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N.º 15. SESSÃO DE 20 DE JUNHO. 1853.

PRESIDENCIA DO SR. SILVA SANCHES.

Chamada: — Presentes os srs. deputados.

Abertura: — Ao meio dia e um quarto.

Acta: — Approvada.

O sr. Rebello de Carvalho (Secretario): — Como a camara resolveu, com o fim de economisar tempo, que a mesa désse destino ao expediente, sobre que não tivesse de haver votação, a mesa de hoje em diante seguirá esta pratica, já seguida na sessão passada, isto é, dará destino á correspondencia e mais expediente, e fará publicar o extracto no Diario do Governo, no logar competente, onde os illustres deputados poderão vêr o destino que a mesa dá á correspondencia. Com o mesmo fim de economisar tempo, se os illustres deputados que tenham a apresentar requerimentos, representações, ou mesmo pareceres de commissões, os quizerem mandar para a mesa, sem para isso pedirem a palavra, dar-se-lhes-ha tambem o devido destino. (Apoiados)

CORRESPONDENCIA.

Declarações: 1.ª — Do sr. Rivara, participando que fallou á sessão passada por motivo de molestia. Inteirada.

2.ª Do sr. Ferreira de Castro, participando que o sr. Bivar não póde comparecer á sessão de hoje por justo impedimento. — Inteirada.

3.ª Do sr. Sampaio participando que o sr. Cazal

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Ribeiro não póde assistir á sessão de hoje. — inteirada.

4.º Do sr. Aristides participando que o sr. Gomes Lima não póde comparecer á sessão de hoje por motivos imperiosos. — Inteirada.

5.º Do sr. Bordallo participando que o sr. Fonseca Castello Branco não comparece á sessão de hoje, nem talvez a mais algumas, por incommodo da saude.

Officios: 1.º — Do sr. Affonso Botelho, participando que não póde assistir á sessão de hoje. — Inteirada.

2.º Do ministerio do reino, acompanhando os papeis relativos ao estabelecimento das cadeiras de filosofia, dogma e moral, instituidas no extincto convenio da 3.ª ordem da Penitencia, na villa de Almodovar, pelo padre fr. José de Santo Antonio Moura; satisfazendo assim ao que lhe foi pedido por esta camara. — Para a Secretaria:

SEGUNDAS LEITURAS.

Projecto de lei (n.º 53 A) — Senhores: — A applicação dos principios geraes da sciencia economica a tudo, e em todas as circumstancias, é um caracteristico, um privilegio, ou uma mania da época em que vivemos; no entanto essa estimavel sciencia, que tanta influencia tem exercido nos grandes acontecimentos da época actual, é uma grande regra geral sujeita a grandissimos excepções.

A palavra — vinho — designa tão grande variedade de qualidades, em cujo merecimento e valor influem causas tão differentes, que eu estou persuadido que esta questão, tão interessante á riqueza nacional, não póde ser tractada debaixo de outro principio geral, que não seja o seguinte:

A differença de merecimento, e valor dos vinhos existe na differença das qualidades.

Lastimo que uma especie de mania, que nos faz preferir tudo quanto é estrangeiro, nos tenha feito desconhecer o privilegio que a natureza concedeu ao nosso solo abençoado, dando-nos, em todas as nossas provincias, grande variedade de vinhos superiores finissimos, que deixamos desconhecidos, em quanto fazemos esforços para imitar aquelles que os estrangeiros preparam, pela maior parte, por meio de operações chimicas.

A questão dos vinhos do Douro é uma grande questão economica, que deve ser considerada debaixo de dois grandes pontos de vista.

Como um grande interesse nacional, porque o seu valor se diffunde por todo o paiz; e anima todas as industrias, especialmente das provincias limitrofes.

Como interesse local, por que mais de 5:000 familias tem enterrado o trabalho de quatro gerações, em aridas montanhas, de que tem feito um manancial de verdadeira riqueza publica, á custa de sacrificios incriveis áquem não conhece particularmente as escabrosas margens do Douro.

O grande interesse nacional não consiste em sacrificar a agricultura do Douro aos principios geraes da sciencia economica, para fazer daquelle rico producto parte integrante de, um commercio geral de vinhos, mas sim em prometer o desenvolvimento das qualidades hygienicas, tónicas, e agradaveis ao paladar, com que a natureza os dotou, e fazer que cheguem aos mercados estrangeiros, puros e insuspeitos aos consumidores; fins que se não podem alcançar sem leis que os protejam contra a tendencia geral, e o interesse que ha nas misturas que aquelles vinhos podem soffrer pela superioridade da sua qualidade, que no entanto diminue com ellas, e com a sua diminuição soffre o interesse geral da nação, que exista na superioridade da qualidade, mais que na quantidade daquelles vinhos.

Os cultivadores dos vinhos do Douro tem reconcentrado todos os seus meios de existencia em um só producto; porque o paiz que habitam, não produz mais nada do que vinho; cuja cultura lhes custa, pelo menos, duas terças partes mais, que qualquer outra do mesmo genero, com o seu valor pagam ás industrias das outras provincias, quanto lhes é necessario para a vida, para sustento da qual tudo compram a dinheiro.

O interesse, ou a necessidade dos habitantes do Douro consiste em que os seus vinhos sustentem um preço que lhes cubra o que gastam com elles, e lhes dê com que comprar ás outras provincias, o que lhes é indispensavel para a vida.

A conservação de um preço razoavel aos vinhos de exportação é o eixo em que deve girar todo o systema de protecção ao commercio e lavoura do Douro, mas esse preço deve ser calculado de modo que nem por excessivo difficulte o commercio, nem por baixo maio a lavoura, faça do cultivador um escravo do commerciante.

Na especialidade desta questão tenho como axioma que — a protecção de todos os vinhos do Douro, de todas as suas aguas-ardentes, das aguas-ardentes das outras provincias, e de tudo que tem relação com o commercio destes vinhos, existe na protecção dos vinhos superiores do Douro.

O decreto de 11 de outubro de 1852, retirando á companhia o subsidio de 150 contos, privou o Douro de um soccorro efficaz, a que tinha um direito incontestavel.

Os lavradores do Douro, que devem ser iguaes em direitos e deveres aos lavradores das outras provincias, tem comprado por 12 a 15$000 réis em pipa, o direito de exportar para a Europa os seus vinhos, que os lavradores das outras provincias tem gosado, e estão gosando de graça, ou pagando um direito de saída insignificante; e aquelles desgraçados povos, tão portuguezes como os outros, tem pago os mesmos tributos que pagam todos os outros, e além delles uma somma a maior de 300 a 400 contos de réis annuaes!...

A lei de 21 de abril de 1843 separando, daquella somma, a quantia de 150 contos de réis annuaes, para acudir á imminente ruina que trouxe aquelle paiz a liberdade commercial, não concedeu favor algum aos seus habitantes, fez que fosse menor a injustiça que sobre elles pezava á tantos annos, de serem obrigados a contribuir para as despezas do estado com um tribulo differencial tão exorbitante.

Não me compele discutir o direito com que foi dado, ou tirado á companhia aquelle subsidio, mas obriga-me a imparcialidade com que desejo cumprir os meus deveres, a rectificar algumas idéas, que se tem espalhado sobre este objecto, que não julgo exactas.

O soccorro que a lei de 21 de abril quiz dar á lavoura do Douro, consistia em fazer elevar o preço dos seus Vinhos de segunda e terceira qualidade, que tinham caído n'um excessivo barateio, obrigando a

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Companhia a comprar vinte mil pipos desses vinho, pelo preço de 11$000 a 15$000 réis em pipa; e confiando-lhe a direcção de um systema de restricções calculado para curar a espantosa obstrucção commercial, que produziu o systema de liberdade, ou anarchia commercial, em que esteve aquelle commercio desde 1831- até á publicação daquella lei. Foram estas as obrigações que o contracto solemnisado á face da lei de 21 de abril impoz á companhia.

E certo que a lei errou applicando os seus soccorros aos vinhos ordinarios, mas o erro estava na lei, não havia direito a exigir da companhia, se não que cumprisse as deveres a que a ligavam os seus contractos.

Todas as arguições que se lhe fizeram, podem ser feitas, pelo interesse particular, pelas paixões, ou mesmo pelo desejo leal de uma melhor applicação do subsidio dos 150 contos que se tiravam dos direitos differenciaes que pagava o Douro, mas não pela justiça, a qual deve reconhecer que a companhia cumpriu o seu dever, comprando annualmente vinte mil pipas no Douro, alguns annos por maior preço do que a lei lhe marcou; e só a cegueira das paixões poderá dizer que a compra dessas vinte mil pipas não fosse uma muito valiosa protecção para o Domo, nem tão pouco que os 150 contos de réis que a lei destinou ao soccorro da lavoura, não lhe eram effectivamente applicados: 150 contos repartidos por vinte mil dão 7$500 réis por cada pipa, a compra era feita pelo termo medio de 13$000 réis por pipa, o que junto ao valor dos carretos e outras despezas, que essa compra chamava ao paiz, fazia entrar no Domo, por esse canal, não só os 150, mas 260 a 300 contos de réis annualmente.

A circumstancia de dar o governo á companhia 150 contos não diminuia o beneficio que a compra fazia ao Douro, porque ao vendedor não interessa saber como o comprador junta o dinheiro com que lhe paga; e a companhia pagou sempre pontualmente.

Tambem se não póde dizer que o systema de restricções que pezou exclusivamente sobre os lavradores, não produzisse um grande beneficio ao commercio.

Quando se installou novamente a companhia, os depositos de vinhos de exportação eram exorbitantes; no Porto, Villa-Nova, e Douro existiam habilitados para exportação pouco menos de duzentas mil pipas. Em Inglaterra quarenta mil.

Em 1850 para 1852 chegaram os depositos de vinhos de exportação a não exceder a setenta mil pipas, ou á proporção necessaria para a regularidade de exportação.

Por esta exposição, pódem os imparciaes julgar dos effeitos da lei, sobre o excessivo deposito que ameaçava anniquillar o commercio dos vinhos do Douro.

Apesar dos resultados que produziu o systema de restricções, é certo que ellas se não podiam sustentar pelos mesmos meios, nem para os mesmos fins para que foram creadas, e uma alteração no systema commercial do Douro era indispensavel depois que se igualaram em Inglaterra os direitos de entrada de todos os vinhos, que alli se revogou o acto de navegação, e principalmente depois que as casas expoliadoras guiaram vinhos debaixo das suas marcas, pela navegação indirecta; desde esse momento era indispensavel um novo systema.

As constantes reclamações inglezas tambem não podiam deixar de ser tomadas em consideração.

O decreto de 11 de outubro salvou o decoro nacional, na parte politica da questão; concedeu ao commercio sufficientes garantias, e reconheceu o principio restrictivo de que depende a existencia do commercio dos vinhos superiores do Douro.

No entanto os artigos 1.º e 5.º quasi annullaram esse principio. O systema do corte quantitativo que estabelece deixa em vigor o absurdo systema do commercio dos papeis, e a falla de um corpo entremedio, entre o commercio e a lavoura; ou de algumas providencias que a protejam, entregou os lavradores a discrição do commercio, sem apoio nem protecção.

É preciso, portanto, evitar os inconvenientes, que desde já se conhecem no systema que creou aquelle decreto; e é forçoso não perder esta occasião em que os depositos estão em proporção com a expoliação, para ampliar no novo systema o principio de razoavel liberdade, o que não será possivel, logo que uma colheita abundante e boa elevar os depositos de exportação ao ponto a que a falsa doutrina dos artigos 4.º e 5 os deixa chegar.

Convem evitar o inconveniente de apparecer nos arrolamentos dos vinhos do Douro uma cifra de producção exaggerada, que, nos paizes estrangeiros, dê idéa falsa da quantidade do vinho que ha annualmente no Douro susceptivel de exportação

Convém que uma feira promova a venda dos vinhos do Douro dentro de certo tempo, em que os lavradores necessitem de ter dinheiro apurado para costearem as despezas de sua agricultura na occasião conveniente.

E preciso acabar o commercio de papeis, e determinar a quantidade do vinho habilitado para a exportação de cada novidade, sem dependencia do governo; e para isso se poder conseguir sem arruinar a lavoura, e comprometter o commercio.

Convém promover um justo equilibrio entre a producção e o consumo, por meio da reducção effectiva a agoa-ardente de todo o vinho de exportação, que sobrar das leiras; e para essa reducção não arruinar os lavradores, que não acharem outro meio de consumo immediato para os seus vinhos de exportação, senão a reducção a agoa-ardente.

E preciso que seja elevado o preço dessa agoa-ardente á proporção de poder o vinho reduzido pagar no cultivador o preço que elle lhe custou, e deixar-lhe alguma cousa para a subsistencia de sua familia.

E como a amortisação dos vinhos que superabundam no mercado, feita por um preço que não arruine o productor, é o eixo sobre que deve girar todo o systema de protecção, justa e efficaz, a lavoura, e ao commercio; e como por meio dessa reducção se podem conceder ao commercio prerogativas e favores da maior importancia, que sem ella se lhe não poderiam dar sem risco de escravisar, e perder a lavoura.

É justo que o commercio faça o pequeno sacrificio de comprar alguns almudes dessa agoa-ardente por preço um pouco maior, do que aquelle por que ha de comprar o resto da que gastar no tractamento dos seus vinhos, sacrificio que amplamente compensa a regularidade que a reducção traz ao mercado,

É porém forçoso que todo o systema, que se applique á protecção do Douro, seja fundado na mais

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ampla liberdade, compativel com Os interesses reciprocos da lavoura e do commercio; debaixo desta convicção tenho a honra de propôr o seguinte

Projecto de lei. — Artigo 1.º O decreto do 11 de outubro de 1852 é ampliado e declarado pela fórma seguinte:

Art. 2.º Para os effeitos da presente, lei são restabelecidas as duas demarcações de Feitoria e lin me, como se achavam em 1819.

Art. 3.º Os arrolamentos dos vinhos o geropigas do Douro serão feitos por demarcações, e a cifra das quantidades arrolados nas duas demarcações, serão sempre publicadas separadamente.

Art. 4.º Os vinhos e geropigas do Douro continuarão a ser provados por um jury qualificador.

§ 1.º As provas serão feitas nas assentadas que se julgar conveniente, por demarcações separadamente, principiando pela de feitoria.

§ 2.º Findas que sejam as provas, a commissão reguladora mandata distribuir bilhetes de qualificação na fórma que actualmente se practica, pela totalidade dos vinhos qualificados sem dependencia de qualquer outra formalidade.

§ 3.º A qualificação dos vinhos approvados para exportação não é representada commercialmente por estes bilhetes, mas sim pelo extracto do manifesto de compra, a que elles servirão de documento.

Art. 5.º Será estabelecida na Regoa uma feira com tempo limitado.

§ 1.º Por meio das operações dessa feira, e dos manifestos dos vinhos que nella se comprarem, serão ratificadas as qualificações dos vinhos, e determinada a quantidade de vinho exportavel da referida novidade, independentemente de intervenção do governo.

2.º A commissão reguladora fará annunciar por editaes o dia da abertura da feira, que nunca excederá ao dia 15 de fevereiro de cada anno.

