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SESSÃO DE 15 DE OUTUBRO DE 1890

Presidencia do exmo. sr. Pedro Augusto de Carvalho

Secretarios - os exmos. srs.

Antonio Teixeira de Sousa
Julio Antonio Luna de Moura

SUMMARIO

Lêem-se na mesa os seguintes officios: da presidencia do conselho de ministros, participando a constituição do ministerio; do ministerio do reino, remettendo documentos relativos á eleição pelo circulo n.° 1 (Moçambique); da commissão eleita em uma grande reunião popular em Angra do Heroismo, pedindo a suspensão das bases financeiras da lei que auctorisa o governo a ligar telegraphicamente o continente aos Açores; da camara municipal do Funchal, acompanhando uma representação contra o tratado luso-britannico.- Um telegramma da commissão do recenseamento de Salsete.- Diversos srs. deputados apresentam cincoenta e sete representações contra o tratado luso-britannico.- O sr. presidente participa á camara a nomeação de uma deputação que a representára nas exequias por alma do Senhor D. Pedro IV, e interpretando os sentimentos da camara nomeia a deputação que a represente nas exequias de El-Rei o Senhor D. Luiz e nas felicitações a Sua Magestade pelo seu restabelecimento.- Participa o sr. Paulo Cancella que a commissão de emigração se achava constituida.- O sr. Pedro Victor propõe um voto de profundo sentimento pela morte dos srs. deputados Lourenço Malheiro e Fialho Machado, que é unanimemente approvado; e sob proposta do mesmo sr. deputado foram aggregados á commissão de tarifas dos caminhos de ferro diversos srs. deputados.- Envia para a mesa duas propostas o sr. Guerra Junqueiro.- O sr. Lopes Navarro participa a constituição da commissão de tarifas dos caminhos de ferro.- Suspende-se a sessão até á comparencia do governo. Reaberta a sessão, dá-se conta do decreto do encerramento das côrtes.- O sr. presidente do conselho faz a apresentação do ministerio e lê o programma do governo.- O sr. Franco Castello Branco define a attitude do partido regenerador perante o novo gabinete, e faz diversas considerações de ordem politica e pessoal. - Responde-lhe o sr. presidente do conselho. - O sr. Emygdio Navarro declara, em nome do partido progressista, qual a attitude d'este perante o governo, respondendo-lhe o sr. ministro do reino.- O sr. Guerra Junqueiro despede-se da vida politica e parlamentar, fazendo diversas considerações historicas a proposito da situação do paiz.- Fazem diversas perguntas ao governo os srs. Manuel de Arriaga, Dantas Baracho e Dias Ferreira, respondendo-lhes em breves palavras os srs. presidente do conselho e ministro da marinha.

Abertura da sessão - Ás duas horas e meia da tarde.

Presentes á chamada 102 srs. deputados. São os seguintes: - Abilio Eduardo da Costa Lobo, Abilio Guerra Junqueiro, Adolpho da Cunha Pimentel, Adriano Emilio de Sousa Cavalheiro, Agostinho Lucio e Silva, Albino de Abranches Freire de Figueiredo, Alexandre Alberto da Rocha Serpa Pinto, Alexandre Maria Ortigão de Carvalho, Alfredo Cesar Brandão, Alfredo Mendes da Silva, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Amandio Eduardo da Mota Veiga, Antonio Augusto Correia da Silva Cardoso, Antonio de Azevedo Castello Branco, Antonio Baptista de Sousa, Antonio José Arroyo, Antonio José Lopes Navarro, Antonio Manuel da Costa Lereno, Antonio Maria Cardoso, Antonio Maria Pereira Carrilho, Antonio Costa, Antonio Ribeiro dos Santos Viegas, Antonio Sérgio da Silva e Castro, Antonio Teixeira de Sousa, Arthur Alberto de Campos Henriques, Arthur Urbano Monteiro de Castro, Augusto da Cunha Pimentel, Augusto José Pereira Leite, Augusto Maria Fuschini, Barão de Paçô Vieira (Alfredo), Bernardino Pacheco Alves Passos, Caetano Pereira Sanches de Castro, Carlos Lobo d'Avila Carlos Roma du Bocage, Christovão Ayres do Magalhães Sepulveda, Columbano Pinto Ribeiro de Castro, Custodio Joaquim da Cunha e Almeida, Eduardo Abreu, Eduardo Augusto da Costa Moraes, Eduardo de Jesus Teixeira, Emygdio Julio Navarro, Estevão Antonio de Oliveira Junior, Eugenio Augusto Ribeiro de Castro, Feliciano Gabriel de Freitas, Fernando Mattozo Santos, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco de Barros Coelho e
Campos, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco Joaquim Ferreira do Amaral, Francisco José Machado, Francisco Severino de Avellar, Frederico Ressano Garcia, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Jacinto Candido da Silva, Jayme Arthur da Costa Pinto, João Alves Bebiano, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João José d'Antas Souto Rodrigues, João Maria Gonçalves da Silveira Figueiredo, João de Paiva, João Pinto Moreira, João Simões Pedroso de Lima, João de Sousa Machado, Joaquim Germano de Sequeira, Joaquim Ignacio Cardoso Pimentel, Joaquim Simões Ferreira, José de Alpoim de Sousa Menezes, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José Antonio de Almeida, José Augusto Soares Ribeiro de Castro, José de Azevedo Castello Branco, José Bento Ferreira de Almeida, José Christovão Patrocinio de S. Francisco Xavier Pinto, José Dias Ferreira, José Elias Garcia, José Freire Lobo do Amaral, José Julio Rodrigues, José Maria de Alpoim do Cerqueira Borges Cabral, José Maria Charters Henriques de Azevedo, José Maria Greenfield de Mello, José Maria de Oliveira Peixoto, José Maria, Pestana de Vasconcellos, José Maria dos Santos, José Maria de Sousa Horta e Costa, José Monteiro Soares de Albergaria, José Paulo Monteiro Cancella, José Victorino de Sousa e Albuquerque, Julio Antonio Luna de Moura, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luciano Cordeiro, Luiz Augusto Pimentel Pinto, Luiz de Mello Bandeira Coelho, Luiz Virgilio Teixeira, Manuel Affonso Espregueira, Manuel de Arriaga, Manuel de Oliveira Aralla e Costa, Manuel Thomás Pereira Pimenta de Castro, Manuel Vieira de Andrade, Marcellino Antonio da Silva Mesquita, Matheus Teixeira do Azevedo, Miguel Dantas Gonçalves Pereira, Pedro Augusto de Carvalho, Pedro Ignacio de Gouveia, Pedro Victor da Costa Sequeira, Roberto Alves de Sousa Ferreira, Sebastião de Sousa Dantas Baracho, Thomás Victor da Costa Sequeira, Visconde de Tondella e Wenceslau de Sousa Pereira Lima.

Entraram durante a sessão os srs.: - Adriano Augusto da Silva Monteiro, Antonio Eduardo Villaça, Antonio José Ennes, Antonio Maria Jalles, Antonio Pessoa de Barros e Sá, Bernardino Pereira Pinheiro, Conde de Villa Real, Elvino José de Sousa e Brito, Fidelio de Freitas Branco, Francisco de Castro Mattozo da Silva Côrte Real, Frederico de Gusmão Corrêa Arouca, Ignacio José Franco, João Marcellino Arroyo, José Domingos Ruivo Godingo, José Estevão de Moraes Sarmento, Luiz Gonzaga dos Reis Torgal, Manuel d'Assumpção, Manuel Constantino Theophilo Augusto Ferreira e Manuel Pinheiro Chagas.

Não compareceram á sessão os srs.: - Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alberto Augusto de Almeida Pimentel, Antonio Jardim de Oliveira, Antonio Mendes Pedroso, Aristides Moreira da Motta, Arthur Hintze Ribeiro, Augusto Carlos de Sousa Lobo Poppe, Augusto Cesar Elmano da Cunha e Costa, Conde do Côvo, Eduardo Augusto Xavier da Cunha, Eduardo José Coelho, Fernando Pereira Palha Osorio Cabral, Fortunato Vieira das Neves, Francisco de Almeida e Brito, Francisco José de Medeiros, Francisco Xavier de Castro Figueiredo de Faria, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Ignacio Emauz do Casal Ribeiro, João de Barros Mimoso, João Lobo de Santiago Gouveia, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, João Pinto Rodrigues dos Santos, Joaquim Alves Ma-

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theus, Joaquim Pedro de Oliveira Martins, Joaquim Teixeira Sampaio, José de Abreu do Couto Amorim Novaes, José Frederico Laranjo, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Luiz Ferreira Freire, José Maria Latino Coelho, José de Vasconcellos Mascarenhas Pedroso, Julio Cesar Cau da Costa, Manuel Francisco Vargas, Marianno Cyrillo de Carvalho e Pedro de Lencastre (D.).

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

O seguinte da presidencia do conselho de ministros:

Illmo. e exmo. sr. - Tenho a honra de participar a v. exa., para conhecimento da camara dos senhores deputados da nação portugueza, que, tendo Sua Magestade El-Rei acceitado a exoneração que lhe pediu o ministerio presidido pelo conselheiro d'estado Antonio de Serpa Pimentel: houve por decreto de 13 do corrente nomear-me para os cargos de presidente do conselho de ministros e de ministro o secretario d'estado dos negocios da guerra, dignando-se outrosim de nomear para o ministerio dos negocios do reino o dr. Antonio Candido Ribeiro Costa, antigo deputado da nação e ajudante do procurador geral da corôa e fazenda; para o ministerio dos negocios ecclesiasticos e de justiça o conselheiro Antonio Emilio Correia de Sá Brandão, par do reino electivo, presidente do supremo tribunal de justiça; para o ministerio dos negocios da fazenda o conselheiro José de Mello Gouveia, par do reino, ministro e secretario d'estado honorario e vogal effectivo do supremo tribunal administrativo para o ministerio dos negocios da marinha e ultramar o deputado da nação Antonio José Ennes, inspector geral das bibliothecas e archivos publicos; para o ministerio dos negocios estrangeiros o conselheiro José Vicente Barbosa du Bocage, par do reino, ministro e secretario d'estado honorario; para o ministerio dos negocios das obras publicas, commercio e industria o conselheiro Thomás Antonio Ribeiro Ferreira, par do reino, ministro e secretario d'estado honorario; e para o cargo interino de ministro e secretario d'estado dos negocios da instrucção publica e bellas artes o dr. Antonio Candido Ribeiro da Costa.

Deus guarde a v. exa. Presidencia do conselho de ministro, em 14 de outubro de 1890. - Illmo. e exmo. presidente da camara dos senhores deputados da nação portugueza. = João Chrysostomo de Abreu e Sousa.

Do ministerio do reino, remettendo documentos relativos á eleição de um deputado pelo circulo n.° 1 (Moçambique).

Para a commissão de verificação de poderes.

