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N.º 17. SESSÃO DE 22 DE JUNHO. 1853.

PRESIDÊNCIA DO SR. SILVA SANCHES.

Chamada: — Presentes 79 srs. deputados.

Abertura: — A meia hora depois do meio dia.

Acta: — Approvada.

O sr. Presidente: — Não posso deixar de ponderar ainda á camara, que passava da meia hora quando se abriu a sessão; e tendo de se entrar na ordem do dia á uma hora, quasi que não ha tempo para o expediente; por isso novamente peço aos srs. deputados que concorram mais cedo. (Apoiados)

O sr. Nazareth: — Como assignei o projecto n.º 48 com declaração, e lendo-se encerrado o debate sem que eu tivesse occasião de declarar os pontos em que divergia do projecto, a maneira de o supprir é pela seguinte declaração de voto, que mando para a mesa, para ser inserida na acta.

Declaração de voto: — Declaro que na sessão de 21 do corrente votei contra o § unico do artigo 3.º, e contra o artigo 4.º Do projecto de lei n.º 48. — Nazareth.

Mandou-se lançar na acta.

CORRESPONDENCIA.

Declarações: — 1.ª Do sr. Mello Soares, participando que o sr. Passos (Manoel) não póde comparecer á sessão de hoje. — Inteirada.

2.ª Do sr. Luz Pitta, participando que o sr. Silvestre Ribeiro não póde comparecer á sessão de hoje, e a mais algumas, por incommodo de saude. — Inteirada.

Officios: — 1.º Da camara dos dignos pares, participando terem sido alli approvadas as proposições que lhe foram enviadas por esta camara; — 1. annullando as reformas de alguns officiaes que foram das guardas municipaes de Lisboa e Porto; — 2.º auctorisando o governo para reformar o tenente coronel que foi do exercito hespanhol, Manoel Alvares; — e 3. confirmando a pensão annual conferida a Pedro de Sousa Canavarro; — as quaes todas depois de reduzidas a decretos das côrtes hão de ser opportunamente apresentadas á real sancção. — Inteirada.

2.º Do secretario da direcção da real sociedade humanitaria, acompanhando 100 exemplares do relatorio dos trabalhos da mesma sociedade no primeiro anno da sua existencia, a fim de serem distribuidos pelos srs. deputados. — Mandaram-se distribuir.

Representações: — 1.ª Da camara municipal de S. Pedro do Sul, pedindo que lhe seja doado o estabelecimento de agoas thermaes, situado na villa do Banho, para que, revertendo assim á natureza de estabelecimento municipal, possa a mesma camara melhoral-o pelos meios que parecerem mais convenientes. — A commissão de fazenda ouvida a de administração publica.

2.ª Da misericordia, ecclesiasticos, lavradores, negociantes, proprietarios, artistas, empregados judiciaes e civis, e povoação inteira de Coruche, pedindo que seja modificado o decreto de 24 de dezembro de 1852 sobre legados pios. — A commissão especial de legados pios.

3.ª Dos senhorios, arraes, e escrivães das differentes companhas de redes de arrastar na costa de Lavos e da Luraza, expondo os vexames e arbitrariedades que estão soffrendo com a cobrança do imposto sobre a pesca, estabelecido pela lei de 10 de julho de 1843; e pedindo providencias. — Á commissão de fazenda.

Foi lida na mesa a ultima redacção dos projectos n.ºs 23 e 40, que foi approvada sem reclamação.

O sr. Jeremias Mascarenhas: — Sr. presidente, ha tempo que enviei para a mesa uma nota de interpellação ao sr. ministro dos negocios estrangeiros, e pedi que fosse secreta a sessão em que ella se verificasse, em attenção ao negocio que linha a tractar; e como cada vez se torna mais necessario verificar esta interpellação, por isso peço a v. ex.ª que me proporcione occasião para ella ter logar..

O sr. Presidente: — Na fórma do regimento para haver sessão secreta, é necessario que haja uma proposta assignada por 5 srs. deputados: queira o sr. deputado manda-la para a mesa, para se lhe. dar o competente destino.

O sr. Archer: — Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Palmella, e de muitos cidadãos daquelle concelho em que se queixam dos vexames que estão soffrendo pela execução dos decretos sobre legados pios.

O sr. Pegado; — Peço ser inscripto para apresentaram projecto de lei.

O sr. Arrobas: — Mando para a mesa a seguinte

Nota de interpellação: — Requeiro que seja prevenido o sr. ministro da marinha que pertendo interpellar s. ex. para chamar á sua attenção sobre o facto de se nomearem cirurgiões e officiaes do fazenda extra numerarios, para embarcarem nos navios que sáem a barra para as commissões do ultramar, saindo outros navios sem cirurgiões, em quanto ha em Lisboa cirurgiões e officiaes de fazenda do quadro effectivo. — Arrobas.

Mando tambem para a mesa um requerimento pedindo esclarecimentos pelo ministerio da marinha. (Leu-o)

O sr. Presidente: — O requerimento ámanhã lerá o competente destino; e da nota de interpellação manda-se fazer a communicação respectiva.

O sr. Miguel do Canto: — Mando para a mesa um requerimento, em que peço alguns esclarecimentos ao governo; e mando igualmente a seguinte

Declaração de voto: — Declaro que na discussão do projecto n.º 48 votei contra o § unico do artigo 3.º, e contra o artigo 4.º — Miguel do Canto, D. Rodrigo de Menezes.

Mandou se lançar na acta.

O sr. Affonso Bedelho: — Sr. presidente, quando

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apresentei 2 projectos de lei, que foram admittidos, e mandados publicar no Diario do Governo, não querendo mortificar a camara com um longo discurso, lembrei-me de recommendar aos illustres deputados, que quizerem instruir-se na importante questão do Douro, a leitura da discussão que precedeu a lei de 21 de Abril de 1843, bem como o discurso publicado no Diario do Governo n.º 91 de 20 de abril passado, pronunciado na camara heriditaria pelo visconde de Castro, uma das mais solidas intelligencias, e das pessoas mais competentes que nesta questão conheço, no qual muito de proposito fez sentir a influencia que a especialidade do terreno, da producção e das necessidades da população do paiz vinhateiro do Douro, devem exercer nas providencias especiaes de que precisa aquella lavoura; e como se omittisse no extracto da sessão esta parte de um discursei, a qual julgo essencial, para supprir a falla de uma maior explicação da minha parte, julguei dever fazer esta declaração, e peço aos srs. tachygrafos que façam esta rectificação no Diario do Governo. Por esta occasião remetto para a mesa uma representação da camara municipal do Pezo da Regoa, pedindo a revogação da lei da Parea, e a approvação do projecto que apresentei.

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Mando para a mesa esta

Nota de interpellação. — Requeiro que seja prevenido o sr. ministro do reino, de que desejo dirigir-lhe uma interpellação.

1.º Sobre o resultado das informações a que procedeu, ácerca da prisão illegal e arbitraria perseguição por ordem do governador civil de Béja a alguns individuos moradores em Cabeça Gorda, concelho de Béja, facto a que já se fez referencia na interpellação feita ao mesmo sr. ministro na sessão de 18 de fevereiro ultimo.

2.º Sobre as causas por que se não tem procedido á eleição da camara municipal do concelho de Ferreira do mesmo districto. = Antonio Corrêa Caldeira = Antonio da Cunha Sotto-Maior.

(Continuando) V. ex. e a camara devem estar presentes, que na sessão passada o sr. Alves Vicente fez uma interpellação ao sr. ministro da justiça, ácerca de certos factos menos agradaveis, que elle presumia terem acontecido na relação do Porto. O deputado interpellante apoiou a sua interpellação com alguns documentos, e alguns factos que citou: em consequencia dessa interpellação, sabe v. ex.ª e a camara, que o sr. ministro da justiça de então, o sr. Seabra, mandou o procurador da corôa ao Porto syndicar os factos a que se referiu o deputado interpellante. Eu sei, e sabe toda a camara, que o procurador da corôa chegou a esta capital, e entregou na secretaria da justiça o seu longo relatorio ácerca desta syndicancia; e a opinião publica diz, que no relatorio do procurador da corôa vem indigitados 4 magistrados da relação como devendo ser processados, em consequencia de sobre elles pezarem circumstancias menos agra daveis e suspeitas sempre odiosas.

Foi em consequencia da interpellação que o governo mandou syndicar ao Porto, e como a origem da syndicancia partiu do parlamento, é necessario que a camara não conteste o direito que eu invoco — que o sr. ministro da justiça remetta a esta camara o relatorio do procurador da corôa, com todos os papeis annexos. Nesta conformidade remetto para a mesa este requerimento. (Leu) Faço este requerimento sem nenhuma tenção de aggredir quem quer que seja, talvez antes movido por considerações aliás beneficas, e vem a ser: em consequencia da interpellação, o governo manda syndicar; a syndicancia está feita; se ha culpados, é necessario que elles não contaminem os innocentes; e se os não ha, é necessario que não haja desconfiança: porque não é possivel que haja justiça em um paiz, onde a opinião de um dos primeiros magistrados é que 4 membros de uma relação devem ser suspensos, processados e demittidos porque estão criminosos de peita, venalidade e concussão. Se a camara quer fechar os olhos a isto, eu não estou resolvido a acompanha-la, porque não ha considerações possiveis, pelas quaes o governo não mande aqui os papeis que peço; e eu, quando tracto do fazer alguma cousa que me aconselha a minha consciencia, no cumprimento desse dever não recuo diante de consideração nenhuma, por importante que seja; porque, para mim, não ha considerações valiosas diante do meu dever.

N'este sentido mando para a mesa o requerimento e declaro a v. ex.ª que, não sendo satisfeito immediatamente, eu, ámanhã, depois e em todos os dias, e enquanto houver camara, exigirei que o governo mande os papeis á camara, porque não são negocios diplomaticos, nem negocios pendentes, é um negocio que affecta a justiça, pela qual a camara tem rigorosa obrigação de velai.

Como agora me dão só meia hora para expediente, declaro mais a v. ex. que desejo me dê a palavra quando entrar o sr. ministro da fazenda, ou outro qualquer membro dó governo, para saber se é possivel, que um governo constitucional, em um paiz constitucional, em que esteja funccionando uma camara, sem ha 5 mezes termos noticia de quem é o ministro da guerra: é o primeiro facto que acontece no mundo! Estar um ministro doente ha 5 mezes, não passar a pasta a ninguem, e estarem suspensos os negocios que dizem directa ou indirectamente respeito á repartição de guerra!

Se acaso o actual ministro da guerra está doente, e tão doente que não póde vir á camara, hoje que so vai encetar a discussão do orçamento, quero entrar desassombrado na discussão, e então desejo quem me possa responder, porque não posso estar aqui interpellando quem está ausente; e então quero saber quem responde em seu logar. Ainda ninguem sabe quem faz as suas vezes! Isto não aconteceu nunca. Desafio a que me digam em que paiz do mundo ha um ministro doente, e ninguem sabe quem faz as suas vezes. Eu conheço que a commissão de guerra não dá solução muitas vezes a negocios por uma especie de deferencia, que eu partilho até certo ponto, mas que não póde excluir que nós saibamos quem faz as vezes do sr. ministro da guerra nesta discussão.

V. ex.ª sabe muito bem e a camara, que por decreto de 23 de outubro de 1852 foram addidos a companhias do veteranos todos os officiaes da convenção de Evora-Monte: e parece-me de primeira intuição que, sendo isto assim, não só deviam ler todos os encargos resultantes dessa sua nova posição, mas tambem todos os beneficios; mas não acontece isto: os encargos têem-nos elles, mas os beneficios não. Andam os ministros atroando os nossos ouvidos com esta sua pomposa situação, andam dizendo que pagam em dia, mas não é assim, porque os officiaes da con-

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venção de Evora-Monte que foram addido a veteranos, não vão pagos em dia. Na mesma companhia lin officiaes pagos em dia, o officiaes não pagos em dia; os recibos de todos os officiaes da convenção que entraram para veteranos, são cotados com uma letra encarnada, quer dizer, e um stigma, é um signal para não se lhes pagar! Quando estes officiaes chegam á thesouraria militar, e apresentam o seu recibo, como está colado com letra encarnada não lhes pagam! Isto é que não é possivel continuar. Estão ha seis mezes sem receber. Por um decreto da dictadura -convertido em lei foram esses officiaes addidos a companhias de veteranos, mas nestas companhias todos os officiaes estão pagos em dia, excepto os da convenção de Evora-Monte, estes receberam o mez de dezembro; quero dizer, janeiro, fevereiro, março, abril e maio, não lhe foram pagos. E dizem os srs. ministros que pagam em dia, quando no mesmo corpo e no mesmo quartel ha officiaes que recebem em dia, e officiaes que não recebem, que teem 5 mezes de divida! Isto não é justiça, não a intendo assim.