Art. 6.º As casas ou corporações exportadoras, que tiverem armazem manifestado na alfandega, e um deposito de vinho de expoliação, ao menos de 300 pipas, e que no anno antecedente tivessem exportado mais de 100 pipas, lerão o direito de escolher nas duas demarcações, e farão as suas compras dos vinhos qualificados para exportação, nos 3 primeiros dias immediatos ao da abertura da feira, e nenhum vinho comprado antes desta escolha poderá ser guiado para expoliação.

§ 1.º Nos dias 4 o 5 da feira, farão essas casas ou corporações, os manifestos dos vinhos que tiverem comprado, documentados com os bilhetes de qualificação, e no dia 5 ao sol posto se lançará no livro dos manifestos um termo de encerramento da primeira feira, depois do qual, essas casas não poderão habilitar mais vinho para exportação.

§ 2.º As casas exportadoras de menos de 100 pipas de vinho, que tiverem armazem manifestado na alfandega, e um deposito de vinhos habilitados para expoliação pelo menos de 150 pipas, bem como os especuladores, que igualmente tiverem armazem habilitado na alfandega, e um igual deposito de vinhos para expoliação, comprarão da mesma fórma nas duas demarcações os vinhos qualificados para exportação, que quizerem, que manifestarão nos dias 9 e 10.

3.º No dia 10 se fará o encerramento desta feira, com as mesmas formalidades da 1.ª, depois do qual ninguem podera habilitar mais vinhos para exportação; a não serem os lavradores seus proprios donos.

$ 4.º O negociante, que ao tempo da publicação da presente lei, não tiver o armazem o deposito que ella exíge para gosar do direito de habilitar os seus vinhos para exportação, só o poderá alcançar comprando nas feiras do Douro a quantidade de vinho exportaveis, que a mesma lei exige como condição de habilitação.

5.º Os lavradores que quizerem conservar nos seus vinhos que não venderem, a qualificação que alcançaram nas provas os manifestarão com as mesmas solemnidades nos dias 11 e 12 da abertura da feira.

Pelo acto do manifesto desistem os lavradores do direito de entrarem os seus vinhos manifestados na compra para a amortisação dos vinhos exportaveis.

Obrigam-se a comprar, dentro de 1 mez, a agoardente que a lei determinar, como condição de qualificação.

A não vencer aquelles vinhos senão para os. destinos das suas qualificações dentro de 1 anno, findo o qual os poderão pôr novamente na feira para os vender, ou offerecer para a amortisação, para a qual serão recebidos, não estando defeituosos, e paga a agoardente delles extraída pelo preço da feira em que foram qualificados.

§ 6.º Findos os manifestos dos lavradores, será encerrado o livro com um termo, em que se declare por extenso o numero de manifestos que nelle se lançaram; a quantidade manifestada; e essa quantidade é a que fica habilitada para a exportação da respectiva novidade, que não poderá ser augmentada por pretexto algum.

§ 7.º Os vinhos qualificados exportaveis, ruja qualificação não fôr ratificada pelos manifestos, e operações da feira, e conseguintemente sobrarem da quantidade habilitada para a exportação da respectiva novidade, serão amortisados, e pagos pelo seu producto em agoardente a preço de 150$000 réis a pipa de nove e meio gráos do ariometro de Tessa, sendo todas as despezas até á saída da fabrica de conta do lavrador.

§ 8.º Nos annos de esterilidade de vinhos poderá o preço da agoardente extraída desta amortisação ser augmentado pelo governo, sob proposta da commissão reguladora, ouvidas as associações de lavoura o commercio, mas nunca poderá ser diminuido.

Art. 7.º Os manifestos serão feitos com a maior solemnidade em acto publico, presidido por um membro da commissão reguladora, lançados por ordem numerica em um livro fornecido e legalisado pela commissão reguladora, com termo de abertura, numeração e rubrica de folhas.

§ 1.º A commissão publicará um modêlo de relações impressas com os dizeres necessarios para tornarem facil, e bem intelligivel a escripturação dos vinhos que nellas se incluirem.

§ 2.º Os manifestantes apresentarão relação em duplicado dos vinhos comprados nas differentes freguezias, documentada com Os bilhetes de qualificação, o assignada pelos chefes das casas, ou por pessoa anelo, risada com procuração especial.

§ 3.º A face dessas relações mandará o presidente lavrar o termo de manifesto, declarando por extenso quanto se contém nas referidas relações, com a maior clareza e legalidade, cujos termos serão assignados pelo manifestante, o escripturario da commissão, e rubricados pelo presidente.

§ 4.º Destes termos se lançara cópia exacta na re-

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lnção em duplicado, e uma será entregue ao manifestante, e outra ficará na secretaria da commissão na Regoa, juntamente com os bilhetes de qualificação e procuração que os legalisar.

§ 5.º As relações assim legalisadas são o titulo de qualificação dos vinhos que nella se contém: não são negociaveis, e só á face delles se passará guia aos vinhos nellas qualificados, á proporção que se forem carregando.

Art. 8.º Todos os vinhos, geropigas, ou aguardentes que descerem pelo Douro para a cidade do Porto, deverão ser guiados na Regoa.

§ 1.º As guias dos vinhos de exportação deverão ser passadas á face das relações dos manifestos, e de um attestado da compra da aguardente que a lei mandar fazer como condição de qualificação.

§ 2.º Um artigo regulamentar determinará o modo e as condições com que se deverão passar as guias, bom como o regulamento que deve impôr-se aos arraes que conduzem para o Porto os vinhos de exportação.

Art. 9.º O governo poderá alterar a organisação, attribuições, e vencimentos da commissão reguladora, como julgar conveniente ao serviço de que é encarregada.

Art. 10.º Os regulamentos que tem de fazer-se em observancia do artigo 12.º do decreto deli de outubro, comprehenderão os necessarios para a execução da presente lei.

Art. 11.º Ficam por este modo substituidos os artigos 4.º e 5.º do primeiro decreto de 11 de outubro de 1852. É revogada toda a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos deputados, 25 de maio de 1853. — O deputado por Villa-Real, Affonso Botelho de Sampayo e Sousa.

Sendo admittido, foi enviado á commissão dos vinhos, devendo tambem publicar-se no Diario do Governo.

Projecto de lei (n.º 53 B.) — Senhores: O povo do Douro tem sido ha muitos annos victima de uma grande injustiça; elle tem comprado por 12, 15, e 20$000 réis em pipa o direito de exportarem os seus vinhos, que os outros portuguezes tem gosado, pagando unicamente um direito de 100 até 500 réis em pipa; e desde a instituição da companhia em 1755 até agora tem pago para as despezas do estado, pelo calculo menor que póde fazer-se, 100 milhões de cruzados mais do que os povos das outras provincias!

Os povos do Douro, que vivem no paiz que produz os vinhos superiores, cultivam um terreno escabroso, esteril a tudo que não é avinha, e soffrem um clima inhospito, aonde não vegeta uma folha de qualquer legume nos mezes de verão, em que são privados de todos os gosos que um paiz temperado offerece aos seus habitantes; e povos ha que até vão buscar a agoa que bebem, a grandes distancias das suas habitações; estes corajosos cultivadores são uns escravos das provincias limítrofes, a quem compram tudo que lhes é necessario para a vida; o pão, legumes, e hortaliça, de que se alimentam; as lãs, e linhos de que se vestem, tudo compram, e tudo tiram dos vinhos que grangeam á custa de incriveis sacrificios, e por um preço duas terças partes mais caro que as mais caras culturas do mesmo genero, e ainda lhes pagam os braços que essas provincias não podem sustentar, e que elles occupam nos seus grangeios desde setembro até junho.

Estes desgraçados povos, que nada podem trocar com os outros povos, porque nada têem, o de tudo carecem, têem todos os seus meios de existencia reconcentrados em um só producto — o vinho —, cuja producção é sujeita a mil eventualidades, e dependente de mil circumstancias que influem no seu valor.

Este rapido, mas verdadeiro esboço fará sentir até aos menos conhecedores daquelles povos a dependencia que elles têem de uma protecção efficaz, e o direito com que a pedem.

Os direitos differenciaes que têem pago aquelles povos ha 100 annos, injustos na origem, mas razoaveis nos fins, porque em quanto uma pipa de vinho pagar em Inglaterra 33 libras por direitos de entrada, nenhuma, ou pequena differença fará na exportação o, comparativamente, pequeno tributo que pagam por saída; se esses direitos em vez de entrarem I no thesouro, para o qual todos os portuguezes devem ser collectados igualmente, fossem applicados á conservação, e aperfeiçoamento daquella agricultura, ás suas estradas, e á sua navegação; e se além disso se lhes concedesse o mesmo privilegio de que tem gosado os habitantes da ilha da Madeira, a quem a cai la de lei de 2 de agosto de 1822 concedeu uma prohibição de entrada na ilha de aguardentes estrangeiras, e impoz ás nacionaes, que não forem da producção da ilha, o direito, quasi, prohibitivo de 60$000 réis em pipa, o que equivale á applicação do justo principio de que os lavradores daquella ilha não sejam obrigados a empregar nos beneficios dos seus vinhos aguardentes estranhas, em quanto as poderem timidos vinhos da sua propria colheita, principio que com justiça poderia, e deveria, talvez, applicar-se ao Douro, que não teria então necessidade de outra protecção.

A necessidade que tem os povos do Douro de uma protecção efficaz, e a justiça com que a reclamam, é evidente; essa necessidade está tambem reconhecida pelo segundo decreto deli de outubro, o qual muito bem intendeu, que a verdadeira protecção á agricultura do Douro consisto na amortisação effectiva de uma quantidade dos seus vinhos, por meio da reducção a aguardente; no entanto não é unicamente nessa reducção, nem na exportação dessa aguardente que consiste a protecção efficaz aos vinhos do Douro, mas sim em fazer que a reducção se faça salvando aos vinhos reduzidos o preço que custam ao cultivador, e deixando alguma cousa para ajudar a subsistencia de sua familia.

O Douro gasta no tractamento dos seus vinhos de exportação todas as agoas-ardentes que póde fazer dos seus proprios vinhos, e compra, nem póde deixar de comprar, ás outras provincias tres quartas partes das agoas-ardentes que precisa para esse tractamento; não é portanto a causa da sua decadencia o excesso da sua producção, mas sim o prejuizo que causa ao lavrador do Douro o ter de sujeitar a sua agoa-ardente ao preço por que a podem levar ao Douro os cultivadores de vinhos das outras provincias, os quaes, grangeando terrenos mais ferteis por preços muito menores, tendo nas suas terras tudo que precisam para a vida, podem vender por preços, por que os lavradores do Douro não podem sem se arruinarem.

A exportação de mil ou mais pipas do agoa-ardente extraída de vinhos do Douro privaria o paiz dessa agoa-ardente homogénea, preferivel para o tra-

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ctamento dos seus vinhos, ella seria supprida por agoas-ardentes de outras provincias, e ou essa exportação não influiria nada no preço dos vinhos amortisados no Douro, ou tão pouco, que seria insignificante o beneficio que dahi poderia resultar-lhe.

É evidente que a agricultura dos vinhos superiores do Douro se não póde sustentar sem uma protecção, que preste auxilio aos lavradores nas muitas eventualidades que os tornam dependentes desse auxilio, e que sustente o preço que custa a sua agricultura.

É evidente que o meio mais efficaz de effectuar essa protecção é a amortisação da quantidade em beneficio da qualidade, por preço que não arruine o lavrador dos vinhos amortisados.

A reducção da quantidade effectuada no vinho exportavel dá aos commerciantes daquelles vinhos uma base mais certa para os calculos do seu commercio, tirando-lhe do mercado os vinhos sobrantes das feiras.

O methodo de qualificação feito nas operações das feiras, debaixo de um principio derasoavel liberdade, dá ao commercio o beneficio de evitar completamente a feira dos papeis, e produz o justo resultado de estabelecer a quantidade approvada para a exportação de cada novidade pelas operações commerciaes, sem dependencia do governo, vantagens que compensam amplamente o sacrificio, que se lhe pede, de comprarem dois almudes de agoa-ardente em pipa, por alguns tostões mais do que comprarem o resto da que empregam no tractamento dos seus vinhos, para se poder fazer a reducção dos vinhos sobrantes da exportação, sem a qual não podem ter essas vantagens.

A reducção da agoa-ardente dos vinhos qualificados exportaveis pelo preço de 150$000 réis segura aos lavradores um preço rasoavel para os seus vinhos, que os compensa da vantagem de poderem vender os seus bilhetes de qualificação.

Um augmento de preço da agoa-ardente, que se extrair dos vinhos qualificados exportaveis, que se amortisarem, não prejudica os interesses das outras provincias, porque o Douro não póde fazer agoa-ardente sufficiente para os seus vinhos, e esse preço não é senão um regulador mais favoravel do preço por que tem de vender as agoas-ardentes, que o Douro e o commercio não podem deixar de comprar-lhe.

O tributo de 4800 réis, que se exige ás agoas-ardentes das outras provincias, que vierem vender-se ao Douro, nestes seis annos em que tem de crear-se o banco, que deve segurar a prosperidade daquelle paiz, que se diffunde por todas as provincias, é amplamente compensado pelo beneficio que dahi resulta a todas as suas cultura» e industrias, e pelo auxilio que os lavradores dessas provincias que se quizerem associar, tambem podem tirar do banco.

Por todas estas rasões, e para tomar effectivo o benevolo pensamento do governo, manifestado no segundo decreto de 11 outubro de 1852, tenho a honra de propôr o seguinte

Projecto de lei. — Artigo 1.º Será creado um banco protector da lavoura dos vinhos do Douro.

Art. 2.º Para satisfazer aos fins declarados no artigo 3.º do segundo decreto de 11 de outubro de 1852, é o governo auctorisado para applicar o producto do imposto especial, de que tracta o artigo 1.º do referido decreto, a auxiliar a creação do banco protector da lavoura do Douro.

Art. 3.º O fundo do banco será formado com a importancia do referido imposto, e com acções tomadas pelos lavradores, ou outros mutuantes, que nelle se queiram interessar.

§ 1.º Os seus direitos e deveres, a quantidade do fundo, o valor das acções, o modo de realisa-las, os regulamentos por que tem de reger-se, e o tocar da sua residencia serão decretados pelo governo, sobre proposta de uma commissão de lavradores do Douro, por elle nomeada, que reunirá na cidade do Porto.

§ 2.º A essa commissão será entregue o projecto do banco, offerecido ao governo pelo lavrador Felix Manoel Borges Pinto de Carvalho, para servir de base aos seus trabalhos.

Art. 4.º As obrigações de distillação dos vinhos do Douro, e da exportação das agoas-ardentes delles extraídas que o artigo 3.º do referido decreto impunha ás emprezas, que não chegaram a realisar-se, serão substituidas pela obrigação que se impõe ao banco, de reduzir a agoa ardente todo o vinho qualificado exportavel, que, sobrando das feiras, e não tendo sido a sua qualificação ratificada nos manifestos, seus donos lhe quizerem vender, pagando-o pelo seu producto em agoa-ardente, pelo preço que a lei estabelece ás agoas-ardentes extraídas dos vinhos exportaveis, que manda amortisar, com o fim de procurar o possivel equilibrio, entre a producção e o consumo, por meio da reducção da quantidade, em beneficio da qualidade.

§ 1.º São garantidos ao banco os favores concedidos ás projectadas emprezas no § 2.º do artigo 3.º e no artigo 4.º do referido decreto, bem como nos artigos 12.º, 13.º, 14.º, § unico — artigos 15.º e 16.º do programma para as projectadas emprezas.