Do sr. deputado José Dias Ferreira, participando que está anojado pela morte de seu sogro, o exmo. sr. Augusto Ferreira Pinto Basto.

Para a secretaria.

Do ar. deputado Antonio Maria Jalles, participando que não podo comparecer ás sessões da camara por ter fallecido sua mulher.

Para a secretaria.

Da commissão eleita em uma grande reunião popular na cidade de Angra do Heroismo em 3 de agosto ultimo, pedindo a suspensão das bases financeiras da lei que auctorisou o governo a ligar telegraphicamente o continente aos Açores.

Para as commissões de fazenda e de administração publica.

Da camara municipal do Funchal, acompanhando uma representação contra o tratado luso-britannico.

Para as commissões de fazenda, do ultramar e dos negocios estrangeiros e internacionaes e mandada publicar no Diario do governo.

Do ministerio do reino, participando que Sua Magestade El-Rei houve por bem decretar que a sessão real de encerramento das côrtes geraes ordinarias se effectue hoje, pelas cinco horas e meia da tarde, na sala das sessões da camara electiva, reunidos ambos os corpos colegisladores, sob a direcção do presidente da camara dos dignos pares do reino, e que, por circumstancias ocorrentes que impedem Sua Magestade de assistir a esta solemnidade, assistam ao referido acto, por commissão do mesmo augusto senhor, os ministros e secretarios d'estado de todas as repartições.

Para a secretaria.

Telegramma

Margão, 12, ás 12 horas e 55 minutos da manhã. - Camara deputados - Lisboa. - Impossivel reunir, proceder trabalhos eleição deputado. Continuam exilio cidadãos, anarchia, assaltos militares. Supplica adiamento não sacrificar subditos leaes vingança governador. = Commissão recenseamento Salsete.

Para a secretaria.

REPRESENTAÇÕES

Da camara municipal da villa da Povoa de Varzim e da junta de parochia da freguezia de S. João Baptista da villa de Alcochete, contra o tratado luso-britaunico de 20 de agosto ultimo.

Apresentadas pelo sr. presidente da camara, enviadas ás commissões de fazenda, do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes, e mandadas publicar no Diario do governo.

Da junta de parochia da freguezia de Paranhos, da cidade do Porto, no mesmo sentido.

Apresentada pelo sr. deputado Francisco Beirão, enviada ás commissões de fazenda, do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes, e mandada publicar no Diario do governo.

Das camaras municipaes dos concelhos de Cintra e do Villa Nova de Ourem, das juntas de parochia das freguezias de Santa Maria dos Olivaes e de Villa Nova de Ourem, da commissão incumbida no comicio que se realisou em Vizeu em 19 de janeiro ultimo, de promover a subscripção para a defeza da patria, e da commissão patriotica estabelecida na villa do Eixo, no sentido das antecedentes.

Apresentadas pelo sr. deputado Eduardo Abreu, enviadas ás commissões de fazenda, do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes, e mandadas publicar no Diario do governo.

Da camara municipal do Funchal, no sentido das antecedentes.

Remettida em officio, enviada ás commissões de fazenda, ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes e mandada publicar no Diario do governo.

Das camaras municipaes de Vagos e de Ceia, e da junta do parochia da freguezia de Vagos, no sentido das antecedentes.

Apresentadas pelo sr. deputado Paulo Cancella, enviadas ás commissões de fazenda, do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes, e mandadas publicar no Diario do governo.

Das camaras municipaes de Miranda do Corvo e de Estarreja, no sentido das antecedentes.

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Apresentadas pelo sr. deputado Mattozo Côrte Real, enviadas ás commissões de fazenda, do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes, e mandadas publicar no Diario do governo.

Das camaras municipaes de Vouzella, de Povoa de Lanhoso e de Castro Daire, no sentido das antecedentes.

Apresentadas pelo sr. deputado Bandeira Coelho, enviadas ás commissões de fazenda, do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes, e mandadas publicar no Diario do governo.

Das camaras municipaes de Nellas e de Cezimbra e da junta de parochia da freguezia de Cannas de Senhorim, no sentido das antecedentes.

Apresentadas pelo sr. deputado Francisco de Campos, enviadas ás commissões de fazenda, do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes, e mandadas publicar no Diario do governo.

Das camaras municipaes de Pinhel e de Santa Comba Dão, no sentido das antecedentes.

Apresentadas pelo sr. deputado Simões Ferreira, enviadas ás commissões de fazenda, do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes e mandadas publicar no Diario do governo.

Da camara municipal de Lagos, no sentido das antecedentes.

Apresentada pelo sr. deputado Bernardino Pinheiro, enviada ás commissões de fazenda, do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes e mandada publicar no Diario do governo.

Das camaras municipaes do concelho de Peniche, do concelho de Fafe, do concelho de Villa Verde, do concelho de Leiria e dos cidadãos das Caldas da Rainha, dos cidadãos leirienses e da classe operaria da villa de Peniche, no sentido das antecedentes.

Apresentadas pelo sr. deputado Francisco José Machado, enviadas ás commissões de fazenda, do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes, e mandadas publicar no Diario do governo.

Da camara municipal de Villa Real, da commissão districtal delegada da junta geral do districto de Villa Real, e do comicio de Villa Real, no sentido das antecedentes.

Apresentadas pelo sr. deputado conde de Villa Real e enviadas ás commissões de fazenda, do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes, e mandadas publicar no Diario do governo.

Da camara municipal do concelho da Gollegã, da junta de parochia da freguezia do Sacramento de Lisboa, da junta de parochia da freguezia de S. João Baptista de Alhandra, da classe pharmaceutica da capital, da associação do monte pio maritimo e de varios cidadãos de Galveias, no sentido das antecedentes.

Apresentadas pelo sr. deputado Manuel de Arriaga e enviadas ás commissões de fazenda, do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes, e mandada publicar no Diario do governo.

Do atheneu commercial do Porto no sentido das antecedentes.

Apresentada pelo sr. deputado Serpa Pinto, e enviada ás commissões de fazenda, do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes, e mandadas publicar no Diario do governo.

Da camara municipal, junta de parochia, quarenta maiores contribuintes, proprietarios, lavradores e commerciantes do concelho de Trancoso, no sentido das antecedentes.

Apresentadas pelo sr. deputado Xavier da Cunha e enviadas ás commissões de fazenda, do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes, e mandadas publicar no Diario do governo.

Da camara municipal do concelho da Feira, no sentido das antecedentes.

Apresentada pelo sr. deputado Roberto Alves, e enviada ás commissões de fazenda, do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes, e mandada publicar no Diario do governo.

Da camara municipal do concelho de Oeiras, no sentido das antecedentes.

Apresentada pelo sr. deputado Ignacio José Franco, enviada ás commissões de fazenda, do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes, e mandada publicar no Diario do governo.

Das associações: commercial de legistas de Lisboa, de empregados no commercio e industria, de empregados no commercio de Lisboa, atheneu commercial, commercial de emprezarios de açougues de Lisboa, industrial de legistas de calçado, dos alfaiates de Lisboa, de soccorros mutuos lisbonense e da camara municipal de Grandola no sentido das antecedentes.

Apresentadas pelo sr. deputado José Elias Garcia, enviadas ás commissões de fazenda, do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes, e mandadas publicar no Diario do governo.

Da camara municipal de Tondella, no sentido das antecedentes.

Apresentada pelo sr. deputado visconde de Tondella, enviada ás commissões de fazenda, do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes e mandada publicar no Diario do governo.

De uma commissão delegada do comicio realisado em Sabrão, concelho de Paços de Ferreira, em 21 de setembro ultimo, no sentido das antecedentes.

Apresentada pelo sr. deputado Lereno, enviada ás commissões de fazenda, do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes, e mandada publicar no Diario do governo.

Da camara municipal de Villa Nova de Foscôa, no sentidos das antecedentes.

Apresentada pelo sr. deputado José Maria de Alpoim, enviada ás commissões do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes e mandada publicar no Diario do governo.

Da camara municipal de Penafiel, no sentido das antecedentes.

Apresentada pelo sr. deputado José Julio Rodrigues, enviada, ás commissões do ultramar, negocios estrangeiros e internacionaes, e mandada publicar no Diario do governo.

Da commissão eleita n'uma grande reunião popular na cidade de Angra do Heroismo em 3 de agosto ultimo, pedindo a suspensão das bases financeiras da lei que auctorisou o governo a ligar telegraphicamente o continente aos Açores.

Remettida em officio e enviada ás commissões de fazenda e de administração publica.

O sr. Presidente: - Tenho a participar á camara que depois da ultima sessão me foram entregues quatro representações contra o convenio de 20 de agosto, sendo uma da sociedade de geographia, outra de varios habitantes de Seixo de Anciães, districto de Bragança, outra de uma

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commissão nomeada n'uma reunião de jornalistas, e outra em nome do povo de Setubal. Estas representações serão publicadas na folha official, conforme está auctorisado pela camara, o vão ser enviadas ás commissões encarregadas do exame do dito convenio.

Tenho tambem a communicar que, para representar a camara nas exequias do dia 21 de setembro, por alma de Sua Magestade Imperial o Senhor D. Pedro IV, nomeei uma deputação composta dos seguintes srs. deputados, alem da mesa:

Antonio Manuel da Costa Lereno.
Antonio Ribeiro dos Santos Viegas.
Barão de Paçô Vieira.
Francisco Severino de Avellar.
João de Paiva.
Joaquim Ignacio Cardoso Pimentel.
Julio Antonio Luna de Moura.
Julio Cesar Cau da Costa.
Manuel Vieira de Andrade.
Antonio Sergio da Silva e Castro.

Parece-me interpretar os sentimentos da camara, propondo que se nomeie tambem uma grande deputação, para a representar nas exequias que devem verificar-se na proxima segunda feira, por alma de Sua Magestade El-Rei o Senhor D. Luiz I de saudosissima memoria. (Apoiados.)

Se a camara concordar, essa deputação ficará tambem incumbida de apresentar a Suas Magestades as felicitações d'esta camara pelo restabelecimento de Sua Magestade El-Rei da grave enfermidade que tem soffrido (Muitos apoiados.)

Em vista da manifestação da camara, considero approvada a mesma indicação e nomeio para constituirem essa deputação, alem da mesa, os seguintes srs. deputados:

Santos Viegas.
Sergio de Castro.
Ferreira de Almeida.
Luna de Moura.
Antonio de Azevedo Castello Branco.
Vieira do Andrade.
Lobo d'Avila.
José Julio Rodrigues.
Antonio Costa.
Ressano Garcia.

O sr. Paulo Cancella: - Participo a v. exa. e á camara que está constituida a commissão de emigração, tendo escolhido para presidente o sr. Luciano Cordeiro e a mim para secretario, havendo relatores especiaes.

Mando tambem para a mesa duas representações contra o tratado luso-britannico.