Por consequencia, sr. presidente, peço a v. ex.ª que se acaso entrar algum sr. ministro, que me dê a palavra para saber quem responde pelo ministerio da guerra, e se acaso V. ex.ª intender que não deve interromper a discussão, eu pedirei o palavra no orçamento que é! um campo largo e vasio, e verei se por alguma tangente possa intrometter a minha pergunta, porque quero saber quem é o ministro da guerra, e quem é que responde por estas distincções de pagamentos odiosas.

O sr. Presidente — Da nota de interpellação manda-se fazer a communicação respectiva; e em quanto ao requerimento fica para ámanhã se lhe dar o devido destino.

O sr. Palmeirim. — Pedi a palavra apenas para declarar ao illustre deputado que a commissão de fazenda quando tractou de confeccionar o orçamento e dar a seu respeito uma opinião, ouviu um dos srs. ministros, que vinha auctorisado pelo sr. ministro da guerra; e é esse mesmo sr. ministro que na occasião da discussão do orçamento na parte respectiva ao ministerio da guerra, hade tomar a responsabilidade e a sustentação do orçamento deste ministerio.

ORDEM DO DIA.

Continuação da discussão do projecto n.º 42.

O sr. Presidente: — Vai dar-se conta de um artigo addicional que hontem foi mandado para a mesa pelo sr. Vellez Caldeira.

Artigo addicional. — Os empregados de officios vitalicios, a que o decreto de 16 de janeiro de 1831 teve em vista beneficiar, e que ainda não tenham sido attendidos, porque seus empregos não tivessem ordenados, mas só emolumentos, ser-lhes-hão applicaveis as disposições do mesmo decreto, servindo de base para o subsidio a lotação, que tivessem os officios de que foram privados. — Vellez Caldeira.

Foi admittido, e ficou em discussão.

O sr. Cardozo Castello Branco: — Neste projecto consigna-se a disposição de que estas pensões tenham assentamento na fórma da lei; e como talvez não possam ter cabimento todas ao mesmo tempo por não haver as vagas sufficientes, e sendo por isso necessario regular a preferencia, por isso mando para a mesa o seguinte.

ADDITAMENTO: — A ordem, nos assentamentos dos subsidios, ou pensões concedidas por esta lei, será regulada pelos annos de serviço dos agraciados, preferindo os que tiverem mais. — Cardozo Castello Branco.

Foi admittido, e ficou tambem em discussão.

O sr. Vellez Caldeira: — Mando tambem para a mesa o seguinte additamento ao do sr. Cardozo Castello Branco.

Additamento: — O assentamento de que tracta o artigo 3.º, terá logar desde já, com relação ao ultimo assentamento em 30 de junho de 1849. — Vellez Caldeira.

Egualmente mando para a mesa o seguinte Artigo addicional: — Os empregados de logares triennaes, que no momento do restabelecimento do governo legitimo se apresentaram logo, e continuaram empregados até serem extinctos os seus logares, por ser posta em vigor a nova legislação, serão igualmente contemplados com subsidio, applicando-se-lhes, no que fôr compativel, as disposições do decreto de 16 de janeiro de 1831-. — Vellez Caldeira.

Tanto o additamento, como o artigo addicional foram admittidos, e ficaram tambem em discussão.

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Sinto muito dizer, que achando até certo ponto muito justa a proposta mandada para a mesa pelo sr. deputado Vellez Caldeira, e tambem concordando muito com o additamento proposto pelo sr. Cardozo Castello Blanco, creio todavia que a camara não póde tomar conhecimento de uma materia tão grave e tão importante sem ouvir primeiro uma commissão, e sem esta commissão se pôr de accordo com o sr. ministro da fazenda. Estes são os principios que eu reputo applicaveis ás propostas dos illustres deputados.

Mas ha outra consideração mais valiosa que só por si influiria no meu animo para eu rejeitar in limine as propostas dos srs. deputados, se acaso não tivesse muita consideração por elles. Receio que resulte o seguinte, que é ser adiado o projecto em discussão, e então não fazermos bem a ninguem, querendo fazer bem a toda a gente.

Por consequencia se os illustres deputados querem concordar comigo, mandem-se estas propostas á commissão respectiva sem prejuizo da approvação do projecto, porque se o projecto fôr approvado e a commissão concordar com as idéas expendidas pelos illustres deputados, póde por meio de um artigo addicional, ou por meio de nova disposição attender ao que ss. ex.ªs querem; porque de outro modo póde acontecer o seguinte que é — não se fazer bem a ninguem por se querer fazer bem a muita gente.

O sr. Justino de Freitas: — Eu fui prevenido pelo sr. Cunha Sotto-Maior; não é possivel já fazer-se cousa alguma sem esses addiamentos voltarem á commissão de fazenda, e então pedia eu a v. ex. que sem mais demora consultasse a camara sobre se acaso essas differentes emendas e additamento que se tem apresentado, devem voltar á commissão.

O sr. Vellez Caldeira: — Os additamentos que offereci, estão comprehendidos nos projectos que apresentei, e que foram remettidos a commissão; mas não os tendo a Commissão attendido, é esta a occasião propria de os submetter á consideração da camara, porque tractando-se de dar pensões a empregados de re-

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partições extinctas, todos devem ser attendidos; e sendo a materia dos additamentos da mesma natureza da do projecto, não acho necessario que elles vão á commissão.

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Eu mando para á mesa o seguinte

Requerimento: — Requeiro que a proposta do sr. Vellez Caldeira, e o additamento do sr. Cardozo Castello-Branco sejam remettidos á commissão de fazenda, sem prejuizo da discussão do projecto. — Cunha Sotto-Maior.

Foi admittido A discussão.

O sr. Maia (Francisco): — Eu intendo que não é possivel tractar de repente destes additamentos offerecidos pelo sr. deputado Vellez Caldeira; intendo tambem que os empregados a que elles se referem, devem ser comprehendidos n'um projecto em separado; porque tambem separadamente tem sido contemplados os individuos que estavam na posição daquelles de que tracta o addiamento do sr. Vellez Caldeira. Alem disto, não se sabe nem o numero, nem a qualidade, nem o direito que esses individuos tem. Póde deixar-se de attende los desde já; tambem os demais de que já selem tractado, não foram attendidos desde logo que requereram a primeira vez; mas tem-no sido á proporção que as circumstancias o tem permittido. Portanto julgo que a materia do additamento offererecido pelo sr. Vellez Caldeira, não póde nem deve ser tractada sem primeiro, ácerca delle, ser ouvida a commissão competente.

O sr. Pinto de Almeida: — Peço a v. ex. que consulte a camara sobre se a materia está sufficientemente discutida.

Julgou-se discutida.

O sr. Presidente: — Vou agora, por á votação da camara a proposta do sr. Cunha Sotto-Maior.

O sr. Cazal Ribeiro: — Peço a palavra sobre o modo de propôr.

O sr. Presidente: — Tem a palavra.

O sr. Casal Ribeiro: — Eu vejo que a proposta do sr. Cunha involve tanto os additamentos do sr. Vellez Caldeira, como o do sr. Cardozo Castello-Branco: ora eu intendo que os primeiros devem ser remettidos á commissão, porque involvem materia nova; mas o segundo não está neste caso; este póde desde já ser votado, e eu, por parte da commissão, declaro que ella o adopta; por isso peço que sejam postos á votação separadamente. (Apoiados)

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Para simplificar a questão, eu retiro a parte da minha proposta relativa ao additamento do sr. deputado Cardozo Castello-Branco, e limito-a só aos additamentos offerecidos pelo sr. Vellez Caldeira; e fique-se intendendo bem que a remessa á commissão é sem prejuizo do andamento do projecto n.º 42, que a camara já votou.

O sr. Vellez Caldeira: — Sr. presidente, tres foram as propostas que eu mandei para a mesa: uma dellas não é mais que um additamento ao do sr. deputado Cardozo Castello Branco, e duas é que são materia nova, segundo dizem alguns senhores, mas effectivamente não o é, porque se tracta nellas de empregados pertencentes ás repartições extinctas. Se ha aqui alguma differença, consiste ella, em que uns são afilhados, e outros não...

O sr. Santos Monteiro: — Eu peço a palavra para explicação a respeito de afilhados.

O Orador: — Mas quando a camara intenda que estas minhas propostas devem ir á commissão, não póde deixar de fazer excepção a respeito da que eu offereci como additamento ao additamento do sr. -Cardozo Castello-Branco. Portanto peço que quando se puzer á votação, se separem as materias, para que umas não prejudiquem as outras.

O sr. Santos Monteiro: — Principiarei por dizer, que eu respeito muito o sr. deputado Vellez Caldeira, mas é necessario que s. ex.ª não lance na camara asserções que são totalmente destituidas de todo o fundamento. E necessario que saiba, e o saiba de uma vez por todas, que a commissão de fazenda não tem afilhados: a commissão de fazenda não vê individuos, não vê senão a razão e a justiça. (Apoiados)

Quanto ao mais julgo que é indifferente ir ou não ir o terceiro additamento do sr. Vellez Caldeira á commissão, porque, vá ou não vá, elle póde ser approvado por esta camara. (Apoiados)

O sr. Presidente: — Eu, para satisfazer a todos os desejos da camara, vou propôr este objecto á votação por partes.

Consultada a camara por este modo, resolveu-se que fossem remettidos á commissão os additamentos do sr. Vellez Caldeira, excepto o que é additamento ao do sr. Cardozo Castello-Branco, e que este, e o do sr. Cardozo Castello-Branco não fossem d commissão.

O sr. Presidente: — Por consequencia ficam em discussão unicamente o additamento do sr. Cardozo Castello-Branco, e o do sr. Vellez Caldeira que tem relação com este.

O sr. Avila: — Sr. presidente, o additamento do sr. Castello Branco é santo e justo: é até regulamentar, e mesmo quando não fosse consignado na lei, o governo a quem pertencia adoptar uma regra sobre este objecto, de certo adoptaria o que está no additamento. Entretanto já que o additamento se apresentou, será bom que a sua disposição vá na lei, e por isso eu voto com toda a satisfação por elle. (Apoiados)

A camara sabe, que a lei que regula o assentamento das classes inactivas estabelece como ponto de partida o dia 30 de junho de 1849; por consequencia se as vacaturas que tem occorrido desde então, são mais do dobro do assentamento que se tem feito ate agora, se houver uma margem sufficiente para comprehender todos estes novos pensionistas, e talvez haja, segue-se que não ha que estabelecer preferencia entre elles; mas se não houver essa margem, se não puderem ser attendidas todas ao mesmo tempo, por não haver as sufficientes vacaturas, segue-se que ha a estabelecer uma regra de preferencia entre elles, e esta de certo não póde nem deve ser. outra senão aquella proposta no additamento do sr Castello Branco (Apoiados). Por consequencia, repito que voto por elle, ainda que pareça desnecessario; porque de certo o governo não seguiria outra regra.

Agora quanto ao additamento do sr. Vellez Caldeira direi, que é uma idéa exacta, mas está mal redigida, e é até desnecessaria, porque a regra que s. ex.ª estabelece, está em vigor. — Mas a frase desde já póde dar logar a um equivoco ou a uma interpretação que não reputo a melhor. Se este desde já, quer dizer — que se lhes faça o assentamento desde já, isso é impossivel que se adopte, porque não se póde assentar pensão alguma, sem ter vagado o do-

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bro. — Se o illustre deputado quer tomar para ponto de pallida para este assentamento, o assentamento de 30 de junho de 1849, muito bem e se é essa a sua intenção, direi que até é desnecessaria uma proposta; mas se é o contrario disto, se quer que se faça desde já o assentamento, haja ou não cabimento, isso é que não póde ser, e neste caso voto contra o additamento.

O sr. Vellez Caldeira: — Eu approvo inteiramente a proposta do sr. Castello Branco; e em quanto ao meu additamento, elle não comprehende a idéa que indicou o sr. Avila, porque o que desejo, e que assim como a camara hontem fez uma excepção a respeito da pensão que votou, na regra adoptada para o assentamento das pensões, se faça o mesmo a respeito dos pensionistas a que se refere o projecto

O sr. Avila: — Se o illustre deputado intende que a camara não devia votar a pensão que hontem votou, o meio de que deve lançar mão é o de propor a reconsideração da decisão de hontem, mas não pedir que se converta em regra geral aquillo que se consentiu como uma excepção em circumstancias especialissimas. Além de que é necessario ter em vista não violar o principio que a lei de 16 de novembro de 1841 estabeleceu, em virtude da qual já hoje é menor a verba que se paga ás classes inactivas, e de futuro ainda ha-de vir a ser mais consideravel a economia resultante da mesma lei.