§2.º Em cada anno, verificada que seja a distillação de todo o vinho qualificado exportavel, que seus donos lhe quizerem vender, receberá o banco o saldo do producto total do imposto especial, que não tiver recebido, e o governo completará pelo cofre da alfandega a somma garantida no § 2.º do artigo 3.º do decreto, e no § unico do artigo 14.º do programma, no caso nelle expresso.

Art. 5.º O banco fica sujeito ás obrigações impostas ás projectadas emprezas no § 4.º do artigo 3.º do decreto, bem como nos 3.º e 4.º do artigo 7.º, e artigos 10.º e 11.º do programma.

Att. 6.º Os fundos, que o governo concede ao banco pela importancia do tributo especial, creado pelo segundo decreto de 11 de outubro de 1852, até ao anno 1857 inclusivè, ficarão pertencendo á lavoura do Douro, e no caso, não esperado, que o banco haja de liquidar, esses fundos e seus proventos serão gastos nas estradas do Douro.

Art. 8.º Todos os vinhos do Douro, que se habilitarem para exportação, serão obrigados a comprar ao banco dois almudes de aguardente, extrahida dos vinhos amortisados no Domo.

§ unico. Nenhum vinho do Douro de exportação, será guiado para o Porto, sem juntar attestado de haver comprado uni almude de aguardente, que determina o § antecedente, nem despachado na alfandega do Porto, sem attestado de ter comprado outro almude dentro de um anno da data da carregação no Douro.

Art. 8.º Fica por este modo declarado, alterado,

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e ampliado o segundo decreto de 11 de outubro de 1852.

Art. 9.º Todas as aguardentes, que se gastarem dentro das demarcações de feitoria e ramo, que não forem extrahidas de vinhos nellas produzidos, pagarão um direito de 4$800 réis, em pipa, por tempo de 6 annos, que será applicado para os fundos do banco.

Art. 10.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos deputados, 28 de maio de 1853. — O deputado por Villa Real, Affonso Botelho de Sampaio e Souza.

Foi admittido, e enviada á commissão dos vinhos, enviada a de fazenda, devendo ser publicado no Diario do Governo,

Mandou-se imprimir um parecer da commissão de guerra sobre a projecto do sr. Placido de Abreu, relativo aos bachareis em mathematica pela universidade de Coimbra.

O sr. Alves Martins. — Tinha pedido a palavra para quando estivesse presente o sr. ministro da fazenda, não para o interpellar, nem censurar; mas para chamar a attenção de s. ex.ª sobre o que selem passado em Villa Real, quanto a pagamentos. Já no anno passado estiveram em atraso os pagamentos aos egressos 3 ou 4 mezes, e dando eu disto parte ao sr. ministro da fazenda, s. ex.ª logo deu providencias. Agora torno a ser avisado que ha os mesmos embaraços, e os mesmos inconvenientes, e estou certo que, se me dirigisse em particular ao sr. ministro, s. ex.ª daria providencias, mas intendi que devia chamar a sua attenção sobre este negocio publicamente, para que nq futuro senão repitam taes abusos, e para que lá se saiba que ha quem fiscalise o procedimento de quem quer que os commette; porque ha egressos que recebem 3$000 réis por mez, e quando se annuncia no Diario do Governo o pagamento, acodem ao cofre do districto, ás vezes em distancia de 4 e 5 leguas, e diz-se-lhe que não ha dinheiro; e logo fóra da thesouraria apparece alguem que quer rebater. Por isso intendi que devia chamar a attenção do sr. ministro da fazenda neste logar, para que a publicidade sirva de correctivo aos abusos, se por ventura se poderem tornar a repetir.

O sr. Ministro da fazenda (Fontes Pereira de Mello: — Eu torno nota das observações que fez o illustre deputado, e indagarei quaes são os motivos que deram causa a essa falta, e espero que será remediada.

O sr. Barão de Almeirim: — Mando para a mesa a seguinte

Nota de interpellação: — Peço se avise o sr. ministro da fazenda de que desejo interpellar s. ex.ª ácerca das difficuldades existentes na ilha de S. Miguel, e nas mais dos Açôres, nas, transacções commerciaes e pagamento de impostos, em virtude da falla de moeda de prata, e em consequencia de se não querer recebei a do ouro nas repartições fiscaes,; bem como de se não querer dar entrada na alfandega de S. Miguel aos soberanos como moeda do paiz, apezar de terem curso legal, mas simplesmente como moeda estrangeira. Peço a urgencia desta interpellação. — Barão de Almeirim.

(Continuando) Aproveitarei a palavra para pedir a v. ex.ª me queira dizer, se se fez já aviso ao sr. ministro do reino, de uma interpellação que eu annunciei aqui a s. ex.ª sobre o modo porque se tem feito as vistorias aos terrenos proprios para a cultura do arroz; porque ha já muitos dias que annunciei essa interpellação, e desejava verifical-a com brevidade. Igualmente desejava que viessem os esclarecimentos que pedi ácerca do caminho de ferro, antes de se entrar na discussão do contracto: ha já bastantes dias que os pedi.

O sr. Presidente: — Quanto á interpellação que mandou agora para a mesa, far-se-ha a communicação; das outras tem-se feito; quanto aos esclarecimentos renova-se o pedido.

O sr. Justino de Freitas: — Mando para a mesa a substituição ao projecto n.º 33, sobre instrucção publica superior, segundo as idéas que vogaram na camara.

O sr. Julio Pimentel: — Por parte da commissão de instrucção publica mando para a mesa um projecto de reforma para a instrucção primaria, o qual peço que seja impresso no Diario do Governo.

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Pedi a palavra para vêr se consigo da commissão de guerra alguma cousa. A commissão de guerra, sr. presidente, tem em seu poder desde o principio da sessão, muitos e varios requerimentos de officiaes, uns injustamente preteridos, outros injustamente reformados, outros injustamente demittidos por motivos politicos, e a commissão de guerra (não sei a razão porque, nem a quero saber, mas acceito o facto conforme se me apresenta) não tem dado parecer algum sobre estes requerimentos. (Uma voz: — Já prometteu dar) Prometteu dar; mas a sessão vai adiantada, e a commissão de guerra adia de sessão para sessão a apresentação desse parecer. Ora, depois que a camara approvou o parecer da commissão de guerra, para serem reintegrados os officiaes inferiores, que estavam demittidos por motivos politicos; depois que a commissão de guerra apresentou um projecto para serem annulladas as reformas aos officiaes da guarda municipal, não é justo nem que a commissão de guerra, nem que a camara consintam que estejam injustamente reformados officiaes generaes, como, por exemplo, o general Magalhães, que foi reformado contra todas as leis existentes, e contra todos os usos e costumes inalteravelmente seguidos até hoje na reforma.

O general Magalhães foi injustamente reformado, o veiu a esta camara, depois de correr lá fóra todos os tramites, para que lhe fosse anullada a reforma, e não é possivel por motivo nenhum, que elle seja menos considerado que os officiaes da guarda municipal, cujas reformas a camara annullou, e do que os sargentos demittidos por motivos politicos, que já podem entrar no exercito; e fallo ainda de outro militar, coberto de feridas, sobre um requerimento que já a commissão de guerra na sessão passada deu um parecer favoravel; refiro-me ao tenente Lucena, de que tive a honra de apresentar o seu requerimento, e que mandei para a mesa ha 4 mezes; e ainda a commissão de guerra não quiz dar parecer nenhum sobre isto.

Se a illustre commissão de guerra apresentou, como disse, um projecto para entrarem nas fileiras do exercito os officiaes e sargentos inferiores demittidos por acontecimentos politicos, porque razão não apresenta igualmente a commissão de guerra para serem reintegrada? no exercito os officiaes que não são subalternos, e que tambem se acham demittidos por motivos politicos? Pois se a commissão de guerra apre

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tentou aqui um parecer a respeito de individuos de uma certa parcialidade politica, e apezar da direita da camara não pertencer a essa parcialidade politica, votou pelo parecer, quando aqui foi apresentado, e não só votou, mas defendeu como sua palavra a justiça desse parecer, para serem nullas as reformas dadas aos officiaes da guarda municipal de Lisboa e Porto, porque não haveis de seguir o nosso exemplo? Pois se foi uma cousa justa o annullarem-se as reformas aos officiaes da guarda municipal, o entrarem para o exercito os officiaes inferiores demittidos por motivos politicos, porque não achais justo que se annulle tambem a reforma aos officiaes superiores que foram injustamente reformados, e não mandais entrar para o exercito os individuos que não são inferiores, e que foram demittidos por motivos politicos?

Sr. presidente, a questão é esta — estes individuos ou se queixam com razão, ou sem ella; — se tem razão, tenha a illustre commissão de guerra bastante coragem e independencia, e venha á camara dizer — estes individuos foram injustamente reformados, deve ser annullada a sua reforma; — se acaso não lêem razão, apresente-se o parecer, e digam — estes individuos não lêem razão, porque estão reformados em virtude desta ou daquella lei — ou então tenha a commissão a coragem e a franqueza de dizer os motivos porque não dá o seu parecer. Mas a commissão fechou-se com os documentos, e não dá parecer algum! Ha oito dias prometteu ao sr. Cezar de Vasconcellos trazer aqui o seu parecer, mas até hoje ainda não deu parecer algum.

Por consequencia eu hei-de continuar a pedir este parecer, e hei-de fallar todos os dias neste negocio até que haja um resultado; e quanto mais se demorar, mais hei-de atormentar a commissão de guerra até vir dizer á camara quaes os motivos que a obrigam a ser justa para uns, e injusta para outros, que estão nas mesmas circumstancias.

Portanto peço que se dê um parecer sobre todos, em geral, que se achem em identicas circumstancias, mas quando se não dê em geral, dê-se sobre o requerimento do general Magalhães, que se queixa de lei sido injustamente reformado, e sobre o requerimento do tenente Lucena, que pede entrar para o exercito, visto que foi compellido a dar a sua demissão por motivos politicos.

O sr. Placido de Abreu: — Sr. presidente, um illustre deputado tractou de excitar o zêlo da commissão de guerra, a fim de apresentar o seu parecer sobre os requerimentos que versam sobre materia de preterições e reformas de alguns officiaes do exercito A commissão tem tractado effectivamente destes requerimentos, e para mostrar ao illustre deputado quanto é difficil a resolução deste negocio, basta dizer que á commissão sobre o assumpto de pretenções e reformas já foram 12 projectos, que têem sido considerados, e chegou finalmente a um resultado a esse respeito; e precisa apenas ter uma conferencia com o sr. ministro da guerra para trazer á camara o seu parecer definitivo. Já se vê por tanto que a commissão tem feito tudo quanto está ao seu alcance para resolver esta questão, e que não é por esquecimento que não tem apresentado o seu parecer.

Agora sobre materia de reformas que o nobre deputado citou como sendo cousa muito facil, permitta-me que lhe diga que é este um negocio de bastante melindre, e que a commissão de legislação julgou de um modo muito differente daquelle que agora apresenta o nobre deputado, porque a commissão de legislação, que ninguem póde deixar de julgar apta no modo de intender as leis, acêrca dessas reformas foi de opinião que o governo não tinha infringido a lei neste negocio. Por consequencia já se vê que isto não é negocio que não seja muito melindroso e que se resolva depressa; e nós lemos obrigação de trazer á camara um parecer o mais bem elaborado, segundo as nossas forças.

Ora depois disto é preciso notar que nós estamos sobrecarregados de muito trabalho, e não somos dotados de forças taes que possamos fazer tudo de repente. Eu pela minha parte posso dizer que não tenho deixado de attender por um só momento a tudo, quanto me está incumbido, e que pela commissão tem sido determinado. Mas tambem é preciso que, eu e os meus collegas que têem igualmente trabalhado muito, tenhamos algum tempo para descançar. Entretanto nós temos tractado de todos os assumptos que estão a nosso cargo com a maior assiduidade, e permitta-me o nobre deputado que Ibo diga que apesar da muita consideração que tenho para com s. ex.ª e que me persuado têem tambem os meus collegas da commissão, embora o illustre deputado diga que nos ha-de atormentar, não havemos de fazer mais do que aquillo que temos feito até aqui, porque por nos atormentar não sei que possamos andar mais depressa (O sr. Corrêa Caldeira: — O tormento é o remorso de não ter feito o. seu dever).

O Orador: — É o remorso de não ler feito o seu. dever! Se o illustre deputado tem remorsos, nós não temos nenhum; (Apoiados) temos feito o que podemos, e que está ao nosso alcance. (Apoiados)

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Sr. presidente, ou eu me expliquei mal, ou o illustre deputado não me intendeu bem; mas o que creio, é que fui eu que me expliquei mal.

Eu não pedi á commissão de guerra que apresentasse um projecto sobre o modo de regular as reformas em geral; eu disse que a respeito daquelles militares, que apresentaram requerimentos a esta camara, queixando-se de estarem injustamente reformados ou preteridos, a commissão de guerra dê um parecer, para sabermos se foram ou não foram justa ou injustamente reformados ou preteridos.

A questão é esta e muito simples: — o general Magalhães requereu a esta camara, queixando-se de que foi injustamente reformado, porque a respeito dessa reforma se preteriram todas as formulas das leis existentes, porque lhe foi dada sem nunca a ter pedido, e sem ser em virtude de informação de uma junta de saude. O tenente Lucena foi injustamente preterido por ter sido offendido e mal tractado no seu comportamento e brio militar. Este official tem sido sempre um militar distincto tanto em tempo de paz como no de guerra, mas escandalisado desse máo tractamento havido para com elle, foi obrigado a dar a sua demissão. Agora pede ser integrado no exercito. A camara que ainda ha pouco tempo votou que os officiaes inferiores e sargentos demittidos por motivos politicos fossem reintegrados no exercito, e a commissão de guerra que se appressou a dar o seu parecer ácerca desses individuos, appresse-se tambem a dar um parecer sobre o requerimento de 3 ou 4 officiaes, que não são subalternos, e que foram de-

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mittidos por motivos politicos, ou que se acham reformados injustamente, porque o que é necessario, é que se faça justiça igual para todos.

Eu não intendo que os deputados venham aqui só para fazer a corte aos srs. ministros. Intendo que os deputados devem tractar dos interesses da nação em logar de fazerem a côrte aos srs. ministros.

O general Magalhães foi, como já disse, injustamente reformado. A commissão de guerra do anno passado disse que este general estava injustamente reformado: o procurador geral da corôa disse que estava injustamente reformado. Todos os papeis da commissão de guerra do anno passado foram remettidos á commissão de guerra desta camara: deveis lêr esses papeis e apresentar um parecer sobre elles; e se intendeis que a commissão de guerra do anno passado decidiu mal a pertenção desse official, tende a coragem de vir dar um parecer nesse sentido, e não venhais dizer que eu peço um parecer geral sobre reformas, quando eu peço uma decisão designadamente a respeito destes officiaes.

-Realmente custa a ouvir a sangue frio; é um facto que cobre as faces de pejo e de vergonha; é um escandalo que brada aos Céos, quando ouço dizer á illustre commissão de guerra — ha seis mezes que não temos descançado, deixem-nos descançar! Pois que tendes feito ha ti mezes! [Nada! De sorte que em Portugal não ha tempo para nada! Não ha tempo para a commissão dar um parecer sobre um official que se queixa de estar injustamente reformado, e que pede á camara que lhe faça justiça, tendo de mais u mais o requerente a seu favor o voto da commissão de guerra do anno passado; e agora diz a commissão de guerra actual — deixem-nos descançar — não temos tempo, estamos cançados! Ora isto é bonito... (Riso) Deixem descançar a commissão de guerra...