O sr. Pedro Victor: - Pedi a palavra, apesar do estado da minha voz quasi me não permittir fallar, para cumprir um triste e doloroso dever. Durante o interregno parlamentar falleceram dois srs. deputados que eram commigo representantes do districto de Beja, os srs. Lourenço Malheiro e Fialho Machado. Peço a v. exa. que consulte a camara se consente que seja lançada na acta da sessão um voto do sentimento pela morte d'esses illustres deputados e que essa resolução da camara seja communicada ás familias dos finados.

A perda d'estes dois illustres deputados não é apenas uma desgraça para suas familias, e um tristissimo acontecimento para os seus amigos; os seus altos merecimentos, talentos e virtudes permittem asseverar que é tambem uma perda nacional, e a camara por certo não terá duvida em significal-a o lamental-a em nome do paiz, testemunhando a suas familias este ultimo preito e esta ultima homenagem. (Muitos apoiados.) Espero, pois que, todos se associem a esta manifestação de sentimento.

Mando para a mesa uma proposta para que sejam aggregados á commissão encarregada de estudar as tarifas de caminho de ferro alguns srs. deputados.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

Leu-se na mesa a seguinte:

Proposta

Proponho para que na acta seja lançado um voto de profundo sentimento pela morte dos illustres deputados os srs. Lourenço Pereira Malheiro e Antonio Fialho Machado, e que d'esta resolução se dê conhecimento ás familias dos fallecidos. = O deputado pelo circulo do Beja, Pedro Victor da Costa Sequeira.

O sr. Presidente: - Creio que está no sentimento de toda a camara a approvação da proposta apresentada pelo sr. Pedro Victor, para se consignar na acta d'esta sessão um voto de profundo sentimento pela perda dos dois srs. deputados Lourenço Malheiro e Fialho Machado, e para se communicar essa resolução ás familias dos illustres finados. (Apoiados geraes.)

Em vista da manifestação da camara considero a proposta approvada unanimemente.

Leu-se tambem na mesa a seguinte:

Proposta

Proponho para serem aggregados á commissao encarregada de estudar a questão das tarifas dos caminhos de ferro os srs. deputados João Marcellino Arroyo, Francisco Felisberto Dias Costa, Dantas Baracho, Antonio de Azevedo Castello Branco, Virgilio Teixeira, Lopes Navarro. = O deputado por Beja, Pedro Victor.

Foi approvada.

O sr. Serpa Pinto: - Mando para a mesa uma representação do atheneu commercial do Porto contra o tratado luso britannico.

Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte a publicação d'esta representação no Diario do governo.

O sr. Presidente: - É escusado consultar a camara, porque ella já auctorisou a publicação de todas as representações n'esse sentido.

O sr. Elias Garcia: - Mando para a mesa as seguintes representações:

Das associações, commercial de lojistas de Lisboa, empregados no commercio e industria, empregados do commercio de Lisboa, atheneu commercial, commercial de emprezarios de açougues de Lisboa, industrial do lojistas de calçado, alfaiates de Lisboa, soccorros mutuos lisbonense e da camara municipal de Grandola.

Póde dizer-se que estes votos, pareceres ou reclamações aqui formulados representam os votos ou reclamações de muitos milhares de cidadãos e são mais uma prova das muitas que a cidade de Lisboa tem dado contra o tratado de 20 de agosto.

Não desejando alargar-me em considerações para não tomar tempo, limito-me a pedir a v. exa., se digne ordenar a sua publicação na folha official, conforme já foi deliberado.

O sr. Manuel de Arriaga: - Mando para a mesa cinco representações contra o tratado de 20 de agosto, da camara municipal do concelho da Gollegã, da junta de parochia da freguezia do Sacramento de Lisboa, da junta de parochia da freguezia de S. João Baptista de Alhandra, da classe pharmaceutica da capital, da associação do montepio maritimo e de varios cidadãos de Galveias.

Roqueiro que estas representações, como se tem feito em relação ás outras, sejam publicadas na folha official visto estarem escriptas nos termos devidos.

Tambem estimaria que a camara me acompanhasse no desejo de que todas as representações que têem sido apresentadas a este respeito e publicadas, se reunissem n'um volume, para ficarem como documento historico digno de ser consultado por todos e que, alem de ser distribuido pelos membros de uma e outra casa do parlamento, o fosse tambem pelas escolas e salas de estudo, porque é bom que

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hoje e mais tarde se saiba o que a nação sentiu de nobre, elevado e patriotico, n'este lance muitissimo angustioso.

Eu podia fazer uma proposta n'este sentido, mas deixando isso á descripção de v. exa., sr. presidente, terá talvez melhor destino.

Antes de terminar desejo deixar consignada aqui a minha surpreza por ver só hoje a camara tão cheia de representantes da nação, quando até agora me tenho encontrado apenas com tres ou quatro dos meus collegas, sem termos a quem nos dirigirmos nos dias mais difficeis da crise!

Apesar das indicações da presidencia designando os dias em que haveria sessão, e quando as circumstancias mais reclamavam o conselho e o auxilio de nós todos, a camara mantinha-se deserta!!

Quem prevenia os deputados de que não deviam cá vir a quem os attrahiu hoje em tão grande numero, tudo isto com tamanho menoscabo dos seus direitos e da sua dignidade?!

Mysterios em que não quero agora penetrar, limitando-me a deixar consignadas estas palavras para descargo da minha consciencia, e como protesto contra aquelles que abatem por fórma similhante a representação nacional!

O sr. Eduardo Abreu: - Mando para a mesa varias representações, das camaras municipaes dos concelhos de Cintra e de Villa Nova de Ourem, das juntas de parochia das freguezias de Santa Maria dos Olivaes e de Villa Nova de Ourem, da commissão incumbida no comicio realisado em Vizeu em 19 de janeiro ultimo, de promover a subcripção para a defeza da patria, e da commissão patriotica estabelecida na villa do Eixo. Todas estas representações são contra o tratado de 20 de agosto e como estão nos devidos termos, v. exa. terá a bondade de as mandar publicar na folha official.

O sr. Veiga Beirão: - Mando para a mesa uma representação da junta de parochia da freguezia de Paranhos da cidade do Porto contra o tratado de 20 de agosto e cuja publicação não requeiro, visto a camara ter já resolvido que todas as representações idênticas sejam publicadas na folha official.

O sr. Guerra Junqueiro mandou para a mesa as seguintes propostas:

«Proponho que sejam proclamados benemeritos da pátria os fallecidos Silva Porto e tenente Valadim.

«Lisboa, 18 de setembro de 1890.= Guerra Junqueiro = José Maria de Alpoim = Fernando Pereira Palha = Luciano Cordeiro = A. Ennes = José Elias Garcia = João Pinto dos Santos.

«Proponho que sejam concedidas pensões ás filhas do africanista Silva Porto e á viuva do tenente Valladim.

«Lisboa, 18 de setembro de 1890. = Guerra Junqueiro = José Maria de Alpoim = Fernando Pereira Palha = Luciano Cordeiro = Antonio Ennes = José Elias Garcia = João Pinto dos Santos.»

Entendia que as familias d'esses benemeritos não podiam nem deviam receber esmolas de quem quer que fosse, nem do Rei, nem do povo, mas sim uma pensão do estado porque isso não significava um favor, mas era uma divida que se pagava.

Desejava saber que destino se dera a uma proposta por elle apresentada, para que os despojos mortaes de Camillo Castello Branco e Silva Porto fossem trasladados para o pantheon dos Jeronymos.

(O discurso será publicado na integra e em appendice a esta sessão, quando s. exa. reveja as respectivas notas tachygraphicas.)

O sr. Lopes Navarro: -Participo a v. exa. e á camara que está constituida a commissão encarregada de estudar as tarifas dos caminhos de ferro, tendo escolhido para presidente o sr. Arroyo e a mim para secretario.

O sr. Emygdio Navarro: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Thomar contra o tratado luso-britannico.

O sr. Conde de Villa Real: - Mando para a mesa varias representações contra o tratado luso-britannico.

O sr. Fernando Mattozo: - Mando para a mesa uma representação contra o tratado luso-britannico.

O sr. Presidente: - As propostas apresentadas pelo sr. Guerra Junqueiro ficam para segunda leitura.

Por parte do sr. presidente do conselho foi-me declarado que só podia comparecer na camara ás tres horas. Suspendo portanto a sessão até á comparencia do governo.

Interrompeu-se a sessão eram tres horas menos dez minutos.

Reabriu-se a sessão ás tres horas e dez minutos.

Leu-se o decreto de encerramento.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (João Chrysostomo): - Peço a benevolencia de v. exa. e da camara para ler o discurso que projectava recitar se não fosse o meu estado de saude e a minha idade.

«Tendo sido encarregado por Sua Magestade El-Rei de organisar ministerio, venho hoje dar conta ao parlamento da maneira como me desempenhei d'esse honroso e difficil encargo, que acceitei movido pela unica ambição de ainda prestar um serviço á minha patria antes de me despedir da vida. Outros o prestariam melhor do que eu; mas sou cidadão, e para o cumprimento do dever civico não ha limite de idade; sou militar, e fica mal ao soldado voltar o rosto aos perigos.

«O ministerio houve de organisar-se conforme as necessidades excepcionaes da situação politica. Não representa um partido, mas ha de representar os principios de governo que são communs aos partidos liberaes e monarchicos, e diligenciará merecer, quanto possivel, a cooperação ou benevolencia de todos, zelando os interesses publicos, que elle sobrepõe ás suas conveniencias particulares. Tão pouco saíu das maiorias parlamentares, e por isso não conta com a sua confiança politica, nem a solicita; todavia, tendo por essencial missão occupar-se de assumptos que estão ligados á honra e á fortuna do paiz, e que o preoceupam e agitam, espera que os corpos legislativos lhe não faltem com o concurso e o apoio de que elle precisar, e quando o precisar, para o desempenho da sua missão nacional.

«Esses assumptos especiaes são a questão de fazenda e o infeliz desaccordo com a Inglaterra, motivado pela concorrencia dos seus interesses com os nossos direitos na Africa oriental. Ácerca d'este desaccordo, o governo, identificado com o sentimento nacional, não póde recornmendar á sanação do parlamento o tratado de 20 de agosto, embora não pretenda estorvar a execução da sua clausula que já o sujeitou a essa sancção. Acceitaria de bom grado modificações no mencionado tratado que, resalvando a dignidade e os interesses da nação, facilitassem o restabelecimento da mais completa harmonia entre Portugal e a sua antiga alliada; mas ainda não sabe se terá de se julgar inhibido de promover taes modificações pelos factos que se diz terem occorrido recentemente á entrada do Zambeze, e que, se não fossem explicados satisfactoriamente, difficultariam ainda mais o accordo equitativo que o governo portuguez sempre tem desejado sinceramente.