O sr. Vellez Caldeira: — Eu não quero atacaras decisões da camara; a minha obrigação é respeita-los; o que desejo é que se execute o preceito da caria de ser a lei igual para todos, e se a camara fez uma excepção á regra do assentamento das pensões a respeito de um individuo, porque essa pensão era para alimentos, a mesma excepção deve ser applicada a estes pensionistas, por que tambem as suas pensões são para alimentos.

O sr. Cazal Ribeiro; — Eu não estive hontem presente quando se discutiu a pensão, á que o sr. deputado se refere; mas segundo as informações que me deram, o caso de que se tracta, não é a mesmo Em primeiro logar aquella pensão era, por assim dizer, uma divida de sangue desta situação politica, e esta consideração, que não póde referir-se a nenhuma outra pensão, não podia deixar de actuar sobre o animo da camara, para ser menos rigorosa na applicação dos principios geraes que estão estabelecidos a este respeito, e para fazer alguma excepção, a favor daquelle pensionista; mas ainda assim mesmo parece-me que o que a camara votou, não foi aquillo que o sr. deputado suppõe, porque a camara o que determinou, foi (segundo me consta) que no caso de que houvesse cabimento na occasião do fallecimento do pai do pensionista, se fizesse desde já o assentamento, mas não deliberou que se fizesse o assentamento mesmo no caso de não haver então ou agora cabimento.

Por tanto não posso deixar do votar contra o additamento do sr. Vellez Caldeira, e julgo que deve ser approvado o do sr. Cardozo Castello Branco.

Procedendo-se á votação, foi approvado o additamento do sr. Cardozo Castello Branco; e foi rejeitado o do sr. Vellez Caldeira; intendendo-se que a remessa dos artigos addicionaes do sr. Vellez Caldeira á commissão, não impede o andamento deste projecto.

O artigo 6.º do projecto foi approvado sem discussão.

O sr. Ministro da fazenda: — Vou ler uma proposta de lei. E a seguinte

Proposta de lei (n.º 56 B): — Sendo reconhecida a impossibilidade de se discutirem em ambas as camaras, nos poucos dias de sessão que restam do presente mez, os projectos de lei da receita e despeza do estado para o anno economico proximo futuro, e carecendo o governo habilitar-se legalmente para cobrar as rendas publicas, e para lhes dar a devida applicação nos termos da legislação em vigor, em quanto o? referidos projectos não forem convertidos em lei, julgo indispensavel sujeitar ao vosso exame e approvação a seguinte proposta de lei.

Artigo 1.º É o governo auctorisado para proceder á cobrança dos impostos e demais rendimentos publicos, respectivos ao anno economico de 1853 a 1854, e a applicar o seu producto ás despezas do estado correspondentes a este mesmo anno, segundo o disposto no decreto de 26 de julho de 1852, e mais disposições legislativos em vigor.

Art. 2.º Esta auctorisação durará até ao fim da actual sessão, se antes não fôr approvada pela côrtes a lei da receita e despeza do estado para o referido anno economico.

Art. 3.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Ministerio da fazenda, em 22 de junho de 1853. = Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello.

(Continuando) Pela natureza da proposta V. ex. verá que é urgente, por isso pedia lhe mandasse dar o andamento ordinario, para que a commissão de fazenda possa apresentar quanto antes o seu parecer sobre ella. Parece-me que está redigida de maneira que não poderá suscitar duvida alguma aos illustres membros da commissão, nem mesmo aos nobres deputados que não são da commissão; no entretanto elles farão o que julgarem melhor.

Foi declarada urgente, e remettida á commissão de fazenda.

O sr. Presidente: — Passa-se á

SEGUNDA PARTE DA ORDEM DO DIA.

Discussão do projecto nº 41 — Orçamento da despeza.

O sr. Secretario Rebello de Carvalho (Principiou a lêr o projecto em que se decreta a despeza.)

O sr. Avila: —. V. ex.ª não póde por em discussão o projecto n.º 41, que o sr. secretario vai lêr, senão depois do estarem votados todos os orçamentos parciaes.

O sr. Presidente: — Se o sr. deputado me dá licença, eu explico o que tencionava fazer. Depois da leitura do projecto hei-de perguntar á camara o modo como intende, que deve regular esta discussão; mas o que tencionava fazer depois, fal-o-hei agora.

Tem havido diversos modos de discutir o orçamento entre nós. Houve uma discussão geral em 1851; depois da discussão em geral entrou em discussão o projecto correspondente a este, e depois é que se discutiram os orçamentos capitulo por capitulo, ou o desenvolvimento como o ministerio apresentou. Nos annos anteriores tinha-se discutido cada

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um dos orçamentos parciaes, o depois e que se discutiu o projecto correspondente a este. Ha dois methodos a seguir: qual delles quer a camara adoptar Eu, se isto cabo nas minhas attribuições, que estão! comtudo subordinadas á decisão da camara, intendo que é mais conveniente que se discuta primeiramente o orçamento em geral, e depois que se discuta cada um dos orçamentos parciaes capitulo por capitulo, (Apoiados) porque o projecto e o resultado delles. (Apoiados) E e isto o que eu proporei á camara se convém nisso, quero dizer, ha uma discussão geral, e depois entra-se na discussão do orçamento da junta do credito publico, e neste caso tambem é desnecessario estar a lêr o projecto. Está por tanto em discussão na sua generalidade o projecto n.º 41, sobre o orçamento da despeza do estado.

O sr. Cunha Sotto-Maior (Sobre a ordem): — Sr. presidente, eu não quero repellira discussão do orçamento, nem retardar o exame que os deputados têem direito de fazer da gerencia dos srs. ministros; mas parece-me que nós não podemos entrar com verdadeiro conhecimento de causa nesta discussão, sem ler presente o relatorio e outros documentos que o sr. ministro da fazenda deveria ter ha muito tempo mandado á camara, porque a apreciação do orçamento depende do modo como o sr. ministro se houve na gerencia dos dinheiros publicos; e isto tem ligação com a gerencia futura.

Ora ha dias o meu illustre amigo o sr. deputado Avila pediu ao sr. ministro da fazenda que tivesse a bondade de mandar á camara o relatorio e alguns documentos, que prendem com o orçamento; o sr. ministro observou que alguns documentos estavam impressos, e que viriam á camara em pouco tempo. Mas o sr. ministro da fazenda, ou por ler que fazer, ou por outro qualquer motivo, não mandou ainda nem o relatorio nem os documentos.

Eu não quero propôr o adiamento, porque tendo manifestado por vezes que devia haver toda a urgencia nesta discussão, pareceria que era contradictorio, se na occasião em que se annuncia a discussão do orçamento, me atrevesse a propôr o adiamento desta discussão até virem o relatorio e mais documentos; mas não o proporei. No entretanto se o sr. ministro da fazenda tem o relatorio e alguns documentos já impressos, peço-lhe que os mande, e que sejam distribuidos quanto antes, e que se entre logo nesta discussão.

Por consequencia, se acaso a camara acha que merecem alguma consideração estas minhas observações, proporia que em quanto estes documentos e relatorio não viessem, se sobre-estivesse na discussão do orçamento, porque não sei como a camara quer á vista do estado deste paiz nú e descarnado, entrar na discussão do orçamento, e dar um voto consciencioso. Ora o acto addicional, que a camara approvou no anno passado, determina com relação ao sr. ministro da fazenda, que uma das suas primeiras obrigações é apresentar quanto antes o relatorio da repartição a seu cargo. Eu creio que á camara ainda não foi presente nenhum relatorio apresentado por s. ex.ª; e n'um paiz onde as finanças estão tão desbaratadas, onde a administração da fazenda é, para assim dizer, uma diversão, não sei como se queira discutir uma questão essencialissima, sem estarem presentes os documentos relativos a este objecto. E a discussão mais nua e descarnada possivel, e nem me lembra que se começasse nunca a discussão do orçamento sem se apresentarem as documentos que servem para o apreciar. Pois se vós fallais em medidas novas, onde estão ellas. Ninguem as viu, ninguem as conhece.

Por consequencia, eu já disse que não me atrevo a mandar proposta para a mesa, mas se v. ex.ª intende que estas minhas reflexões merecem alguma consideração, e se os nobres deputados acham que eu tenho razão, espero que me ajudem neste empenho; e se os illustres deputados acham que esta minha proposta não serve de nada, levantem-se e peçam a palavra para a combater, que eu lhe responderei.

O sr. ministro da fazendo (Fontes Pereira de Mello): —.Sr. presidente, eu já manifestei numa das sessões passadas o desejo que tinha, e a obrigação mesmo, de apresentar quanto antes o relatorio do ministerio da fazenda a meu cargo, acompanhado dos documentos respectivos; mas contando com a benevolencia da camara disse nessa occasião, que os muitos trabalhos de que estava sobrecarregado, não me tinham permittido fazer ainda ©relatorio, que é sempre o costume ser feito pela mão dos ministros. Disse eu mais nessa occasião que uma parte dos documentos que acompanham o relatorio, e que são verdadeiramente a parte mais importante para a discussão e illustração da Camara, que era absolutamente indispensavel para a discussão, eu poder ia em poucos dias mandar para a camara esses documentos que estivessem impressos, e effectivamente o estão, e hoje mesmo estando na secretaria da fazenda dei ordem para serem broxados e mandados á camara.

Não me parece que o illustre deputado fosse exacto em dizer que eu tinha infringido as disposições do acto addicional, nem da carta constitucional, porque eu não acho nem em um nem em outra, disposição que determine a época em que os ministros devem apresentar os seus relatorios. O que se acha no acto addicional a respeito das obrigações do ministro da fazenda já foi cumprido por mim. Diz o acto addicional no artigo 13.º (Leu)

É exactamente o que eu fiz; eu cumpri este preceito, apresentando a conta geral do anno findo e a conta do exercicio do actual anno economico; apresentei além disso as contas de gerencia do ministerio a meu cargo, que ainda faltavam para completar a lacuna que existia em relação ás ultimas contas apresentadas na camara pertencentes ao mesmo ministerio, e estão hoje em dia, por consequencia as contas da gerencia do ministerio da fazenda; e apresentei tambem o orçamento geral da receita e despeza do anno seguinte que manda o mesmo artigo 13.º do acto addicional; e por tanto tenho cumprido as suas disposições.

Parece-me que o nobre deputado não foi bastante rigoroso na appreciação daquillo que me imputava estar em falla, para com a camara.

Agora em quanto á necessidade da presença do relatorio e dos documentos, que estão annexos, não me parece que seja um objecto tão importante, como o nobre deputado diz; e de que não possa prescindir-se para a discussão do orçamento; principalmente no que toca a gerencia dos dinheiros publicos, porque uma parte dos documentos que acompanham o relatorio, são mais documentos comprovativos da receita effectuada nos diversos cofres do reino do que da applicação da despeza ou do modo como tem sido dis-

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tribuido pelos differentes ministerios, e parece-me que essa parte terá de ser mais considerada no orçamento da receita do que na discussão deste orçamento. Não me parece pois que a apresentação destes documentos seja uma condição indispensavel para se poder discutir o orçamento da despeza.

Com tudo eu torno outra vez a comprometter-me para com o nobre deputado, e com a camara a mandar distribuir esses documentos, que estão impressos, como já disse, porque não sou capaz de faltar á verdade; mas falta um pequeno trabalho, que é necessario para se poder fazer a distribuição convenientemente pelos srs. deputados.

Parece-me que ficará satisfeito o meu nobre amigo o sr. Cunha; e que talvez não insista na sua questão de ordem, por isso que o nobre deputado, como tem manifestado por muitas vezes, deseja anciosamente que se discuta o orçamento, assim como o deseja o governo e como o desejam todos os illustres deputados, porque é um dos objectos mais importantes que ainda pezam sobre a camara.

O sr. Carlos Bento: — Sr. presidente, é tal a opinião que eu tenho á formalidade constitucional, que confesso que não apoio o adiamento apresentado pelo illustre deputado, que se senta naquelle lado da camara, ou antes tendencia de adiamento, porque não chegou a ser adiamento, com quanto eu intenda que taes observações são justas, com quanto eu intenda que era necessario (e o sr. ministro da fazenda até certo ponto reconheceu esta necessidade) que á camara fossem presentes os documentos a que se deve referir o relatorio de s. ex.ª, para que se podesse fazer idéa exacta do nosso estado financeiro.

