2144 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
Desejo tambem lembrar a s. exa., que me parece necessario que o governo olhe um pouco para o modus vivendi que se tem estabelecido na construcção d'esta linha, entre os pequenos empreiteiros e os differentes operarios, que são empregado, na construcção.
S. exa., de certo, já tem conhecimento, como toda agente, pelos jornaes, das gravissimas desordens que ahi se têem dado, provenientes principalmente de duas causas; a primeira, porque os empreiteiros não pagam semanalmente aos operarios, mas, pelo contrario, umas vezes ás quinzenas, outras vezes de mez a mez e em prasos muito dilatados. V. exa. muito bem comprehende que, não sendo os operarios Capitalistas e andando a trabalhar em obras tão custosas, como são aberturas de tunneis e outras similhantes, e não vendo na mão o producto do seu trabalho, para adquirirem, como quizerem e onde quizerem, os generos necessarios á sua sustentação e ao seu alimento, vêem-se compreendidos, não só a atacar a propriedade alheia, mas d´isso a envolverem-se em desordens com os empreiteiros, dando em resultado ferimentos e mortes. Ainda ha pouco os jornaes têem posto em relevo dois ou tres factos d'essa ordem praticados proximo da cidade da Guarda.
Parece-me, pois, que os licaes que o governo tem junto da construcção d'aquella linha, por uma questão de ordem publica, que interessa a tudo, devem tratar de vigiar e fiscalizar estes diferentes factos e actos praticados pelos empreiteiros, por fórma que estabeleçam ahi a ordem e não a desordem, e que procurem fazer com que os operarios sejam espreitados nos seus direitos, como cidadãos portuguezes e como pobres e desgraçados que são.
Era sobre estes pontes que desejava chamar a attenção do Sr. ministro das obras publicas, e aguardo a resposta de S. exa., pedindo a v. exa. que me inscreva para fallar depois de s. exa. ter terminado.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): — já depois de s. exa. me ter fallado aqui ha mezes, na questão dos projectos definitivos do caminho de ferro da Beira Baixa, appareceu no Diario do governo uma portaria, que em parte responde ás observações do illustre deputado. Não sei se s. exa. tem conhecimento d'essa portaria.
Essa portaria manda adoptar a variante feita pelos engenheiros os srs. Perfeito de Magalhães e Navarro, e determina á companhia que apresente o projecto definitivo segundo aquella variante.
Consta - me que a companhia está fazendo os estudos n'esta conformidade, e já vê v. exa. que em parte estão satisfeitos os seus desejos.
A companhia terá uma certa repugnancia em aceitar a variante; disse mesmo que ia levantar arbitragem por causa dos projectos, e que esses projectos importavam para a companhia um tunnel de 30 metros, isto é, despeza de duzentos e tantos contos de réis. Foi, porém, o que eu ordenei.
Approvei o projecto dos engenheiros do governo, e ordenei que a companhia fizesse esse projecto, conforme as disposições do contrato, que dá ao governo auctorisação para o fazer.
Com relação á demora no trabalho, parece-me que o illustre deputado apreciou mal a questão, imaginando que a Companhia tem interesse qualquer em demorar a construcção.
Emquanto os trabalhos não estão concluidos, a companhia nada receba. O illustre deputado sabe que aquella linha é construida garantia de juros, e emquanto a linha não for aberta á exploração, e portanto emquanto não estiver concluida, a companhia nada recebe. Conseguintemente não ha gerencia alguma n´essa demora, mas sim perda valiosa.
Relativamente aos empreiteiros, s. exa. sabe que as empreitadas já estão em cinco ou seis. Primeiramente a obra foi contratada com um sub-empreiteiro; depois este passou a outro, e assim successivamente; a o governo não póde nem deve intervir n'isso; limita-se unicamente a fiscalisar os trabalhos, e a usar dos meios de fiscalisação que o regulamento lhe garante.
São estas as explicações que eu tenho a dar ao illustre deputado.
O sr. Franco Castello Branco: — Parece-me que o illustre ministro se esqueceu de responder a uma das perguntas.
O Orador: — Com effeito. Com relação á outra pergunta s. exa. tem na portaria que approvou os estudos, parece-me que até á Covilhã, a declaração expressa de que o praso começa-se a contar da data d'aquelle projecto, para aquella secção; e é claro que para as outras só se póde contar depois da approvação dos projectos.
Assim tenho respondido ás observações do illustre deputado.
O sr. Franco Castello Branco: — Sr. presidente, peço a v. exa. que consulte a camara sobre se consente que eu responda desde já ao sr. ministro das obras publicas.
Vozes: - Falle, falle.
O sr. Franco Castello Branco: — Uma pequena observação em resposta ás considerações do sr. ministro das obras publicas.
Eu estimo muito saber que o governo, por uma portaria, ordenou para a companhia qual devia ser o traçado por ella seguido, e quaes os estudos a fazer do unico lanço cujo projecto definitivo ainda não está approvado. Mas estimaria muito mais de saber que a companhia tinha dado cumprimento á portaria e não ficado em uma situação equivoca.
S. exa. disse que a companhia ficou tão descontente com aquella portaria do governo, que manifestou a intenção de recorrer á arbitragem.
O que eu desejo saber é que praso se concedeu á companhia para cumprir a portaria, isto é, para apresentar o projecto relativamente aos estudos que se mandaram fazer, ou para recorrer á arbitragem.
O que não póde ser é o governo publicar uma portaria para não produzir resultados alguns.
Continúo a dizer: está o projecto relativo a esse lanço approvado?
Não está.
Esta é que é a questão principal.
O sr. ministro ordenou que se fizessem certos estudos; pois, se a companhia não cumprir as ordens do governo, eu peço a s. exa. que empregue outros meios mais energicos, mas consoantes a effectuarem-se os mesmos estudos.
Quanto ao interesse que s. exa. diz haver para a companhia em apressar a construcção da linha, as rasões apresentadas parecem á primeira vista concludentes.
Mas, sendo assim, não sei como a companhia não procura habilitar-se promptamente com os primeiros elementos para a construcção, os quaes são os estudos e os projectos.
Pois a companhia tem todo o interesso em completar a linha, para receber a annuidade da garantia de juro, e está demorando ha dois annos a representação dos projectos definitivo. quando sem elles nenhuma obra póde começar?
Eu supponho que ha aqui algum outro interesse.
O sr. ministro não ignora que a respeito da companhia se dão circumstancias de tal ordem, circumstancias que eu não posso nem quero estar a explanar na camara, que constituem um ponto de interrogação realmente duvidoso.
A companhia tem todo o interesse em que se conclua a obra quanto antes, mas o que é certo é que ella até hoje não apresentou um projecto definitivo completo, o que é certo é que os trabalhos continuam com todo o vagar, e o que é certo é que a companhia não construe directamente,