«N'este estado de cousas, o actual gabinete não póde ainda tomar resoluções definitivas que sirvam de norma ao seu procedimento futuro, a não ser a de zelar inquebrantavelmente a honra do paiz; logo, porém, que possa tomal-as sem precipitação, communical-as-ha ao parlamento, que convocará novamente, se lhe for preciso o seu concurso, e annuncial-as-ha á nação, cujo apoio generoso deseja merecer em todas as eventualidades d'este difficil lance.

«Relativamente á questão fazendaria, o governo ha de esforçar-se por firmar o credito publico, atacado no estrangeiro por interesses particulares, mas não abalado, felizmente, por suspeitas fundadas de que Portugal possa algum dia deixar de honrar os seus compromissos, como sempre

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os tem honrado até aqui. Para mais energicamente rebater esses ataques, impor-se ha o severo preceito de se abster de quaesquer despezas que não sejam imprescindiveis e de realisar corajosamente todas as economias permittidas pelas necessidades dos serviços publicos e pelos encargos essenciaes da civilização. É este o artigo fundamental do seu programma de administração interna. Comquanto sympathise com todos os progressos materiaos, julga indispensavel sustal-os, embora sem ruina ou estrago da que estiverem iniciados, emquanto a situação da fazenda publica não for tal que inspire plena confiança a nacionaes e estrangeiros, o assegure aos contribuintes que lhes não serão exigidos novos sacrificios. O governo declara solemnemente que empenhará toda a energia da sua vontade e todo o apoio que lhe possa dar a opinião publica, na execução do proposito inabalavel, que lhe deve ser facilitada pela absoluta isenção de preoccupações partidarias, de atalhar o crescimento assustador das despezas publicas e adoptar uma politica financeira de reparação e consolidação.

«São estas as deliberações capitães do novo ministerio, que se julga, incumbido especialmente, se não exclusivamente, de resolver ou preparar a solução dos dois problemas que n'este momento mais se impõem á solicitude dos homens publicos. Havendo, porém, de se occupar tambem de todos os ramos da governação, em todos elles subordinará os seus actos e propositos ás regras da mais escrupulosa moralidade, de que é penhor o passado dos ministros, de um sincero respeito pela lei, que os auctorisa a fazel-a respeitar por todos os funccionarios e cidadãos, e de uma inabalavel convicção dos principios liberaes, que são o alicerce das nossas instituições. Cingindo-se a estas regras, o governo espera conseguir, ao menos, que a sua gerencia determine o apaziguamento das paixões politicas e assegure ao paiz o socego e a confiança de que elle tanto precisa para trabalhar pela sua prosperidade.»

O sr. Franco Castello Branco: - Sr. presidente, cabe-me a honra de definir a attitude que o partido regenerador toma em face do governo que hoje se apresenta n'esta camara, organisado pelo honrado general o sr. João Chrysostomo de Abreu e Sousa. Essa attitude, francamente, sinceramente apoiada por todos os membros regeneradores das duas casas do parlamento e que foi hontem indicada pelo alto criterio politico e pelo sincero patriotismo do respeitavel e illustre chefe do partido regenerador o sr. Antonio de Serpa, cifra-se em receber o actual governo com uma attitude do espectativa benevola. A declaração feita pelo illustre presidente do conselho, de que o ministerio não só era formado fóra dos partidos, mas que forcejaria em todos os seus actos por se conservar independente de todo o espirito de facção,- as circumstancias graves que o paiz atravessa e as duas questões superiores que se impõem, não só á attenção dos homens publicos, mas de todos os portuguezes - a resolução do grave conflicto com a Inglaterra e a situação financeira, que de ha muito não se apresenta por fórma a inspirar a maior e mais completa confiança sobre o ponto de vista da sua liquidação, eram motivo bastante para que o partido regenerador, que ha pouco deixou aquellas cadeiras, e que as deixou sem saudade absolutamente alguma, tão ingrata e difficil lhe foi a vida durante o tempo que ali esteve; (Apoiados.) eram motivo bastante para que a sua attitude, ao receber o novo gabinete, fosse a da expectativa mais benévola que é possivel.

Mas alem d'isso, militava ainda outra rasão, como era a de fazerem parte d'esse governo homens como o sr. conselheiro Bocage e o sr. conselheiro Mello Gouveia, que dispensaram ao governo transacto todo o seu apoio, (Apoiados.) já com os seus votos no parlamento, já com a coadjuvação politica da sua auctoridade moral, que é grande; (Apoiados.) para que o partido regenerador, independentemente das outras rasões a que ha pouco me referi e que por si só já eram bastantes para aconselharem esta attitude, fosso levado por esta rasão de ordem pessoal a esta attitude benevola que acabo de definir. (Vozes: - Muito bem).

Expectativa benevola, disse eu que seria a attitude mantida pelo partido regenerador para com os actos do novo gabinete; mas devo acrescentar que a respeito da questão principal, o conflicto com a Inglaterra, essa expectativa benevola vae até ao ponto de o partido regenerador desejar com a maior sinceridade poder apoiar, e coadjuvar mesmo, os actos do governo, as medidas, os expedientes, os recursos, de que elle lance mão para resolver essa questão, como o ministerio passado pretendeu resolvel-a, com honra para o paiz. (Muitos apoiados.)

A pasta dos estrangeiros, de certo n'este momento uma das mais pesadas, se não a mais pesada, foi alem d'isso confiada, como já disse, a um distinctissimo membro do partido regenerador, a um homem a quem esse partido costuma ha muito tempo acompanhar com a sua estima e com a sua maior consideração. (Muitos apoiados.)

Portanto, ainda alem da gravidade da questão em si, essa rasão, por assim dizer de ordem pessoal, impunha ao partido regenerador a obrigação de, n'essa parte, não só prometter desde já uma espectativa benevola, mas até desejar com a maior sinceridade, que os meios de que o novo governo lance mão possam merecer todo o apoio, porque não lh'o negará. (Vozes: - Muito bem.)

Em relação á questão de fazenda, eu que fui ministro d'essa pasta, concordo absolutamente com o que no programma lido pelo honrado general o sr. João Chrysostomo de Abreu e Sousa se refere especialmente a essa materia. Sou tambem, como s. exa., de opinião, que é mais difficil a liquidação das difficuldades de momento, synthetisadas acima de tudo por uma enorme divida fluctuante, ainda mais do que propriamente pela falta de recursos ordinarios do thesouro para fazer face ás despezas obrigatorias do mesmo thesouro. Quando eu tive a honra de entrar para o governo que ha pouco se demittiu, a questão de fazenda apresentava dois aspectos: um grande desequilibrio orçamental, e a impretorivel necessidade de liquidar uma divida fluctuante, a maior que n'este paiz tem havido.

Foi para o primeiro ponto que eu dirigi principalmente as minhas attenções, por entender que, para poder tentar uma larga operação de credito no estrangeiro para consolidar a divida fluctuante, o que primeiro que tudo nos cumpria fazer era equilibrar o orçamento, dando assim aos capitalistas nacionaes e estrangeiros a certeza de que, se Portugal até hoje tem honrado sempre os seus compromissos, não só estava disposto e resolvido a continuar a honral-os, mas tinha effectivamente recursos para o conseguir.

Sob este ponto de vista sabe, pois, a camara que deu a sua approvação ás medidas que eu tive a honra de apresentar, que a questão de fazenda melhorou e melhorou consideravelmente.

Pelos novos recursos que o parlamento entendeu dever votar e a que o paiz, por factos decorridos desde a votação d'esses novos recursos se tem sujeitado, póde assegurar-se que o equilibrio do orçamento ordinario vae estabelecer-se era bases solidas desde o momento que, a respeito de despezas, se siga o programma que foi hoje lido pelo illustre general e presidente do conselho, o que aliás, como hão de estar lembrados os membros d'esta camara, era tambem aquillo que eu considerava uma necessidade impreterivel e inadiavel. (Apoiados.)

Relativamente á liquidação e consolidação da divida fluctuante, permitta-me a camara que eu diga alguma cousa, não como necessidade de explicar a attitude do partido regenerador em face do novo governo, unico motivo que me levou a pedir a palavra, mas sob o ponto de vista unicamente pessoal.

É sabido hoje que eu preparára uma larga operação de credito para a consolidação d'essa divida.

Não venho aqui expor nem discutir, porque não é occasião opportuna, quaes eram os termos em que se havia de

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fazer essa operação, a mais larga e importante, sob o ponto de vista do credito que n'este paiz se tem realisado.

O que quero sobre tudo é affirmar, para não deixar duvidas a ninguem, que as negociações que, com auctorisação do parlamento a esse respeito se tinham iniciado, estalo em altura de não constituirem de fórma alguma compromisso para o governo portuguez, nem mesmo para aquelle de que eu fazia parte. (Apoiados.) Ha portanto para o novo ministro da fazenda, qualquer que seja o ponto de vista em que se considerem, plena liberdade de poder acceital-as ou rejeital-as conforme entender. (Muitos apoiados.)

Outro facto quero ainda affirmar á camara, e vem a ser que, desde o momento em que o ministerio de que eu tive a honra de fazer parte apresentou a Sua Magestade a sua demissão, nunca mais, como era obvio e natural, deu um passo que fosse no sentido de adiantar essas negociações.

Tendo procurado ser preciso e conciso, como era de necessidade n'este momento, nada mais necessito dizer para definir a attitude do partido regenerador em face do novo governo.

Nenhuma pergunta lhe dirijo sobre as questões pendentes. Tendo feito parte dos conselhos da corôa, sei quantas vezes é altamente inconveniente fazer perguntas antecipadas que obrigam a respostas que, pelo menos, são desde logo aproveitadas por tantos que hoje fora das nossas fronteiras espreitam todos os momentos para prejudicarem o paiz.

Não dirijo, pois, muito intencionalmente, e supponho que n'isto não divirjo dos outros membros do partido regenerador que têem assento n'esta camara, nenhuma pergunta ao governo, deixando-lhe plena e inteira a liberdade da sua acção, em primeiro logar porque lhe promettemos uma espectativa benevola, e em segundo logar porque queremos ter depois toda a liberdade de critica para os seus actos.

Concluindo devo ainda sob um ponto de vista pessoal dizer á camara que todos os membros d'este governo que se apresentou hoje aqui pela primeira vez me merecem, não só toda a consideração, mas muita estima pessoal.

Já me referi especialmente a dois que me deram a honra de me acompanhar com os seus votos em todas as medidas que eu apresentei á camara, e são elles os srs. conselheiros Bocage e Mello Gouveia.

Não podia tambem deixar de mencionar muito especialmente o sr. conselheiro Antonio Emilio de Sá Brandão, illustre ministro da justiça, e a quem me prendem relações da maior e mais intima amisade que ha muitos annos prezo.