Accresce, sr. presidente, que as nossas circumstancias são circumstancias especiaes. O orçamento que nós tractamos de decidir hoje, não é o orçamento que se tem discutido até agora, porque os orçamentos quasi geralmente nunca appareciam depois de medidas tão importantes, como aquellas que foram tomadas por s. ex.ª o sr. ministro da fazenda conjunctamente com os seus collegas. Ainda não houve a apresentação de medidas tão importantes, tomadas dictatorialmente em relação a fazenda, para se conseguir um resultado qualquer, e o sr. ministro da fazenda foi o primeiro a proclamar, que era para se realisar esse resultado, que tomou essas medidas. Nem era de suppôr que s. ex.ª deixasse de ser movido por um fim importante, por exemplo, o de restabelecer o equilibrio entre a receita e a despeza. E necessario saber se effectivamente, se realisou esse equilibrio entre a receita e a despeza.

O sr. ministro da fazenda disse muito bem, que esses esclarecimentos serviam mais ainda para a receita do que para a despeza; concordo nesse ponto; mas o que é verdade é, que nas circumstancias extraordinarias em que se acha o nosso paiz, o orçamento da receita até certo ponto esta especialmente subordinado ao orçamento da despeza, senão veja a a camara uma circumstancia. A receita do estado é orçada em 12:000 contos, mas é preciso que a camara saiba, e sabe-o perfeitamente, que 1:000 e tantos contos são um ramo de receita tirado da despeza, isto é, é a deducção feita aos empregados publicos eá divida fundada interna e externa, que passa para a verba da receita. Logo a camara vê que o orçamento da despeza, nas circumstancias especiaes de deficiencia de recurso do thesouro, está altamente subordinado ao orçamento da receita. E é por isso que eu em épocas anteriores me parece que não estava inteiramente fóra do verdadeiro caminho, quando pedia que primeiro se discutisse o orçamento da receita que o da despeza.

Nas sessões passadas fiz essa proposta e não estou envergonhado de a ter feito; não me parece que deixasse de ter motivos sufficientes, para pedir que se apresentasse primeiro a receita com que podiamos contar; porque não basta dizer que havemos de fazer toda a despeza que se apresenta no orçamento; não basta dizer que o estado exige uma despeza certa e determinada, que sempre se ha-de fazer; eu não posso seguir os preceitos dessa escóla, assim como não sigo inteiramente os preceitos da escóla contraria, isto é, que só se ha-de pagar aquillo para que chegar a receita; ha certas despezas que se hão-de fazer por força, embora fosse necessario augmentar a receita, embora fosse preciso um encargo novo. Mas assim como ha certas despezas que não se podem deixar de fazer, tambem ha despezas — que se podem fazer quando ha muito para ellas, e que quando a não ha, se podem diminuir. É o que succede aos vencimentos dos empregados publicos e aos juros da nossa divida interna e externa.

Ainda mais, sr. presidente, ha questões pendentes a decidir, por exemplo, com relação ao decreto de 30 de agosto, e ao decreto de 9 de outubro que me parece que é um decreto subsidiario, porque me parece que era destinado a supprir a falta de execução do decreto de 10 de agosto por parte de um estabelecimento. A amortisação de notas a que o banco era obrigado pelo decreto de 3 de agosto, não se tinha effectuado, e então o governo disse pelo decreto de 9 de outubro de 1852 — para satisfazer a essa despeza que o banco deixa de fazer, o governo apropria-se da receita de 300 contos que o contracto do tabaco devia satisfazer ao banco. Um no orçamento procuro eu essa despeza que devia ficar a cargo do governo, mas não a acho; quero dizer, o governo é obrigado a amortisar mais 9 contos de réis de notas mensalmente, 108 por anno; perguntarei eu, considera-se em execução o decreto de 9 de outubro? Se se considera, qual é a razão porque no orçamento falta essa despeza?...

O sr. Presidente: — Mas permitta-me que lhe observe, que isso é já um pouco fóra da questão de ordem; ella limita-se a saber, se havemos ou não entrar já na discussão do orçamento.

O Orador: — Eu confesso que v. ex. tem razão; mas succede muitas vezes, que se tem razão em diversas posições; V. ex.ª tem razão na sua posição de presidente, e talvez eu não esteja completamente destituido de razão, como deputado, apresentando as duvidas que se me offerecem a respeito do orçamento. É verdade que todas estas considerações levam á adopção da proposta mandada para a mesa pelo illustre deputado; mas já digo — eu sou altamente defensor das formalidades constitucionaes. Eu acho que o peior de todos os governos é o da permanencia da dictadura. (Apoiados) Chegou a occasião de discutirmos o orçamento, e parece-me que não estamos sufficientemente informados para o discutir; acho que nos faltam alguns esclarecimentos para o podermos discutir, mas acho que ainda era peior não o discutir.

Resumindo, sr. presidente, direi, que com quanto eu intenda que seja uma circumstancia bastante triste

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não ter podido ser presente a esta camara o relatorio do sr. ministro da fazenda, eu que desejo a intervenção desta camara, não posso comtudo deixar de approvar, que se discuta desde já o orçamento, não desconhecendo a importancia dos esclarecimentos que faltam.

O sr. Arrobas: — Reconheço que o governo cumpriu o acto addicional, mandando á camara os orçamentos e as contas de gerencia. Por este lado o sr. ministro da fazenda tem dado provas de zelo e actividade: mas não desejando eu fazer censura ao governo, não posso deixar de notar comtudo a difficuldade de se poder entrar na discussão do orçamento, sem que o relatorio do sr. ministro da fazenda venha á camara.

Sr. presidente, um orçamento e a expressão de todas as necessidades nos differentes ramos do serviço; e os meios necessarios para occorrer a estas necessidades deve ser bem conhecido de todos, especificando-se no orçamento a verba correspondente a cada necessidade; e não é possivel conhecerem-se as relações que existem entre umas e outras, sem que venham os esclarecimentos a tal respeito. Os nossos orçamentos não são orçamentos, são uma cousa que eu não intendo; e o unico orçamento que me dei ao trabalho de estudar, não o intendi. entre nós um orçamento não quer dizer a expressão das necessidades de um ramo de serviço, quer dizer outra cousa que provarei, quando se tractar da especialidade deste objecto.

Os proprios relatorios que tem vindo aqui, e que eu examinei, não são sufficientes, para por elles se conhecer a verdade do orçamento; porque as verbas que vem nos orçamentos, muitas vezes não são as sufficientes para aquillo a que são destinados; outras vezes as applicações não são convenientemente feitas. Não basta dizer, que dois e dois são quatro, é preciso conhecer que as operações que o governo tem feito, são dirigidas com talento, e executadas com economia; é preciso que tudo isto se esclareça. Mas o que vejo no orçamento, não é mais do que um jogo decifrassem importancia nenhuma. Algumas daquellas que eu examinei, não satisfazem ao fim para que vem alli consignadas, e outras não são verdadeiras. Por tanto não posso entrar na discussão do orçamento sem vêr a explicação do mesmo orçamento, e esta explicação é o relatorio do sr. ministro da fazenda.

Ora não estando a camara sufficientemente habilitada para entrar na discussão do orçamento, de que serve esta pressa, que parece haver, para se entrar desde já nessa discussão í Que pressa ha em discutir-se, sem o perfeito conhecimento de causa, um assumpto, o mais importante que um deputado é chamado a resolver? Eu confesso que não intendo os orçamentos; e desafio os nobres deputados, para que digam, se ha algum que os intenda, sem serem explicados.

Não podendo eu intender uma peça que sou chamado a julgar, tenho escrupulo em emittir o meu voto, e por isso tenho receio de entrar na discussão do orçamento; e talvez que me ausente durante a sua discussão, em quanto elle não exprimir sinceramente as necessidades de um certo ramo de serviço.

Diz-se: ha muita pressa em discutir o orçamento; eu tambem tenho muito pressa, em que elle se discuta, mas quero que elle se discuta como deve ser, e não que se discuta á pressa, que até certo ponto póde prejudicar os interesses do paiz; porque não desejo entrar na discussão de uma materia, que não póde ser discutida nem avaliada, sem conhecimento de causa.

Portanto apoio o pedido feito pelo illustre deputado; muito principalmente depois da declaração que fez o sr. ministro da fazenda, de que os documentos que fazem parte do seu relatorio, brevemente virão á camara.

O sr. Ministro da fazenda (Fontes Pereira de Mello): — Não sei se o illustre deputado que acabou de fallar, fez alguma impressão na camara; porque depois de dizer que não intendera o orçamento que se discute, fez uma censura que comprehende não só este orçamento, mas todos os orçamentos passados, presentes e futuros, que forem como este: e até disse que não intendendo o orçamento se abstinha por consequencia de entrar no exame desse documento, sem que eu apresente o relatorio do ministerio a meu cargo. Os orçamentos não são faceis de fazer. Eu por muito tempo tambem os não intendi, e só á força de estudar muito pude intender alguma cousa; o se compararmos o actual orçamento com os outros orçamentos que se tem apresentado, este não é mais do que a cópia dos orçamentos anteriores.

Eu admiro, sobre tudo, por conhecer o talento e a capacidade do nobre deputado, que s. ex.ª não possa intender o orçamento, sem que eu apresente o meu relatorio; mas esta minha admiração sobe de ponto, quando em todos os relatorios dos differentes ministerios não encontro nelles documento algum, que possa ser indispensavel para a discussão do orçamento de despeza.

A moção que o sr. Cunha fez, é para que senão comece a discutir o orçamento sem que se apresente o relatorio do ministerio da fazenda a meu cargo; mas o relatorio do ministerio da fazenda, assim como todos os relatorios apresentados pelos diversos ministerios, servem só para o parlamento apreciar a conducta e o procedimento do governo no intervallo das sessões; e em regra não se póde dizer que serve para esclarecer o orçamento. Por exemplo o relatorio que eu apresentei nesta camara no anno passado, contém diversos documentos; uma parte delles é relativa ao negocio do sal de Setubal. Pergunto: — de que servem, para illustrar a questão do orçamento, as representações das camaras municipaes relativas ao sal de Setubal! De nada. Depois seguem-se diversos documentos a respeito da linha de circumvalação da cidade, depois um mappa dos rendimentos arrecadados nas diversas alfandegas do reino no anno anterior; irias todos estes documentos, assim como quaesquer esclarecimentos que possa apresentar o relatorio, em nada alteram a cifra que vem comprehendida no orçamento. Segue-se depois um mappa das receitas provenientes das contribuições directas arrecadadas nos diversos districtos no anno de 1850 a 1851; mas quaesquer que sejam estes mappas ou documentos, repito, em nada alteram a cifra do orçamento. Então para que é esta urgencia de se apresentar o relatorio do ministerio da fazenda, sem o que não se póde intender o orçamento da despeza?

Todos estes são documentos que illustram e que a camara deve ter em consideração, mas para apreciar a questão do orçamento, o relatorio não serve de nada. Os relatorios dos ministerios como já disse, servem para se poder examinar a marcha do governo

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no intervallo das sessões, mas não tem nada com a questão dos orçamentos.

Não posso negar que o illustre deputado e a camara tem direito de exigir os documentos, nem nego mesmo que elle alguma luz possam lançar quanto ao orçamento da receita, mas quanto ao da despeza que é aquelle que se vai discutir, não comprehendo o motivo porque tanto se insta por elle.

Ora todas estas observações que acabo de fazer, foram mais para justificar o orçamento que apresentei á camara, e que um illustre deputado atacou tão desapiedada e cruelmente, do que para combater a questão de ordem apresentada pelo illustre deputado o sr. Cunha, que não está formulada por escripto, nem me parece que este illustre deputado insista muito por ella, porque quando s. ex.ª faz empenho numa cousa qualquer, insta muito por ella, e prorompe ate em altas vozes. Creio que as minhas observações lhe fizeram algum pezo.

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Não fizeram, está enganado: eu tenho a palavra para responder.

O Orador: — Não digo isto com sentido nenhum de o offender: o illustre deputado sabe que eu o tracto melhor do que me tracta a mim. Portanto, digo, que se o illustre deputado insistir na sua moção, e se eu intender, que devo pedir de novo a palavra, fa-lo-hei, ainda que creio não será preciso: lisonjeio-me de esperar que á vista das observações que acabo de fazer, o illustre deputado não reputará demasiadamente importante para esta discussão, a apresentação do meu relatorio.

O sr. Cindia Sotto-Maior: — Não julguei que a minha pobre e infeliz proposta havia de escandalisar tanto o sr. ministro... (O sr. Ministro da fazenda: — Não escandalisou) Eu vou dizer os motivos que pie levaram a faze-la, e os motivos pelos quaes ainda presisto nella, porque as observações feitas pelo sr. ministro não me demoveram nem um apice da convicção que havia formado.