Sr. presidente, eu intendo que as commissões desta casa são para apresentar os seus pareceres sobre todos os negocios que lhes são affectos. Se a illustre commissão de guerra intende que deve comprazer mais com os srs. ministros do que satisfazer a certas indicações de justiça, então tenha a coragem de apresentar aqui um parecer e diga — a pertenção deste official não póde ser attendida, por que está reformado por estas e aquellas razões. Mas se é certo que o official está injustamente reformado, porque é que não fazeis caso e não attendeis a esta prestação que é da maior justiça.

Eu queria que me desfizésseis este argumento: — Por que é que mandastes entrar para o exercito os officiaes inferiores e sargentos demittidos por motivos politicos? Qual é a razão por que os sargentos podem entrar, e os alferes e tenentes não? Por que declarastes injusta e de nenhum effeito a reforma dada a alicies, tenentes e capitães da guarda municipal, o que não hão-de ser annulladas as reformas dadas injustamente a generaes? Por que é a commissão de guerra lauto a favor dos sargentos, e contra os alferes e os tenentes, e lauto a favor dos officiaes da guarda municipal, e contra os generaes? Eu sei muito bem por que; sei de mais... mas não o quero dizer. Eu percebo as cousas muito bem. Não julguem que Deos tem retirado a sua mão para tão longe de mim, que eu não perceba as cousas; percebo muito bem o que isto e.

Uma commissão que não quer dar o mesmo parecer sobre uma pretenção que está em termos identicos de outra sobre que deu um parecer, uma commissão que annulla reformas dadas injustamente a officiaes da guarda municipal, e não quer que se annullem as reformas dadas a generaes em identicas circumstancias, é uma cousa que não tem resposta, está abaixo da synthese e da analyse.

Por consequencia insisto em que a commissão de guerra dê o seu parecer sobre as reformas de que fallei: se acha justa a pretenção, attenda-a; se a acha injusta, declare-o; tenha a coragem da sua situação; não esteja amarrada a um cepo sem fazer nada.

Prometto não tirar a mão de cima deste objecto, por que ámanhã, depois, e depois hei de fallar sempre nelle, em quanto o parecer não vier; ao menos hei-de escandalisar a camara com as minhas observações.

Quero que a commissão de guerra diga quaes são os motivos, por que não dá o seu parecer.

O Sr. Placido de Abreu — Sr. presidente, eu intendia que as explicações que tinha dado ao illustre deputado — deviam contental-o: aqui não se discute agora nem se as reformas foram boas ou se são más, nem se foram por lei ou contra lei. Se o illustre deputado intende que as leis foram feridas, está no seu direito de propôr uma accusação ao governo. A commissão de guerra não faz a côrte aos ministros, nem deixa de a fazer; a commissão é uma delegação da maioria da camara, e ha de cumprir o seu dever conforme intendei, e ha de ter a coragem sufficiente para vir a camara propôr aquillo que julgar que é conveniente, e a camara adoptará o que julgar melhor em sua sabedoria. A commissão tem coragem bastante para tomar a responsabilidade da sua posição, e para se apresentar na camara com a dignidade que lhe é propria, tem-no feito já em outras occasiões e ha de faze-lo. Se o illustre deputado sabe cumprir os seus deveres, a commissão tambem os sabe cumprir.

São estas as explicações que eu tenho a dar; e de resto nós tractaremos de apresentar á camara aquillo que está a nosso cargo com a brevidade que fôr compativel.

O sr. Cezar de Vasconcellos: — Peço a palavra.

O sr. Presidente: — Eu intendo que este incidente não póde continuar. O illustre deputado fez o seu pedido á commissão de guerra para que ella désse o seu parecer, e a commissão deu já as suas explicações: tudo o que é daqui por diante, parece-me que é gastar tempo inutilmente; por isso não posso continuar a dar a palavra sobre este objecto. (Apoiados)

O sr. Rivara. — Quando pedi a palavra, não sahia da resolução da camara na sessão passada, porque não estava presente, ácerca do modo de abbreviar alguma cousa o expediente; por isso vou mandar agora para a mesa uma representação da camara municipal de Portel, em que pede a extincção do imposto das terças dos concelhos.

O sr. Guerreiro: — Ha muito tempo que apresentei aqui uma representação, em que se pediam providencias, para que fosse concertada a estrada que vai das Alturas para Bragança, a qual está intransitavel em 5 pontos.

Já fallei aos membros da commissão de fazenda sobre este objecto, mas não obtendo unia resposta que me satisfizesse, chamo a attenção do sr. ministro das

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obras publicas, para que mande estudar as obras que alli são indispensaveis. Eu não quero que se faça uma estrada nova; o que quero é que se torne transitavel a que existe, que é a unica que na provincia de Traz-os-Montes existe capaz de melhor viação; e lembra-me que é tal o estado daquella provincia que sendo muito abundante de generos, alli morrem estagnados, por não haver viação por onde sejam conduzidos, bastando notar, que em janeiro estava a batata em Bragança a 120 réis, e no Porto a 310 réis o alqueire, e a castanha a 100 réis em Bragança, e a 600 réis no Porto; e nem com esta differença de preços os almocreves queriam trazer estes generos ao Porto, porque com as despezas de transito, por causa dos máos caminhos não lhes restava lucro algum.

Peço pois que s. ex.ª tome em consideração o que acabo de dizer, para mandar proceder aos concertos que acabo de indicar que são necessarios.

O sr. Ministro das obras publicas (Fontes Pereira de Mello): — A minha resposta é a mesma que tenho dado em casos similhantes: não me posso comprometter a mandar fazer esta estrada, porque todos sabem que o producto do imposto especial para as estradas produz pouco em relação ás necessidades que ha; entretanto mandarei examinar os concertos de que carece a estrada de que fallou o illustre deputado; e se dos meios que forem votados para obras publicas, poder prover a esses concertos, não terei duvida em os mandar fazer.

O sr. Guerreiro: — Eu não pedi uma estrada nova; o que quero é que se repare a principal estrada de Traz-os-Montes, que está em tal estado que se não póde transitar, e isto é o que não sabem os membros da commissão de fazenda, que nunca por lá passaram; e por isso a minha opinião ç contra as commissões, porque não teem conhecimento destas cousas.

O sr. Corrêa Caldeira: — Sr. presidente, eu sei muito bem que o regimento da casa não permitte que se apresentem na camara requerimentos de particulares, e que a regra geral a seguir é mandal-os para a caixa, donde passam para a commissão de petições; comtudo ha casos totalmente excepcionaes, e a estes pertence o requerimento de um cidadão vehementemente accusado no parlamento, porque então a sua petição, resultado necessario da immerecida provocação, do aggravo, da accusação, entra no sagrado direito de defeza, e não está na liberdade de quem é accusado recusar-se a defender-se, sob pena de deixar passar o aggravo como justificado, a imputação criminosa, ou deshonrosa como provada; e é precisamente o que acontece no caso a respeito do qual chamo a attenção da camara.

Sr. presidente, na sessão de 16 do corrente o sr. Pinto de Almeida, apresentando um documento, com o qual devia provar as imputações que tinha feito á camara ecclesiastica do Porto, depois de outras considerações accrescentou, segundo está escripto no extracto da sessão «evitando-se assim os escandalos que se estão practicando, segundo lhe consta, na camara ecclesiastica desta cidade, e é supposto eu tivesse intendido, quando o sr. deputado proferiu estas palavras, e ainda hoje supponho, que a allusão não era feita á camara ecclesiastica de Lisboa, mas sim á do Porto, á qual se referia o documento que o sr. deputado apresentou; comtudo concluindo-se pelo extracto do que o sr. deputado disse, que quiz precisamente fallar de escandalos commettidos na camara ecclesiastica de Lisboa, á vista desta imputação a camara não estranhará, untes por certo julgará muito nobre, que o escrivão da camara ecclesiastica de Lisboa, é sr. José Maria Couceiro, vendo a sua reputação offendida em logar tão respeitavel, como é a camara dos deputados da nação portugueza, por palavras tão directamente accusadoras, como as do sr. deputado Pinto de Almeida, venha pedir que os factos que comprovam, ou possam comprovar a accusação do illustre deputado, sejam pela commissão ecclesiastica, se lá estão, ou pela camara, remettidos directamente ao governo, para que este tome delles conhecimento, e ouça o accusado em sua defeza. O procedimento deste cavalheiro, encarregando-me da apresentação do requerimento, que vou mandar para a mesa, é summamente nobre, louvavel, e brioso, por que testimunha não só que o accusado tem consciencia de não ler faltado aos seus deveres, mas que deseja manter a sua reputação e bom nome perante os seus concidadãos. (Apoiados)

Sr. presidente, eu desejava que o requerimento deste cavalheiro fosse lido na camara, visto que foi aqui que se lhe fez a censura; mas se a camara intender que isto lhe toma tempo, sem necessidade e sem proveito, limitar-me-hei a pedir que seja impresso no extracto da sessão, para que ao publico, no mesmo logar, onde se lhe deu conhecimento da censura, se manifeste tambem esta legitima pertenção do accusado em sua defeza; e pedirei tambem á illustre commissão ecclesiastica, que convide o sr. deputado, que fez a accusação, se quer insistir nella, a remetter-lhe as informações e documentos, que provem os factos, em que fundou a sua imputação, a fim de que sejam remettidos ao governo, como o accusado pede, e á face delles se promova a instauração do processo conveniente e legal.

(Pediram a palavra os srs. Pinto de Almeida, e Alves Martins).

O sr. Presidente: — Já deu uma hora; ámanhã se dará andamento ao requerimento.

O sr. Corrêa Caldeira: — Talvez a camara não se oppozesse a que isto se decidisse já. O sr. Pinto de Almeida pediu a palavra, talvez queira dar algumas explicações a este respeito; eu requeria a v. ex.ª que consultasse a camara para isto acabar.

Consultada a camara sobre se queria que este incidente continuasse até terminar, decidiu negativamente.

O sr. Presidente: — N'uma das sessões anteriores, ha já bastantes dias, o projecto n.º 3 conferindo ao menor Macario de Castro Souza Pinto Cardozo, filho do coronel Cardozo, uma pensão de 45$000 réis, que o governo lhe decretou, ficou adiado para quando estivesse presente o sr. ministro da fazenda: como se acha presente, está em discussão o sobredicto projecto, com a substituição que então lhe offereceu o sr. Silva Pereira.

(Cederam da palavra os differentes srs. deputados, que a tinham pedido, quando este projecto esteve em discussão.

O sr. Silva Pereira: — Quando este projecto entrou em discussão, disse eu, que me custava a conformar-me com uma tão grande pensão, como aquella que foi proposta pelo governo e approvada pela commissão, e declarei á camara que, com quanto esteja na intenção de dar todo o meu apoio ao ministerio actual, este apoio não póde ir além dos limites que me te-

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nho prescripto em objectos de economia Informado depois de que a pensão, deduzidas as decimas, de 45$000 réis ficava reduzida a 30 ou 32$000 réis, não tenho duvida em me conformar com ella. Ainda a acho exaggerada: mas em vista dos motivos politicos, que levaram o governo a propo-la, em vista da consideração que se deve ter com um serviço de natureza nova no nosso paiz, qual foi o daquelle official expor a sua vida para conter o seu corpo em disciplino, não tenho duvida em retirar a minha substituição, e peço á camara que me permitta retira-la. A camara conveiu.

O sr. D. Rodrigo de Menezes: — Sr. presidente, eu não posso ter em vista contestar os principios da justiça e da moralidade, com que esta pensão foi dada ao menor Macario de Castro; sei perfeitamente que se deve premiar o militar que tem o heroismo de sacrificar a sua vida para resistir a uma revolução, quando aquelles que a fizeram, tantos premios tem tido; entretanto não posso conceber como se dê uma pensão tão grande só para a educação de um menor. Ouço dizer que esta pensão é reduzida, mas eu não posso votar, sem que o sr. ministro da fazenda tenha a bondade de responder a duas perguntas, que se tornam precisas para meu esclarecimento.

Ha tempo que fiz aqui um requerimento, pedindo que pelo ministerio da fazenda fosse mandada a esta casa uma relação dos assentamentos das pensões e suas vacaturas, isto em satisfação de uma portaria de 26 de abril de 51 do ministerio do sr. Avila, que manda que todos os annos seja remettida a esta casa esta relação; esse requerimento não tem sido satisfeito, e por isso tenho votado pelo adiamento de todas as pensões para depois da discussão do orçamento. Mas no caso actual desejava que o sr. ministro da fazenda me dissesse, se esta pensão é ou não de consideração, e se ha de ter logar só depois de haver o dobro das vacaturas; porque no caso de não ser de consideração, e por consequencia dever ter uma deducção de 50 por cento, votarei por ella.

O sr. Ministro da Fazenda (Fontes Pereira de Mello): — Eu não tenho duvida de mandar á camara o assentamento das classes inactivas, com a indicação das vacaturas que tem occorrido desde 1834 para cá, e se os trabalhos que tenho a meu cargo me tivessem permittido redigir o meu relatorio, já o tinha apresentado á camara, porque os documentos que são a parte importante do relatorio, estão promptos, e até impressos; por elles é satisfeito o requerimento do sr. deputado, e se a camara se contentar, eu enviarei esses documentos com um relatorio muito simples, porque não tenho tempo para o desenvolver.

Mas em quanto ao caso de que se tracta, não póde haver duvida, porque as pensões não se dão senão na conformidade do decreto de 16 de novembro de 1841, que é pelas vacaturas, e todas as pensões de sangue na conformidade das leis são pensões de consideração; por consequencia a pensão de que se tracta, ha de ler a deducção competente no integral da mesma pensão, que é 25 por cento, e ha de ser considerada como pensão de consideração em virtude das leis.

O sr. Avila — A medida a que o sr. D. Rodrigo alludiu, e que eu adoptei quando estive no ministerio da fazenda, não tinha por fim senão habilitar o corpo legislativo a fiscalisar todos os annos a execução da lei: e se effectivamente a lei tem sido cumprida, resulta que não se tem feito assentamento de pensão alguma desde 1819 para cá, sem ter vagado o dobro dessa pensão: logo no caso de que se tracta, a pensão não póde ter assentamento para pagamento sem vagar o dobro da mesma pensão. E por esta occasião pedirei ao sr. ministro da fazenda que, visto, como s. ex.ª disse, estarem promptos os documentos respectivos ao relatorio do sou ministerio, e que sem duvida são a parte principal do mesmo relatorio, os mande distribuir pelos srs. deputados, e acho que a camara se deve contentar com um relatorio resumido.

É preciso partir do principio, que hoje não ha pensões de consideração e de não consideração, por que desde o momento em que na mesma occasião se paga ás classes activas e inactivas, acabou essa distincção; mas ficou-se sempre chamando classes inactivas de não consideração áquellas que recebem pelo seu titulo de renda vitalicia, e recebem metade das pensões que tinham, em quanto os outros pensionistas recebem na proporção das deducções que soffrem as classes activas; e não ha exemplo nenhum de pensão votada pelo corpo legislativo, que fosse considerada pensão de não consideração: por consequencia a pensão de que se tracta, se fôr votada, ha-de ser paga segundo a cifra que se votar, menos as deducções geraes que são 25 por cento.