É do meu dever, que cumpro gostosamente, dizer a s. exa. e assegurar-lhe que póde contar com todo o meu, apoio, sempre que as questões dependentes da sua pasta não tiverem caracter politico em que eu me veja obrigado a acompanhar o meu partido, tanto no parlamento como fóra do parlamento, se em qualquer occasião eu podér ajudar s. exa. na difficil tarefa que sobre si tomou. É essa a minha obrigação, é esse o meu dever, pela extrema amisade que me liga ao nobre ministro da justiça.

Sabe todo o paiz que, se s. exa. é o primeiro magistrado portuguez pela sua posição hierarchica, não o é menos pela sua competencia e auctoridade moral; não podia pois ser mais acertada a sua escolha para a gerencia dos negocios publicos.

Termino, desejando a este governo uma vida tão feliz e venturosa quão difficil e dolorosa foi a do ministerio a que eu tive a honra de pertencer.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (João Chrysostomo): - Uso da palavra simplesmente para apresentar os agradecimentos do gabinete a que tenho a honra de presidir, pelas phrases que acaba de pronunciar o distincto orador d'esta camara e illustre ministro da fazenda da situação transacta.

Congratulo-me por encontrar no partido regenerador a coadjuvação que ha de facilitar a missão difficil e embaraçosa de que me encarreguei.

Conto com o apoio do parlamento e de todos os homens sinceros e amigos do seu paiz, esperando assim poder, com o gabinete que me acompanha, vencer as difficuldades em que estamos envolvidos.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O sr. Emygdio Navarro:-Disse que os seus amigos politicos o haviam incumbido de definir a sua attitude em face do actual governo, o que ía fazer tão claramente e tão subitamente como podesse.

O partido progressista acceitava a constituição politica do ministerio, tal como fôra definida pelo nobre presidente do conselho: era um ministerio sem caracter partidario, e que se propunha governar com isenções partidarias.

O nobre presidente do conselho era um dos marechaes do partido progressista, que illustrava com os seus altos merecimentos e honrava com as suas preclaras virtudes; mas, não obstante, e apesar das sympathias, que eram muitas, por alguns dos actuaes ministros, podia até dizer que por todos elles; apesar da esperança e do desejo de que alguns dos actuaes ministros voltem a robustecer as fileiras do partido progressista, este partido não tem representação no ministerio. É um governo extra-partidario, e assim fica estabelecido.

A attitude do partido progressista em face do novo governo será de espectativa e benevolencia. Póde até dizer que será da maxima benevolencia. Não quer isto dizer de fórma alguma, que o partido progressista abdica das suas reivindicações, ou modifica as suas opiniões nas graves questões pendentes. Quer dizer que acata a gravidade excepcional das circumstancias, que lhe impõem esta reserva benevola. E a benevolencia, se não fosse já resolução anterior, como imposta por essa força, teria sido resolução immediata, em presença da honrada e patriotica declaração, que acabava de ser lida pelo sr. presidente do conselho.

Não faria perguntas ao governo para não lhe crear difficuldades. Não queria constrangel-o a respostas, que podessem compromettel-o, ou com a opinião publica, cujos favores o governo não póde dispensar, ou com as potencias estrangeiras, que não deve malquistar e provocar inutilmente, ou com as suas proprias consciencias, que em todos os casos devem respeitar. E menos necessidade tinha de fazer perguntas depois da declaração ministerial.

O partido progressista desejava poder converter a sua benevolencia em apoio caloroso, e para isso bastava que o governo se inspirasse em todos os seus actos, e até ao fim, no bem publico e nos sentimentos e na dignidade da nação, como se inspirára na redacção da declaração patriotica e dignissima, que o sr. presidente do conselho acabava de ler á camara.

(O discurso será publicado em appendice a esta sessão, quando s. exa. o restituir.)

O sr. Ministro do Reino (Antonio Candido): - Levanto-me para agradecer as nobres palavras de referencia com que o illustre deputado o sr. Emygdio Navarro, em seu nome, e em nome da minoria progressista, comprimentou e saudou o ministerio.

O ministerio, sr. presidente, acceitando o poder com as grandes responsabilidades, que elle envolve n'este momento, entende que cumpriu o seu dever. Esta convicção fica radicada, e o ministerio fica consolado desde que por parte dos representantes dos dois grandes grupos d'esta camara tão sincera e generosa justiça é feita ás suas intenções.

Ás reservas que os meus amigos o sr. Franco Castello Branco e Emygdio Navarro se impozeram, aconselhadas pela mais perfeita comprehensão da melindres da conjunctura, esforçar-se-ha o ministerio por corresponder digna-

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mente com os acua autos, que, se não valerem como elemento positivo para a resolução das grandes questões que nos embaraçam n'este momento, hão de ficar como documento de que foram rectas, justas, sinceras e inspiradas no bem publico as intenções do governo.

A attitude dos dois illustres parlamentares, que não póde deixar de ser a attitude de toda a camara, (Muitos apoiados.) realisa o que nós esperavamos.

N'este momento tão difficil, tão angustioso, quando só quem tenha o coração leve póde deixar de tremer e de receiar pelo que talvez nos traga o dia de ámanhã, (Apoiados.) quando a superstição do mal e da fatalidade sem remedio parece que começa a invadir alguns dos mais valentes; n'este momento, o que é justo, digno e moralmente bello é isto: é que os partidos enrolem as suas bandeiras, que os resentimentos deixem de ter voz, que as pequenas divergencias desappareçam, e que só a alma da patria vibre em todos com o mesmo sentimento, com a mesma esperança emfim, de que a final triumphem o direito e a justiça. (Muitos apoiados.) O contrario seria uma impiedade. (Apoiados.)

Foi para dizer estas poucas palavras que eu me levantei.

E, já que estou com a palavra, quero repetir, pela posição especial que occupo no ministerio, uma das declarações feitas pela honrada e veneranda palavra do illustre presidente do conselho.

O ministerio está fora dos partidos; não combaterá, não bostilisará ninguem; tambem não auxiliará com a boa fortuna nenhum dos agrupamentos partidarios em que está dividida a sociedade portuguesa; mantendo a sua dignidade verá, por cima dos partidos, unicamente a nação, e interpretando as suas aspirações esforçar-se-ha por honrar estes sentimentos e por satisfazer devidamente a essas aspirações.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Guerra Junqneiro: - Disse que se encerrava hoje a camara e terminava para elle definitivamente a vida politica e parlamentar. Regressava á sua arte, ao mundo sereno do espirito, da verdade e da belleza, onde não ha nem miserias que causam nauseas nem desillusões que causam odios.

Volvia a essa região chimerica do ideal, que jamais devera ter abandonado, e se partia satisfeito por se ver longe d'este torvelinho diabolico de hypocrisias e de mentiras, levava comtudo no coração angustiado o triste presentimento da agonia proxima e porventura irremediavel do seu paiz.

Que os ultimos vinte e cinco dias haviam sido para elle vinte e cinco annos dó experiencia. Não ha sombra de esperança que resista ao espectaculo vergonhoso que dêmos á Europa n'estas tres semanas. Substituimos repentinamente a tragedia pela força, e o mundo, que nos contemplava, substituiu tambem a admiração sympathica pelo sorriso desdenhoso.

No dia 15 de setembro cercava-se a bandeira nacional para a defender valorosamente do escarro ultrajante do convenio. A Europa fitava-nos, exteriormente impassivel, mas interiormente commovida. De subito, eis que se transforma o mastro da bandeira n'um mastro de cocagne, e todos os partidos politicos se engalfinham uns nos outros com uma furia raivosa e virulenta, para ver qual d'elles arrancaria primeiro lá de cima as sete pastas de ministros, penduradas ao vento por gran-cruzes!

A historia repete-se muitas vezes.

A 18 de outubro de 1817 eram suppliciados em Lisboa os oito martyres da patria, que heroicamente ousaram levantar-se contra o predominio infame do governo inglez em Portugal. A Inglaterra, que viera para libertar-nos, ficava para escravisar-nos. A revolta d'esse punhado sublime de valentes significava, alem do odio santo á Inglaterra, o protesto soberbo contra a vilania obesa de D. João vi, que, perante a invasão da sua patria pelo estrangeiro, fugira ignobilmente para o Brazil com os bolsos atulhados de peças, as ventas entupidas de rapé e a alma obstruida de immundicies!

Gomes Freire foi assassinado, é o verbo proprio, ás nove horas da manha em S. Julião da Barra. Os outros sete condemnados á morte enforcaram-nos depois do meio dia no campo de Sant'Anna, coalhado inteiramente de povo. Aquella immensa e pathetica multidão ía assistir ao supplicio degradante da honra nacional, justiçada pelas mãos sinistras de Beresford, o carrasco inglez.

Previa-se que o povo se levantasse n'um impeto leonino de indignação e desespero, não deixando consummar o monstruosissimo attentado. N'um instante houve effectivamente grande tumulto, chegando a suppor-se que era o principio de motim.

Mas, averiguado o caso, narra um historiador, «que um aguadeiro, soffrego do horrendo espectaculo, caíra do barril a que trepara para ver melhor, e occasionára na queda uma agitação, que, propagando-se de grupo a grupo, fizera suppor que o povo se tumultuára. Prestes terminou, porém, o incidente e as execuções concluiram-se imperturbadas depois das nove horas da noite, com serem lançadas ao mar as cinzas dos martyres da patria».

Hoje, passados setenta annos, repetiu-se a historia. Ha tambem um rei divorciado da nação. O justiçado é o mesmo,- a patria portugueza. O carrasco é o mesmo,-o implacavel inglez. O povo assistiu da mesma fórma ao tragico espectaculo. Da mesma forma se acreditou n'uma sublevação tremenda e vingadora. Da mesma fórma houve ainda dois grandes e clamorosos tumultos. E por ultimo, para completar o simile, se veiu tambem a averiguar que haviam sido, não dois aguadeiros, mas dois ministerios que, caindo de cima dos seus barris, occasionaram na quéda uma agitação, que propagada de grupo em grupo, fizera suppor que o povo se tinha sublevado.

E a execução vae já em moio. Resta apenas agora deixal-a concluir, e que as cinzas de Portugal sejam lançadas pela Inglaterra aos quatros ventos.

Será esse o terrivel e vergonhoso desenlace? Apesar de tudo, apesar de tudo... é possivel que não.

O passado e o futuro de alguns homens que alem estavam sentados n'aquellas cadeiras e alguns bellos periodos da declaração que o honrado presidente do conselho acabava de ler á camara, deixavam-lhe ainda n'este ponto, felizmente, a miragem de uma boa e consoladora esperança.

Mas, se tal succeder, calemo-nos ao menos por uma vez com essa rhetorica vasia, grotesca á força de falsa, de tropos inflammados e patrióticos, com bandeiras das quinas, Lusiadas, convento dos Jeronymos, estatua de Camões, etc., etc.