Das proprias palavras do sr. ministro da fazenda, deprehendi eu, e deprehenderiam muito os entes mais apaixonados, que o relatorio se compõe de documentos, e de documentos que dão conta de certos dados importantes, de documentos que illustram exprimem e explicam a gerencia de um ministro, ou de um dado ramo do serviço. Ora sendo isto assim, parece-me que propondo eu que á camara fosse enviado o lelalorio do sr. ministro, com os documentos que s. ex.ª já declarou estavam impressos, e que senão achavam na camara, por isso que estavam a broxar; circumstancia aggravante para o negocio, já a camara vê, digo, que sendo estes documentos os que explicam a gerencia do sr. ministro, eu estava no meu direito fazendo similhante pedido.

Para que se possa examinar uma dada despeza, examinam-se as razões que o ministro expende para a fazer; e se os factos me comprovarem, que a despeza foi mal feita; se eu vir que ella não produziu resultado nenhum vantajoso, eu fico habilitado para negar a verba, caso que ella seja novamente pedida.

Já a camara vê que não é indifferente a apresentação do relatorio do sr. ministro, antes devotarmos o orçamento.

Demais, vós que tomastes estes logares para exprobardes ao lado direito da camara todos os erros e desacertos que elle commetteu, tendes obrigação de fazer melhor do que elle fez; mas nesta questão não fizestes melhor, fizestes peior, porque o lado direito da camara nunca apresentou ao parlamento a discussão dos orçamentos, se não depois de apresentar os relatorios. Pois porque não apresentastes já os relatorios? Esta é que é a questão! Diz-se que a questão é uma questão de formula; mas se o governo representativo é uma questão de formula, admira como os puritanos, aquelles que n'outro tempo queriam tudo aferro e fogo, se esqueceram já dessa formalidade, e approvam hoje o que então combatiam.

Pergunto: se acaso um deputado pedir o relatorio do sr. ministro da fazenda, e se em virtude delle mostrar que certas despezas foram malfeitas; que além de malfeitas, foram improductivas, que ha escandalo na distribuição da despeza, e que por conseguinte a camara não deve votar certas verbas, pergunto, digo, não haverá alguma utilidade em se examinar o relatorio? Parece-me que sim.

Mas, sr. presidente, se acaso é necessario que eu dê um documento de humildade, eu, que sou lido como um homem soberbo, cheio de orgulho e de maldade; eu, que sou tido, para assim dizer, como uma especie de satanaz parlamentar; se a camara quer que eu gema até ue rebentarem os rins, por ler vindo dizer-lhe que o sr. ministro não cumprira com o artigo 13 do acto addicional, eu, sr. presidente, soffrerei mudo e indignado a pena que por tamanho delicto me fôr imposta. Não sei como disse que o acto addicional, no seu artigo 13, obrigava os srs. ministros a apresentarem n'um certo praso os seus relatorios: s. ex.ª, respondendo-me, disse que no acto addicional se não determinava a época em que devesse ter logar a apresentação dos mesmos relatorios, e na verdade, depois de lêr o artigo vejo que effectivamente não fui exacto. Por tanto, aqui me tem a camara a seus pés contricto e humilhado, confessando o meu erro; ainda nenhum sr. deputado veiu ao parlamento confessar tão francamente que commetteu um erro e uma inexactidão!

Eu não quero adiar a discussão do orçamento: não é esta a minha intenção, nem os meus desejos; tomara eu entrar nella quanto antes. O illustre deputado, o sr. Arrobas, póde ler escrupulo em entrar nesta questão; mas eu apesar de não ter todos os esclarecimentos, nem de estar sufficientemente habilitado para o fazer, desde já prometto entrar nessa discussão: hei de entrar nella de alguma maneira. Se a camara achar que esta discussão é extemporaneo, eu não lerei a menor duvida em retirar o meu pedido: se a camara quer que eu retire esta proposta, ou esta moção que eu fiz, como estou em maré de benevolencia, não tenho duvida, uma vez que alguem me peça para assim o fazer.

O sr. Presidente: — O sr. Cunha retira o seu pedido?

O sr. Cunha Sotto-Maior — Eu, sr. presidente, não me apresento nunca como victima, mas se alguem me pedir que o retire, ou se alguem mostra nisso desejos, eu não tenho a menor duvida em o fazer.

O sr. José Estevão (Sobre a ordem) — Eu pedi a palavra para lembrar ao illustre deputado que podemos cortar esta discussão, sem ser preciso pedir-lhe que use da sua generosidade. Eu peço a v. ex.ª que consulte a camara se quer passar á ordem tio dia.

Assim, se decidiu, e entrou portanto em discussão, na sua generalidade, o orçamento.

O sr. Arrobas: — Sr. presidente, eu não estava

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piepurado para entrar hoje na discussão du oiçaniento; e por isso náo loniarei muito tempo á camara jor agora, reservando-me para quando se tractar da discussão em especial do orçamento do ministerio da marinha, para então expor a minha opinião sobre o methodo de fazer entre nós os orçamentos, e sobre a difficuldade de votar com verdadeiro conhecimento de causa as verbas que alli eslão consignadas, sem os esclarecimenlos que julgo deverem sempre ucompa-nhar os orçamentos.

Unicamente tomei a palavra para poder responder ao sr. ministro da fazenda, visto que a camara julgando disculida a materia da questão de ordem, eu não pude usar da palavra que tinha pedido.,

Sr. presidente, o sr. ministro da fazenda disse que os relatorios dos respectivos ministerios não são necessarios para se votarem as verbas do orçamento; que a sua utilidade é unicamente a de se conhecer por elles a marcha do governo noanno anterior, para se conhecer se elle merece a confiança do paiz; mas eu discordo completamente da opinião de s. ex.ª, e pela minha parte não me julgo habilitado a discutir os orçamentos de um modo conveniente, sem que venham á camara esses documentos.

Eu discutirei unicamente o oiçarnenlo do ministerio da marinha, quando elle vier á discussão na especialidade, por isso que tenho supprido em parte a falla do relatorio daquelle ministerio com os esclarecimentos pedidos ao governo, e que o illustre ministro daquella repartição me tem mandado com toda a lealdade.

Sr. presidenle, eu vejo no orçamento um monlão de algarismos, que não sendo acompanhados de um bom relatorio, parecem mais organisados para encobrir a verdade, para difficultar o exame do legislador, do que para mostrar as necessidades de um ramo de serviço, e os meios de satisfazer a essas necessidades.

Quando eu disse que não intendia o orçamenlo sem as explicações e esclarecimenlos de um bom relatorio, não quiz dizer senão que elle em si está mal confeccionado; que os varios elementos de que elle se compõe não veem perfeitamente distinctos e classificados, nem veem expressar as relações que entre si ligam esses diversos elementos; e que falla a analyse circumstanciada para se poder avaliar se as operações são concebidas com prudencia, dirigidas com acerto, e executadas com economia.

Comtudo, relativameute a verbas que já existiam em outros orçamentos, a verbas augmentadas, ou novas ou supprimidas, é o relatorio quem deve explicar-nos os effeitos que se obtiveram com umas; quaes as vantagens e inconvenienies que produziram na practica, para se promover a continuação das vantagens e desviar os inconvenientes, podendo assim a camara reconhecer se as verbas, que veem repetidas dos outros orçamentos, devem ser conservadas, supprimidas ou modificadas, vendo pelos relatorios, se ellas satisfizeram aos fins para que eram propostas.

Sr. presidente, ha uma parte, que sem relatorio se não póde avaliar devidamente, se são as verbas supprimidas dos outros orçamentos. Annunciam-se como economias as diminuições no papel, e pelo menos no ministerio da marinha as verbas supprimidas dão ao estado uma grande perda, como provarei quando se tractar deste ministerio; e um relatoiio deve explicar as razões dessas suppressões, e as vantagens dessas pertendidas economias; deve dar-nos

finalmente os esclarecimento para poder ju!gar-se dessa decisão do governo.

As verbas novas tendem tambem a conseguir algum fim; o governo deve explicar as vantagens que dahi resultam; e o modo porque as operações, em geral, se devem dirigir para assignar um bom resultado. Por ullimo, sr. presidente, no orçamento vem confundidas despezas de natureza differente, o que toma impossivel um verdadeiro exame.

Sr. presidenle, deve.conhecer-se o estado, em que se acha cada repartição, e o que ha do importante a fazer, para se poder avaliar, se as verbas propostas tem uma applicação productiva, e se são sufficientes. Por exemplo, no ministerio da marinha pedem«e madeiras para conslrucção e reparo dos navios da armada; e com tudo o governo declarou não querer mandar proceder a construção alguma nova: o governo não diz em um relatorio, quaes são os navios que precisando e merecendo fabricos, devem ser fabricados durante o anno economico; não nos diz um relatorio a despeza de costeamento dos navios armados, quaes os navios que se devem vender, ou demolir; quaes as construcções novas que se devem fazer, para podermos sustentar um dado armamento, porque os navios não são elernos: e necessario cuidar a cada instante da sua substituição: não diz um relatorio, se os processos seguidos são os mais perfeitos I e economicos para os podermos conservar, aperfeiçoar, ou substituir.

Um relatorio, álem da analyse do passado, traz tambem a justificação do presenle. Ahi se veem uo relatorio da marinha de 1850 as relações nominaes de todos os servidores do estado, e isto não é indifferente, porque a camara póde intender, que apesar dos quadros serem legaes, elles se não preencham: nesse relatorio vem um quadro da distribuição da força naval, comparada com a dos annos anteriores; vem um mappa do estado dos nossos navios, pelo qual se podem avaliar as despezas necessarias para chegar a um estado normal; alli se encontra um largo relatorio sobre a organisação e necessidades do arsenal, da cordoaria, e das repartições de fazenda etc. e de tudo isto não posso deixar de concluir, que falla a parte mais importante nesta discussão; e por isso me absterei de entrar na discussão dos orçamentos dos outros ministerios, parecendo-me ler provado sufficientemente, que a opinião do sr. ministro da fazenda não é a melhor para se seguir, se se quizer votar com conhecimento de causa, e não tornar inutil a discussão sobre os oiçamentos.

Sr. presidente, a camara não deve limitar se na discussão do orçamento a fazer um papel de guarda-livros do governo: não deve examinar sómente, se as despezas que alli vem votadas, eslão auctorisadas por lei, mas deve ainda examinar, se essas despezas são todas productivas; se os fins a que ellas tendem, podem ser salisfeitos com os meios proposlos; e apezar das opiniões em contrario, que tenho ouvido nesta camara, peço licença para notar, que em todos os annos as commissões do orçamenlto, e ainda mesmo esta, se serviram deste poder, propondo a suppressão de verbas auctorisadas por lei.

Sr. presidente, quando se discutir o orçamento, que eu estou habilitado a discutir, mostrarei á camara, o que são, e para que servem os nossos orçamentos: mostrarei, que elles são calculados sem baze alguma segura; que não exprimem nada: que umas

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Verbas são excessivas, outras insignificantes, outras para applicar a despezas que se occultam; que as que são votadas para esse fim, tem de receber outra applicação; que tudo finalmente parece preparado para impossibilitar um exame intelligente, e um estudo methodico. Para então convidarei o sr. ministro da fazenda para me explicar certas cousas, e s. ex.ª verá, que quando eu disse que não se intendiam os orçamentos, não quiz dizer, que os não sabia ler, mas sim que elles não exprimiam cousa alguma; occultavam, o que podiam, e confundiam tudo

Sr. presidente, se em qualquer anno os relatorios são necessarios, neste são indispensaveis, depois de uma dictadura que fez reformas, como a da nova organisação de marinheiros militares, do pessoal de saude, a contadoria, e arsenal de marinha etc. — Eu desejo ver em um relatorio, se esse corpo de marinheiros militares tem dado na practica os resultados, que previu o illustre auctor daquella organisação; quero ver, se a rapidez dos armamentos, a disciplina, a instrucção, a regularidade e a economia tem sido o resultado obtido, ou se pelo contrario é tudo illusorio; e se para esse corpo quasi só se mandam os vadios que não servem para o exercito; se a marinhagem tem tanta ou menos instrucção que dantes; e se finalmente esta organisação só tem servido para dar origem a novos abusos: se a despeza tem diminuido com a suppressão do batalhão naval ele. E todo este estudo deve ser auxiliado por um bom relatorio; mas, graças á lealdade do sr. ministro da marinha, eu tenho quasi todos os esclarecimentos necessarios para discutir o orçamento da repartição de marinha, logo que s. ex.ª satisfizer, como tem feito até aqui, aos meus pedidos, que ainda restam por fazer.

Sr. Presidente, eu só usei da palavra para mostrar ao sr. ministro da fazenda as razões que tinha para me julgar impossibilitado de discutir na ausencia dos relatorios respectivos os differentes orçamentos, reservando-me unicamente para o de marinha, a respeito do qual obtive alguns esclarecimentos.