Agora, segundo intendo, o corpo legislativo não póde senão approvar ou rejeitar a pensão decretada pelo governo, mas não augmental-a ou dimmuil-a; e nesta conformidade voto por aquella que se propõe, em attenção ao pensamento que a dictou, e a que é temporaria, porque é para a educação de um menor, até completar 25 annos.

O sr. D. Rodrigo de Menezes: — Depois dos esclarecimentos que o sr. ministro da fazenda teve a bondade do me dar, eu intendo que esta pensão de 45$000 réis fica reduzida a 33$000 réis, porque tem a deducção de 25 por cento, mas ainda a acho excessiva, e por isso mando para a mesa esta

Proposta: — Proponho que a pensão do menor Macario de Castro, fique reduzida a 21$000 réis. — D. Rodrigo de Menezes.

Foi admittida, e ficou conjunctamente em discussão.

O sr. Gomes: — Como até aos 21 annos deidade devo o agraciado estar habilitado a adquirir meios de subsistencia, e coma o de que se tracta, é de lhos subministrar ale então, mando para a mesa o seguinte additamento á proposta do sr. D. Rodrigo.

Additamento: — Proponho que a pensão cesse logo que o agraciado complete 21 annos; o seja satisfeita a contar da publicação da lei. — C. M. Gomes.

Foi admittido, e ficou tambem em discussão.

O sr. Vellez Caldeira: — Sr. presidente, custa-me pedir a palavra para impugnar esta pensão. Quero conceder que a historia que se conta para se conceder esta pensão, seja verdadeira; mas, sr. presidente, eu sou justo; quero que se faça justiça igual. Eu queria, sr. presidente, que a illustre commissão de fazenda, quando emittiu o seu parecer sobre esta pertenção, désse o seu parecer tambem ácerca das outras pensões concedidas pelo governo, que são justas, por que ha outros pertendentes com igual ou maior justiça.

Eu vejo, que para viuvas de marechaes de campo

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propõe o governo a pensão de 400$000 réis! Vejo que o governo propoz uma pensão de 400$000 reis para a viuva de um marechal de campo, que fez serviços importantes ao seu paiz, e foi talvez em consequencia das repelidas e constantes injustiças que se lhe fizeram, que elle morreu; e quando se propõe uma pensão de 400$000 réis para a viuva de um marechal de campo, quando se deixa reduzida á miseria a viuva de um magistrado dignissimo, que foi presidente de um dos tribunaes de Lisboa, não se propondo para essa viuva uma pensão, apezar dos grandes e relevantes serviços que seu marido prestou ao paiz, ha-de-se dar a um menor 45$000 réis mensaes só para a sua educação. Eu acho esta pensão muito exaggerada; e se esta tem deducções, tambem as outras as tem. Se esta pensão de 45$000 réis mensaes, que importa em 540$000 réis annuaes, é só para a educação do menor, acho-a muito exaggerada. Se é para mais alguma cousa, se é para sustentar o fausto ou luxo, o paiz não está em circumstancias de dar dinheiro para isto; e então deve attender-se a cousas de mais justiça e de primeira necessidade. Em fim eu o que quero, é consignar a minha opinião, e por isso concluo votando contra a pensão proposta.

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Sr. presidente, eu verdadeiramente não posso dar a minha opinião ácerca deste objecto, e com relação ao guantum da pensão, sem que a camara resolva previamente o seguinte — tem ou não tem a camara o direito de cortar a verba de uma pensão qualquer, decretada pelo executivo, e por este proposta á sancção do parlamento? — Se a camara tem direito para a cortar, então voto que a pensão seja reduzida; se não tem direito, então collocado entre o dilemma de não conceder cousa alguma, ou conceder uma verba que reputo exaggerada, antes quero conceder essa verba exaggerada. Portanto é preciso que a camara decida previamente este ponto — se a camara tem direito, se póde cortar o quantum da pensão proposta pelo governo — então voto pela reducção proposta pelo sr. D. Rodrigo de Menezes; agora se não tem direito, se tenho devotar em tudo ou nada, voto no primeiro sentido; porque em minha opinião esta pensão é justa, e tão justa que se o coronel Cardoso não tivesse deixado um filho, a regeneração devia ter inventado um filho ao coronel Cardoso, porque é este o unico meio da regeneração se poder rehabilitar perante a opinião publica, que lastima este acontecimento.

Em conclusão, vou mandar para a mesa uma questão previa, que é a seguinte:

Questão previa: — Póde a camara alterara verba de uma pensão — Cunha Sotto-Maior. Foi admittida, e entrou em discussão.

O sr. Presidente — Portanto a questão prévia reduz-se a saber, se nas faculdades da camara está só o approvar, ou rejeitar a pensão, como ella foi decretada pelo poder executivo, e por este proposta á camara; ou se tem o direito de augmentar ou diminuir essa pensão. E pois isto o que está em discussão.

O sr. Avila: — Sr. presidente, eu pedi a palavra não para rejeitar a questão prévia, mas para ponderar ao seu illustre auctor, e á camara, que ligar a questão prévia á questão da pensão é adiar a resolução desta, Deos sabe para quando. A questão proposta agora é uma questão importante que não póde, nem deve resolver-se de repente. (Apoiados) Eu estou intimamente convencido de que o corpo legislativo não leiu faculdade senão para approvar ou rejeitar uma pensão decretada pelo poder executivo, «por este trazida a sancção do corpo legislativo: estou convencido igualmente de que quando da carta constitucional senão depreendesse esta doutrina, devia adoptar-se como meio regimental para evitar os abusos e Os grandes inconvenientes que se seguiriam do systema contrario. Mas apesar de ser esta a minha convicção intendo, que se póde sustentar a doutrina contraria e que esta questão involve um ponto grande de doutrina constitucional, que diz respeito ás attribuições do poder executivo, e ás attribuições do poder legislativo, e que por isso senão póde resolver assim, e entro mesmo em duvida se uma camara com poderes ordinarios, qual é esta, póde interpretar um artigo constitucional. (Apoiados) Com isto não quero dizer que senão dê andamento á questão prévia, nem póde já deixar de se tomar conhecimento della desde que foi lançada na camara com esta formalidade, mas quero dizer primeiro; que esta questão não deve discutir-se, nem resolver-se sem ir a uma commissão (Apoiados) e segundo; que deve tomar-se conhecimento della para se lhe dar o devido andamento sem prejuizo da discussão e votação da pensão de que se tracta. (Apoiados) Por isso eu sem combater a questão prévia peço comtudo ao illustre auctor della que a não vincule á questão da pensão, que se discute, para que se possa votar a mesma pensão. E approvando-se a proposta do governo não se prejudica a questão prévia, não fica prejudicada a questão constitucional que é a que o meu nobre amigo quer que se discuta. Discuta-se embora, mas depois que uma commissão dê sobre ella o seu parecer, e a proposta siga os tramites, que o regulamento estabelece para negocios desta natureza.

O sr. D. Rodrigo de Menezes. — Não ha duvida que segundo o artigo 31. § 11.º da carta, compete ao governo o decretar pensões, titulos, honras, ele.; mas senão coubesse ao corpo legislativo o alterar as pensões, de que servia a discussão sobre ellas? Pede a boa razão que, logo que se apresenta á camara um decreto do governo, concedendo uma pensão, e este decreto vai a uma commissão, que apresenta o seu parecer favoravel ou não, logo que isto se discute, póde alterar-se. E isto que se da nas pensões, dá-se em muitos outros projectos de lei do governo, por exemplo, no estabelecimento de ordenados. O governo estabelece um ordenado para qualquer logar que creou, vem á camara propô-lo, a camara altera-o para mais ou para menos, e o governo acceita. Portanto, sr. presidente, sem entrar em mais considerações sobre este objecto, eu intendo que a camara póde alterar as pensões. Intendo que para conveniencia publica a camara não deve dar pensões, porque seguir-se-ía o absurdo década um dos deputados apresentar uma pensão para um seu afilhado, e o orçamento seria pequeno para satisfazer a tantas exigencias: mas intendo que no caso actual a camara póde votar uma diminuição na pensão.

O sr. Maia (Francisco): — Eu conformo-me inteiramente com a opinião do sr. Avila. A questão prévia apresentada pelo sr. Cunha não se póde resolver immediatamente, e se elle instar por ella, deve ir a uma commissão, e então eu cedo da minha questão prévia que tinha tenção de apresentar. Eu intendo que a camara não póde votar sobre essa proposta, porque ella imporia alterar a interpretação

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que se tem dado constantemente a este ponto. Ate hoje nunca se tem alterado uma proposta de pensão apresentada pelo governo, e se isso se fizesse, importava nada menos que diminuir as attribuições do poder executivo, e assumir o poder legislativo aquellas que não lhe compelem pela letra da carta. Demais, a interpretação que desse a camara dos deputados, de nada valia; podia ella intende-lo assim, e a camara dos pares intende-lo de outro modo, e ainda de outro modo intende-lo o poder moderador. Mas eu intendo que por umas côrtes ordinarias não podem ser interpretados artigos da carta, que tractam das attribuições do poder executivo, porque é expresso na constituição_ que o que diz respeito a direitos civis do cidadão e attribuições dos differentes poderes politicos, é constitucional, e só póde ser alterado ou interpretado por côrtes com poderes especiaes; e se nós resolvessemos a proposta do sr. Cunha, seguir-se-ía que podiamos dar esta interpretação, como já se deu outra que não se devia dar, sem que eu reconheça que as côrtes que a fizeram, tivessem poder para isso.

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Eu convenho que a minha proposta vá a uma commissão, porque não quero de maneira nenhuma prejudicar a resolução do projecto que está em discussão; por consequencia peço licença á camara para a retirar, visto que póde dar logar a uma larga discussão, e esta larga discussão póde fazer» com que o projecto não seja resolvido; mas desejo que a minha proposta vá u uma commissão para sobre ella dar o seu parecer.

Foi retirada a proposta.

O sr. Alves Martins: — Eu voto a favor do projecto tal e qual está, porque não são 45$000 réis nominaes, mas são com o abatimento de 25 por cento, e porque esta pensão é temporaria, pois que é só para a educação do filho do coronel Cardozo. Eu sou muito remisso em votar pensões, mas esta pensão é da natureza daquellas que não ha ninguem que resista a ellas. Eu intendo que a razão especial que levou a camara a votar esta pensão, é o estar a camara ligada regeneração (Apoiados) e quando se juntam sentimentos de humanidade com a justiça, não ha sobre que hesitar.

O marechal Saldanha não estava no Porto, quando teve logar -a revolta, ou antes, barulho, porque não se lhe póde chamar revolta; por casualidade ainda ouvi os tiros de que o coronel Cardozo foi morto. A camara ouviu já, na discussão que teve logar, que este militar morreu querendo manter a disciplina no seu corpo; talvez seja a unica excepção que temos tido, porque os militares morrem no seu posto, mas no fogo, e assim muitos têem morrido; mas este morreu chamando á ordem os seus soldados insubordinados, morreu dentro do quartel no meio de um barulho horrivel. Creio que isto o de toda a consideração; e ha mais ainda, que o duque de Saldanha estava á frente do movimento, e sendo esta a unica victima que houve nesse movimento, senão se désse uma pensão para a educação do unico filho que tinha, creio que não se faria justiça.

Por consequencia, eu intendo que a pensão deve votar-se, e se não houvessem outros documentos que mostrassem os sentimentos de humanidade do duque de Saldanha, bastaria este para os patentear. Não direi mais nada, e julgo que a camara deve votar isto sem mais discussão,

Vozes: — Votos, votos.

O sr. Presidente: — Não ha mais ninguem inscripto; vai-se votar o projecto na generalidade. Foi approvado.

O sr. Maia (Francisco): — Peço que se dispense o requerimento para se discutir já na especialidade.

Assim se resolveu.

Entrou em discussão o artigo 1.º

O sr. Barão de Almeirim: — Sr. presidente, eu acabei de votar pela generalidade do projecto, mas não posso approvar o artigo 1.º tal e qual está redigido, porque concordando eu no que é justo que se conceda a este menor uma pensão para a sua educação e sustentação, intendo comtudo que a pensão que se propõe, é muito superior áquillo que se deve conceder, porque uma pensão de 45$000 réis é muito subida para o que é concedida, isto é, para a sustentação e educação de um menor.

Todos nós sabemos que em todos os collegios se recebe educação pagando-se apenas 12$000 réis, ou o maximo 3 moedas cada mez; portanto, já se vê, que para a educação deste menor não será necessario conceder mais do que uma pensão, quando muito, de 3 moedas; e além disso deve conceder-se-lhe mais alguma cousa para o seu vestuario, e outras despezas necessarias para a sua educação. intendo, pois, que se deve conceder a pensão, mas em logar de ser de 45$000 réis, proponho que seja de 5 moedas mensaes; porque julgo esta quantia sufficiente, não só para pagar a sua educação e sustento no collegio, mas tambem as outras despezas que já apontei.

Quando aqui se tractou deste objecto pela primeira vez, vi combater a proposta do sr. Silva Pereira, na qual se pedia que esta pensão fosse reduzida. Disse-se então — que em virtude da carta pertence ao poder executivo o conceder pensões por serviços feitos ao estado; e que por consequencia não se podia mexer na verba proposta, isto é, que a camara não podia alterar a cifra proposta pelo governo para esta pensão — eu intendo, porém, que com quanto a iniciativa seja do governo, todavia a camara tem direito de, intervir, se assim julgar conveniente, na somma que se estabelece para esta pensão. (Apoiados) Se isto assim não fôra, então para que fim vir aqui a proposta do governo? Se fosse simplesmente para a approvar, então não era necessario que se estabelecesse a cifra; bastava só que o governo dissesse — em consequencia dos serviços prestados por este ou aquelle individuo, deve conceder-se-lhe uma pensão — mas uma vez que o governo, na proposta que apresenta, marca a cifra que se deve conceder, é claro que a camara tem o direito de intervir na quantidade proposta, para a augmentar ou diminuir. (Apoiados)

Concluo, pois, dizendo que se deve conceder uma pensão para a sustentação e educação do menor de que se tracta, não de 45$000 réis como o governo e a commissão propõem, mas sim de 5 moedas mensaes.

O sr. J. J. Tavares: — Sr. presidente, o objecto da discussão, tão circumstanciado como vai sendo, prende toda a minha attenção, e occupa toda a minha sensibilidade. Supponho bem digna de ser transmittida á posteridade uma medalha de ouro, que n'uma face represente o cadaver desse valente militar, que preferiu antes perder a vida, com todas as suas esperanças seductoras, do que faltar ao seu dever; e junto delle um Ínclito general que, no cam-

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po da batalha, nunca deixou de ser magnanimo e generoso para com os seus inimigos vencidos, admirando o valor, e chorando dolorosamente a perda de tão honrado official, não obstante ser seu adversario, como chorou Cezar, quando, no porto de Alexandria, lhe apresentaram a cabeça de Pompeo, seu rival. Na outra face da medalha deve-se representar o nobre duque de Saldanha, entrando nesta casa, e trazendo, como pela mão um menino, pedindo á camara uma pensão para ser educado e sustentado, a qual lhe é unanimemente concedida com toda a benevolencia e generosidade. Porém, para que a composição desta medalha possa ser em tudo completamente verdadeira, é necessario ainda uma outra circumstancia, qual é que a camara vote a pensão tal qual foi pedida pelo nobre marechal, e proposta pela illustre commissão de fazenda.

