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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS.
SESSÃO DE 12 DE JUNHO.
Presidencia do Ex.mo Sr. Silva Sanches.
Á meia hora depois do meio dia verificou-se pela chamada, feita pelo Sr. Secretario Mamede, estarem presentes 52 Srs. Deputados.
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão.
O Sr. Secretario Cyrillo Machado leu a acta da sessão antecedente, que foi approvada sem reclamação.
Deu-se conta na mesa da seguinte
CORRESPONDENCIA.
Um officio do Sr. Deputado Miguel do Canto e Castro, participando que razões imperiosas o obrigam a sair de Lisboa, e pede por isso licença para se ausentar até ao fim da sessão actual.
Foi concedida a licença.
Deu-se expediente pela Mesa aos seguintes requerimentos, que foram remettidos ao Governo:
1.° Do Sr. C. M. Gomes: «Requeiro se requesito do Governo, pelo Ministerio dos Negocios da Guerra, e tambem pelo da Marinha, uma nota da importancia que se devia cobrar por desconto para o montepio, e da que se devia pagar por pensões do montepio, no anno anterior áquelle em que se tomou a providencia de restituir aos contribuintes, que quizessem, as sommas que haviam pago.»
2.° Do Sr. Julio Guerra: «Requeiro se peça ao Governo, pelo Ministerio da Guerra, remetta a esta Camara os esclarecimentos seguintes:
1.° — Quanto se desconta mensalmente para o montepio militar a cada uma das classes dos officiaes do exercito.
2. — Quanto recebe liquido mensalmente cada pensionista do referido montepio, em relação ás mesmas classes.
3.° — Qual é a despeza mensalmente feita com as ditas pensionistas.
4. — Quantos são (por classe) os officiaes, que actualmente contribuem para o mesmo montepio.
5.° — Quantos officiaes existem em cada uma das classes, comprehendendo-se os activos e inactivos do todas as armas do exercito.»
3. Do Sr. A. Corrêa Caldeira: — Requeiro que se officie ao Governo pelo Ministerio dos Negocios Estrangeiros a fim de que sejam remettidos a esta Camara, sem demora, os seguintes documentos:
1.° — Cópia authentica do Decreto pelo qual o Visconde de Alte foi nomeado enviado extraordinario e Ministro plenipotenciario do Governo portuguez junto aos Governos do Turim e Napoles.
2.° — Dita do Alvará, ou diploma de naturalisação (Denigen) obtido pelo dito Visconde de Alte, sob o nome de João Carlos de Orta, do Governo de Sua Magestade britanica.
3.° — Dita do parecer cio Procurador geral da Corôa, sobre a legalidade os illegalidade do despacho do Visconde de Alte para a missão diplomatica referida, em attenção á sua qualidade de subdito inglez por naturalisação.
4.° — Dita da informação do Conde de Lavradio, enviado extraordinario portuguez em Londres, e dos pareceres dos Advogados inglezes, a que se soccorre sobre o mesmo assumpto.
4.° Do Sr. Corrêa Caldeira: — Requeiro que se officie ao Governo pelo Ministerio dos Nego cios da Marinha e Ultramar, a fim de que remetta a esta Camara sem demora, ou a cópia authentica do Decreto pelo qual foi despachado (segundo se affirma) o Bacharel Joaquim Pinto de Magalhães, que serviu de Governador geral interino da provincia de Moçambique, Juiz da Relação de Loanda, ou a declaração formal de que tal despacho se não fez.
5.° Do Sr. José Estevão; — Requeiro que se peça ao Governo que envie a esta Camara, da Repartição da contabilidade do Ministerio da Guerra, os papeis pertencentes á Sr. D. Izabel Maria Baracho.
6.° Do Sr. Cunha Sotto-Maior — Requeiro que o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros remetta a esta Camara o parecer do Procurado geral da Corôa, ácerca dos aggravos contra o consul de Pernambuco.
Tiveram segunda leitura os seguintes projectos de lei.
1.° — Do Sr. Archer assignado tambem pelos Srs. Garcia Peres e J. M. de Andrade, para ser concedido a qualquer empreza ou companhia que se forme legalmente para estabelecer a navegação a vapôr entre Setubal e Alcacer do Sal pelo rio Sado, um subsidio mensal de 60$000 réis durante seis annos e isenção de direitos de embandeiramento para o barco ou barcos que a empreza ou companhia importar para o referido fim.
Á commissão de administração publica.