Então n'esse caso substitua-se a estatua do poeta por uma estatua de banqueiro, e aproveite-se o mosteiro de Belem para n'elle instalar havanezas e mercearias, prostibulos e restauranta, casas de prego e casas de tavolagem.

Se tal succeder, calemo-nos de uma vez para sempre, e não tornemos a fallar na nossa gloria epica, que assombrou o mundo, porque d'essa gloria restará apenas uma carcassa podre de gigante deitada ao sol á beira do oceano, formigando sobre ella, segundo as estatisticas, cerca de uns cinco milhões de vermes, que seremos nós todos!

(O discurso será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando s. exa. tenha revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Manuel de Arriaga: - É tão solemne o momento em que nos achâmos, o caminho que se vae seguir, qualquer que seja a direcção que leve, é tão cheio de responsabilidades, que eu, antes que se dê mais um passo, desejo interrogar o sr. presidente do conselho ou algum outro membro do ministerio, sobre as duvidas, mas duvi-

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das Beiras, que levantaram no meu espirito as declarações agora feitas n'esta casa.

O discurso do nobre presidente do conselho lido perante a representação nacional, não nascido espontaneamente, mas pautado, reflectido e passado a escripto sobre o papel para que ficasse bem gravado na memoria de todos, representa todo o programma do novo governo para resolver a crise excepcional e duplamente difficil a que as situações transactas nos impelliram e arrastaram.

Estando n'este momento o paiz ancioso e o mundo civilisado attento á orientação e linha de conducta que o novo governo vae traçar para resolver os conflictos caseiros e externos que nos creára o ultimatum de 11 de janeiro, as declarações acabadas de fazer n'esta casa assumem um valor e um alcance excepcionaes, para que não inspirem e não provoquem um maduro exame e para que lhes seja permittida a incerteza e vacuidade que desde logo se lhes nota!...

O discurso lido por s. exa. revela por consequencia o plano premeditado do governo para resolver as crises em que nos debatemos e é por isso que vi com espanto e magua que n'elle se mantém o statu quo, que nos cerceia as liberdades publicas, que é tudo o que ha de peior; e que, estando para fechar se o parlamento, se mantém enigmatico sigilo sobre as medidas que vão ser adoptadas e que a salvação publica reclama promptamente, entregando-se assim a opinião desconfiada, legitimamente desconfiada, á elaboração de duvidas e de suspeitas, quando convinha que tudo ficasse aqui esclarecido!

É preciso que lá fora o paiz saiba que n'este subito accordo dos dois lados da camara sobre as anodinas declarações do governo, algumas vozes se levantaram da parte dos seus representantes a exigir do governo explicações que satisfaçam e serenem os animos tão justificadamente sobresaltados.

S. exa. os srs. ministros não só convergiram as suas attenções para as questões de fazenda, e internacional, com exclusão de outras não menos graves que molestam o paiz, mas restringindo-se áquelle dois pontos aliás erriçados de innumeras difficuldades e perigos, nada nos dizem do que vão e esperam fazer!

E é sob este vácuo e é debaixo d'estas incertezas e duvidas que se separam dos chamados representantes da nação!

Parece que os srs. ministros opinaram na sua alta sabedoria que o paiz está muito satisfeito com o que fizeram os seus antecessores em tudo o que não diz respeito á questão ingleza e á questão fazendaria; pois eu que afasto neste momento do meu espirito qualquer idéa partidaria, posso declarar-lhes solemnemente, como interprete da opinião e do sentir unanimes da patria, que urge reparar muito damno que lhe foi feito, reivindicar muitos direitos que foram violados, arrancar muitas barreiras que nos separam, extinguir muitos ódios que nos dividem.

É preciso reconhecer que o caminho percorrido desde 11 de janeiro foi errado, que o tempo foi perdido, e que a situação se acha agora muito peior, bem mais aggravada do que antes de 11 de janeiro! Pois o governo pretende accudir aos males que dilaceram a patria deixando enterrados nos corações todos estes espinhos que nos têem trazido febricitantes ?!...

Pensa o governo em resolver o grave problema com a Inglaterra dividindo-nos no interior com leis odiosas e de excepção e appellando para os favores e complacencias da bossa secular e implacavel inimiga?!!

Acha prudente e politico seguir na esteira do seu antecessor que nos assediou por todos os lados de perigos e vergonhas?!... Quer continuar a manter na desconfiança e na excitação de um povo desesperado esta infeliz nação que já não sabe onde encontrar os filhos de out'rora que lhe deram poderio e renome?!

Se o governo quer tranquillisar o paiz aponte um caminho seguro, traga-lhe uma solida garantia para o que lhe pormette, que não póde ser apenas a lealdade das suas consciencias, porque isso só por si não basta. O paiz precisa de garantias solidas para se tranquillisar e ninguem lh'o deve levar a mal.

A minha opinião, repito, é que o caminho percorrido desde 11 de janeiro foi errado, que o tempo foi perdido, e que o que se fez tem necessariamente de ser desmanchado.

Como quer, pois, o novo governo que o paiz se aquede com as suas declarações de todo o ponto insuficientes?!

O illustre ministro do reino, Candido de nome e Candido de alma, quer que saiamos tranquillos com as suas promessas; mas promessas já hoje não bastam, porque de ha muito sei o que são os programmas ministeriaes. Guardem para si as suas rectas intenções, em que acreditâmos, e dêem ao paiz as obras que d'ellas emanam e de que elle carece. Só isto nos póde satisfazer.

Caíu sobre este malfadado paiz como uma verdadeira calamidade publica o partido que a indignação popular expulsou das cadeiras do poder; deixou como legado á nova situação as malditas medidas por elle promulgadas, em virtude das quaes a liberdade foi coarctada.

Como quer o novo governo unir a familia portugueza para a grande lucta contra a Inglaterra, violando-nos as nossas mais caras liberdades, amordaçando a imprensa, dissolvendo as aggremiações populares, e tornando o direito de reunião e de protesto um verdadeiro ludibrio?!

Se mantem os decretos antigos, como das suas declarações se deduz, não tem o direito em fallar-nos em liberdade, e melhor fôra que nunca nas suas mãos caíssem os sellos do estado.

Se a sua confissão sincera no seu amor ás invocadas instituições liberaes os leva a antepor-se a esses malditos decretos, ainda assim o paiz não fica tranquillo nem satisfeito. Passariamos d'essa maneira a viver da graça regia e não como povo democrático e livre que só acata a justiça e só quer leis onde ella se revele e mantenha.

Prescindimos dos favores, e reclamâmos o que nos foi roubado. Exigimos em nome da justiça e da opinião revoltada que nos dêem ao menos as leis em que viviamos.

Queremos, por consequencia, que o ministerio assuma a responsabilidade indeclinavel de rasgar todos aquelles decretos nascidos da dictadura e voltar á lei antiga, mais sã e mais justa, a unica perante a qual nos poderemos por agora conciliar.

O statu que não é possivel mantel-o. Não busquem, pois, posições equivocas, soluções mysteriosas. Basta do que já está feito. Não confiem no inimigo, confiem em nós. (Riso.) Em nós sim, na patria. Mas quando fallo na patria vejo que mereço o escarneo dos senhores!

Repito, confiem em nós, no paiz, na patria, nos nossos direitos individuaes, na nossa solidaridade, nos nossos sacrificios, nas nossas abnegações, e absolutamente nada no nosso inimigo. Definamos a nossa situação claramente. Se dão mais um passo sem primeiro reformar o que fizeram os seus antecessores e sem restabelecer a liberdade e com ella a conciliação da familia portugueza, estão, como os seus antecessores, igualmente perdidos!

Mas, sr. presidente, o que mais aggrava a situação, já de si tão periclitante, do actual governo, é o erro de se separar n'este momento da representação nacional antes de definir a sua attitude perante a Gran-Bretanha e de obter o seu indispensavel apoio para arcar com as difficuldades que pretende vencer. Não se comprehende e muito menos se póde relevar um tamanho erro politico.

Se não confiam no parlamento, dissolvam-no e busquem outro melhor orientado no pensar e sentir da nação. Sem os representantes d'esta aqui reunidos é que não podem dar um passo que mereça confiança! Pensem bem n'isto.

O que vão fazer e o que esperam alcançar?

Em que factos positivos baseiam as suas esperanças?

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Escusam de nos embalar com palavras vãs e com programmas nascidos apenas da sua boa vontade.

Outros iguaes tenho ouvido e não nos podemos já hoje sugeitar-nos a novos desenganos. Inspirem-se na alma do paiz para não errarem, mas para isto é preciso que se afastem de quanto fizeram os seus antecessores.

Não vão mendigar favores ao inimigo, que alem de inuteis, o paiz não os acceita, por deshonrosos.

Não se dirijam á Inglaterra, que se tornou fatalmente incompativel comnosco, dirijam-se ás potencias signatarias do tratado de Berlim, tratem em nome dos nossos direitos e confundam perante elles no tribunal competente a nação nossa insultadora. Confiem na nossa justiça e na patria, se querem que dentro e fóra do paiz os tomem a serio. Para o conseguirem só têem a meu ver dois meios: desviarem as negociações de Inglaterra aonde não devem voltar, para as potencias signatarias do acto de Berlim, junto das quaes, embora só haja para nós um simulacro de direito, sempre teremos alguma cousa mais do que os ultrages da Inglaterra; e acabarem de vez com as leis de excepção que nos desauctorisam e dividem!

Das declarações solemnes dos srs. ministros nada porém se fica sabendo a tal respeito, e o que disseram é como se de pouco ou nada valesse! Uma outra falta noto eu e de não menos gravidade, o seu não esperado e injustificavel silencio sobre o escandaloso testamento da situação transacta!

O novo governo nascido do grave conflicto aberto entre a opinião publica e o governo que foi por ella escurraçado do poder, parece querer governar com a opinião e disforçar os seus melindres profundamente offendidos com os abusos que á ultima hora se commetteram com os sellos do estado. Reclama imperiosamente o paiz um exemplo de moralidade contra aquelles que se não pejaram de mercadejar em proveito de mesquinhos interesses politicos, com a auctoridade que lhes havia sido arrancada das suas mãos impuras.

Que coherencia, que seriedade politica deve merecer a nova situação ao paiz suspeitoso e irritado, conformando-se, como parece, com similhantes escandalos!

Reclamâmos em nome da moralidade offendida e do respeito devido ás leis e á auctoridade em si, que tudo seja revogado para exemplo presente e vindouro, embora por uma justa ou equitativa revisão, se mantenha d'esse testamento indecoroso tudo o que mereça sel-o, mas feito por quem esteja já investido de auctoridade para o conseguir; o escandalo não está tanto nos actos em si, como nas mãos que os praticaram; o escandalo está principalmente na exploração da sellos do estado por aquelles a quem esses sellos foram arrancados em nome da nação.