Sr. presidente, alguns dos meus illustres collegas suppõem esta pensão demasiada e excessiva; mas não é assim; muito principalmente se a considerarem em relação ao acontecimento inexplicavel, e ás circumstancias desgraçadas que a motivam. Exemplos tão extraordinarios e proveitosos, acções tão heróicas e tão pouco communs devem ser sempre rasgadamente apreciadas. Um premio concedido a tempo é muitas vezes um dos maiores productores do merecimento e das acções nobres.

Peço por tanto aos meus illustres collegas que não deixem de aproveitar esta occasião de darem ao mundo um testemunho incontestavel de que são justos e generosos em promover e recompensar o merecimento e as virtudes.

O sr. Presidente: — Vou propôr á resolução da camara o artigo, ficando salvo — o quanto — e depois de approvado — o quanto — de pensão, então proporei a emenda.

Foi approvado o artigo 1.º quanto ao principio de conceder-se a pensão e sendo depois rejeitada a emenda do sr. D. Rodrigo, que propunha, que a pensão fosse de 24$000 réis, foi approvada a quantia de 45$000 réis que se contem no artigo.

Foi lido o artigo 2.º, e a emenda a elle offerecida pelo sr. Gomes, a qual sendo rejeitada, foi depois approvado o artigo 2.º

Entrou em discussão o artigo 3.º

O sr. Avila: — O artigo em discussão diz — que a pensão será satisfeita ao interessado desde o dia do fallecimento de seu pai, pelas vacaturas que forem occorrendo nas classes inactivas em conformidade do artigo 4.º da lei de 10 de novembro de 1841 — Parece-me que a redacção deste artigo não é boa; por que não era possivel que se sujeitasse esta pensão ás regras estabelecidas na carta de lei de 16 de novembro de 1841, e se marcasse ao mesmo tempo a época desde a qual a pensão se deve contar; uma cousa destroe a outra. Acho que esta parte já não tem nada com a questão da pensão: o que me parecia portanto melhor e mais logico era retirar o artigo (Apoiados).

Peço á illustre commissão de fazenda, ao governo, e principalmente ao sr. ministro da fazenda, que tenham a bondade de attender a que nas diversas leis de receita e despeza, que se tem votado desde 1819 até hoje, em todas ellas se tem estabelecido — que para nenhuma pensão se possa abrir assentamento para ler cabimento, se não lendo vagado o dobro dessa pensão em relação ao ultimo assentamento.

Logo é evidente que desde o momento em que esta pensão fôr approvada pelo corpo legislativo tal qual se acha no projecto em discussão, o sr. ministro da fazenda ha de mandar examinar se ha cabimento para ella, e caso que o haja, então é que s. ex.ª a póde mandar pagar: não é possivel que no projecto se estabeleçam duas idéas que são inteiramente contrarias, e que se destroem uma á outra. O fixar a época desde a qual se ha de marcar o pagamento, e o estabelecer por outra parte que o cabimento só terá logar segundo as prescripções da carta de lei de 16 de novembro de 1841, é uma cousa inteiramente impossivel: são duas idéas que mutuamente se destroem, como já disse, e repito.

Parecia-me portanto, que o mais conveniente era eliminar o artigo, 3.º, seguindo-se a respeito desta pensão a regra geral, com o que se evitam inconvenientes graves, e não peoro muito a sorte do agraciado. No entretanto, a camara fará aquillo que melhor intender.

O sr. D. Rodrigo de Menezes: — Na realidade não posso comprehender este artigo em discussão, e folgo muito que elle não venha na proposta do governo. Intendo que a idéa da illustre commissão foi reportar-se ao artigo 4.º da lei de 16 de novembro de 1841, o qual manda que o cabimento de qualquer pensão só lenha logar quando vagar o dobro.

A querer-se conceder o vencimento da pensão desde o dia em que foi decretada, isso augmentaria consideravelmente a despeza publica porque ha pensões dadas a viuvas, ha 3 ou 4 annos, isto é, desde a morte de seus maridos, e se a lei tem effeito retroactivo para uns, tambem o ha de ter para outros, se o tem pura o individuo de quem se tracta, tambem o ha de ler para outras pessoas que se achem nas mesmas circumstancias.

O sr. C. Gomes: — Eu, sr. presidente, á vista do que dispõe este artigo 3.º, intendi, que o unico meio que havia de se conciliar a sua primeira parte com a segunda, era dar ao filho do coronel Cardozo, quando houvesse cabimento em pensões, não só os 45$000 réis mensaes, mas tambem o necessario para o indemnisar dos atrazados, a contar do dia do fallecimento de seu pai: pareceu-me que era isto o que se pretendia; e como eu não convenho nesta theoria, foi por isco que mandei para a mesa a minha substituição.

O sr. Avila já disse que não era possivel pagar esta pensão, senão depois della ter cabimento, como dispõe a carta de lei de 16 de novembro de 1811, e parece-me que neste ponto ninguem pode ir com bom fundamento de encontro á opinião de s. ex.ª Sendo pois isto assim, e não me parecendo muito rasoavel a doutrina que pelo artigo se estabelece, foi o motivo porque mandei para a mesa a minha substituição, pela qual ainda ensisto.

O sr. Carlos Bento: — Parece-me que a questão não é tão simples como a apresentou o illustre deputado, que se senta do outro lado. S. ex.ª intendeu que era conveniente a suppressão do artigo, mas a minha opinião é que a suppressão deste artigo desfigura o pensamento do projecto, e tanto isto é assim que o illustre deputado que se senta no banco superior, e que neste momento acaba de fallar, tambem intende que se não deve marcar a data desde quando este pensionista deve começar a receber, quer dizer que só comece a receber desde o dia em que esta pensão

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tiver cabimento em conformidade da lei existente. Eu intendo porem, que é indispensavel marcar-lhe a data desde quando o pensionista tem direito a receber, visto que esta pensão que se concede, não é uma pensão da natureza de todas as outras: esta pensão não é daquellas em que o prestacionado espere que lhe toque a sua vez para poder entrar nas vacaturas, porque, pelo projecto, passada que seja a idade de 25 annos, já não tem direito a receber nada. Póde-se dar a hypothese de effectivamente não haverem vacaturas até á épocha em que complete a idade que no projecto se lhe marca. Supponhamos que ha pertinacia em viver da parte dos pensionistas, e que não morre nenhum até á épocha marcada no projecto. De que lhe serviria então conceder-lhe esta pensão? Faremos nós as leis só para ter o gosto de as vêr ficar no papel?

Por tanto, sr. presidente, eu sou de voto que se declare a data desde a qual o interessado tem direito a receber a sua pensão, e neste sentido não poiso concordar na suppressão do artigo.

O sr. Avila: — Eu não desejo que a camara vote um absurdo, e por isso desde o momento em que a camara decretar que esta pensão começa desde a morte do coronel Cardozo, não se deve de modo nenhum fallar no artigo 4.º da lei de 16 de novembro de 1841, o qual estabelece quando deve ter logar o cabimento.

Se a camara quer votar a primeira parte do artigo 3.º, isto é, se quer que a pensão fique valendo para todos os effeitos desde a morte do pai do agraciado, então é necessario que no artigo se diga sómente = esta pensão assim concedida será satisfeita ao interessado desde o dia do fallecimento de seu pai = mas dizer-te no mesmo artigo = que esta pensão terá logar pelas vacaturas que occorrerem nas classes inactivas, na conformidade do artigo 4.º da lei de 16 de novembro de 1841 = com isto é que eu não posso concordar, porque o reputo uma verdadeira contradicção.

Se o artigo 3.º estivesse redigido da maneira que acabo de indicar, eu pelas mesmas razões politicas, porque, fallemos claro, esta pensão tem rigorosamente um caracter politico: aqui não ha unicamente a consideração dos serviços do coronel Cardozo, ha um pensamento politico e generoso que eu abraço: mas digo, se o artigo 3.º estivesse redigido da maneira que acabo de indicar, eu votava por elle da mesma maneira que votei pelo artigo primeiro. Mas não me parece que seja eu que deva propôr essa redacção, mas sim o governo, ou a illustre commissão de fazenda.

O sr. Santos Monteiro. — A commissão não (em duvida em concordar com a suppressão das ultimas palavras do artigo 3.º

O sr. C. Gomes. — Sr. presidente, peço que a camara attenda ao passo que vai dar. A lei de 16 de novembro de 1841, querendo que as nossas finanças não fossem absorvidas em pensões, estabeleceu a salutar providencia, de se não dar pensão sem que vagasse o dobro da quantia necessaria para ella; a camara irá agora abrir o primeiro precedente em contrario, precedente que será repelido, e que annullará aquella lei, e trará o desbarate da fazenda. Tenho muito pezar de não saber que este projecto havia de ser discutido hoje, porque me falla uma demonstração, que desejava apresentar á camara, onde se vê que dos individuos que vencem pelo thesouro, ha quasi tantos inactivos quantos os activos. O paiz carece de um exercito para a sua defeza paga a 20 mil e tem de pagar a quasi outros 20 mil individuos inactivos; o paiz carece de quem lhe administre justiça, ha de sustentar dous quadros de magistrados; e assim a respeito dos outros rumos. É neste estado de coisas que se quer abrir a porta á concessão de pensões, e concedel-as com antedata de 2 annos!!...

Não se impressione a camara com a observação que se fez, do haver a circumstancia especial de ser necessaria a pensão para a educação do pensionista. Admittir esta razão é revogar a lei de 1841. Pois o que importam as pensões que se concedem? Alimentos a necessitados: pois havemos de fazer excepção para a pensão que se destina a educar um mancebo, e havemos de dizer á viuva de um general, que espere que haja cabimento para ter meios de se alimentar? Não digo que não haja razão para aquella, mas é ella ainda maior para o geral das pensões; e, sobre todas as razões, ha a da possibilidade do thesouro. Portanto não se retirando o ai ligo 3.º, voto pela mesma emenda.

O sr. Justino de Freitas: — Sr. presidente, o argumento apresentado pelo illustre deputado, que me precedeu, não colhe para o caso em questão, porque as pensões concedidas ás viuvas, e outros individuos, não são de caracter temporario, como esta de que se tracta agora, porque concede-se unicamente até que este mancebo tenha 25 annos, e por esta rasão é preciso marcar a data desde a qual este pensionista deve principiar a receber, porque do contrario póde dar-se o caso delle ficar reduzido a receber só metade do tempo que se lhe quer conceder, ou quando tivesse logar o recebimento pela regra geral, já passasse da idade que no projecto se lhe marca.

Sr. presidente, ainda ha outra rasão. Os outros pensionistas desde que começam a receber, recebem durante toda a vida: póde uma viuva receber durante 30 ou mais annos uma pensão, mas este moço a quem o projecto diz respeito, recebe só 10 annos.

De mais a mais esta pensão tem um caracter politico, e já na camara se tem ponderado as rasões de conveniencia politica, que acompanham esta pensão, e portanto voto pelo projecto, julgando não ler mais nada a accrescentar.

O sr. Carlos Bento: — Sr. presidente, eu aprecio devidamente o pensamento politico, que me parece existir neste projecto, mas, sr. presidente, tambem não desconheço a importancia das considerações que apresentou o illustre deputado que se senta nos bancos superiores.

Eu intendo que a artigo em discussão não está bem claro, nem está redigido de maneira, que não apresente alguns inconvenientes. Ora, quando se apresentou este projecto, argumentou-se que não ia augmentar a despeza, porque para ter logar o cabimento desta pensão, era necessario que no respectivo quadro das vacaturas houvesse duas vagas, em conformidade da lei existente, para então poder ter logar a realisação desta despeza. Tem-se feito valer este pensamento, que tambem foi approvado por mim. A camara quando vota uma pensão a uma viuva, reconhece que se acha em más circumstancias, e parece que a logica pede que ella a receba immediatamente; porém não acontece assim, ha a consideração do orçamento, tambem para não ser illusoria esta pensão. Eu não combato a concessão desta pensão, mas o que me parece indispensavel, é que não

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é muito conveniente affastar-se a camara da regra geral em quanto a pensões; até mesmo porque o interessado póde tambem fazer operações de credito sobre esse fundo, que se lhe concede para poder viver; é o mesmo que acontece ás outras classes inactivas, porque desde que se lhe concede uma pensão, tem de ter uma entrevista com o agiota, e negociar sobre a concessão que as camaras lhe fizeram.

Por conseguinte, sr. presidente, estabeleça-se embora uma outra época em quanto á data do vencimento dessa pensão; mas intendo que não nos devemos affastar da regra geral; porque ella e tão benefica e recommendada nas circumstancias em que nos achamos, que não podemos de maneira nenhuma advogar a causa do projecto, com violação da regra geral estabelecida pela lei de 1841.

O sr. Passos (Manoel): — Sr. presidente, o negocio é serio e grave. A camara está impressionada com a idéa de fazer economias; é essa a primeira necessidade do parlamento, é o que reclamam os interesses z do paiz. Mas a camara está tambem impressionada com a idéa de um grande infortunio, o do ultimo orfão que as dissensões politicas legaram á sua consideração. A camara reconhecendo isto, vota os meios de prover á educação deste orfão, o ultimo que nos legou a guerra civil; porém se o artigo foi approvado como está redigido, a camara ou vota uma inutilidade, ou viola um grande principio para organisação da fazenda publica. A camara não póde sacrificar o principio, consentindo que uma pensão seja inscripta, sem que o dobro da quantia em que importa, se ache em disponibilidade; quero dizer — não se póde dar uma pensão de 500$000 réis, por exemplo, sem ter vagado 1:000$000 réis. Mas a camara obedecendo a este principio não vota a este orfão cousa alguma para a sua educação; é preciso entregal-o á agiotagem e credito; é preciso entregal-o á miseria.

A intenção da camara é prover desde já á educação deste orfão; por consequencia a proposta do sr. Gomes é justa; mas se nós formos applicar o rigor do principio, e não dermos cabimento a esta pensão, senão quando houver uma vacatura, o orfão não tem meios para educação, senão se entregar á agiotagem, o que de certo a camara não quer.

Por consequencia intendo que este negocio não pode ser considerado como pensão, nem está na regra geral das pensões. O que a camara vota, é uma despeza extraordinaria, votando como tem votado muitas vezes os meios para alguns estudantes irem a Coimbra ou a outras partes estudar: vota para prover á educação deste mancebo, e diz ao sr. ministro da fazenda, que inclua no orçamento, na conformidade desta lei, a despeza que propõe, por espaço de 10 annos, e acabados estes 10 annos cesse esta despeza.

Portanto estou persuadido que se a illustre commissão de fazenda redigisse o projecto desta fórma, e que em logar de pensão declarasse que era um subsidio, venciam-se todas as difficuldades, satisfazia-se ao pensamento da camara, porque se davam meios reaes de educação a este orfão, e ao mesmo tempo não se quebrava o grande principio que se tem adoptado para diminuir as despezas publicas.

Na questão de pensões póde a camara dispensar esta da regra geral, mas a camara deve meditar que o primeiro exemplo que ella der a este respeito, é uma porta aberta para immensos abusos de que o paiz se ha de ressentir. Por consequencia voto que este projecto volte á commissão, para ler redigido de outro modo.