O sr. Ministro da Fazenda (Fontes Pereira de Mello) — Sr. presidente, eu pedi a palavra quando o illustre deputado que acabou de fallar, disse — que o orçamento estava organisado de proposito para não ser intendido por ninguem... (O sr. Arrobas: — Parecia). O Orador: — Parecia ao nobre deputado. Esta recriminação, sr. presidente, não é propria de um cavalheiro como o nobre deputado que se assenta nos bancos do parlamento. Se o governo fosse tão indigno da sua missão, que viesse trazer um orçamento á camara, ou um documento qualquer organisado de proposito para não poder ser intendido por ninguem, o illustre deputado era réo de um grande crime, de ter uma só vez approvado um acto deste governo; porque o governo que practicasse uma similhante indignidade, ou uma falla tão grave do cumprimento de seus deveres, não merecia o voto do illustre deputado, nem de nenhum dos membros do parlamento... (O sr. Arrobas: — Eu disse que parecia). O Orador: — Bem; não insisto mais sobre este ponto; mas peço ao illustre deputado, que usando da sua intelligencia que Deus lhe deu, e da sua illustração, me combata n'outro campo, porque sempre me ha de achar prompto a responder-lhe.

Sr. presidente, se o illustre deputado não intende o orçamento, como elle se deve intender, não tenho culpa disso. O illustre deputado prova que não intende o orçamento, quando diz — que precisa as explicações do governo para saber se ha de votar a verba relativa ao corpo de marinheiros militares — o illustre deputado prova que não intende o orçamento, porque depende das explicações do ministro para saber se ha de votar uma verba, que está auctorisada por lei, e que ha de fazer-se effectiva, em quanto o illustre deputado, ou qualquer dos illustres deputados, não fizer unia proposta alterando essa auctorisação, ou esse systema que está votado. Tem rasão o illustre deputado, porque não intende assim orçamento.

Sr. presidente, a camara tem de certo direito de examinar todas as questões do orçamento, e todas as questões de administração que lhe são correlativas; é por isso que neste e n'outro pai lamento tem sido sempre mais larga a discussão sobre este ou aquelle objecto, que é mais proprio para se tractar na apreciação do orçamento em relação ao seu exame, porque é nessa occasião que se fazem muitas considerações importantes, que se fazem muitas recommendações ao governo, e se tiram muitos esclarecimentos para guiar a administração, e de que se colhem muitas vantagens e resultados para o bom seguimento da causa publica (Muitos apoiados).

«Mas não voto, diz o illustre deputado, por esta verba sem me darem taes e taes esclarecimentos. » Pois o illustre deputado não teve occasião propria de levar a effeito os seus desejos, quando se votou a proposta para a fixação da força de mar? Pois não tinha então o direito de pedir todos os esclarecimentos ao governo, e munido delles dizer a camara — eu intendo que esta força não está convenientemente organisada, ou está mal organisada, e não se deve votar, porque é com estes meios que eu desejaria que se votasse (ou por tal ou qual motivo que podia apresentar o nobre deputado) e por consequencia proponho a sua revogação? Mas agora no orçamento ha devotar, póde não votar senão quizer — mas intendo que nesta parte o direito de votar é liberrimo, mas não logico; póde ser livre, mas não logico. É o que acontece nesta materia a respeito de todas as considerações que fez o illustre deputado, tanto em relação á reforma do pessoal de saude, como em relação a outras reformas que foram actos de dictadura, que hoje são leis do paiz; e que nem a illustre commissão de fazenda nem o governo tinham direito de excluir ou alterar no orçamento. (Apoiados) Irrogou-se uma censura por aquillo que era obrigação de cumprir. Como havia o governo deixar de mencionar no orçamento aquillo que está auctorisado por lei, e que dava direitos, ou em relação a funccionarios, ou em relação á fazenda publica? Como havia a illustre commissão de fazenda risca-lo?

O sr. Arrobas: — Eu declarei que votava por

ISSO.....

O Orador — Mas o illustre deputado foi severo de mais, e muito; metta a mão na sua consciencia no modo de apreciar o procedimento do governo e da illustre commissão de fazenda, com que fui de accôrdo, sobre que tivemos muitas conferencias ácerca deste objecto.

Permitta portanto o illustre deputado, que sem animosidade alguma, porque sou incapaz de a ter para com os meus collegas, e muito menos para com o illustre deputado, que lhe faça estas ponderações

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que exige a situação em que me acho collocado, e a obrigação que tenho de defender aquillo que na conformidade das leis está consignado no orçamento.

Sr. presidente, esperava que o illustre deputado na discussão da generalidade tractasse dor systema de fazenda que o governo tinha adoptado, e que n'alguma parte podia prender com o orçamento; vejo porém que se occupou do ministerio da marinha, que não está em discussão, mas eu acceito essa discussão quando quizer, e só quiz fazer sobresair a circumstancia de que não está em discussão, por bem da ordem. Eu não tenho a pretenção da infallibilidade; póde ser que aprecie mal, mas não declino a responsabilidade que me pertence, e o meu collega da marinha tambem não é capaz de deixar de responder ao illustre deputado sobre tudo o que lhe perguntar relativamente a qualquer objecto que diga respeito a repartição a seu cargo. Mas eu mesmo que redigi e examinei detidamente o orçamento da marinha do anno passado, não tenho duvida em responder a algumas observações do illustre deputado.

Queria s. ex.ª que o orçamento designasse a despeza correspondente para o fabrico de cada um dos navios, para as construcções novas e para outros misteres, em logar de fazer a apreciação, como está feita, pela natureza do material existente. Pois não sabe o illustre deputado que lendo de se apresentar ás côrtes o orçamento geral no principio de janeiro década anno, tem de ser confeccionado 6 mezes antes; porque logo que se fecham as côrtes, o ministro da fazenda pede aos outros ministros que collijam immediatamente os documentos necessarios para fazerem os seus orçamentos para ser apresentado as coites o orçamento geral em tempo competente; os outros ministros procedem a isso, de sorte que vem a ser 2 annos antes, que nesses ministerios se faz o orçamento para um certo anno; e quando isto é assim, já o illustre deputado quer que o governo indique com tanta antecedencia quaes os navios que precisam fabricos no anno economico de 1853 — 1854, e quaes as construcções novas que se hão de fazer! Isto é exigir de mais. O que o orçamento indica, é em relação a marinha que existe, á sua força, ás suas necessidades provaveis; tudo o mais é contingente de futuro. O governo apresenta uma nota em relação ao que se tem gasto nos annos anteriores, por exemplo no material em relação a maçame, velame, ferragens madeiras, etc.

O sr. Arrobas: — Vem tudo junto.

O Orador: — Não vem tudo junto; aqui está por exemplo — carvão de pedra para consumo dos vapores e serviço do arsenal 70:000$000 réis. Veêm algumas cousas reunidas, porque não podem deixar de vir; não se ha de fazer um orçamento para cada um dos objectos detalhadamente; isso seria querer o impossivel; os orçamentos seriam interminaveis, e não se chegava a resultado nenhum proficuo. (O sr. Arrobas: — Veja o orçamento francez) Tenho visto alguns orçamentos dos outros paizes, e a fallar a verdade não me tenho envergonhado muito do orçamento que se apresenta ás côrtes em Portugal quanto aos seus detalhes, e esclarecimentos que o acompanham.

Agora como o illustre deputado póde ter conhecimento do modo como se applicam estas sommas, do modo como se empregam, e pelas contas de gerencia do ministerio da marinha, que são apresentadas a camara, e que estão em dia, como julgo. O illustre deputado tem o direito de as examinar, mas como isso é trabalhoso, assenta que é melhor pedir esclarecimentos. O illustre deputado tem tambem o direito na discussão da especialidade de usar da sua iniciativa, e pedir os documentos que quizer para seu esclarecimento, que o sr. ministro da marinha não lhe negará um só dos documentos que lhe sejam precisos. Não sei pois como o nobre deputado vem dizer que não póde discutir o orçamento sem se ter apresentado o relatorio do ministerio da marinha.

O nobre deputado declarou que se tinha dirigido á illustre commissão de fazenda dizendo-lhe — Vós, commissão de fazenda, não estais decidida a augmentar a verba que eu mostro ser necessaria para os fabricos, e construcções novas que são indispensaveis...

O sr. Arrobas: — Que o governo quer fazer.

O Orador: — O governo tem os maiores desejos de o fazer; quer faze-lo, mas não póde, e ao nobre deputado compele nesta parte apreciar devidamente a situação do governo, porque não é só deputado em relação ás necessidades da marinha, mas de toda a nação portugueza, e tem de considerar todas as cifras que são de utilidade publica e de interesse geral (Apoiado) o illustre deputado póde ter muitos desejos de que tenhamos muitas fragatas, muitos brigues, muitos vapores, para mandar ás nossas colonias, e a todas as quatro partes domando, mas o governo não tem meios, porque se se applicassem os poucos recursos que ha só á marinha, ficariamos sem estradas, sem caminhos de ferro, sem instrucção; em summa deixaria de haver outros melhoramentos que o paiz reclama. Parece que o illustre deputado intende que senão precisa mais nada do que melhorar o estado da nossa marinha. Não ha um unico portuguez que não se interesse pelo augmento e prosperidade da nossa marinha, mas é preciso tambem que se façam algumas considerações mais elevadas, e não se deixar arrastar por este sentimentalismo, na verdade muito louvavel, mas que nos póde conduzir tambem a absurdos, quer dizer, a querer applicar tudo para um ramo só de serviço publico, alias muitissimo importante, despresando completamente os outros; porque note o nobre deputado que não se podia applicar maior somma para estas despezas senão á custa das outras.

A illustre commissão de fazenda respondeu pois muito bem ao nobre deputado — nós não votámos mais do que o governo pediu. O governo contenta-se com esta verba por força de necessidade: desejaria empregar muito mais na marinha, mas não póde, e por isso adia esse augmento para circumstancias mais prosperas, como hoje se está adiando para circumstancias mais prosperas a satisfação de muitas necessidades publicas. (Apoiados)

Portanto e esta a razão porque intendo que a illustre commissão de fazenda respondeu muito bem, e porque me parece que as censuras do illustre deputado foram demasiadamente acrimoniosas, com quanto esteja persuadido de que não foram estes os seus desejos; e o nobre deputado não podia deixar de reconhecer que eu faltaria aos meus deveres, se acaso não fizesse estas considerações, para justificar o procedimento do governo e da illustre commissão de fazenda. (Vozes: — Muito bem).

O sr. José Estevão (Sobre a ordem). — Eu uso da palavra sobre a ordem para pedir a v. ex.ª licença

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para lhe recordar que esta é a discussão em geral do orçamento. (Apoiados)

O sr. Presidente: — Na discussão em geral creio que todos os deputados lêem o direito de fallar sobre cada um dos pontos do orçamento, que querem, o que dispensa uma discussão em geral sobre cada um dos ministerios, junta do credito publico, etc. Entretanto a camara ahi está para resolver como intender.

O sr. Barão de Almeirim: — Sr. presidente, eu não posso deixar de notar com muito sentimento meu, que no dia em que se começa a discussão do orçamento do estado, a esta discussão fallam differentes ministros desses poucos que temos. Tendo sido a ausencia dos srs. ministros um dos motivos principaes pelos quaes o andamento dos negocios publicos nesta camara tem corrido de uma maneira pouco conveniente, melhor correriam de certo se não fosse a falta de attenção e assiduidade com que ss. ex.ªs teem tractado esta camara, faltando aqui constantemente; e deixando correr os negocios mais graves quasi á revelia; são mui poucos os dias em que assistem as sessões do parlamento; esta falta torna-se tanto mais notavel hoje quanto que ao cabo de 6 mezes de sessão quando se annuncia a discussão do orçamento, discussão a mais importante para o ministerio, não se apresenta aqui senão um dos ministros. — O ministerio ha muito que devia estar completo, mas não o estando, e havendo apenas 3 ministros que se apresentam no parlamento algumas vezes, hoje nesta discussão solemne não se apresenta senão 1. Se isto continuar durante o progresso desta discussão, não será possivel, de fórma nenhuma, que se realise o que o sr. ministro da fazenda declarou, que nas differentes repartições, cada uni dos srs. ministros daria á camara os esclarecimentos precisos, porque não estando presentes não podemos obter esses esclarecimentos especiaes a respeito de cada uma das verbas dos diversos orçamentos sobre que haja necessidade de fazer quaesquer observações; seria por consequencia muito para desejar que os srs. ministros deixando de tractar esta camara com a falla de consideração e attenção com que a tem tractado até aqui, ao menos nesta occasião da discussão do orçamento não abandonem a camara, e assistam com assiduidade á discussão do orçamento. (O sr. Ministro da fazenda: — O governo está presente). Não sabia que o sr. ministro da fazenda era o governo.