Mantendo o novo governo este estado de cousas, como parece, deixou por esse facto de merecer a minha confiança e por isso a minha expectativa é toda de reserva e de desconfiança e lastimo-o porque será tambem a da maioria da nação.

Eu tenho ouvido muitas palavras bonitas das bôcas de outros ministros, mas têem. se ficado em dizel-as; as obras de que carecemos é que ninguem as vê; o mesmo succederá á actual situação, se não mudar desde já de rumo e de processo.

Para combatermos o inimigo poderoso que temos pela frente, e para remediarmos ainda a tempo os erros que havemos commettido, é preciso um plano definido e bem assente no apoio da opinião unanime do paiz.

Deixem-se de habilidades diplomáticas, que aliás não têem e já surgem tarde; abandonem as zumbaias e humilhações perante o inimigo insolente que devidamente as repelle, percam a esperança de desviar a politica colonial ingleza do rumo em que ella vae. O conflicto ante a força bruta e a ambição descomedida da Inglaterra e o nosso indiscutivel direito e reconhecida fraqueza, está aberto n'um periodo que já vae longo; fechem-n'o em nome do direito das gentes, e quanto antes, appellando directamente para as potencias mais fortes, e submettamo-nos depois ás suas decisões boas ou más. O que não for isto será um erro e um perigo mais a juntar a muitos outros.

Appellem para quem representa o direito, mais ou menos, para a conferencia. Discutam ali o conflicto, definam claramente ante elle o nosso direito, a nossa posse, os nossos serviços á civilisação, denunciem-lhe todos os ultrages de que temos sido victimas, porque a nossa contendora conta com a impunidade dos seus abusos, e que decidam pró ou contra nós. Só assim a nação ha de submetter-se.

Ha de submetter-se em nome d'esse congresso, ao seu veredictum, mas nunca ás intimações petulantes d'esse inimigo secular, a Inglaterra, que foi introduzido por nós, dentro da nossa casa e que depois de protegido, e augmentado com os despojos arrancados á nossa incuria, como a vibora danninha, aquecida com o nosso calor, morde-nos no que temos de mais sagrado: no nosso direito, na nossa honra, na nossa dignidade!

O sr. Presidente: - Lembro ao illustre deputado que a hora está muito adiantada e que ha mais srs. deputados inscriptos.

O Orador: - Acceitando a indicação de v. exa. vou terminar, mandando para a mesa uma proposta que passo a ler, e que peço seja tomada na devida consideração, porque n'ella está consubstanciada a unica politica sensata e patriotica do que é mister lançar mão.

(Leu.)

Aqui tem v. exa. a minha proposta. Sobre a primeira parte nada direi porque faço justiça aos membros do novo governo que a não porão em duvida em face das duras lições recebidas pelos seus antecessores. Quanto fizerem no mesmo sentido será alem de vão e nefasto, uma provocação lançada ao paiz e que deve ser a ultima.

Apesar do governo nada dizer sobre a linha de conducta que vae traçar, espero que não se atreverá a antepor-se á opinião do paiz.

Chamo a attenção de todos para a ultima parte da proposta, que é grave e merece ser meditada.

Sem um voto do parlamento os srs. ministros não podem marchar; não podem dar um passo officialmente. É preciso que o parlamento se pronuncie unanimente contra o ultrajoso e iniquo tratado de 20 de agosto, para se encetarem as novas negociações: tudo quanto fizerem ao contrario, será até ridiculo lá fóra. Como se poderá obter isto? Dissolver a camara porque não confiam n'ella? Perfeitamente de accordo. Consultando desde já a opinião do paiz? Perfeitamente de accordo. Esse é o caminho unico que nos póde acreditar junto das outras nações, em vista do desaccordo profundo que se deu entre o parlamento, o governo transacto e a nação.

Ha dentro d'esta casa novos compromissos tomados para ser rejeitado o tratado em homenagem á opinião publica offendida? Prosigam então em caminho seguro; proroguem por mais um dia a sessão parlamentar; porque a rejeição do tratado, é o unico ponto de partida da nossa regeneração futura.

Tenho dito.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (João Chrysostomo): - O illustre deputado que me precedeu no uso da palavra pediu diversas explicações, que não sei se ouvi todas, porque o meu orgão acustico talvez me não permittisse ouvir; creio, porém, que uma das explicações pedidas ao gabinete a que tenho a honra de presidir, é o que tenciona o governo fazer a respeito da dictadura exercida pelos nossos antecessores.

A esse respeito devo observar a s. exa., que hoje, não ha já essa dictadura; ha a lei que a sanccionou; (Apoiados.) portanto, para revogar ou alterar essa lei têem de seguir-se os tramites regulares e ordinarios. (Apoiados.)

Sobre este ponto, pois, não tenho mais nada a dizer.

Perguntou tambem o illustre deputado, quaes as garan-

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tias que trazemos, garantias, em relação, creio eu, ao que o paiz póde esperar de nós.

As garantias que offerecemos é a nossa sinceridade e a nossa conducta passada. E o amor que temos pela liberdade e pelas instituições, amor que temos demonstrado muitas vezes, já no campo da batalha, já fóra d'elle. (Apoiados.- Vozes: - Muito bem, muito bem.)

Se ha alguma pergunta com relação á questão ingleza, o meu illustre collega o sr. Bocage poderá melhor dar explicações do que eu. Nada mais.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente: - Devo lembrar á camara que o mais tarde que posso encerrar a sessão é ás quatro horas e um quarto, por isso que a sessão de encerramento tem de verificar-se n'esta sala ás cinco horas e meia da tarde, e o governo tem ainda de se apresentar na outra camara. Peço, pois, aos srs. deputados, a quem vou conceder a palavra, que restrinjam quanto ser possa as suas considerações, porque ainda ha muitos oradores inscriptos.

O sr. Dantas Baracho: - Sr. presidente, v. exa. e a camara não suppõem de certo que, no uso que vou fazer da palavra que me foi concedida, eu me afaste das declarações feitas pelo sr. João Franco Castello Branco, com respeito ao modo de pensar do partido regenerador ácerca da organisação do actual ministerio.

Como o sr. João Franco Castello Branco, não farei perguntas ao governo, nem relativamente á questão ingleza, nem relativamente á questão financeira, que são aquellas de que trata especialmente a mensagem que o sr. presidente do conselho leu á camara. Como muito bem disse o sr. João Franco, as respostas que provocassem essas perguntas poderiam embaraçar a acção do governo perante o estrangeiro, na solução d'aquellas duas importantissimas questões.

V. exa. e a camara sabem, porém, perfeitamente que, quando se deu o ultimatum de 11 de janeiro, se levantou associadamente com esta questão a questão da defeza nacional, suscitada pela maneira como se manifestou a opinião publica em tão ponderoso assumpto. (Apoiados.)

Satisfazendo a essas indicações, o governo regenerador promulgou, em dictadura, differentes decretos, cuja execução ainda se não tornou effectiva em alguns d'elles.

Foi o não cumprimento d'esses decretos, cujas causas eu agora não apreciarei, que me determinou a pedir a palavra, no intuito de pedir explicações ao governo. Como a camara reconhecerá, trata-se de uma questão da mais alta importancia, mas de caracter perfeitamente interno, não receiando eu, portanto, formular perguntas a este respeito. No caso a que me refiro as respostas do governo só poderão esclarecel-a, sem que d'ellas se possa derivar o menor compromettimento de caracter internacional.

N'estas condições e no interesse do paiz, do exercito e porventura do proprio governo, eu desejava saber se o governo tenciona tornar effectivas as reformas que constam dos decretos de 11 de fevereiro, no que dizem respeito á defeza nacional, e especialmente se tem tenção de adoptar o projecto, e suas respectivas bases, de reorganisação do exercito, affecto e em estudo na commissão superior de guerra.

Eu já disse que não desejava afastar-me, por principio algum, das declarações do sr. João Franco Castello Branco, e por isso mesmo que se, a despeito da indole essencialmente interna da questão militar, o governo entenda que as minhas perguntas podem por qualquer fórma collocal-o em embaraços, eu dispenso-o de me dar resposta, porque não serei eu que virei lançar a nota discordante n'este concerto de benevolencia, em que tomam parte todos os partidos monarchicos, na recepção feita ao ministerio.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (João Chrysostomo): - O illustre deputado pediu explicações ácerca dos decretos relativos á defeza do paiz e á organisação do exercito.

É hoje o primeiro dia em que, póde dizer-se, este governo entra em exercicio de suas funcções, e em vista da declaração que li á camara em nome do gabinete, e n'uma situação em que temos questões de primeira ordem, como é a questão ingleza e a questão fazendaria, é a essas que principalmente havemos de attender. Não quer isto dizer que desde o primeiro dia em que formos ás secretarias a tomar conta dos differentes negocios, não toquemos n'aquelles a que se referiu o illustre deputado, mas é evidente que não podemos por agora precisar nenhuma resposta. Não consultei nenhum dos meus collegas, e similhante assumpto exige um estudo serio, que ainda não fiz, o que me inhibe n'este momento de responder.

Agora devo declarar a v. exa., sr. presidente, e á camara, que terei de retirar-me em breve para fazer a apresentação do gabinete na camara dos dignos pares.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente: - Eu já annunciei á camara que a sessão se encerraria ás quatro horas e um quarto.

O sr. Dias Ferreira: - Sr. presidente, enuncio u o illustre chefe do gabinete uma these de governo, definiram os grandes partidos d'esta terra a sua gloriosa attitude politica em frente da nova administração, e conta o governo com quasi unanimidade dos votos, o que ha treze annos se não via n'esta casa.

Sob o ponto de vista do convencionalismo parlamentar e politico, usado em Portugal n'estes ultimos annos, está tudo muito bem.

Aqui dentro d'esta casa não é preciso mais nada. Por agora os srs. ministros podem estar tranquillos.

Mas o paiz não se resume nos membros das assembléas politicas, que numa situação penosissima se limitam a meros comprimentos. A nação não póde ficar satisfeita com a declaração escripta do sr. presidente do conselho, porque está cansada de prestar a sua confiança a quem, em vez de remover as difficuldades chronicas da nossa administração, tem os nossos interesses em constante sobresalto, e isto sem fazer reparo agora, porque as circumstancias o não permittem, sobre a redacção da declaração escripta pelo que respeita á questão ingleza.

O governo carecia de dizer ao paiz o seu pensamento sobre alguns assumptos palpitantes da actualidade, sem comtudo deixar de manter as reservas que julgar necessarias no interesse do estado. O governo não póde pretender para si um voto cego de confiança nacional; nem o paiz dá esse voto com a facilidade com que o dão as côrtes.

A memoria escripta do sr. presidente do conselho segue o typo dos programmas dos governos, que nos ultimos annos têem occupado aquellas cadeiras, porque ainda aqui se não apresentou nenhum, que promettesse esbanjamentos e immoralidades.

Sei que a situação do governo é diificil, e não tenho o menor desejo de lha aggravar.

