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2588 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

bindo a 430.000:000$000 réis, e representando, sem contar com o ultimo emprestimo, um encargo annual de réis 13.000:000$000, pouco mais ou menos, que sommado aos 3.000:000$000 réis representativos de juros e amortisação de differentes obrigações emittidas, de emprestimo: para diversos fins, de transacções com os bancos para pagamento às classes inactivas, etc., perfaz a somma total de 16.000:000$000 réis, que significam o que annualmente pagamos pelo nosso recurso ao credito. Ora, sendo as receitas ordinarias do estado 31.000:000$000 réis pouco mais menos, mais de metade d'esta quantia é absorvida pelo pagamento dos encargos da nossa divida, que constantemente augmenta, porque ao passo que vamos sempre pedindo, a amortisação é illusoria.
Deve pintar-se côr de rosa uma situação financeira de tal modo desequilibrada? E serão funereas cassandras os deputados que ousam insistir em tão fatal situação, angustiosa já no presente, prenhe de gravissimas catastrophes no futuro?!
Se percorrermos o orçamento dos differentes estados da Europa e da America, a não ser de algum que esteja como a Turquia, em plena bancarota, encontrâmos não raro dividas publicas em absoluto muito maiores do que a nossa. Basta considerar a divida dos Estados Unidos, a divida ingleza e a divida da França. Mas estas enormes dividas, em primeiro logar explicam-se por acontecimento extraordinarios e anormaes; por exemplo a divida publica dos Estados Unidos é o resultado da lucta gigantesca eu que aquelle paiz se debateu durante tres annos arruinando, para redimir alguns milhões de escravos, a sua prosperidade e as suas finanças, e regando os campos de batalha da emancipação dos negros com o sangue de um geração inteira dos seus generosos filhos.
A divida publica de Inglaterra acha-se sobrecarregada com os encargos de numerosas operações financeiras indispensaveis para occorrer às despezas fabulosas das sua continuadas guerras commerciaes em todo o mundo.
A divida publica da França, alem de representar o preço das suas repetidas mudanças de regimen, das innumeras guerras napoleonicas e das invasões que soffreu, foi ha dez anno extraordinariamente augmentada em virtude do pagamento da indemnização de 5.000.000.000 de francos, e das despezas anormaes occasionadas pela criminosa guerra em que a lançou o segundo imperio. Eis a origem de tres da maiores dividas publicas contemporaneas. Mas falta alguma cousa que é necessario dizer ainda á camara.
Os Estados Unidos, apesar de terem apenas saido da sua espantosa guerra civil, amortisam todos os annos a sua divida de muitos milhões de dollars; a França ha quinze annos sómente de distancia da maior catastrophe que registram os annaes das guerras modernas, tem ultimamente abolido alguns dos mais odiosos impostos, de que se vir obrigada a lançar mão, para fazer face aos tremendos compromissos de honra que na guerra com a Prussia contrahira; a Inglaterra, finalmente, na decada de 1860-1870, apesar do resgate das linhas telegraphicas pelo estado, que custou ao thesouro 9.000.000:000 de libras esterlinas apesar da indemnisação do Alabama, e apesar da reducção de 12.000.000:000 de libras nas receitas publicas, proveniente da reforma aduaneira livre-cambista de Gladstone amortisou a sua divida publica de 20.000.000:000 libras!
E nós? Nem temos grandes catastrophes nacionaes par explicar o enorme augmento da nossa divida, nem abolimos os impostos mais odiosos, antes todos os dias os estamos aggravando, nem podemos amortisar um ceitil da nossa divida, não obstante a paz octaviana de que gosâmos ha trinta annos!
Será uma situação assim, repito, normal ? Estará o paiz em que tal situação se apresenta, ainda com tendencias para se aggravar, no estado de feliz bem aventurança em que apraz ao sr. ministro da fazenda pintal-o? Pela minha parte não o creio, e oxalá que o futuro bem proximo não venha dar uma triste confirmação às minhas palavras, e uma realidade desastrosa aos meus presentimentos!
Quando os juros do diversos encargos absorvem mais de metade da receita de um orçamento, a situação do paiz em que tal facto se dá, não póde ser apresentada com essas cores risonhas com que constantemente a apresentam os senhores deputados da maioria; mas deve, pelo contrario, fazer que para ella seriamente convirjam todas as attenções.
E depois, sr. presidente, não sabemos todos nós que um dos motivos de augmento da nossa divida consolidada, provem principalmente da extrema facilidade com que n'este paiz se contrahe divida fluctuante, não a divida fluctuante normal, não a divida fluctuante que é a representação de receita, e que por isso é indispensavel para a gerencia financeira do estado, visto representar sem inconveniente antes com vantagem um recurso de que póde lançar mão o ministro da fazenda, para solver encargos immediatos do thesouro para os quaes não bastaria a receita arrecadada n'um certo momento; mas divida fluctuante que é destinada a pagar o deficit ordinario do orçamento, que por consequencia não tem para a compensar como representação os impostos em cobrança, devendo por isso ser consolidada quando attinge um certo limite por uma operação de credito como aquella que ainda ha pouco aqui se discutiu.
Não se illudam, portanto, com o estado da nossa fazenda, que é grave e que deve ser objecto de serio estudo e meditação da parte dos poderes publicos, em quem é ridiculo esse optimismo de que a todo o momento fazem gala.
Eu não trato agora, porque ainda não pude orientar-me bem n'este dedalo de jogos acrobaticos de cifras, com que tão facilmente brinca o sr. relator; não trato agora, digo, de verificar as combinações engenhosas de s. exa., para attenuar na apparencia o deficit real do nosso orçamento.
Apenas me espanta a tranquillidade de animo, com que se lança mão de um expediente que já não illude ninguem, porque não passa de unia rhetorica sui generis, sem poder convencer, do momento em que é conhecida.
Com effeito, se muitas vezes uma figura de rhetorica, do que podemos chamar a rhetorica oratoria, confunde momentaneamente um adversario, pouco experimentado nas argucias da palavra, é tambem verdade que esta novissima dos numeros tem uma apparente eloquencia, que não raro desnorteia o deputado pouco ao corrente das habilidades e prestidigitações que podem fazer-se com os algarismos!
Eu não posso por isso entrar desde já n'um campo que o sr. relator guarda com mais ciume, do que o dragão da fabula guardava o jardim das Hesperides; mas é possivel que entre ainda alguma vez, porque estudo com boa vontade, e aproveito bem as lições dos mestres.
Com esta boa vontade, pois, é não só possivel, mas muito provavel até, que eu chegue dentro em pouco a poder acompanhar os illustres deputados mais competentes n'estas combinações de cifras do orçamento, que, apesar do mysterio com que pretendem rodeal-as, estão bem longe de resumir toda a questão de fazenda, tal como ella deve no meu entender ser considerada.
Sr. presidente, para terminar o que tenho a dizer com relação às nossas receitas publicas, lembrarei a proposito do abuso que se tem feito nestes ultimos tempos do credito a phrase rigorosa e digna de ser profundamente reflectida de Adam Smith n'um dos capitulos mais luminosos da sua obra onde ha tanto ainda que aprender, apesar dos progressos, que desde então têem feito as sciencias economicas. Adam Smith affirmou que quando a divida publica de uma nação attinge certos limites de crescimento, já não é possivel mantel-a com honra e sem quebra dos compromissos contrahidos.
Ora eu receio, sr. presidente, que a divida publica de Portugal se vá acercando d'esse termo apontado como um perigo pelo grande economista escossez, termo extremo em