2.° — Do Sr. Palma assignado tambem pelos Srs. Ortigão, Santos Monteiro, Albergaria Freire, e J. M. de Andrade, para o Governo ser authorisado a levantar o capital preciso para a construcção do uma ponte sobre o rio de Silves, nas proximidades de Villa-nova de Portimão, e creando um tributo de um por cento ad valorem em todos os generos que se exportarem pela barra da mesma villa, para ser applicado ao pagamento dos juros e amortisação do capital.
O Sr. Palma pedio que este projecto fosse impresso no Diario do Governo.
Posto a votos este requerimento não houve vencimento, e o projecto foi remettido ás commissões de fazenda e obras publicas.
Foi lida na Mesa a seguinte proposta do Sr. Roussado Gorjão:
Senhores. — Na sessão proxima anterior (a de 9 do corrente) se distribuiu nesta Camara o parecer da illustre commissão de legislação sobre o meu voto em separado — constituindo parecer de minoria — no projecto de lei da receita do Estado, para o futuro anno economico de 1855 a 1856.
Bem seguro estou de que a alta sabedoria da Camara por certo acharia no bem elaborado parecer da illustre commissão de legislação, a prova incontestavel da exemplar inteireza e proficiencia a que me referi no relatorio da proposta que tive a honra de apresentar na sessão do dia 8 proposta que a illustrada rectidão da Mesa se dignou acolher, e do fazer com que tivesse o andamento competente.
Tenho a consciencia de que — fazendo eu completa justiça á proficiencia dos principios desenvolvidos no sentido em que o foram — me cabe o direito a igual justiça na exacta appreciação dos principios, que eu expendera; e mais ainda no fim essencial a que se destinara o meu voto em separado.
Todos sabem que o orçamento, na Lei de meios, consiste na designação expressa do complexo de receitas (em sentido virtual] que podem ser destinadas ás despezas do Estado: bem como ninguem ignora tambem o grave inconveniente, que resulta de qualquer omissão em assumpto de tão ponderosa importancia.
Precisamente neste sentido — e por taes motivos — é que eu intendi, que, na designação descriptiva das receitas virtuaes, se devia fazer expressa mensão «do valor resultante das circumstancias, que devem ser attendidas na época em que finda o terceiro triennio do contracto do tabaco e sabão, em conformidade com as solemnes disposições do artigo 2.° do Decreto de 27 de Outubro de 1846.»
De uma tal expressa mensão, nenhum perigo ou damno resultava a quem quer que fosse: em quanto, porém, ao perigo e damno de ser omittida, eu deixo á exclarecida penetração de todas as intelligencias competentes o apreciar o seu importantissimo alcance.
Pelo que me diz respeito, ainda hoje é minha muito humilde opinião: — 1.°, que a expressa mensão, é indispensavel na Lei da receita; 2.°, que a questão, em sua origem primitiva, era de natureza muito simples; 3.°, e que todas as occorrencias ulteriores a tem convertido em questão ponderosamente complexa.
E, na verdade, que a revisão, a que constantemente me hei referido, consiste e reduz-se apenas a um artigo de inspecção pura e simplesmente fiscal, para indispensavel instrucção dos poderes executivo e legislativo, a que subsequentemente se houvessem de seguir os resultados que fossem de Lei, e das solemnes condições do contracto: condições e Lei religiosamente executadas e feitas executar; porque executar e cumprir, e fazer cumprir e executar (nada mais nada menos), é o duplicada sacrosanto mistér das Côrtes e do Governo.
Em quanto ao modo pratico de levar a effeito os resultados da revisão pura e simplesmente fiscal, espero merecer a justiça de se reconhecer, que, por modo algum, emitti opinião a tal respeito; e de que sou o primeiro a conformar-me com as idéas de que o assumpto é summamente grave.
E tão grave, quanto é innegavel, que a situação financeira do paiz tem sido levada a um excesso tal de complicação, que é absolutamente impossivel já hoje tracta-la em discussões parlamentares, sem que primeiro o complexo de todos e cada um dos seus diversos ramos, haja sido convenientemente apreciado.
Não se recorrendo a essa meditada, circumspecta e profunda apreciação, corre-se o grande perigo de cair em gravissimas equivocações, em detrimento irremediavel da fazenda nacional; e até mesmo — de se menospresar o caracter e as rectas intenções de quem propugna pela verdade, pela exactidão, e pelos solidos principios de incontestavel justiça.