O sr. Ministro da fazenda (Fontes Pereira de Mello): — Sr. presidente, eu não desejo, nem o governo deseja, que a camara viole a regra estabelecida pela carta de lei de 16 de novembro de 1841, para melhor garantia da economia da fazenda publica, e tanto o governo o não deseja, que no decreto que deu a origem a este projecto, vem consignada essa idéa, assim como vem tambem consignada no projecto pela illustre commissão de fazenda. Entretanto um sr. deputado do lado direito da camara, o sr. Avila, notou que parecia haver uma certa contradicção entre as prescripções do artigo em discussão e a sua lettra, porque em quanto dizia n'uma parte que a pensão será paga ao pensionista desde o fallecimento de seu pai, dizia depois, na conformidade da carta de lei de 16 de novembro de 1841. A razão, sr. presidente, porque o artigo foi redigido assim, e não sustento a perfeição da sua redacção, isto é, o pensamento que dominou o governo e a illustre commissão foi o de que naquella época havia logar para cabimento desta pensão, porque em abono da verdade (e isto não é só relativo a esta administração, mas a administrações interiores) o numero das pensões que se tinham dado, era inferior ao numero da vacaturas que então existiam; por consequencia nessa época havia logar para cabimento, e determinando-se que se pagasse em relação ao dia do fallecimento de seu pai, satisfazia-se a um principio de justiça, e de generosidade politica para com esta victima das nossas dissensões politicas, e ao mesmo tempo mantinha-se o principio consignado na carta de lei de 16 de novembro de 1841, que a camara quer, e o governo tambem quer vêr conservado. Neste presupposto a camara não quebrava o principio que se quer sustentar, e satisfazia ao mesmo tempo aos sentimentos de generosidade que nella dominam, approvando o artigo como está redigido, na certeza de que eu por parte do governo me comprometto a que só esta pensão seja paga em relação á época do fallecimento do pai do pensionista, se acaso nessa época houver cabimento na conformidade da lei. Estou persuadido que foi neste presupposto que se redigiu o artigo como se acha, e votando-se assim, estão satisfeitos os desejos da camara, e se mantem o principio da caria de lei de 16 de novembro de 1841, que com tanto empenho se quer sustentar.

O sr. Vellez Caldeira: — Se se tracta da pensão, está isso decidido pela camara; agora quanto ao modo de a realisar, é que o não está, e o artigo da commissão não é sustentavel, porque está em opposição ao que dispõe o artigo 4.º da lei de 16 de novembro de 1841.

Pelo que respeita á declaração do sr. ministro da fazenda, de que o governo estava na intenção de manter integralmente as disposições da lei de 16 de novembro de 1841, s. ex.ª não pensou que com esta ambiguidade que se quer dar ao projecto, altera-se completamente a regra estabelecida naquella lei, a deixa-se uma poria aberta que a todo o tempo póde ser invocada para se seguir o mesmo exemplo.

O sr. Ministro da fazenda (Fontes Pereira de Mello): — Tomo a palavra para responder sómente ao illustre deputado na parte em que elle se referiu ás poucas palavras que acabei de dizer.

De certo que haveria contradicção no artigo, se

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acaso na época do fallecimento do pai do agraciado não houvesse cabimento em conformidade da carta de lei de 16 de novembro de 1841; mas, como eu já disse á camara, naquella época havia effectivamente cabimento para a pensão, porque felizmente as pensões concedidas durante os ultimos annos eram inferiores ao cabimento em conformidade da caria de lei de 16 de novembro de 1811. Foi neste presupposto que se redigiu o artigo assim como está; e em todo o caso o governo compromette-se, se porventura não houvesse cabimento para esta pensão desde a época do fallecimento do pai do orfão de que se tracta, a não fazer effectiva a pensão em quanto não houver cabimento. Desta maneira parece-me que não ha contradicção alguma, e póde-se satisfazer a ambos os preceitos do artigo, não só ao desejo da camara de abonar esse vencimento desde a época da morte daquelle official, mas ao mesmo tempo de manter intacto o principio consignado na carta de lei de 16 de novembro de 1841.

O sr. Vellez Caldeira: — Eu insisto ainda nos mesmos argumentos que apresentei, e concluo que ou o artigo é escusado, ou se vota uma excepção á regra estabelecida na carta de lei de 16 de novembro.

Não havendo mais ninguem inscripto, julgou-se a materia discutida, e foi approvado o artigo 3.º em todas as suas partes. — O artigo 4.º foi approvado sem discussão.

O sr. Silvestre Ribeiro (Sobre a ordem): — Estando presente o sr. ministro da marinha desejo que seja consultada a camara sobre se permitte que se tracte agora do requerimento que eu mandei para a mesa em outra sessão, pedindo alguns esclarecimentos ácerca das nossas relações com o Brasil; e que ficou adiado quanto á opportunidade da remessa, até s. ex.ª estar presente.

Consultada a camara, resolveu-se affirmativamente; e por isso entrou em discussão o seguinte:

Requerimento: — Requeiro que pelo ministerio, dos negocios estrangeiros sejam remettidos a esta camara, por cópia, os papeis officiaes que contém as explicações havidas no Rio de Janeiro entre o ministro rios negocios estrangeiros do imperio, e o ministro de Sua Magestade Fidelissima naquella côrte, em virtude dos quaes cessou a interrupção official entre o governo de Portugal, e a legação brasileira na côrte de Lisboa. — Silvestre Ribeiro.

O sr. Ministro da marinha (Visconde d'Athoguia): — Não ha a menor objecção em mandar á camara os documentos a que se refere o illustre deputado; tenciono junta-los ao meu relatorio, que dentro em muito poucos dias espero apresentar ao parlamento; mas, como não posso determinar o dia preciso para esta apresentação, se tiver mais demora do que supponho, antecipar-me-hei a fazer a remessa desses papeis, para satisfazer aos desejos do nobre deputado.

O sr. Silvestre Ribeiro: — Visto que não ha inconveniente nu remessa, o que peço é que s. ex.ª tenha a bondade de mandar esses esclarecimentos com a maior brevidade, porque poderá demorar-se a apresentação do relatorio. Nada mais tenho a dizer, reservando as reflexões que tenho a fazer sobre este assumpto para quando vierem esses papeis.

Posto á votação o requerimento, foi approvado.

O sr. Presidente: — Passa-se á discussão do projecto n.º 14. E o seguinte.

Pareceu (n.º 14..) — A commissão de fazenda, á qual foi enviado o parecer da commissão de instrucção publica, com audiencia da de guerra, sobre o projecto de lei apresentado pelo sr. deputado Julio Pimentel, auctorisando o governo a crear na escóla polytechnica um logar de substituto á 6.ª cadeira da mesma escóla, não encontra obstaculo á realisação do mesmo projecto.

Sala da commissão, 22 de março de 1853. =. João Damazio Roussado Gorjão, presidente interino = Francisco Joaquim Maia, vencido = Augusto Xavier Palmeirim = Justino Antonio de Freitas = Antonio dos Santos Monteiro = José Maria do Cazal Ribeiro = Visconde da Junqueira.

Projecto de lei (n.º 12 — G.) — A commissão de instrucção publica examinou com escrupulosa attenção o projecto n. 6 KK, apresentado a esta camara em sessão de 4 de março pelo deputado J. Pimentel, e que tem por objecto auctorisar o governo a crear na escóla polytechnica um logar de substituto á 6.ª cadeira, a qual é, segundo a lei da creação da mesma escóla, destinada ao ensino da chymica geral e suas principaes applicações ás artes.

O decreto, que creou a escóla polytechnica, estabeleceu, guiado pelos principios da mais severa economia, que as duas cadeiras de fysica e chymica tivessem um unico substituto, sem attender a que se podia dar o caso em que ambos os proprietarios daquellas cadeiras se achassem simultaneamente impedidos, como actualmente acontece, nem a que as conveniencias da instrucção publica exijam para o bom regimen das cadeiras em que se explicam aquellas sciencias, a existencia permanente de proprietarios e substitutos especiaes, cuja constante occupação seja o estudo e practica das mesmas sciencias, condições sem as quaes não se póde dignamente exercer o magisterio naquelles ramos dos conhecimentos humanos.

A economia, realisada com a suppressão de um substituto, imporia apenas a insignificante quantia de 400$000 réis, dos quaes se devem ainda deduzir os impostos a que hoje estão sujeitos os ordenados de todos os servidores do estado.

O prejuizo que deriva desta economia, é incomparavelmente maior do que a vantagem que ella offerece, pois são consequencias immediatas dellas: — 1.º o encerramento de uma das duas cadeiras, logo que se realise o impedimento simultaneo dos dois proprietarios; — 2.º a impossibilidade de habilitar professores especiaes para a regencia das cadeiras de fysica e de chymica; porque um unico substituto, ou ha de dedicar-se exclusivamente a uma das duas sciencias, que, apesar da sua mutua ligação é dependencia, têem occupações tão diversas, abandonando a outra; ou, querendo cultiva-las simultaneamente, com difficuldade se tornará eminente em qualquer dellas. E, como sejam na época actual a fysica e a chymica indispensaveis ao progresso das sciencias naturaes, e no aperfeiçoamento economico das nações, a vossa commissão, vendo que o projecto que lhe foi submeti ido, tende não só a tornar effectivo o bom regimen da escóla polytechnica, mas tambem a formar homens especiaes nos dois ramos mais importantes das sciencias fysicas, é de parecer que deve ser convertido em lei o seguinte projecto, com o qual tambem se conforma a commissão de guerra. Projecto de lei.

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Artigo 1.º É auctorisado o governo a crear na escóla polytechnica um logar de substituto á 6.ª cadeira da mesma escóla.

Art. 2.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da commissão de instrucção publica, em 12 de março de 1853. = Basilio Aberto de Sousa Pinto, vencido, e com voto separado = Francisco José Duarte Nazareth — Antonio Ferreira de Macedo Pinto = Manoel Joaquim Cardozo Castello Branco = Justino Antonio de Freitas — Julio Maximo de Oliveira Pimentel = José Eduardo Magalhães Coutinho.

Pertence ao n.º 12 — G. — Sou de voto que, em quanto se não provêr as necessidades da instrucção primaria, se não augmente a despeza da secundaria e superior; porque, ainda que nestas ha fallas, comtudo as daquella são mais importantes e urgentes.

E no caso de se julgar que ha recursos para acudir a todas: então proponho que se crie não só a substituição especial para a cadeira de chymica da escóla polytechnica, como propõe a commissão, senão tambem outras para as cadeiras de iguaes disciplinas na universidade e na academia polytechnica do Porto; porque estão em iguaes circumstancias, o não póde haver motivo para contemplar uma e despresar as outras. — Basilio Alberto de Sousa Pinto.

O sr. Maia (Francisco): — Sr. presidente, tendo sido remettido á commissão de fazenda o projecto da illustre commissão de instrucção publica, eu assignei vencido no parecer da commissão de fazenda, e então acho-me constituido na obrigação de declarar a camara o motivo porque assim assignei.

Sr. presidente, não serei eu de certo, que me opponha a creação de qualquer instituto de instrucção publica. Mais de uma vez em camaras eu tenho defendido a conservação de alguns estabelecimentos litterarios; mas por isso mesmo que eu desejo que a instrucção publica e augmente e progrida em todos os ramos que o paiz deseja e necessita, por isso é que assignei vencido este parecer.

Sr. presidente, a instrucção superior faz hoje uma despeza immensa. Não entro agora na questão, se é possivel reorganisar se de outro modo; parece-me que sim, o que vejo é, que ha muitos estabelecimentos, que tem cadeiras iguaes em uns e outro, algumas na instrucção secundaria, e outras na superior.

Sr. presidente, quando se estabeleceu esta escóla, os legisladores de então intenderam, e na minha opinião, intenderam muito bem, que nas duas cadeiras de chymica e física bastava um substituto, e a este elevar-se-lhe o ordenado a mais do que demandava esta instituição. Ora não me parece regular, que por um incidente, que póde não repelir-se, e havendo a lei prevenido o modo de supprir esta falla extraordinaria, se vá agora decretar uma despeza permanente, porque a exemplo dele tornar-se-ha ao antigo systema de lei em todas as cadeiras um substituto.

Parece-me que o governo poderá prover a este impedimento simultaneo dos dois lentes proprietarios, sem ser necessario fazer unia excepção a respeito de estabelecimentos litterarios. Se na escóla polytechnica não ha lentes, como eu creio que devia haver, que possam reger estas cadeiras, mediante uma gratificação, chamem-se de fóra quaesquer lentes que estejam habilitados convenientemente a explicai estas materias de chymica e física. Eu intendo que o ensino destas sciencias não esta limitado só a estes 2 lentes, porque já se deu o caso de estarem 4 cadeiras sem lentes proprietarios, que as regessem, não por impedimento temporario, mas por morte, e remediou-se este inconveniente, regendo uns as cadeiras de outros.

Sr. presidente, se acaso esta despeza permanente fosse necessaria, eu votaria por ella, porque, repito, não me recuso, sempre que seja preciso, a votar por tudo quanto é instrucção publica, porque sem ella não póde progredir o systema representativo; (Apoiados) mas quando vir que não é necessaria, hei-de oppôr-me a que se façam despezas, que depois privam de se crear outra instituição.

Parece-me, pois, que sem offender o auctor do projecto, que teve em vista prevenir este inconveniente, se póde occorrer a elle, sem ser necessario crear uma cadeira de substituto, e votar uma despeza permanente. Isto quanto á materia; mas quanto á fórma não póde ser concedida ao governo auctorisação para fazer esta creação, porque isso é da privativa competencia do corpo legislativo, o qual não delega estes poderes.

Voio portanto contra o artigo.

O sr. Julio Pimentel. — Sr. presidente, a razão mais forte apresentada pelo illustre deputado que acaba de fallar, para combater o projecto que eu tive a honra de apresentar á camara, foi a do augmento da despeza. Na verdade é uma verba nominal de 100$000 réis que se accrescentam no orçamento, considerando-se simplesmente, como parece, só o consumo, e não a producção. Mas na realidade será inutil a questão de que se tracta, será desnecessaria, será apresentada para accommodar algum afilhado, sela feita para augmentar mais o numero dos empregados publicos. Não é de certo Ninguem póde duvidar de que a cadeira de chymica na escóla polytechnica é uma cadeira absolutamente necessaria para a applicação dos diversos alumnos que alli frequentam.

Esta escóla habilita hoje para um grande numero de profissões, não só para as escólas especiaes, como para a escóla medico-cirurgica, farmácias, differentes armas do exercito, escóla naval; e ainda para muitas outras profissões que não tem escólas especiaes, em todas e necessaria a chymica, e para algumas é até o mais interessante e indispensavel de todos os estudos subsidiados. Não receio, pois, que se negue que o estabelecimento de uma cadeira de chymica na escóla polytechnica, que é necessaria para a instrucção de um glande numero de individuos, seja uma creação inutil.

