o tinham desempenhado, assim como pela pratica adquirida, haviam já conseguido, e creio que muito justamente, dos governos anteriores, o estarem collocados em posições taes que desempenhavam altas funcções no serviço d'aquelle ministerio; emquanto que havia outros, que posto que mais antigos no ministerio das obras publicas, ou de mais habilitações escolares, não tinham de facto tido occasião de occupar as posições mais elevadas, e de prestar os serviços que aquelles outros tinham prestado. Não era pois nem só as habilitações escolares e a natureza d'ellas, nem só a antiguidade do serviço, nem só a posição occupada anteriormente, que podiam servir de regra exclusiva, e por isso a commissão nomeada propoz os que serviram de base á classificação, e que eu adoptei; regras todavia que deixavam ainda uma grande indeterminação na classificação dos individuos, tanto mais que se devia attender não só á importancia e natureza das funcções exercidas, mas ainda ao modo como tinham sido exercidas, o que dava em resultado uma ultima e necessaria apreciação da parte do ministro.

O que é certo é que a posição dos empregados technicos do ministerio das obras publicas não estava garantida por nenhuma lei. Eram simples empregos de caracter têmpora rio e eventual, commissões de confiança e empregados perfeitamente amoviveis; havendo completa liberdade na sua nomeação e exoneração. O governo tinha assim sempre exercido o seu direito, exonerando os individuos encarregados de qualquer commissão quando o entendia conveniente, e mandando recolher ao ministerio da guerra os officiaes do exercito quando assim o julgava acertado sem dar rasão alguma dos motivos que tinha para proceder d'esta maneira. Portanto de qualquer fórma que se procedesse na classificação não havia direitos legaes a attender; o que havia era o direito que todos têem em geral de serem contemplados da fórma que é de justiça e de equidade em suas pretensões individuaes, sem prejuizo do interesse geral.

A isto procurei eu attender quanto me coube no possivel. E não tendo a commissão feito uma escolha individual para as differentes classes da engenheria, encargo que eu não lhe podia impor, era a mim, como ministro da corôa, que me cabia o dever d'essa escolha individual e definitiva, e o meu primeiro dever n'essa escolha era inspirar-me principalmente da conveniencia publica. Assumi pois essa responsabilidade, porque o interesse publico e os deveres do meu cargo exigiam que eu tomasse a mim esse encargo tão penoso.

Fiz essa escolha conforme a minha consciencia m'a dictou, attendendo ás conveniencias do serviço e procurando cingir-me ás bases que estão estabelecidas no decreto de 3 de outubro. Enganar-me-ía eu em relação a um ou outro individuo? Realmente nada de mais possivel, porque eu não sei quem possua o estalão do merecimento relativo de muitas centenas de individuos, para os poder classificar com toda a exactidão, segundo esse merecimento. Eu de certo não o tinha. Fiz porém todos os esforços para obter o mais exacto conhecimento de todos os serviços e circumstancias de todos os individuos que, depois de serem nomeados para as differentes classes, segundo as bases adoptadas, foram após isso collocados pela sua ordem, segundo as suas antiguidades, em cada uma das classes, em conformidade com o parecer da commissão a que já me referi. Alem dos esclarecimentos e informações que procurei obter, ouvi os proprios interessados que me quizeram esclarecer acerca das suas circumstancias; mas com estas informações augmentava a minha perplexidade, porque parecia resultar d'ellas que a maior parte dos interessados estavam no caso de occupar os primeiros logares, ou, pelo menos, que os logares que eu tinha a offerecer nas differentes categorias eram muito inferiores em numero aos individuos que se julgavam habilitados a esses logares, e mesmo com direito a elles.

E como ao contrario do que se esperava, eu, em vez de completar o quadro, fui parcimonioso n'isso, pois apenas nomeei quatro inspectores em logar de quinze, e em todas as outras categorias e classes do quadro deixei vacaturas; d'aqui resultou que todos ficaram n'um logar inferior áquelle que presumiam que íam occupar. Os que esperavam ser inspectores, acharam se engenheiros chefes de 1.ª classe; os que esperavam ser engenheiros chefes de 1.ª classe, acharam-se engenheiros chefes de 2.ª classe, e assim por diante, de sorte que houve um desapontamento geral. Confesso que foi uma cousa que eu senti muito, mas que não era possivel evitar senão duplicando ou triplicando o quadro nas categorias superiores. Havia mais de doze individuos que exerciam já funcções de inspector ou outras equivalentes, e um não menor numero de individuos, que ainda não tinham exercido taes funcções, se julgava com tão bom ou melhor direito a exerce-las.