Assim tem a Camara considerado em sua extremada sabedoria, todas as vezes que se apresentam circumstancias que demandem a concorrencia mutua dás duas illustres commissões, de legislação e de fazenda; porque innegavelmente os negocios da fazenda constituem uma especialidade, que exige uma particular, não distrahida, e quasi exclusiva applicação — constante pratica nunca interrompida — um estudo perseverante — um conhecimento profundo das leis fiscaes antigas e modernas — assim como espirito habilitado para não hesitar no perfeito conhecimento de direito, e dos factos ou arestos; dessiminados nesse mar immenso de consultas, provissões, resoluções regias, regulamentos, regimentos especiaes, condições de contractos, casos julgados, etc., etc.
Agora mesmo se dá o caso da concorrencia das duas illustres commissões para desenvolvimento da marcha e definitiva ultimação do assumpto de summa transcendencia de que actualmente a Camara tem a occupar-se.
Porém, o tempo insta; a discussão do orçamento progride; a sessão annual aproxima-se ao seu termo; o apuramento dos factos e circumstancias correlativas é objecto de que nem Se póde, nem se deve prescindir; o numero total dos membros das duas illustres commissões não póde ser distraído da regularidade da hora da sessão parlamentar: será possivel comtudo, que cinco membros (isto é: dois eleitos pela illustre commissão de legislação, dois pela illustre commissão de fazenda, e o author do voto em separado) formem uma secção preparatoria de trabalhos, exercendo essas funcções no proprio edificio das Côrtes, em modo que possam ser chamados em qualquer occorrencia que o torne necessario.
Tenho a consoladora profunda convicção, Srs. de que fareis completa justiça á gravidade reconhecida do assumpto, e á pureza de intenções, que me persuade a ter a honra de vos apresentar a seguinte
Proposta.
1.° Proponho que as illustres commissões de legislação e de fazenda, nomêe cada uma dellas dois de seus membros, para formar uma secção preparatoria de trabalhos, que se comporá de cinco; entrando nesse numero o auctor do voto, em separado, sobre o projecto da lei da receita.
2.° Que a secção preparatoria, assim formada, exerça suas funcções no edificio das Côrtes donde possam seus respectivos membros ser convocados em qualquer occorrencia eventual, que a regularidade dos trabalhos parlamentares possa exigir.
3. Que á secção preparatoria sejam entregues (logo que cheguem) os documentos sollicitados ao Governo, em virtude da minha proposta, de 8 do corrente.
4.° E, finalmente, que, desde logo que hajam chegado taes documentos, se reunam as duas illustres commissões, e o auctor do voto em separado, para elaborarem quanto deva ser apresentado á discussão e deliberação da Camara.
Apresentada em sessão de 11 de Junho de 1855. = João Damásio Roussado Gorjão. Requerimento addicional. Requeiro que esta proposta seja declarada urgente para todos os effeitos. = João Damásio Roussado Gorjão.
O Sr. Roussado Gorjão que sendo materia grave aquella de que se tracta na sua proposta, intende que tudo quanto fôr concorrer para que ella se esclareça é bom e conveniente. Que não pede nenhuma commissão que vá perturbar os trabalhos parlamentares, e isto está desenvolvido e explicado na sua proposta — e ter-se-ia abstido de fazer esta reflexão se tivesse a certeza de que todos os seus collegas tinham visto a sua proposta, porque o seu pensamento estava estabelecido.
A proposta foi admittida.
O Sr. Santos Monteiro intende que a proposta vai estabelecer um precedente novo, e um pouco fóra do commum, e por isso pedia que o illustre Deputado concordasse em que a sua proposta fosse primeiro impressa no Diario do Governo para se poder conhecer todo o seu alcance.
O Sr. Roussado Gorjão concorda com os desejos do illustre Deputado, porque tambem tem interesse em que a Camara possa fazer verdadeiro conceito da sua proposta.
Ficou, portanto, adiada a discussão da proposta do Sr. Roussado Gorjão para depois de ámanhã.
O Sr. Presidente disse que agora ia a Camara constituir-se em sessão secreta por assim o exigir o bem do Estado.
Era uma hora da tarde.
Sendo quatro horas da tarde tomou-se a abrir a sessão publica.
O Sr. C. M. Gomes mandou para a Mesa um parecer da commissão do ultramar.
O Sr. Presidente disse que a ordem do dia para quinta-feira era, continuar-se na sessão secreta, depois a continuação da que vinha para hoje. Levantou a sessão, eram quatro horas da tarde.