Mas tenho primeiro que tudo de cumprir o meu dever de representante do povo, e no cumprimento d'esse stricto dever vejo-me forçado a declarar que o ministerio não foi organisado nas condicções reclamadas pela situação grave do paiz, nem de conformidade com os bons principios constitucionaes.

O paiz, na situação dolorosa que atravessa, precisava de um ministerio homogeneo para resolver as questões que nos trazem em sobresalto, que não podem ser resolvidas por ministerios chamados de conciliação, destinados a uma vida ephemera, e sem resultados valiosos para a causa publica.

Alem d'isso, sobre a organisação do ministerio foi ouvido o conselho d'estado, e não foi precisamente o conselho d'estado quem derrubou o gabinete dimissionario.

O ultimo ministerio baqueou diante de um movimento nacional, franca e claramente pronunciado. Era pois sobre

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o movimento nacional que devia formar-se o ministerio, e não sobre o voto do conselho d'estado.

Era necessario dar satisfação completa á vontade popular, que parece accordar para se occupar dos seus interesses, com o que eu muito folguei.

Repito hoje o que tantas vezes tenho dito n'este logar.

Se a nação não tomar uma attitude energica, que se imponha aos poderes do estado, e os obrigue a inclinar a cabeça diante da sua vontade soberana, grandes desastres nos esperam, e para muito breve.

Uma larga e dolorosa experiencia deve ter convencido o paiz de que será fatalmente victima, se deixar correr á revelia os seus destinos.

Os que fazem profissão da governança não podem dar-lhe mais do que lhe têem dado.

O sr. Presidente - Tenho a dizer a v. exa. que o governo tem de se apresentar da outra camara, e tem de se arranjar a sala.

O Orador: - Obedeço a v. exa.

Vozes: - Falle, falle.

O Orador: - São difficeis e gravissimas as circumstancias em que nos achamos. Assim o tenho dito ha largos annos n'esta casa. São precisos remedios energicos e esforços heroicos para accudir á situação difficil era que collocaram o paiz.

Mas esta situação nada tem de extraordinario.

As angustias e afflições do paiz não são um incidente da vida nacional, são a conclusão forçada e inevitavel dos processos administrativos dos nossos governantes.

O paiz não rompeu agora em calorosas manifestações só por via do tratado com Inglaterra. Doe-lhe tanto, e talvez mais que a chamada questão ingleza, a medonha situação financeira que os governos lhe prepararam.

Dos perigos que ameaçam o thesouro a culpa é exclusivamente dos governos, e para o estado agudo em que se encontra a questão ingleza contribuiram elles tambem muito e muito.

Quando se levantou a questão de Portugal com Inglaterra, que deu logar ao ultimatum de 11 de janeiro, e ao convénio de 20 de agosto? Em agosto de 1887!! (Apoiados.)

O governo inglez póde ser accusado de ter offendido os nossos direitos aos territorios africanos, e de não ter respeitado as relações de velha alliança entre os dois povos, nem as susceptibilidades e os brios do povo portuguez; mas não póde ser accusado de tergiversações na questão fundamental das nossas contendas, porque o governo inglez precisou, logo no principio, em termos bem frisantes a questão, declarando terminantemente, que não nos reconhecia direito a territorios em que não tivessemos occupação effectiva, e definiu logo as condições da occupação. N'este terreno se conservou sempre.

Não nos deu a mais leve esperança, nem de mudar a sua opinião ácerca do nosso direito de occupação em territorios africanos, nem de deixar de fazer vingar, ainda pela força, a sua jurisprudencia internacional.

Que fizeram os governos de Portugal durante este longo periodo, em que estiveram sempre pendentes sobre a nossa cabeça as ameaças inglezas?

Gastaram o tempo, primeiro em trocar correspondencias, em grande parte impertinentes, e depois em negociar um tratado entre o fraco e o forte, talvez na esperança de que não seria este o que teria de dictar as condições do contrato!

O estado da questão ingleza representa pois para nós, n'este momento, uma conclusão, resultante de abuso de força por um lado, e de infelicidade dos nossos estadistas pelo outro!

Com a fazenda publica succede o mesmo.

As circumstancias da fazenda publica são difficeis, mas difficeis hoje, como já o eram ha um mez, ou ha um anno.

A situação do thesouro é cada vez mais penosa por culpa unica e exclusiva dos governos.

Pois não vimos, ainda ha poucos mezes, durante a discussão do projecto dos addicionaes, que representava para assim dizer um imposto de guerra, desfilarem por diante da votação compacta do parlamento providencias de augmento de despeza, algumas de utilidade contestavel, e todas de necessidade adiavel, como a construcção do cabo submarino para os Açores, o monstruoso subsidio á mala real, a aposentação dos parochos, e até o caminho de ferro de Mossamedes, quando o governo se estava compromettendo á construcção do caminho de ferro de Pungue?

Pois augmentar successiva a invariavelmente a despeza publica, quando o contribuinte não quer nem póde pagar mais, não é preparar sciente ou insolentemente a banca-rota?

Mas o peior, o que tira ao povo todas as esperanças de melhores dias, é que não toma conta do poder senão quem administra assim!

Não pensam os governos e parlamentos durante largos annos senão em augmentar desordenadamente os encargos do thesouro, e depois dão-se por admirados de serem graves as circumstancias da fazenda publica!

É evidente que nos achámos n'uma situação grave e violenta. Mas esta situação nada tem de extraordinario, nem de surprehendente.

Pelo contrario é o resultado inevitavel e fatal dos governos se preoccuparem só com empregos e com eleições, e de gastarem desordenadamente para constituirem artificialmente partidos, e se manterem longamente no poder.

Mas não quero concluir sem completar o meu pensamento sobre a illegalidade com que foi ouvido o conselho d'estado sobre a organisação do novo ministerio, que aliás devia ser feita sobre as impressões do movimento nacional.

Annunciou toda a imprensa, sem protesto em contrario, que fôra convocado o conselho d'estado para o palacio da Pena a fim de ser ouvido sobre a constituição do novo governo.

Nos termos do artigo 110.° da carta o conselho d'estado é ouvido sobre todos os negocios graves e medidas geraes de publica administração, e em todas as occasiões em que o Rei se proponha exercer qualquer das attribuições do poder moderador, indicadas no artigo 74.°, á excepção do § 5.°; e este § 5.° refere-se á livre nomeação e demissão dos ministros d'estado.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (João Chrysostomo): - Peço licença para rectificar um facto. Eu sou membro do conselho d'estado, e posso affirmar que esta corporação não se reuniu para tratar de constituir governo; reuniu-se, é verdade, nos termos da lei, mas para a approvação de propostas de lei, votadas pelo parlamento. (Apoiados.)

O Orador: - Registo a declaração do sr. presidente do conselho, aliás contraria ás declarações de todos os jornaes...

Vozes: - O que importam os jornaes!

O Orador: - Desde que a imprensa toda affirmava que o conselho distado se reunira para ser ouvido sobre a crise ministerial, e o facto era destituido de fundamento, deviam todos os interessados, no numero dos quaes incluo o sr. presidente do conselho, apressar-se a desmentir uma noticia, que accusava a violação do um artigo fundamental da carta.

Deixando por agora este incidente, que a estreiteza do tempo me não deixa seguir, vou terminar com algumas perguntas aos srs. ministros, a que s. exas. responderão, como o interesse do estado lhes aconselhar.

Primeiro:

Está o governo resolvido a usar da auctorisação, que lhe confere uma lei recente, para conceder á mala real réis 500:000$000 de subsidio sem concurso, em vez de réis 98:000$000, que com ella ajustára em concurso?

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O uso d'esta auctorisação aggravaria a nossa situação, já tão penosa e angustiosa, porque ia logo empenhar a nação em mais 6:000 contos de réis a favor de uma empreza particular.

Segundo.

Está tambem o governo resolvido a usar da auctorisação, que tem por lei, para dar de arrematação por dezeseis annos, sem possibilidade de remissão por parte do estado, a receita mais importante do nosso orçamento, a receita do tabaco?

Este assumpto prende fundamentalmente com a nossa situação financeira.

Terceiro.

Tem o governo opinião assente sobre uma questão para nós da mais alta importancia, que é a questão, pendente em juizo, do já por tantos titulos celebre caminho de ferro de Lourenço Marques?

Começou o governo portuguez por dar preferencia á construcção de um caminho, que directamente só aproveitava a hollandezes e a inglezes, e por tal fórma se houve depois nas relações com os concessionarios e seus adherentes, que se collocou na tristissima posição de se sujeitar a uma arbitragem internacional n'uma questão, que não tem essa natureza, em que os interessados nos pedem cerca do 8:000 contos de réis.

Não liquidará de certo o tribunal os seus direitos em tão exorbitante som ma, mas em todo o caso está sub judice áquelle extraordidario pedido.

Adoptou o governo ou pensa em adoptar algumas providencias para a defeza e sustentação dos nossos direitos perante o tribunal competente?

Quarto.

Tenciona o governo usar da auctorisação para a construcção do caminho de ferro de Mossamedes que, com os mesmos governos á frente dos negocios, ha de produzir complicações iguaes ás do caminho de ferro de Lourenço Marques, que é em todo o caso um caminho de ferro sem movimento, para ser construido n'uma situação angustiosa da fazenda publica, e que era votado nas côrtes ao mesmo tempo que se contrahia com a Inglaterra a obrigação de construir o caminho de ferro de Pungue?

Quinto.

Quer o governo manter a reforma da escola do exercito, feita em pleno regimen testamentario, com grande augmento de despeza para o thesouro, que levantou contra si o parecer de todos os homens competentes, e irritou profundamente a opinião?

Sexto.

Tenciona o governo manter as vinte e oito ou trinta comarcas, creadas tumultuariamente sem se attender a que nalguns concelhos nem pessoal sufficiente haverá para compor a lista dos jurados, e a que em quasi todas fica em grave perigo a administração da justiça criminal, por não ser facil em circumscripções tão pequenas obter jury á altura da sua elevada missão?

Sr. presidente, a urgencia do tempo e a benevolencia de v. exa. e da camara, obrigam-me a pôr ponto nas minhas considerações.

O sr. Ministro da Marinha (Antonio Ennes): - Em resposta ao illustre deputado sobre os assumptos que directamente prendem com a minha pasta, tenho a dizer que o governo não usará da auctorisação relativa á navegação para a Africa, embora se julgue obrigado a dar, por uma fórma legal e equitativa, auxilio aos capitães nacionaes envolvidos na empreza da mala real.

Relativamente ao caminho de ferro de Mossamedes e cabo submarino para os Açores, o governo não tomou deliberação alguma.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente: - A sessão de encerramento das cortes geraes é ás cinco horas e meia.

Está encerrada a sessão.

Eram quatro horas e meio da tarde.

O redactor = Lopes Vieira.

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