Ora eu, em vez de satisfazer a estes desejos e aspirações, só nomeei quatro inspectores, como já disse, e assim similhantemente nas outras categorias, de sorte que o numero dos individuos por mim nomeados para o quadro da engenheria civil foi ainda menor do que o numero dos individuos que eu encontrei empregados n'aquelle ministerio, e nem um só individuo de fóra d'elle foi nomeado para o corpo de engenheria, não obstante ser grande o numero de pessoas, quer militares quer civis, que, por occasião das reformas, solicitaram fazer parte do pessoal technico do ministerio das obras publicas. A todas estas solicitações resisti pelo principio de economia, e desejo de reduzir o pessoal, em vez do augmentar, e apesar mesmo de alguns requerentes serem pessoas de merecimento, muito aptas e que já tinham feito bom serviço n'aquelle ministerio.

Torno a repetir, procedendo assim, procedi com o direito de que tinham usado os ministros meus predecessores, collocando no serviço do modo que entendiam mais conveniente ao mesmo, serviço as pessoas que lhes mereciam confiança: a confiança technica, se entende, de bem desempenharem o serviço que lhes era commettido.

Foi d'esta fórma que eu resolvi a questão. Levantaram-se algumas reclamações. Não me admirou isso, o que me admirou foi o pequeno numero d'essas reclamações, porque, note a camara, tendo-se collocado e nomeado proximo de quatrocentos individuos, não me consta que existam no ministerio das obras publicas mais de trinta a quarenta reclamações; entretanto é possivel que haja muito mais gente que se julgue prejudicada; mas deferindo ás reclamações mudavam os queixosos, mas naturalmente não diminuia o numero d'elles, porque appareciam outros.

Não tive occasião de me occupar da questão, porque saí do ministerio pouco depois das reformas. O que é certo é que me assistia o desejo de fazer justiça a todos, e este desejo era tanto mais forte, que quasi todos eu conhecia pessoalmente, e com todos mantinha ou relações de amisade, ou, pelo menos, de boa camaradagem. Não havia portanto, nem podia haver em caso algum, intento de offender pessoa alguma, nem tão pouco rasão para não procurar attender todas as indicações da conveniencia do serviço do ministerio a meu cargo.

O sr. conde de Castro, tendo recebido mais algumas reclamações sobre a classificação, nomeou uma commissão, composta de cinco membros, para tomar conhecimento dellas, e fez-me a honra de incluir o meu nome entre os nomeados. Eu dirigi-me immediatamente ao sr. conde de Castro, e pedi-lhe o obsequio de me dispensar d'aquelle encargo, pelas mesmas rasões a que se referiu o illustre deputado que me precedeu. Notei eu ao sr. ministro, que instaurado um recurso qualquer ou segunda instancia, para avaliar e julgar aquellas reclamações, em que tinha sido o juiz na primeira instancia, julgava do meu melindre, e conforme a minha consciencia, não dever ser juiz na segunda instancia, tanto mais que eu não queria de modo algum prejudicar qualquer direito ou justiça que assistisse aos reclamantes. Que tinha feito a classificação procurando ser imparcial, justo e recto, mas que a outros competia avaliar o modo como eu tinha procedido.

Eu apresentei todas estas considerações ao sr. ministro; s. ex.ª, não obstante, insistiu em que eu fizesse parte da commissão, mas eu declarei desde logo, que iria á commissão sómente para dar informações, e que não votaria em qualquer resolução por ella tomada; declaração que repeti no seio da commissão, e de que pedi se tomasse nota.

Agora, entrando na questão para que pedi principalmente a palavra, vou mandar para a mesa uma proposta concebida nos seguintes termos:

«Proponho que se recommende ao governo que, por via da commissão externa que se houver de nomear, ou por outro qualquer meio, se verifique qual era o numero de empregados nas differentes repartições do ministerio das obras publicas antes das reformas de 1864, e qual é o numero dos que foram nomeados depois, em virtude das reformas, e que não serviam n'aquelle ministerio. Qual foi o augmento de despezas provenientes d'ellas, e quaes foram as vantagens ou inconvenientes que resultaram d'essas medidas.

Ter-me-ía dispensada de fallar agora n'este assumpto mandando esta proposta para a mesa, se eu, depois de effectuadas estas reformas, tivesse tido occasião de dar conta,