Depois de fazer estas observações não seguirei o exemplo do nobre deputado que encetou esta discussão, entrando desde logo na discussão especial de uma parte do orçamento, porque, eu intendo, que não é esta a occasião de entrar nessa discussão especial; quando ella vier, eu hei-de tambem tomar parte nella; porque intendo que ha muito que dizer sobre os differentes pontos, ou verbas dos diversos capitulos do orçamento em todos os ministerios, nos quaes se devem fazer illiminações completas, n'outras certas reducções parciaes, porque só assim poderemos fazer alguma cousa que concorra para a organisação da fazenda publica, mas isto só em especial se póde fazer; ha no orçamento muitas verbas a respeito das quaes se pódem lazer economias, e economias muito attendiveis, e que hão de dar um resultado bastante forte, para poder occorrer ás medidas de fomento com que este governo tem querido felicitar o paiz, mas que ainda até hoje o não tem conseguido, nem será possivel conseguil-o, nem tão pouco alcançar a organização da fazenda publica se se continuar na marcha ou systema que este governo tem adoptado até aqui.

Mas agora, sr. presidente, entrarei na discussão da generalidade do parecer n.º 41 da illustre commissão de fazenda, que é aquillo que está actualmente em discussão, e para esta não intendo eu, sr. presidente, que seja preciso a presença dos relatorios dos differentes ministerios, mas quando chegarmos á discussão especial, então intendo que será muito conveniente que já tenham vindo estes relatorios para por elles se poder conhecer da gerencia dos srs. ministros, e se as despezas que tem feito, tem sido todas em conformidade do que está designado por lei, ou marcado no respectivo orçamento, e por isso eu peço ao sr. ministro da fazenda que active a conclusão do seu relatorio tanto quanto fôr possivel para que seja presente impreterivelmente antes da discussão especial do mesmo orçamento.

Sr. presidente, diz a illustre commissão de fazenda, que intende, que muito conviria reduzir a despeza em varios ramos de serviço publico, que uma longa serie de vicissitudes tem tornado excessivamente dispendiosos. Depois menciona o estado desgraçado dos credores do thesouro, e dos servidores do estado, e conclue a commissão este periodo a que me refiro, dizendo, que é necessario, que é indispensavel haver o maior rigor, em despezas, que possam evitar-se, sem prejuizo de serviço e da causa publica. Ora, sr. presidente, depois da commissão apresentar este ennunciado esperava eu, que a illustre commissão nos apresentasse economias importantes, economias de absoluta necessidade, economias que podiam produzir um effeito consideravel e salutar para a organisação da fazenda nacional, e para o desenvolvimento dos melhoramentos materiaes do paiz; mas com espanto meu, sr. presidente, vi o contrario de tudo isto, vejo de mais a mais neste periodo, o seguinte: (Leu)

Sr. presidente, a commissão de fazenda reconhece a urgencia de todas as reformas, todos nós as reconhecemos, a opinião publica reclama-as todos os dias, e de todas as fórmas, e a commissão de fazenda diz-nos, que não acredita, que possam convenientemente fazer-se por occasião da discussão do orçamento!!!

E para admirar, sr. presidente, que ao mesmo tempo que a commissão de fazenda reconhece a urgente necessidade de se fazerem algumas reformas, diga, que não é na discussão do orçamento, que ellas pódem ter logar!... Então quando é que se podem fazer as reformas nas despezas publicas? Pois quando é que se podem propôr certas reformas, e diversas reducções nas verbas da despeza publica, senão quando se discute o orçamento?... É na occasião da discussão do orçamento, que devem examinar-se as verbas que são excessivas para as reduzir, as que são inuteis ou illegaes para as eliminar, e as que são productivas para as conservar, e as que podem concorrer para o fomento da riqueza publica, e para desenvolver os melhoramentos materiaes do paiz, para se augmentarem ou propôr outras novas; eis-aqui está como eu intendo a discussão do orçamento de despeza do estado,

O que eu vejo neste proceder da commissão, é seguir a tactica antiga, sempre que se tracta de economias, adiadas para o dia seguinte, é isto mesmo que se tem feito ha muitos annos.

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Sr. presidente, quando se tracta de economias, intende-se sempre que devem ficar para o dia de ámanhã, e com esta espera de dia para dia, o resultado é nunca chegarem, o resultado e que as rendas do estado são consumidas n'um sorvedouro, que ha muito tempo absorve as receitas publicas, e a fazenda dos contribuintes; eis-aqui finalmente em que dá este systema de adiar as economias; tudo com o fim de continuar sempre o governo a fazer despezas perfeitamente inuteis; é preciso empregar todos os meios para que o governo faça tambem as despezas productivas, e indispensaveis aos melhoramentos materiaes do paiz; é por meio das economias, que isto pôde e deve fazer-se.

Sr. presidente, ha muito tempo que o governo foi auctorisado pelo parlamento para fazer a reducção dos districtos administrativos, assim como dos concelhos do reino, organisando administrativamente o paiz de uma melhor fórma, por este meio o governo podia dar uma nova fórma a este ramo de serviço publico, e ao mesmo tempo fazer algumas economias na verba de despeza destinada para este fim; daqui podiam vir economias importantes; mas o sr. ministro do reino, ou o governo, não tem tractado disso. A commissão de fazenda diz no seu relatorio, que julga conveniente que o governo fizesse estas reducções, para as quaes ha tanto tempo, ha tantos annos o governo está auctorisado por lei especial!!! Eu intendo, que a commissão faria muito melhor serviço ao paiz, que muito melhor desempenharia o mandato que lhe deram os seus constituintes, se em vez desta simples observação, que faz ao governo, ella apresentasse aqui um projecto de lei, pelo qual essas reducções se levassem a effeito desde já.

Tambem ha muito tempo que o governo por uma lei passada no parlamento, está auctorisado a proceder a uma nova divisão ecclesiastica, reducções de diocezes, etc, e ainda até agora não tem feito nada a este respeito!... Por este modo não é possivel o governo chegar a organisar as finanças nem o paiz, porque elle não cuida nem practica os meios especiaes e necessarios, pelos quaes póde chegar a esse fim. Diz a commissão, que reconhece a necessidade do fazer refórmas e reducções, nas despezas do ministerio da guerra, mas que não é ella a propria para as propôr, nem esta a occasião de se discutirem.

Sr. presidente, eu julgo que é sempre opportuna a occasião para se fazer bem ao paiz, e julgo que é a missão dos deputados como representantes do paiz, promover esse bem; por consequencia, não posso com a commissão julgar que a occasião opportuna não é esta, intendo que sim, intendo que esta é a occasião de se fazerem as economias não só neste ministerio, mas em outros ramos de serviço publico. Quando chegar a occasião propria, quando se tractar desse ministerio, apontarei algumas verbas que não só devem ser reduzidas, mas eliminadas. Admira-se um illustre deputado de eu dizer isto, pois eu desde já lhe apresento uma. Qual é a necessidade que lemos de conservar o commando em chefe do exercito? Essa repartição que não serve para nada, senão para consumir 20:000$000 réis annuaes ao estado. (O sr. Camarate: — Peço a palavra.)

Diz mais a commissão que só com o effeito do tempo algumas reducções e economias se podem operar no serviço do exercito. Ora eu digo que em quanto esta camara não tomar uma medida pela qual deixe

de ter o governo a faculdade de conferir todos esses logares que forem vagando no exercito, não se faz nada, porque á proporção que ha um logar vago, esse logar é preenchido. Eu desejo que se faça aqui unia medida legislativa na qual isso se estabeleça de uma maneira tal que o governo não possa reincidir. Era preciso por consequencia que a commissão apresentasse este seu relatorio acompanhado de um projecto de lei em virtude do qual durante algum tempo fosse o governo inhibido de fazer promoções no exercito, e relativamente aos empregados civis intendo que devia a commissão apresentar uma medida que marcasse o mesmo, para que de fórma nenhuma se despachassem novos empregados civis em quanto houvessem supranumerarios que podessem preencher esses logares. Eu não vejo o decreto que obrigue o governo a fazel-o assim; ha muito tempo que todas as camaras teem aconselhado os governos dessa maneira, mas os governos teem sempre feito o contrario; e continuarão, em quanto uma lei lho não vedar.

Diz-se muitas vezes que o governo não póde preencher esta obrigação, porque entre as classes de inactivos supranumerarios não ha individuos que possam bem desempenhar os cargos que se acham vagos; mas estas classes são muito numerosas, e se em uma classe se não encontram individuos capazes, que possam preencher aquelles logares que estão vagos, podem ir buscasse a outra classe desses supranumerarios, onde de certo se encontrarão, e só por esta fórma se poderá obter uma verdadeira economia.

Quando chego ao ministerio da marinha confesso que me admira que a commissão não visse ahi tantas verbas que necessitavam de ser eliminadas (O sr. Palmeirim — Poço a palavra) quando chegar a occasião opportuna, eu as apresentarei, mas o que posso desde já dizer á camara é que sendo quasi textualmente copiado o orçamento do ministerio da marinha proposto para 53 a 54 daquelle que foi proposto o anno passado, não se lhe tocasse quando a commissão de fazenda do anno passado tinha examinado esse ministerio, tinha já apresentado aqui o seu parecer sobre elle, e nesse parecer havia reducções que importavam pouco mais ou menos em 70 a 80 contos, e quando tractarmos em especial do ministerio da marinha, eu apresentarei aqui essas mesmas reducções, e comprovarei que a cifra não ha de ir longe desta que acabei de indicar.

Sr. presidente, a commissão tractando da distribuição do imposto destinado para estradas, apresenta um mappa dessa distribuição. Eu confesso que a commissão das obras publicas que é auctora desse mappa, guiou-se mais neste negocio pelas reclamações dos povos do que effectivamente por aquillo que era justo. Este imposto creado para estradas é muito pequeno em relação ás necessidades que nós temos neste ramo de melhoramentos publicos, e confesso que desejaria muito poder augmental-o não só ao duplo, mas ao triplo ou quadruplo desta cifra; mas em quanto isto não póde ser, attendendo a que o ministerio e a commissão de fazenda não buscaram os meios de o poder conseguir, que eram as economias naquellas despezas que estão effectivamente marcadas no orçamento com liberalidade de mais, uma vez que isto se não faz, convinha aproveitar esse imposto o mãi que fosse possivel. E qual será o meio de o poder conseguir? Não era de certo outro senão estabelecer um systema geral de obras de estradas, em virtude do qual estas

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obras fossem principiadas em dois ou tres pontos do paiz, e dahi seguissem geralmente por essas estradas que devessem chamar-se estradas reaes, ou principaes ramos de communicação do paiz, e não se estabelecerem pequenas dotações para cada um dos districtos administrativos, as quaes não servem por fórma nenhuma senão para alguns pequenos reparos em estradas, reparos que por isso que são pequenos, por isso que as forças da dotação pela qual ellas são feitas, não dão meios para se concluirem em tempo competente, são pela maior parte das vezes destruidas pelos invernos que sobreveem, e por consequencia a despeza é completamente perdida para o paiz, e para o melhoramento material da viação publica; e além disso uma grande parte destas dotações é consumida pelas administrações, pelas fiscalisações, por aquelles que estão á testa desses trabalhos.

Não posso deixar por esta occasião de lembrar á camara o que aconteceu com as obras do Tejo, para as quaes havia uma dotação de 10 contos de réis annuaes, dotação que era consumida em mais de 5 contos pelos directores e fiscaes dessa mesma obra, e a obra não progrediu, nem podia progredir, porque não tinha dotação sufficiente para os trabalhos materiaes. É justamente isto o que acontecerá com a distribuição que a commissão apresenta do imposto destinado para as obras de estradas.

Dir-se-ha talvez que os povos reclamam, que todos querem que no seu concelho se applique alguma parte desse imposto que todos pagam para o melhoramento das estradas; mas é preciso que nós saibamos, se adoptado o systema que eu tenho apresentado aos povos desta ou daquella provincia que hoje poderiam reclamar com razão em consequencia desses trabalhos estarem distantes da sua patria, não veriam chegado o tempo em que os trabalhos chegassem a essa provincia, e podessem aproveitar-se do tributo por elles pago, e as suas reclamações cessariam; porque a opinião publica sempre é justa, e nós devemos sempre dar attenção ás justas reclamações dos povos, mas não quando ellas são desvairadas, de outra fórma havemos de prezistir sempre no estado em que lemos estado desde que se pagou este tributo.