Pelo que respeita á substituição da cadeira — a lei da creação da escóla polytechnica estabeleceu para as 2 cadeiras de chymica e física que são a 6.ª e a 7.ª que houvesse um unico substituto, em quanto que para as outras cadeiras de sciencias naturaes ha um substituto para cada uma dellas. Mas a practica já offerece grandes difficuldades na substituição destas 2 cadeiras por um unico substituto, por que dando se o caso que agora se dá, e que póde repetir se não só por este motivo, mas por outros, tem de vêr-se a escóla polytechnica na necessidade de ter as duas cadeiras fechadas, porque o unico substituto, com os poucos recursos que tem, não póde prestar-se a fazer a substituição em ambas essas cadeiras, nem mesmo a lei o obriga a isso. E ainda quando

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podesse, se apparecesse a circumstancia particular que póde dar-se de estar impedido o unico substituto por estado de saude, ahi estavam fechadas as duas cadeiras mais importantes da escóla polytechnica, sem poder supprir-se este inconveniente.

Sr. presidente, o suppôr que um unico homem esteja em estado de substituir ambas as cadeiras, é suppôr uma cousa que não se póde apreciar. Ainda que entre as duas sciencias apparecem relações muito intimas, comtudo para reger bem qualquer dellas é necessario uma constante applicação, porque cada uma de per si encerra objectos vastissimos, e que demandam um serio estudo nos seus progressos.

A idéa do sr. Maia, de fazer com que as cadeiras sejam substituidas com professores convenientemente habilitados, chamados de fóra para as regerem mediante uma gratificação, é inadmissivel: em primeiro logar, porque se oppõe á organisação da escóla, e por esta circumstancia não se ha-de transtornar essa organisação. E demais que provas tem o governo de que esses individuos estão ou não convenientemente habilitados para reger essas cadeiras?

A razão principal deste projecto não é tanto a necessidade de substituir os dois professores que estão impossibilitados presentemente de exercer o magisterio. A sua maior conveniencia, e a razão mais importante que me moveu a apresental-o, é a necessidade absoluta que ha de homens especiaes para estes estudos. —

Tem-se dicto muitas vezes, e disse-se ainda hoje, que se tracta muito da instrucção superior, e não se cuida da instrucção primaria; se isto não é um calambur, é um epigramma. Na verdade a instrucção primaria é necessario que se espalhe por todo o paiz, mas esta só por si não satisfaz a todas as necessidades do estado. E necessario habilitações para diversos encargos publicos e diversas profissões; essas habilitações não se adquirem só no ensino primario; hão de colher-se na instrucção superior. Não sei como podesse avançar-se, que ha instrucção superior de mais no paiz. Quaes são os homens notaveis, quaes os sabios que leiu feito avançar as sciencias entre nós! Quando la fóra o movimento das sciencias em todos os paizes é ião rapido, Portugal (algumas excepções áparte) não apresenta nenhum homem notavel nas sciencias.

Nós não lemos na realidade homens especiaes para a necessidade do ensino. Em gera), para cada uma dessas sciencias é preciso crear esses homens, esses homens não se criam, não se podem crear senão por estimulos, senão proporcionando-lhes os meios de poderem entregar toda a sua vida, todos Os seus cuidados ao estudo das sciencias; não é possivel estar a par da sciencia, sem a estudar constantemente: é preciso estar habilitado para os trabalhos practicos. O ensino das sciencias hoje não se póde fazer, como se fazia dantes, estudando uma lição na vespera, para no dia seguinte a ir iccilar; (Apoiados) 'á preciso que o homem que ensina qualquer sciencia, esteja ao facto do estado actual della; sem isso é impossivel reger uma cadeira, de modo que possa satisfazer ás necessidades do ensino, com honra sua e proveito de seus discipulos. Esta foi a rasão principal, o motivo mais poderoso que obrigou a apresentar o projecto em discussão. É necessario crear os homens especiaes; não póde haver professor sufficientemente habilitado para reger uma cadeira, para desempenhar cabalmente todas as obrigações de seu cargo, sem estar constantemente ao facto dos progressos da sciencia. Convencido pois desta necessidade, propuz o projecto em discussão, pelo qual ainda voto (Apoiados).

O sr. Pinto de Almeida: — Sr. presidente, está em discussão, na sua generalidade, o projecto n.º 11, pelo qual é auctorisado o governo a crear na escóla polytechnica desta cidade mais um logar de substituto á 6.ª cadeira da mesma escóla.

Eu voto contra o parecer dado pela commissão de instrucção publica, não só por ser augmento da despeza; mas por ser uma injustiça o conceder um substituto mais á escóla polytechnica, quando esta tem mais substitutos que nenhum outro estabelecimento litterario; e eu pergunto, se a camara deve conceder á escóla polytechnica de Lisboa mais um substituto, quando esta tem pelo decreto de 18 de janeiro de 1837 dez cadeiras, e oito substitutos: e se lhe concedermos mais um, veiu a ler quasi tantos proprietarios como substitutos.

A polytechnica do Porto, pelo decreto de 13 de dezembro de 1837, tem onze cadeiras e seis substitutos, e a universidade de Coimbra tem nas faculdades de mathematica e filosofia, pelo decreto de 20 de setembro de 1844, quatorze cadeiras, e sete substitutos.

Que igualdade existe entre este estabelecimento litterario, para que se pede um substituto; e estes dois ultimos que acabo de mencionar? Direi affoitamente, que nenhuma. Então para que ha de a camara dalli polytechnica desta cidade mais um substituto, e não o dar ás outras escólas de que fallei 7 Por ventura não tem vindo a esta camara o ministerio pedir duzias de empregados para accumularem as funcções de deputado, com os seus empregos? Tem. E o que é mais, e que veiu pedir até um deputado para ir exercer uma commissão fóra desta cidade, que foi o sr. Baldy, contra o que eu votei, porque não admitto deputados honorarios; e a camara negou-lhe? Não.

Porque não ha de o governo vir pedir á camara os dois dignos professores para exercerem cumulativamente as funcções do magisterio com as de deputado? Não serão elles capazes? São de certo pela sua vasta intelligencia, e tanto é verdade, que um delles, se não me engano, está exercendo algumas sete commissões, e mui importantes, tanto na camara, como fóra della.

Sr. presidente, uma das razões que se dá para fazer passar o projecto em questão, é o serem deputados os professores de physica e chimica, de que se tracta, E quem nos diz a nós que o individuo que fôr nomeado substituto, ámanhã não será eleito deputado? E sendo-o, já se vê que trarão á camara outro projecto para mais um substituto, e deste modo leremos, não digo mais substitutos que proprietarios, mas talvez mais substitutos que discipulos; (Apoiados) e assim a despeza aonde irá parar?

Eu intendo que o projecto é escusado, porque lemos o regulamento de 25 de junho de 1851, que desde o artigo 26.º inclusivè até ao 28.º diz a maneira e o modo por que se devem reger as cadeiras, dizendo quem as ha de substituir na falta dos substitutos e proprietarios. Este regulamento diz, que se chame um professor de uma das outras cadeiras, ou substituto que a vá reger; e não havendo, que convide até algum lente jubilado, ou pessoa de fóra in-

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telligente que a vá reger. Qual é melhor o fazer-se uma pequena despeza, e temporaria, ou uma permanente?

Não tem a sexta cadeira um substituto? Tem. Não será este bastante, tanto mais quando estas duas aulas de física e chimica são alteradas como estas? De certo o é. Então para que lhe dar outro?

Concluo dizendo, que se se conceder mais um substituto para a escóla polytechnica de Lisboa, deve a camara concedel-o com mais razão para a universidade de Coimbra e escóla polytechnica do Porto, porque tem menos substitutos que a escóla polytechnica de Lisboa.

Eu desejo muito e muito que a camara, longe de augmentar a despeza, que é o que se tem feito, ainda que não com o meu voto, tracte de fazer economias, que é o que o paiz reclama muito, e com muita razão. (Apoiados)

O sr. Pegado. — Sr. presidente, darei alguns esclarecimentos á camara sobre a necessidade do serviço da minha escóla, em quanto aos professores substitutos. Não me parece proprio argumentar, dizendo, que se não deve dar a uma escóla o que se não der a alguma outra. Se alguem se persuade, que ha alguma cousa, que se chame rivalidade, entre as escólas ou estabelecimentos scientificos, eu não possuo taes sentimentos; pelo. contrario, a mais perfeita harmonia se dá entre os collegas da escóla e da universidade; e esta amisade satisfaz-me muito, porque é uma cousa que deve honrar muito ambos os estabelecimentos. (Apoiados) Pensar ou sentir de outra fórma, está muito abaixo da posição de lentes e de deputados. Tudo quanto ha a fazer é examinar, se a escóla polytechnica precisa, com effeito, de mais 1 professor supplente. Se a universidade, ou se a academia do Porto precisar de mais pessoal, representando, certo estou de que o poder legislativo não deixará igualmente de lhe attender.

A escóla precisa de mais um professor supplente, não é por se acharem na camara dois dos seus lentes; mas porque de ha muito tempo se reconhece essa necessidade. Logo quando a escóla se creou, a commissão, que elaborou o projecto, viu, que eram precisos tantos lentes supplentes, quantos eram os proprietarios. Se o não fez, foi por não dar causa, ou pretexto, ao que se chama então rivalidade, clamando-se contra a despeza, que um quadro de pessoal maior acarretaria, No estado actual das sciencias não e possivel deixar de ter para cada cadeira um proprietario e um supplente. Todas as nossas legislações attenderam a isto mesmo, como vou demonstrar.

Na academia real da marinha, que em 1837 foi incorporada na escóla polytechnica, havia sómente tres cadeiras mathematicas, que tinham tres lentes proprietarios, tres lentes substitutos ordinarios, e um lente substituto extraordinario, que vencia o mesmo ordenado e tinha os mesmos direitos que os ordinarios.

As cadeiras filosóficas da nossa universidade sendo selo, tem seis supplentes; pois assim devem ser considerados os tres substitutos ordinarios, e os tres demonstradores; e além disso, ha os oppositores, que são substitutos extraordinarios. De modo que na universidade só póde ficar alguma cadeira fechada, quando ha vacaturas, por falla de pertendentes ao magisterio, como tem acontecido á faculdade de mathematica; pois não ha menos de 3 classes de supplentes, como acabo de mostrar.

E quaes são os professores supplentes na escóla polytechnica? Unicamente os substitutos privativos: e a cadeira de chimica não o tem. Os substitutos das outras cadeiras não pódem leccionar em chimica, porque são precisos para as suas cadeiras privativas.

Sr. presidente, peço licença á camara para notar que os lentes substitutos da escóla polytechnica não são o que até 1837 se chamavam em Portugal — lentes substitutos. — O artigo 9.º da lei da escóla diz: Os lentes substitutos servem para fazer as vezes dos proprietarios nos seus impedimentos, e para os ajudar nos casos, e pelo modo que o conselho da escóla determinar.

São pois os substitutos na escóla polytechnica, os ajudantes dos proprietarios. A escóla não tem demonstradores, como tem a universidade; os seus substitutos fazem todo o serviço de supplentes ás cadeiras, de ajudantes e de demonstradores. E porque quiz a lei que isto assim fosso? E porque nas modernas instituições denominadas — escólas polytechnicas — o methodo do ensino é todo diverso do das faculdades das sciencias. Segue-se o methodo chamado das repetições, caracteristico dos institutos polytechnicos, instituto destinado a preparar e formar discipulos em conhecimentos fysico-mathematicos para as profissões scientificas thechnicas. A indole e organisação das escólas polytechnicas é diversa da indole e organisação das faculdades das sciencias.

Nesta opinião tenho eu do meu lado todos quantos têem escripto sobre o ensino, a legislação dos paizes mais adiantados, e finalmente os meus collegas e mestres na universidade, que constantemente têem proferido que as faculdades são instituições mui differentes em seus objectos o fins das instituições denominadas polytechnicas.

Nos institutos polytechnicos ha prelecções, repetições semanaes, mensaes, trimestres, trabalhos gráficos, manipulações, e ensaios. Ha repetições e lições auxiliares nas chamadas salas do estudo. Todos estes trabalhos houve nos primeiros annos da escóla: alguns cessaram depois que se nos queimou o edificio onde estavamos. As manipulações chimicas têem sem -pie havido até hoje E quem coadjuva os proprietarios em tão variado serviço, são os substitutos; e não lemos a classe de repetidores, que todos os institutos polytechnicos têem. Nas faculdades não ha este mecanismo especial do ensino. No actual estado da vastidão e aperfeiçoamento de todos os ramos da sciencias fysico-naturaes, se o substituto de zoologia o fôr tambem de fysica ou mineralogia, ou o de chimica o fôr de botanica, ele nunca chegaremos a ter nem chimico, nem botanico, nem mineralogista, ele. O que faz que os substitutos sejam ainda em alguns estabelecimentos indistinctamente de quaesquer cadeiras, é o preleccionar com o livro á vista — com o compendio aberto. (Apoiados) O estabelecimento, onde isto se practicar, difficilmente poderá florescer. Já se não professa assim nos modernos estabelecimentos. As prelecções são o que se chama actualmente lições vivas. O professor ora, faz uma lição toda sua, explica a sciencia, e não explica um livro. Se o professor é isto, não póde um professor supplente ir lêr na primeira cadeira em que faltar o proprietario por impedido, qualquer que seja o objecto della. Muito imperfeito deve ser o ensino feito pelo antigo systema de explicação de compendio. Mas, repito, para lermos bons professores substitutos.

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e forçoso e indispensavel, que cada um o seja de uma cadeira designada.

Se se quer pelo menos uma cadeira de chymica em Lisboa, é preciso que além do lente proprietario haja um supplemente. Em Lisboa ha outro motivo para haver para cada cadeira um supplente. Não poucas vezes o governo emprega em commissões temporarias os lentes de Lisboa, no que faz muito bem, porque as sciencias e os professores para utilidade practica e que servem.

Os lentes não pódem desempenhar as suas funcções de deputado e de professor, em quanto as côrtes estão abei las; elles vão pelos seus laboratorios e officinas vêr os trabalhos, ordena-los, inspecciona-los; mas tudo isto é mui differente de preparar as lições e as experiencias para as suas explicações, e desempenha-las como devem: porque, como já se notou, as prelecções actualmente não são feitas pelo antigo methodo, que se chamava explicar o compendio.

Muito me comprazo de vêr ao meu lado o meu discipulo na universidade hoje duas vezes meu collega, tirando generosamente alguns momentos das suas noites de descanço para os dar na instrucção á classe laboriosa dos seus eleitores: mas esse trabalho é sómente de algumas primeiras noções da chymica industrial, e em poucas noites do anno.

Mas em qualquer caso a questão é, que querendo uma cadeira pelo menos de chymica em Lisboa, é indispensavel, que essa cadeira lenha um supplente, lista questão é independente do caso especial e accidental de estarem na camara dois lentes. As leis antigas e modernas providenciaram para varios estabelecimentos, creando substitutos ordinarios e extraordinarios.

Intendo pois que a camara deve approvar o projecto que se discute.

O sr. Passos (Manoel): — Requeiro que v. ex.ª consulte a camara sobre se a materia está discutida na generalidade.

Julgou se discutida, e foi approvado o projecto na generalidade — E a requerimento do sr. Justino de Freitas dispensou-se o regimento, para se passar desde já á discussão especial.

O sr. Presidente: — A hora está a dar: a ordem do dia para ámanhã é a continuação da de hoje, e o projecto n.º 48 sobre a creação de um hospicio na cidade do Funchal, na ilha da Madeira, auctorisando Sua Magestade Imperial para asna creação: este projecto será o primeiro que ámanhã se ha-de discutir. Está levantada a sessão — Eram 4 horas da tarde.

O REDACTOR

José de Castro Freire de Macedo

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