Sr. presidente, o tributo para estradas é notado no orçamento em duzentos e tantos contos de réis. E bem claro que se este tributo tivesse sido bem approveitado como devia ser; se tivesse sido bem applicado, nós poderiamos ter pelo menos 20 ou 30 legoas de estradas por anno, e tendo-se pago este tributo ha 3 e 4 annos segue-se que teriamos já 60 ou 80 legoas de estradas, e não as temos. Por consequencia o mal está no systema, está no methodo, e é contra esse systema e contra esse methodo que eu não posso deixar de levantar a minha voz.

Diz mais a illustre commissão — julgando que esta cifra e muito diminuta para occorrer ás muitas necessidades do paiz sobre materias de estradas; que será muito conveniente que sobre ella o governo contractasse um emprestimo para poder fazer estes trabalhos em maior escala e com maior actividade e promptidão.

Mas, sr. presidente, como é possivel que a illustre commissão acredite nestas palavras. Como póde crer que seja possivel levantar um emprestimo quando não ha credito no governo, nem no paiz, nem fóra delle, e na efficacia de levar por diante estas obras. Qual é a razão porque apezar dos bons desejos do sr. ministro de obras publicas, nenhuma das obras que se tem procurado realisar, teem progredido entre nós? E porque não temos meios para as fazer, e não temos meios porque não lemos credito para negociar um emprestimo para essas despezas. E é em presença destes factos, que a illustre commissão não póde ignorar, que ella vem aconselhar o governo, e lembrar a conveniencia de levantar um emprestimo! Se a illustre commissão soubesse que havia alguem que queria contractar o emprestimo, ainda eu intendia que assim se exprimisse; mas eu creio que a illustre commissão não o sabe, por consequencia estas palavras lançadas no relatorio, intendo que não são senão palavras illusorias para entreter a opinião publica.

Diz mais a illustre commissão, que, em conformidade de uma proposta do governo, que foram applicados para o caminho de ferro de leste os fundos que o governo tinha applicado para o caminho do ferro do norte.

Sobre este ponto eu pediria á camara, que não tomasse resolução alguma, porque o caminho de ferro ainda é problemático; intendo que não tem sido mais que uma pura ficção até hoje, porque até agora, em todos os actos que se teem practicado, não tem havido mais que bons desejos, e um caminho de ferro feito sómente com bons desejos não passa de ficção, não passa além da pomposa inauguração, e nada mais.

Sr. Presidente, eu intendo que nós não devemos tractar deste negocio do caminho de ferro, porque ainda não sabemos se havemos de applicar esses fundos para este caminho, ou para outro, porque com esta companhia não ha cousa nenhuma com que se possa contar; e tambem não sabemos se ha de ser em virtude deste contracto, ou de outro contracto, ou de outro programma que ainda haja de apparecer

Conclue finalmente a illustre commissão propondo que se conserve uma pensão de 6:800$000 reis, que se tem pago até hoje ao sr. conde de Penafiel, pela privação do officio de correio-mór, que pertencia á sua familia. Eu intendo que esta pensão não deve de modo nenhum ser approvada pelo corpo legislativo, porque, em virtude dos preceitos da caria constitucional, os empregos não são propriedade de ninguem. Em virtude desta doutrina, não só o sr. conde de Penafiel, mas muitos outros proprietarios de empregos publicos os perderam e não tiveram compensação alguma, e nesta mesma casa ha alguns nessas circumstancias, e quando os não houvesse aqui, havia lá fóra muitos; além de que a justiça deve ser igual para todos, e por consequencia muito embora a illustre commissão venha dizer que não concede esta pensão, mas sim um titulo de renda VII alicia, todavia no orçamento se abona uma verba para pagar ao sr. conde de Penafiel uma pensão a que não tem direito, e que com justiça não se deve abonar, embora se pague por a repartição do correio, ou por outra repartição do estado; a verba lá está, e ha de necessariamente influir na despeza publica.

Eu não combato aqui senão o modo como se applica esta ou aquella despeza; combato aquellas despezas que são injustas, e que não posso deixar de combater, hei de combatel-as sempre com todas as minhas fôrças.

Concluindo, digo, que não posso deixar de reprovar o parecer da commissão, que está em discussão, por todos os fundamentos que apresentei, e porque intendo que em todos os ministerios ha muitas ver

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bas que devem ser destruidas, e outras substituidas, e porque por este meio se podem estabelecer muitas economias que a illustre commissão não apresenta no seu parecer.

Sr. presidente, se houver de passar este parecer, eu desde já declaro, que não voto por essas reducções mesquinhas que nelle se apresentam, porque intendo, que por tão pouco não vale a pena de se mexer na area santa dos srs. ministros, quero que a sua obra passe limpa de toda a correcção.

O sr. Palmeirim (Sobre a ordem): — Mando para mesa o parecer da commissão de fazenda, ácerca da proposta de lei apresentada na sessão de hoje pelo sr. ministro da fazenda, a fim de que o governo seja auctorisado para proceder á cobrança dos impostos e mais rendimentos publicos respectivos ao anno economico de 1853 a 1854, e applicar o seu producto ás despezas do estado correspondentes a esse mesmo anno. Peço que este parecer e o projecto sejam impressos no Diario do Governo de ámanhã.

Assim se resolveu.

O sr. Presidente: — Continua a discussão sobre a generalidade do orçamento.

O sr. Maia (Francisco): — Sr. presidente, eu tinha pedido a palavra para explicar, que não intendia o que queria dizer a discussão na generalidade deste projecto, por isso que intendo, que o orçamento não póde ser rejeitado na sua totalidade, e que a expressão generalidade, não é senão aquillo que se está vendo — divagações, fallando-se sobre objectos que não vem nada para a discussão actual, e tomando-se tempo á camara, sem haver nada que resolver em relação ao objecto que se_ discute.

O illustre deputado que encetou a discussão, disse, que não intendia nada do orçamento; porém depois manifestou que intendia, e que intendia muito; mas apesar de intender muito, persuado-me que elle não intendeu o que é um orçamento. O orçamento não é uma collecção de leis de administração e de fazenda; o fim do orçamento não é reformar as leis existentes; e se os nobres deputados intendem, que se podem e devem fazer no orçamento certas e determinadas reformas, então proponham essas reformas, e não queiram que a commissão de fazenda se encarregue de tudo, quando os illustres deputados que teem a iniciativa como a commissão de fazenda tem, ainda se não lembraram de propôr esses grandes melhoramentos de reforma; e comtudo censuram a commissão de fazenda, porque não se tem encarregado desses trabalhos.

Rogo, pois, aos nobres deputados que nos apresentem esses trabalhos, e que não queiram encarregar aos outros o que pertence a todos, porque todos os deputados são obrigados a trabalhar do mesmo modo. (Apoiados) A missão da commissão de fazenda, na qualidade de commissão do orçamento, é simplesmente verificar, se as verbas contidas no orçamento, quer de receita, quer de despeza, estão auctorisadas por lei, e se estão alli na conformidade das leis. Logo que se conheça que ellas estão nestas circumstancias, a commissão póde mencional-as no seu parecer, e propôr a sua approvação; porque uma vez que as verbas do orçamento estão alli designadas, em virtude de uma lei, só em virtude de outra lei e que podem ser eliminadas. (Apoiados)

A commissão adoptou o principio, de que não é pela discussão do orçamento que se organisa a fazenda publica; para mim isto é um absurdo. (Apoiados) Portanto se alguns srs. deputados pretendem tirar do orçamento uma ou outra verba, então apresentem, para esse fim, um projecto de lei. (Apoiados)

Sr. presidente, eu declaro a v. ex.ª e á camara, que a commissão de fazenda trabalhou de dia e de noite na confecção deste projecto; fez economias, alterou e adoptou varias disposições com relação a despezas, de accordo com o governo, porque os srs. ministros prestaram-se a entrar nas conferencias da commissão, e tiveram de concordar com algumas das suas observações. O nobre deputado o sr. barão de Almeirim foi tão apressado nas censuras injustas, que dirigiu á commissão de fazenda, que até a censurou, dizendo — que a commissão não tinha adoptado uma disposição, pela qual não podessem ser admittidos nas vacaturas dos quadros effectivos senão os individuos fóra dos quadros — quando é certo, que a commissão, no projecto em discussão, propõe, que o governo não possa prover nos logares que vagarem nas diversas repartições, senão os individuos que houverem fora dos respectivos quadros. O que é notavel é, que o illustre deputado censurou primeiro a commissão, dizendo, que não tinha proposto economia alguma, e depois censurou-a por ter proposto a economia relativa á reducção por uma renda vitalicia, a pensão que se está dando ao conde de Penafiel pelo seu emprego de correio-mór do reino. O que é certo é que esta pensão, bem ou mal intendida, tem um caracter legal, que lhe dá a lei; e a commissão de fazenda, reduzindo esta pensão a uma renda vitalicia, longe de merecer censura da parte do nobre deputado, devia merecer-lhe muitos louvores.

O illustre deputado que encetou a discussão, disse, que tinha informações muito circumstanciadas sobre o, que se passa no ministerio da marinha, actualmente. A commissão pouco importa que o illustre deputado tenha estas informações, porque não é da competencia da commissão examinar o que se passa nas differentes repartições; a sua missão é aquella que cumpriu, isto é, avaliar as despezas que se fizeram naquella repartição, e nos differentes ramos a cargo do ministerio da marinha. Em quanto aos quadros estabelecidos por lei, a commissão intendeu que não devia tocar-lhe; e em quanto ás outras despezas eventuaes, intendeu que ellas estavam calculadas aproximadamente, segundo as necessidades que o governo apresentou, a respeito das quaes o sr. ministro da marinha deu todas as explicações á commissão, e provavelmente tambem as dará á camara.

A commissão de fazenda convidou todas as commissões da camara a que mandassem um dos seus membros para ser ouvido por ella; e o que está no orçamento foi feito com consentimento, annuencia, ou parecer, que esses srs. deputados, delegados das differentes commissões, manifestaram perante a commissão de fazenda. Não referirei o que se passou na commissão, porque isto não é para aqui; mas o resultado foi serem ouvidos esses srs. deputados, e a commissão de fazenda, depois de os ouvir, concordou no parecer que se apresenta.

O sr. deputado que acabou de falar, disse — que rejeitava as mesquinhas economias que a commissão propõe; — ellas não são nada; mas a commissão não podia propôr outras. Se o sr. deputado intende, que póde propol-as maiores, tem a liberdade de, durante a discussão, offerecer os convenientes projectos de lei,

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porque a commisão intende, é creio que a camara tambem intende, que não se póde eliminar despeza feita em virtude de lei, sem que se proponha um projecto de lei, que deve ser discutido previamente, para depois ser levado ao orçamento, porque o orçamento contém as despezas que são feitas em virtude da lei, que tem passado devidamente.

Disse o illustre deputado tambem, que linha muitas economias a propôr, e que só no ministerio da marinha a commissão dê fazenda do anno passado fazia uma economia dê 100 contos. Não me lembra da verba de economia que se propunha, mas sei que do modo por que se faziam as reducções, em logar de 100 ou 200 contos, podia-se eliminar toda a despeza, porque não havia mais que fazer do que chegar ao ministerio da guerra e em logar de 2:000 contos, votar só 1:000 contos, pegar em um empregado é despedil-o ou reduzil-o a metade, etc.; deste modo com muita facilidade se fazem economias.

Um illustre deputado, que te um dos ornamentos desta camara, pediu a palavra para fazer algumas reflexões sobre a organisação de fazenda, ou sobre as medidas financeiras; mas permitta-me o illustre deputado que lhe observe, que não e a discussão do orçamento que nos ha de levar á organisação da fazenda; essa ha de necessariamente nascer do fomento da industria e do commercio; e do augmento da riqueza do paiz que só póde vir o rendimento necessario para fazer face ás despezas; de outra maneira e impossivel. Como podem haver contribuições, se não houver contribuintes habilitados para as pagar? Embora se julgue isto uma idea banal, mas e exacta; e o que se practica nos paizes estrangeiros, o prova. A nossa visinha Hespanha, apezar das difficuldades em que se tem visto continuamente, não tem desesperado, e todos os ministerios de todas as côres politicas que alli tem havido, tem constantemente procurado fomentar as fontes de riqueza nacional, já promovendo a mineração, a communicação intenta por meio de caminhos de ferro; já fomentando as industrias de todas ás especies, as relações com as suas colonias, e a sua grande navegação; é desta maneira é que tem conseguido dos contribuintes as sommas necessarias para fazer face ás suas despezas. Vozes: — Deu a hora.

O sr. Presidente -A ordem do dia para ámanhã será, primeiramente a apresentação de projectos de lei pelos srs. deputados que para isso estão inscriptos, e depois a continuação da que vinha para hoje. Está levantada a sessão. — Eram quatro horas da tarde.

O REDACTOR

José de Castro Freire de Macedo.

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